PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO Revista do Tribunal Superior do Trabalho Ministro Almir Pazzianotto Pinto Presidente Ministro José Luiz Vasconcellos Vice-Presidente Ministro Francisco Fausto Paula de Medeiros Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho Ministro João Oreste Dalazen Ministro Carlos Alberto Reis de Paula Ministro Antônio José de Barros Levenhagen Comissão da Revista Ano 66 - n° 3 - jul a set - 2000 RS/Porto Alegre - Av. Pernambuco, 2810 - CEP 90240-002 - Fone (51 ) 346.1300 / Fax: (51 ) 222.9142 SP/São Paulo - Pça. da República, 376/11° and. - CEP 01045-000 - Fone/Fax: (11) 3224.9600 RJ/Rio de Janeiro-R. Buenos Aires, 70/6° and. - CEP 20070-020 - Fone: (21) 224.3399 / Fax: (21)252.9143 PE/Recife - Marquês de Olinda, 200/310 - CEP 50030-000 - Fone/Fax: (81 ) 224.1868 Internet: www.sintese.com - E-mail: sintese@sintese.com ISSN 0103-7978 Revista do Tribunal Superior do Trabalho / Tribunal Superior do Trabalho. -Vol. 21,n.l (set./dez. 1946) - Rio de Janeiro : Imprensa Nacional, 1947-. Trimestral Irregular de 1946-1968. Suspensa de 1996-1998. Continuação de: Revista do Conselho Nacional do Trabalho, 1925-1940 (maio/ago.). 1977-1993 - coord. do Serviço de Jurisprudência e Revista. A partir de 1994, sob coord. da Comissão de Documentação. Editor: 1946-1947, Imprensa Nacional. 1948-1974, Tribunal Superior do Trabalho. 19751995, LTr. 1999-, Síntese. 1. Direito do Trabalho. 2. Processo Trabalhista. 3. Justiça do Trabalho - Brasil. 4. Jurisprudência Trabalhista - Brasil. I. Brasil. Tribunal Superior do Trabalho. CDU 347.998.72(81) (05) Organização e Supervisão: Ana Celi Maia de Miranda Equipe: José Geraldo Pereira Baião - Revisor João Cláudio Fernandes Sena Soraya Christina Tostes R. Vivacqua Luiz Carlos Lirio Chaves Capa: Andrea Paiva Nunes Editoração Eletrônica: Editora Síntese Ltda Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do Tribunal Superior do Trabalho. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate sobre questões jurídicas relevantes para a sociedade brasileira e de refletir as várias tendências do pensamento jurídico contemporâneo. Tribunal Superior do Trabalho Editora Síntese Ltda. Subsecretaria de Documentação Praça dos Tribunais Superiores, Bl. D, Anexo II - Térreo 70097-900 Brasília DF Fone: (61) 314,4235 E-mail: biblioteca@tst.gov.br Internet: www.tst.gov.br Av. Pernambuco, 2810 90240-002 Porto Alegre RS Fone: (51) 346.1300 Fax: (51) 222.9142 E-mail: sintese@sintese.com Internet: www.sintese.com Tribunal Pleno Ministro Almir Pazzianotto Pinto - Presidente Ministro José Luiz Vasconcellos - Vice-Presidente Ministro Francisco Fausto Paula de Medeiros - Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho Ministro Wagner Antônio Pimenta Ministro Vantuil Abdala Ministro Ronaldo José Lopes Leal Ministro Rider Nogueira de Brito Ministro José Luciano de Castilho Pereira Ministro Milton de Moura França Ministro João Oreste Dalazen Ministro Gelson de Azevedo Ministro Carlos Alberto Reis de Paula Ministro Antônio José de Barros Levenhagen Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho Ministro João Batista Brito Pereira Seção Administrativa Ministro Almir Pazzianotto Pinto Ministro José Luiz Vasconcellos Ministro Francisco Fausto Paula de Medeiros Ministro Wagner Antônio Pimenta Ministro Vantuil Abdala Ministro Ronaldo José Lopes Leal Ministro Rider Nogueira de Brito Seção Especializada em Dissídios Coletivos Ministro Almir Pazzianotto Pinto Ministro José Luiz Vasconcellos Ministro Francisco Fausto Paula de Medeiros Ministro Wagner Antônio Pimenta Ministro Vantuil Abdala Ministro Ronaldo José Lopes Leal Ministro Rider Nogueira de Brito Ministro José Luciano de Castilho Pereira Ministro Milton de Moura França Subseção I Especializada em Dissídios Individuais Ministro Almir Pazzianotto Pinto Ministro José Luiz Vasconcellos Ministro Francisco Fausto Paula de Medeiros Ministro Wagner Antônio Pimenta Ministro Vantuil Abdala Ministro Rider Nogueira de Brito Ministro Milton de Moura França Ministro Carlos Alberto Reis de Paula Ministro João Batista Brito Pereira Subseção II Especializada em Dissídios Individuais Ministro Almir Pazzianotto Pinto Ministro José Luiz Vasconcellos Ministro Francisco Fausto Paula de Medeiros Ministro Ronaldo José Lopes Leal Ministro José Luciano de Castilho Pereira Ministro João Oreste Dalazen Ministro Gelson de Azevedo Ministro Antônio José de Barros Levenhagen Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho Juiz Convocado Márcio Ribeiro do Valle* * Convocado em virtude da aposentadoria do Exm° Sr. Ministro Valdir Righetto, ocorrida em 05.05.2000. Juiz Convocado Horácio Raymundo de Senna Pires** Primeira Turma Ministro Wagner Antônio Pimenta Ministro