Artigo de periódico
Os problemas relacionados às perícias judiciais para a constatação de doença ocupacional e a responsabilidade objetiva do empregador pelos danos decorrentes de acidente do trabalho e adoecimentos ocupacionais
Artigo de periódico
Os problemas relacionados às perícias judiciais para a constatação de doença ocupacional e a responsabilidade objetiva do empregador pelos danos decorrentes de acidente do trabalho e adoecimentos ocupacionais
O tema é da maior atualidade, pois a partir da publicação da Emenda Constitucional n. 45/2004 e, sobretudo, após o histórico julgamento do CC n. 7.204-1/Minas Gerais, em 2005 pelo Tribunal Pleno do E. STF, a Justiça do Trabalho passou a se deparar com inúmeros casos de alegação de doença ocupacional. Desde então, os juízes do trabalho passaram a cuidar de questões relacionadas ao bem jurídico de maior relevância para os trabalhadores: sua saúde; de modo que não podemos mais permitir a monetarização desse direito, como ainda ocorre em questões relacionadas às horas extras, aos adicionais de insalubridade e de periculosidade, somente para citar alguns exemplos. Ora, a saúde do trabalhador se trata de um direito humano fundamental. Contudo, as estatísticas de acidente do trabalho demonstram um total descaso para com esse direito essencial. De acordo com o Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho da Previdência Social, houve 545.268 acidentes com CAT emitida em 2008, sendo 80% (438.536) de acidentes típicos. Onde estão as doenças ocupacionais? Segundo as estatísticas, elas representam pouco mais de 3% (18.576) das CATs emitidas. Isso não corresponde à realidade, pois a maior parte dos processos trabalhistas que envolvem a questão traz à tona casos de doenças ocupacionais, não de acidentes típicos. Isso já permite concluir que há, mesmo, uma acentuada subnotificação de acidentes, mormente de adoecimentos relacionados ao trabalho. Para se ter a clareza dessa afirmação, basta constatar que o Anuário referido aponta a quantia de 202.395 acidentes sem CAT emitida, principalmente pela presunção estabelecida a partir do NTEP (Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário). Assim, tivemos no Brasil, somente no ano de 2008, um total de 747.663 acidentes e adoecimentos laborais, dos quais 27% nem foram notificados. Demais, houve um aumento de 60%, de 2001 de a 2008, no número de acidentes do trabalho. E um aumento absurdo de 586% de LER/DORT apenas de 2006 a 2008, com um custo aproximado de R$ 2,1 bilhões, cerca de 1/5 do que se gasta com bolsa-família, um dos programas sociais mais difundidos no atual governo. Isso é, sem dúvida, resultado da intensificação do trabalho, quantitativa e qualitativa, razão pela qual todos os organismos sociais devem lutar pela diminuição da carga horária efetivamente trabalhada (horas extras) e do nível de produtividade (ritmicidade) exigido, atualmente, pelas empresas. Como se não bastasse, mais de 40% dos acidentes típicos atingem dedos, mãos e punho, a principal "ferramenta" do trabalhador, boa parte das vezes gerando incapacidade para o trabalho, pelo menos parcial ou temporária. Mas há uma estimativa da OIT, de 2006, ainda mais assustadora, segundo a qual 6.000 trabalhadores morrem todos os dias, no mundo, em decorrência de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho. Outra estimativa da referida Organização, de 2002, aponta para 2.000.000 de trabalhadores mortos por ano, no mundo, por acidentes do trabalho, ao passo que 900.000 pessoas morrem em acidentes de trânsito, 500.000 devido às guerras e 312.000 de AIDS/SIDA. Ora, isso demonstra que estamos vivendo uma verdadeira "guerra civil" em termos de acidente do trabalho, que mata duas vezes mais do que acidentes de trânsito e quatro vezes mais do que as próprias guerras. E o que tem sido feito pelos governos? Muito pouco. No Brasil, vemos políticas públicas de combate às doenças comuns, para se evitar endemias, pandemias etc., mas quase nada existe para a prevenção dos acidentes do trabalho, inclusive com campanhas educativas e publicitárias. Ocorre que, apenas a título exemplificativo, os acidentes laborais matam 60 vezes mais do que a dengue. Em 2005, houve 45 mortes por dengue no Brasil, enquanto 2.708 trabalhadores perderam sua vida por acidentes do trabalho. Há, pois, no Brasil, uma verdadeira epidemia de acidentes e adoecimentos ocupacionais, com uma naturalização espantosa por parte dos atores sociais e jurídicos. Algo deve ser feito, e urgente!.
