Artigo de periódico
O trabalho como sofrimento: o adoecimento mental causado pelo assédio moral, suas fases, formas de desenvolvimento e normatização no Brasil
Artigo de periódico
O trabalho como sofrimento: o adoecimento mental causado pelo assédio moral, suas fases, formas de desenvolvimento e normatização no Brasil
Ao longo da história, a concepção subjetiva e coletiva sobre trabalho alternouse entre a ideia de ativação por meio da qual se alcança a divindade até o trabalhar como instrumento de tortura, pena e sofrimento. Independentemente da visão predominante em cada cultura e suas influências e ao longo dos séculos, fato é que o trabalho humano é criador das relações entre homens e entre estes e a natureza. Essa ativação caracteriza-se, portanto, como instrumento de manutenção e reprodução da vida e que permite ao trabalhador criar e transformar-se também por esse processo. Ainda que a centralidade do trabalho humano aponte para sua essencialidade na sociedade, como produção de valor, ressaltase que o cuidado com o homem que se ativa e a preocupação com meio ambiente do trabalho e saúde remontam à história mais recente e são dotados de fases. Enquanto o desenvolvimento do capitalismo industrial caracterizou-se por jornadas longas, condições precárias de trabalho e moradia, acidentes de trabalho graves, sem o desenvolvimento de meios para proteção da saúde do trabalhador, em momento posterior, as políticas higienistas e de protagonismo estatal assumiram destaque. Assim, o surgimento das primeiras normas trabalhistas, os pactos para redução de jornada de trabalho e as primeiras leis europeias sobre acidente de trabalho e indenização foram o mote da primeira fase do movimento em prol da saúde do trabalhador – com o marco temporal de destaque a Primeira Guerra Mundial e as bases então criadas para a medicina do trabalho, segundo Dejours. A luta pela sobrevivência do início da industrialização do século XIX deu lugar a luta pela saúde do corpo. Nesse primeiro momento o foco era a saúde física da classe operária (o corpo dócil), assumindo relevo o aspecto mental apenas a contar da segunda onda de proteção ao meio ambiente e saúde do trabalhador – cujo ápice se deu a partir dos acontecimentos de 1968, como os movimentos sociais contrários à sociedade de consumo e as greves selvagens do período. Para a compreensão do adoecimento mental, é preciso definir a organização do trabalho como um dos fatores que podem desencadeá-lo. Nesse sentido, a busca por produtividade e os comandos empresariais podem travestir-se de elementos causadores de assédio moral e adoecimento psíquico dos trabalhadores. Considerando esses aspectos, e a guerra psicológica que pode ser formada pelo assédio moral, inclusive ensejando consequências como absenteísmo, depressão, ansiedade e suicídio, este artigo tem como objetivo inicial a abordagem dos aspectos psíquicos que envolvem a relação entre assediador e assediado. Serão verificados tanto o desenvolvimento dos comportamentos de assédio, como fatores que propiciam o surgimento dessa forma de dominação e terror psicológico no estabelecimento empresarial. Na sequência, serão verificados os diferentes tipos de assédio moral e possíveis repercussões a depender da posição das partes na empresa. Por fim, será abordado o conjunto normativo que envolve a proteção de trabalhadores nessas condições, com enfoque sobre a legislação brasileira recente sobre o tema e peculiaridades dela decorrentes. Para tanto, se utilizará o método bibliográfico, tendo como referência o conceito de psicodinâmica do trabalho, como desenvolvidos por Christophe Dejours, e os estudos de assédio moral capitaneados por Marie-France Hirigoyen.
Para citar este item
https://hdl.handle.net/20.500.12178/179982Itens relacionados
Notas de conteúdo
O relacionamento entre assediador-assediado e elementos propícios ao seu desenvolvimento -- Os tipos de assédio moral e a regulamentação pela lei brasileiraFonte
CARMO, Jéssica Lima Brasil. O trabalho como sofrimento: o adoecimento mental causado pelo assédio moral, suas fases, formas de desenvolvimento e normatização no Brasil. Revista eletrônica [do] Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, Curitiba, v. 9, n. 88, p. 73-79, maio 2020.Veja também
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