Ronaldo José Lopes Leal Ministro João Oreste Dalazen Segunda Turma Ministro Vantuil Abdala Ministro José Luciano de Castilho Pereira Juiz Convocado Márcio Ribeiro do Valle Terceira Turma Ministro José Luiz Vasconcellos Ministro Carlos Alberto Reis de Paula Juiz Convocado Horácio Raymundo de Senna Pires Quarta Turma Ministro Milton de Moura França Ministro Antônio José de Barros Levenhagen Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho Quinta Turma Ministro Rider Nogueira de Brito Ministro Gelson de Azevedo Ministro João Batista Brito Pereira ** Convocado em virtude da aposentadoria do Exm° Dr. Ministro Ursulino Santos Filho, ocorrida em 26.08.2000. Sumário APRESENTAÇÃO (Almir Pazzianotto Pinto) ...............................................................................................................13 DOUTRINA 1. Ação Rescisória: descabimento para impugnar sentença homologatória de acordo (João Oreste Dalazen).................................................................................................................17 2. As ações coletivas e a reforma do Judiciário - O poder normativo e o dissídio econômico de ambas as partes (Ricardo Sampaio)........................................................................................................................27 3. As mudanças no mundo: a globalização, os princípios do Direito do Trabalho e o futuro do trabalho (Georgenor de Sousa Franco Filho)......................................................................................34 4. O direito ao trabalho no conjunto mais amplo dos direitos humanos. Aspectos de sua proteção jurídica no Direito Constitucional brasileiro (Marcus Moura Ferreira)................................................................................ 49 5. Inteligência dos artigos 94, caput, 111, § 2o, e 115 da Constituição Federal - Parecer (Ives Gandra da Silva Martins)................................................................................................77 6. Adequação no número de juízes do Tribunal Regional do Trabalho em virtude de extinção da representação classista por Emenda Constitucional. Interpretação do TST que destina a vaga pertencente a membros da advocacia a juiz togado. Impossibilidade - Parecer (Clémerson Merlin Clève)........................................................................................................83 7. As comissões de conciliação prévia como novo paradigma para o Direito do Trabalho (Raimundo Simão de Melo) .................................................................................................104 8. Jus variandi e alterações contratuais: limites jurídicos (Mauricio Godinho Delgado).................................................................................................129 9. Contratos de trabalho rural e agrários (Saulo Emídio dos Santos)......................................................................................................139 10. O trabalhador rural e a nova prescrição (Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena)......................................................................................144 11. Trading blocks e política trabalhista (Octavio Bueno Magano)......................................................................................................159 Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 11 SUMÁRIO CONCURSO DE MONOGRAFIAS Não intervenção do Estado nas relações de trabalho - Cláusula social nos tratados internacionais (Fernando Resende Guimarães).................................................................................................169 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Orientação Jurisprudencial da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais............................................................................................................................................185 NOTAS E COMENTÁRIOS Posse da nova Administração......................................................................................................213 Homenagem ao Ministro Ursulino Santos Filho................................................................236 TST na 88a Conferência da OIT...................................................................................................237 Comissão de Documentação-nova composição.............................................................255 Ministro do TST -Doutorado.....................................................................................................256 JURISPRUDÊNCIA Acórdãos do TST..............................................................................................................................259 EMENTÁRIO Ementas do