Para citar este item
https://hdl.handle.net/20.500.12178/166894Notas
Palestra proferida no XXXII CONAT - Congresso Nacional dos Advogados Trabalhistas, em Florianópolis, em 4 set. 2010.Notas de conteúdo
O problema das perícias judiciais para a constatação de doença ocupacional: A necessária compreensão do nexo de causalidade, da concausa e das doenças degenerativas. Reflexões necessárias sobre a temática -- O exame de um caso concreto: A equidade e as máximas de experiência comum -- A responsabilidade objetiva do empregador pelos danos decorrentes de acidente do trabalho e adoecimentos ocupacionais: Evolução histórica da responsabilidade civil. A teoria da responsabilidade objetiva na infortunística. A responsabilidade objetiva como responsabilidade trabalhista e contratualFonte
SILVA, José Antônio Ribeiro de Oliveira. Os problemas relacionados às perícias judiciais para a constatação de doença ocupacional e a responsabilidade objetiva do empregador pelos danos decorrentes de acidente do trabalho e adoecimentos ocupacionais. Revista Ltr: legislação do trabalho, São Paulo, v. 74, n. 11, p. 1325-1333, nov. 2010.Veja também
-
Nexo técnico epidemiológico (NTEP) e fator acidentário de prevenção (FAP): objetivo apenas prevencionista, apenas arrecadatório, ou prevencionista e arrecadatório?
Araújo Júnior, Francisco Milton | jul. 2010A crescente complexidade das relações sociais e o avanço científico vêm desencadeando profundas modificações no meio ambiente laboral, na medida em que a acentuada utilização dos mecanismos tecnológicos nos empreendimentos econômicos propicia a elevação das exigências no desempenho das atividades profissionais pelo ... -
Responsabilidade civil no acidente do trabalho e doenças ocupacionais: o nexo causal
Stangler, José Renato | 2014Nos casos de danos à saúde do trabalhador, a regra é a impossibilidade de reparação do dano, uma vez que estes quase sempre são irreversíveis e irreparáveis. Consequentemente, substitui-se a reparação por uma compensação por danos material, moral e estético. A responsabilidade civil do empregador, decorre, de um lado, ... -
Os limites da responsabilidade objetiva
Pinto Junior, Amaury Rodrigues | 2019Durante o exercício da atividade laborativa o trabalhador está sujeito a incontáveis riscos para sua saúde e integridade física, seja em decorrência de acidentes típicos, seja em função de doenças causadas ou agravadas pelas condições em que o trabalho é desenvolvido, as quais podemos genericamente nominar de "doenças ... -
Repercussões do enquadramento da Covid-19 como doença ocupacional
Oliveira, Sebastião Geraldo de | jul. 2020Aborda especialmente a questão controvertida do enquadramento da Covid-19 como doença ocupacional. Com a chegada do novo coronavírus surgiram intensas indagações se essa nova patologia pode ou não ser considerada com doença relacionada ao trabalho, especialmente em razão das diferenças acentuadas de repercussões jurídicas ... -
Enquadramento da Covid-19 como doença ocupacional
Oliveira, Sebastião Geraldo de | set. 2020Aborda especialmente a questão controvertida do enquadramento da Covid-19 como doença ocupacional. Com a chegada do novo coronavírus surgiram intensas indagações se esta nova patologia pode ou não ser considerada com doença relacionada ao trabalho, especialmente em razão das diferenças acentuadas de repercussões jurídicas ... -
Adoecimento psíquico ocupacional no Distrito Federal e em Tocantins sob a ótica da psicodinâmica do trabalho
Chehab, Ana Cláudia de Jesus Vasconcellos | jun. 2015[por] Introdução: O adoecimento psíquico pelo trabalho afeta inúmeros trabalhadores e empresas, sobrecarrega os serviços de saúde e de previdência e desafia os operadores do Direito e da Saúde. Objetivo: quantificar e avaliar o adoecimento psíquico pelo trabalho no Distrito Federal e em Tocantins à luz da psicodinâmica ... -
A prevenção como forma de combater os acidentes de trabalho e doenças ocupacionais e de promover a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho
Moreira, Adriano Jannuzzi; Magalhães, Aline Carneiro | dez. 2012A partir do momento em que a dignidade da pessoa humana e sua efetivação se tornam o fim maior do ordenamento jurídico este escopo começa a permear o mundo juslaboral. As grandes transformações tecnológicas ocorridas nos últimos tempos que nos permitem, ao leve toque de um dedo se conectar, em tempo real, com alguém do ... -
A substituição da monetização da saúde pela diminuição de jornada
Mafra, Juliana Beraldo | jun. 2014A monetização da saúde é a expressão utilizada para se referir ao pagamento de um adicional em decorrência da exposição do trabalhador a agentes nocivos à sua saúde. Trata-se de compensar o trabalhador pecuniariamente pelos possíveis danos a que ele está sujeito por força do trabalho. Essa forma de tratamento dos trabalhos ... -
A Covid-19 como doença do trabalho ou acidente do trabalho e a responsabilidade do empregador
Belmonte, Viviana Rodrigues Moraya Agra | dez. 2021[por] Em um caso concreto, um juiz trabalhista sentenciou um empregador ao pagamento de indenização por danos materiais na forma de pensão mensal e indenização por danos morais, com base na teoria da responsabilidade objetiva do empregador. Diante de tantos outros casos que surgirão a esse respeito, visto que a pandemia ... -
A responsabilidade objetiva do empregador pelos danos decorrentes de acidente do trabalho
Silva, José Antônio Ribeiro de Oliveira | jan. 2010Após a Emenda Constitucional n. 45/2004 os atores jurídicos do segmento trabalhista passaram a dar atenção ao bem mais importante do patrimônio do trabalhador: sua saúde. É de todos sabido que o direito à saúde, em geral, e o direito à saúde do trabalhador, como espécie, estão compreendidos no rol de necessidades básicas ...