TST.................................................................................................................................393 ÍNDICE TEMÁTICO Índice da Jurisprudência do TST................................................................................................445 Índice do Ementário do TST........................................................................................................446 Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 12 APRESENTAÇÃO Sob a administração empossada no dia 1º de agosto, a Revista do TST preservará a orientação que tradicionalmente tem sido observada, comportando-se como instrumento instigador de debates acerca dos temas que dizem respeito ao trabalho e à legislação do trabalho no Brasil. Dentro dessa ótica, sem deixar à margem temas relevantes alusivos às garantias expressas pela Constituição da República, nas convenções e recomendações da OIT, CLT e toda a legislação material e processual, a nossa Revista quer tomar parte ativa nas investigações referentes às mudanças profundas e talvez irreversíveis nas relações de produção e, conseqüentemente, no convívio das empresas com os trabalhadores. Já não pode haver dúvidas sobre o avanço da terceirização e do mercado informal, o aparecimento de novas modalidades de remuneração, das empresas individualizadas, criadas, sobretudo, por executivos bem remunerados e integrantes do jornalismo e do mundo artístico. Não podemos ignorar, por outro lado, as pressões exercidas no sentido de se admitir a flexibilização do contrato individual por tempo indeterminado, permitindo que o empregador o altere dentro de limites preestabelecidos e o conserve em épocas de crise, evitando-se demissões de empregados. Ao mesmo tempo em que o mercado de trabalho declina acentuadamente nas indústrias de transformação e na agricultura - nos Estados Unidos, segundo a Folha de São Paulo (5/9/2000), o número de agricultores [1.900.000] é inferior à população carcerária [2 milhões] - em setores como o de informações, serviços, turismo, vigilância privada, atividades esportivas, a quantidade de pessoas engajadas profissionalmente tem aumentado, como também cresce o número daquelas que prestam serviços a tempo parcial ou contratadas temporariamente, requerendo legislações específicas. Acrescente-se a radical alteração do comportamento do Estado, abandonando a exploração de atividades econômicas, exceto em áreas tidas como estratégicas, fazendo-se substituir pela iniciativa privada nas telecomunicações, siderurgia, administração de ferrovias e rodovias, redes de transmissão elétrica e até mesmo em determinados ramos da segurança. Inserida em nosso País no centro do problema, a Justiça do Trabalho nem sempre tem o seu papel institucional corretamente avaliado por empregadores, trabalhadores, sindicatos e alguns representantes de outros Poderes. Não se reconhece, por exemplo, que as estruturas humana e material de que dispõe são insuficientes para que dê conta, com exemplar pontualidade, das tarefas que lhe são submetidas, não obstante, como registrava o presidente Wagner Pimenta, em artigo de abertura do volume anterior, venha batendo recordes sucessivos, com quase 112 mil processos julgados em 1998 e mais de 121 mil em 1999. Esta, aliás, tem sido a saga do TST, desde que aqui cheguei no mês de setembro de 1988, quando presidia a Corte o Ministro Marcelo Pimentel. Ele e os sucessores, Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 13 APRESENTAÇÃO Ministros Prates de Macedo, Guimarães Falcão, Orlando Teixeira da Costa, José Ajuricaba, Ermes Pedro Pedrassani e meu antecessor Wagner Pimenta, com a colaboração inestimável dos demais ministros, diretores, assessores e servidores, consagraram-se, à exaustão, ao esforço de proporcionar rápida, eficiente, equilibrada e justa prestação jurisdicional às partes. No biênio administrativo que se inicia, e certamente nos próximos, o Tribunal que hoje tenho orgulho de presidir deverá se ocupar das incessantes tarefas processuais, participando, entretanto, das análises sobre o que sucede no dinâmico e fascinante mundo das relações de trabalho, a fim de colaborar, como historicamente vem fazendo, para a modernização da economia e aprimoramento das normas aplicáveis às relações de emprego e de trabalho. Como advertiu alguém, para se estar presente é indispensável ser contemporâneo do futuro. O Brasil, sem embargo da extensão continental do seu território, do gigantismo e da operosidade da população, continua economicamente fraco e socialmente injusto. Vencer a pobreza e corrigir injustiças são alguns dos magnos desafios a vencer do século XXI, que nos espera a pouco mais de cem dias. ALMIR PAZZIANOTTO PINTO Ministro Presidente do Tribunal Superior do Trabalho Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 14 AÇÃO RESCISÓRIA: DESCABIMENTO PARA IMPUGNAR SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO João Oreste Dalazen* Sumário: 1. Remédio para impugnar sentença homologatória de acordo; 2. Conceituação de sentença de mérito: preexclui sentença homologatória de acordo; 3. Alcance do art. 485, inc. VIII, do CPC: rescindível sentença que julga o alcance de transação anterior; 4. Exemplos de cabimento de ação rescisória de sentença baseada em transação anterior; 5. Decisão puramente homologatória de transação: ação anulatória. 1. REMÉDIO PARA IMPUGNAR SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO Proponho-me a examinar aqui a delicada questão consistente em saber se, no processo trabalhista, para impugnar sentença homologatória de conciliação, ou de transação, é cabível a ação anulatória do art. 486, do CPC, ou a ação rescisória, de que cogita o art. 485, inc. VIII, do CPC. Trata-se, pois, de averiguar o meio próprio para atacar sentença homologatória de acordo celebrado perante a Justiça do Trabalho. Sabe-se que a Súmula n° 259, do TST, assentou que o remédio processual idôneo para atacar sentença meramente homologatória de transação, ou de conciliação é a ação rescisória, na Justiça do Trabalho. A abordagem do tema, a meu juízo, reclama necessariamente uma exegese sistemática dos seguintes preceitos, entre outros, do Código de Processo Civil: art. 485 caput e inc. VIII, art. 269, inc. III e art. 486, do CPC. Tal se impõe por força dos arts. 836 e 769, da CLT. 2. CONCEITUAÇÃO DE SENTENÇA DE MÉRITO: PREEXCLUI SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO Ninguém ignora que no sistema processual civil e trabalhista brasileiro a ação rescisória é o meio da qual se pede a desconstituição de sentença de mérito transitada em julgado, como deflui do art. 485 caput, do CPC. Cabe-nos, assim, preliminarmente, buscar uma conceituação para “sentença de mérito”, conquanto sem maior aprofundamento. Ministro do Tribunal Superior do Trabalho. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 17 DOUTRINA O Código de Processo Civil tentou distinguir as sentenças de mérito das sentenças que não são de mérito, através das regras que introduziu nos seus arts. 267 e 269, enunciando particularmente que o processo extingue-se com julgamento de mérito, “quando as partes transigirem”. Sucede, todavia, que, em rigor técnico, somente se pode dizer que extingue o processo com julgamento de mérito uma sentença que haja jurisdicionalmente composto o conflito de interesses. Vale dizer: sentença que termina pelo acolhimento ou pela rejeição do pedido do autor. Sentença que, enfim, decide sobre a pretensão do autor. Conforme ensina MONIZ DE ARAGÃO, a transação e a conciliação traduzem “acordo de vontades pelo qual os litigantes compõem a lide”. São conhecidas formas de autocomposição da lide, constituindo o que CARNELUTTI denominava “equivalentes jurisdicionais” precisamente porque a solução do conflito é alcançada pelas próprias partes, não provindo do Estado. Salta à vista que quando as partes transigem no processo, fazem desaparecer o litígio por ato autônomo de vontade, para o qual o juiz concorre, se tanto, através de mediação. Cessando a lide por ato de disposição, contratual, das próprias partes, resulta manifesto que cessa igualmente a atividade jurisdicional do Estado: eliminada a causa do exercício da função jurisdicional, que é a lide, transmuda-se a atividade ulterior do magistrado em ato meramente formal, sem nenhum conteúdo decisório do litígio, já desaparecido. Daí porque, ao invés de sentença de mérito, haverá, então, simples homologação do “acordo”. Ora, o mero pronunciamento judicial de homologação do acordo destina-se essencialmente apenas a aferir a regularidade extrínseca (formal) do ato, isto é, verificar a exterioridade do negócio jurídico de direito material alcançado pelas próprias partes: examinar se os transigentes são maiores e capazes, se o advogado tem poder especial para transigir, se não há vício de consentimento, etc. Excepcionalmente, penso que o juiz pode até exercer um relativo controle sobre o próprio conteúdo da avença, mas apenas para efeito de recusar homologação, o que não interessa ao caso sob exame. Na hipótese vertente o que sobreleva ter presente é que a sentença homologatória não julga a lide: unicamente verifica a validade da transação. Portanto, a decisão meramente homologatória de transação ou de conciliação cinge-se a chancelar a vontade das partes. Certo que é controvertida, em doutrina, a natureza jurídica da conciliação e da transação homologada em juízo. Pessoalmente, comungo da opinião de CHIOVENDA, para quem ostenta natureza de ato administrativo, com peculiaridades que o distinguem dos demais atos administrativos. Segundo o imortal processualista italiano, ao propor a conciliação, o juiz não exerce função jurisdicional, mas meramente administrativa, porque lhe falece o Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 18 DOUTRINA poder vinculativo, próprio das decisões e porque os tribunais não exercem a sua típica função de dizer o Direito contra a vontade dos particulares. A rigor, a homologação dos negócios jurídicos é uma das espécies atividades da impropriamente denominada jurisdição voluntária. Nela, há participação do Estado para integração dos negócios jurídicos, como se dá em geral nas funções registrárias, certificativas e autorizativas, entre outras. Ora, o art. 485, caput, do Código, ao admitir rescisória de sentença de mérito, naturalmente se reporta à rescisão de sentenças de jurisdição contenciosa, entendidas como tais as que operam a coisa julgada material, porque julgam a lide, eliminando o conflito de interesses mediante declaração do direito em concreto, como preceito de conduta dirigido aos litigantes, o que absolutamente não existe na homologação de acordo. Poder-se-á objetar que o art. 269, inc. III, do CPC equiparou à sentença de mérito os casos de decisões que produzem " equivalentes jurisdicionais”, como a sentença homologatória de acordo. Todavia, manifesta aí a impropriedade do Código, cujo alcance cumpre obter com acuidade e bom senso mediante interpretação sistemática da lei. Naturalmente, como visto, se as partes se compõem, a homologação que se segue não julga a lide, eliminada que foi pelo acordo dos litigantes. Como interpretar, porém, o dispositivo em apreço? Di-lo o Prof. GALENO LACERDA, em precioso artigo doutrinário específico sobre o tema: “A solução é fácil e se ajusta ao sistema legal. Note-se que o Código, no art. 584, III, considerou a sentença homologatória da transação título executivo judicial. Equiparou-a, portanto, quanto aos efeitos, à sentença de mérito transitada em julgado, equiparação que já constava do C.C., art. 1.030, quando atribuiu à transação efeito idêntico ao da coisa julgada. Nesta mesma linha, pois, deve ser interpretado o art. 269, III, do CPC. Quando nele se afirma que na transação se extingue o processo ‘com julgamento de mérito’, o que se visa na verdade significar é que na transação há uma equiparação de efeitos com a sentença de mérito; não que haja identidade de substância com este ato jurisdicional.” (Ação Rescisória e Homologação de Transação”, Revista AJURIS 14, 1978, novembro, p. 29 e segs.) Conforme bem pondera GALENO LACERDA, “o grande mestre que é Alfredo Buzaid não cometeria o erro palmar de impor ação rescisória para desconstituir simples homologação, sem nenhum conteúdo decisório da lide, em que pese a reconhecida falta de clareza do Código no trato do assunto”. De modo que a premissa de meu raciocínio é esta: quando o Código reza, no caput do artigo 485, que “a sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida”, refere-se, apenas, às sentenças que produzem coisa julgada material, que se tor- Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 19 DOUTRINA nam imutáveis porque julgam efetivamente a lide, como atos jurisdicionais, e não administrativos. 3. ALCANCE DO ART. 485, INC. VIII, DO CPC: RESCINDÍVEL SENTENÇA QUE JULGA O ALCANCE DE TRANSAÇÃO ANTERIOR Nesta perspectiva, impõe-se interpretar o inc. VIII do referido artigo 485, distinguindo-o da hipótese prevista no art. 486, destinado à ação anulatória. Como se recorda, o art. 485, inc. VIII, do CPC, estatui que a “sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: (...) VIII - houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença”. Por sua vez, no art. 486, o Código repete a mesma norma que o anterior de 1939 consagrava à ação anulatória (art. 800, parágrafo único) dos atos judiciais das partes, que dependem, ou não, de sentença homologatória: “Art. 486 - Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil.” Imperioso rememorar que no anteprojeto do Prof. ALFREDO BUZAID, a redação por ele dada ao inc. VIII do atual art. 485, fora esta: “Quando foi revogada, ou houve fundamento para revogar, confissão, desistência ou transação, em que se fundou a sentença”. O texto em apreço inspirou-se na antiga redação do art. 771,49, do CPC português, que dispunha: “A decisão transitada em julgado só pode ser objeto de revisão nos seguintes casos: (...) 49) Quando se tiver revogado, ou houver fundamento para revogar, a confissão, desistência ou transação, em que se fundou a sentença”. Sucede que no direito processual português (e no europeu em geral!) não existe ação rescisória. O instituto que lhe faz as vezes (revisão), bem ou mal, é considerado recurso, tanto que integra a Secção VI, do Capítulo VI, ‘Dos Recursos’, Título II, do Livro III, do Código de Processo Civil lusitano. E é julgado pelo mesmo órgão que proferiu a sentença (art. 772, n° 1). Claro está, como se vê, que não é incompatível com o referido sistema lusitano a existência de um recurso denominado revisão para impugnar a homologação formalmente transitada em julgado. Ademais, no Código lusitano, a transação judicial se encerra, não por simples homologação, mas por autêntica sentença condenatória ou absolutória, de acordo com o que foi transigido (art. 300, n° 3 e 4). Bem se percebe, portanto, antes de mais nada, que esse sistema se afasta por completo da tradição e da letra de nosso direito. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 20 DOUTRINA Primeiro, porque notoriamente o nosso sistema não admite recurso para impugnar decisão sob o manto da coisa julgada, ainda que meramente formal. Segundo, porque em nosso sistema a transação não importa a emissão de sentença condenatória ou absolutória, como no Direito português. Com efeito. O art. 1.028,I, do C.C., alude a acordo “homologado pelo juiz”, e o art. 584, III, do CPC, reporta-se à “sentença homologatória”. Aliás, não faria sequer muito sentido que a transação, destinada a prevenir ou eliminar litígio, culminasse com a prolação de sentença condenatória. De sorte que se constata para logo que o art. 485, VIII, do CPC foi transposto de um sistema jurídico em que desempenha outra função e em que absolutamente não constitui fundamento de ação rescisória, de resto ali inexistente. Contudo, uma vez erigido em norma do direito positivo brasileiro, há que se lhe emprestar uma exegese consentânea com o sistema em que está assentado. Afinal, em que caso a transação, “em que se fundou a sentença”, comporta ataque mediante a ação rescisória do art. 485, inc. VIII, e quando cabe impugnação mediante a ação anulatória do art. 486? O Prof. GALENO LACERDA dilucida magistralmente a questão (sem grifos no original): “A distinção é simples. Basta considerar-se que a transação pode ser objeto tanto de sentença homologatória sem lide (já terminada pelas partes), quanto de sentença jurisdicional litigiosa nela baseada. Apenas a esta última hipótese é a que se refere o inc. VIII do art. 485. Em dois casos poderá ocorrer sentença jurisdicional baseada em transação. Em primeiro lugar, a transação, como é sabido, constitui fato extintivo do pedido, assim considerada pelo direito civil, que a equipara a outros atos extintivos de direitos e obrigações, como a novação, etc. Como tal, pode a transação, ser oposta em defesa pelo réu (art. 326 do CPC), como ato anterior - judicial ou extrajudicial, pouco importa - à ação onde pretende o autor reiterar a lide sobre matéria já transigida. Neste caso, como acentua Clóvis Beviláqua, pode o réu opor a exceptio litis per transactionem finitae’ (‘Cod. Civ. Com.’, 5a ed IV/190, coment. ao art. 1.030). Ora, se isto acontecer, e se a sentença acolher a exceção, estaremos em presença de um dos casos de decisão jurisdicional baseada em transação, rescindível pelo inc. VIII, se esta puder ser invalidada. Outra hipótese poderá ocorrer se, depois da transação judicial, mas antes da respectiva homologação, ressurgir o litígio entre as partes, caso em que a homologação incidirá sobre matéria contenciosa, fato que torna jurisdicional e não mais meramente administrativa. (...) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 21 DOUTRINA Isto significa que, em matéria de transação, a ação rescisória só será empregada quando houver sentença jurisdicional que resolva lide reiterada, e o faça por acolher o fato extintivo da transação anterior, celebrada fora do processo (extrajudicial), em outro processo ou no mesmo processo, transação que possa ser invalidada na rescisória.” (ob. cit., pp. 37/38). De fato, a sentença pode basear-se em transação não apenas quando se cingir a homologar autocomposição da lide alcançada entre as partes: igualmente se baseia em transação a sentença que julga o alcance de transação anterior firmada pelas partes. Unicamente esta última admite ação rescisória porque é a única que constitui tecnicamente sentença de mérito. Bem se compreenderá o que se vem de expor se se considerar que muitas vezes a transação não põe fim à lide: não raro, após a transação surge um processo novo para discutir precisamente o âmbito de eficácia ou a validade da transação anteriormente celebrada entre as partes. Uma vez que o Código Civil dispõe que a transação tem força de coisa julgada, é comum dizer-se que em virtude disso a transação equivale à coisa julgada, havendo até mesmo quem sustente que quando se renova uma demanda em que anteriormente se alcançara a transação pode-se opor à chamada exceção de coisa julgada. Entretanto, isso não é verdade. A exceção que se opõe, oriunda do direito romano, é a chamada exceptio litis per transactionem finitae, ou seja, a exceção de lide encerrada por transação. Pois precisamente em tal processo, nascido de uma litigiosa transação anterior e no qual virtualmente o réu ou reclamado opõe a exceptio litis per transactionem finitae, é que se pode proferir uma sentença de mérito passível de ação rescisória, solucionando a lide exsurgente da própria transação. Esta sentença, e unicamente esta, é que será rescindível, com esteio no que dispõe o art. 485, inciso VIII, do CPC. 4. EXEMPLOS DE CABIMENTO DE AÇÃO RESCISÓRIA DE SENTENÇA BASEADA EM TRANSAÇÃO ANTERIOR Vários exemplos são concebíveis dessa situação. Suponha-se, no processo civil, a seguinte hipótese: para prevenir litígio decorrente de contrato de mútuo, o devedor firma transação extrajudicial com o credor, comprometendo-se a outorgar escritura pública de compra e venda do imóvel X, em determinado prazo. Devedor e credor isoladamente subscrevem a transação, obviamente não homologada judicialmente (à falta de processo). Descumprida a avença, a teor do art. 639 do CPC, não há lugar para a execução direta, pois o documento não constitui título extrajudicial (duas testemunhas não o subscrevem), tampouco judicial. Assim, somente restará ao credor propor uma ação em face do devedor objetivando obter, com base na transação celebrada, uma sentença condenatória que dê sustentação a uma virtual e ulterior execução. Quer dizer: a transação suscitará um processo de conhecimento no qual se proferirá uma sentença de mérito para discutir o alcance ou validade da Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 22 DOUTRINA anterior transação. Neste processo, por exemplo, pode o réu objetar que o negócio jurídico está inquinado de vício de consentimento: firmou-o sob coação, digamos. Esta sentença de mérito, sim, inequivocamente é rescindível, Transplantemos agora esse mesmo raciocínio para o âmbito do processo trabalhista. Suponha-se que perante uma Comissão de Conciliação Prévia, lavrou-se “termo de conciliação”, regularmente assinado, sem qualquer ressalva do empregado. Não obstante, o empregado ingressa em juízo com ação trabalhista frente ao mesmo empregador postulando idênticas parcelas já objeto de conciliação: busca o empregado questionar em juízo a constitucionalidade da “eficácia liberatória geral” da transação, a que se refere o art. 625-E, parágrafo único (Lei n° 9.958, de 12.01.2000). O empregador, em defesa, opõe a exceptio litis per transactionem finitae. Neste caso também a sentença que a Vara do Trabalho proferir solucionará jurisdicionalmente o conflito emergente da conciliação extrajudicial. Logo, também aqui, em que se baseou em transação, a sentença de mérito respectiva comporta ataque apenas mediante a ação rescisória do art. 485, inc. VIII. Outro exemplo: no processo trabalhista X, as partes firmaram transação extrajudicial, em que o empregado outorgou quitação geral do contrato de emprego; mediante petição, submeteram-na ao juiz, que não a homologou, todavia, por entender prescindível a homologação ante o que dispõe o art. 158 do CPC. Alegando que a quitação não pode extravasar os limites do pedido deduzido no primeiro processo, o empregado ingressa em juízo com nova ação, pleiteando parcelas não postuladas no processo anterior. O empregador opõe exceção de lide encerrada por transação. O juiz, então, decide esse conflito intersubjetivo de interesses advindo da própria transação anterior, emitindo uma sentença baseada na aludida transação anterior, emprestando-lhe esse ou aquele alcance. Tratar-se-á aí, indubitavelmente, de sentença de mérito impugnável, após o trânsito em julgado, apenas mediante a ação rescisória do art. 485, inc. VIII. Tome-se em conta agora um exemplo ainda mais corriqueiro. No processo trabalhista X, a controvérsia entre as partes centra-se na validade de anterior transação extrajudicial, homologada pelo sindicato, com fulcro no art. 500 da CLT, mediante a qual se deu por rescindido o contrato e o empregado estável outorgou quitação total do contrato de emprego, decorrente de haver aderido a plano de demissão voluntária encetado pelo empregador. Claro está que a sentença aí proferida pelo juiz necessariamente fundar-se-á no alcance ou no efeito liberatório que deva, ou não, merecer a transação firmada pelas partes. Por conseguinte, também aí o juiz proferirá típica sentença de mérito, neste caso sim passível em tese de rescisória. 5. DECISÃO PURAMENTE HOMOLOGATÓRIA DE TRANSAÇÃO: AÇÃO ANULATÓRIA Ora, bem. Em confronto com situações que tais, é facilmente perceptível quão diversa é a hipótese em que a atuação do juiz limita-se a homologar a transação ou conciliação alcançada pelas partes, sem penetrar no âmago do negócio jurídico de direito Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 23 DOUTRINA material que entabularam e, portanto, sem decidir lide alguma, de resto não mais existente. Naturalmente, consoante sustentou o saudoso Ministro COSTA MANSO, alicerçado no étimo grego do vocábulo, ‘homologar não é decidir; homologar é confirmar’ (‘Votos e Acórdãos’, p. 238). Segue-se que não é de mérito a decisão puramente homologatória de transação e, assim, não admite impugnação através de ação rescisória. O que se afirma, por conseguinte, é a necessidade imperiosa de uma distinção para a correta exegese do art. 485, inc. VIII, do CPC: em se cuidando de sentença meramente homologatória de transação, o remédio apropriado para impugná-la, data venia, é a ação anulatória do art. 486 do CPC; tratando-se, porém, de sentença baseada em anterior transação controvertida, que ressurge, o remédio para impugná-la é a ação rescisória. Endosso, ademais, a lição preciosa de GALENO LACERDA: “Que esta é a interpretação exata, lógica, coerente e sistemática do código, basta que se considere que a transação inválida é posta pelo inc. VIII, como causa de rescisão da sentença, no mesmo plano da confissão e da desistência inválidas. Ora, se o Código cogitasse submeter à rescisória meras sentenças homologatórias, o dispositivo não teria nenhum sentido quanto a confissão, pois é evidente que os processos em que esta ocorre não se encerram por ‘homologação’ da confissão, e, sim, por sentença jurisdicional de mérito, desfavorável ao confitente. O de que o Código cogita, pois, no inc. VIII do art. 485, é da rescisão dessa sentença jurisdicional, quando baseada em confissão inválida, idéia, aliás, que se torna clara no art. 352, II, do qual aquele inciso é mera repetição: ‘A confissão, quando emanar de erro, dolo ou doação, pode ser revogada por ação rescisória, depois de transitada em julgado a sentença, da qual constituir o único fundamento’. O mesmo vale para a transação e a desistência: o que constitui objeto da rescisória é a sentença jurisdicional proferida ‘inter nolentes’, com base em transação ou desistência inválidas, e não a mera homologação ‘inter volentes’, que não transita materialmente em julgado. Quando, pois, não houver reiteração de lide já transigida, mas tão-só homologação voluntária de acordo das partes, não tem sentido o emprego da rescisória para desconstituí-lo, A hipótese se enquadra de modo cabal e indiscutível no art. 486 do CPC, isto é, na ação de rescisão, ou anulatória, do ato homologado, a ser movida em primeira instância, pelas vias comuns, sem as galas da instância única da rescisória no Tribunal superior, eis que inexiste, na espécie, a coisa julgada material, própria da verdadeira jurisdição.” (ob. cit., p. 38/39). Outros aspectos sumamente relevantes também não devem passar despercebidos no enfoque do tema. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 24 DOUTRINA Impende ter presente, assim, que o objeto da ação rescisória consiste na desconstituição do ato específico e fundamental do Poder Judiciário, que é a sentença jurisdicional de mérito, tanto que o Código de Processo Civil confere-lhe a dignidade e a situação singular de ser julgada como causa da competência originária dos Tribunais, às vezes em instância única. Portanto, implica malbaratar um remédio processual nobilíssimo franquear-lhe o manejo contra simples homologação de conciliação ou acordo. Afora isso, e sobretudo, viabilizar a ação rescisória contra simples homologação de conciliação ou acordo, além de sobrecarregar desnecessariamente os Tribunais do Trabalho, compromete a prova dos fatos. Com efeito, revela a experiência que, como causa originária de Tribunal, a ação rescisória em apreço dificilmente chega a um bom termo quanto à elucidação do acenado vício de consentimento que teria maculado a transação. Isso pelas naturais limitações dos Tribunais na colheita direta da quase sempre imprescindível produção de prova oral em tais casos. Um quadro totalmente diverso se desenhará se se entender, como se impõe, que para impugnar simples homologação de conciliação ou acordo cabe a ação anulatória de ato jurídico de que cogita o art. 486 do CPC. Cuidando-se de feito afeto à competência dos juízos inferiores, natural que as chances de apuração dos supostos vícios de consentimento apresentam-se muito mais palpáveis. De resto, o bom senso, quando menos, parece indicar que ninguém se acha mais qualificado a aquilatar a presença de virtual defeito na enunciação de vontade que o próprio juízo inferior, afinal precisamente de onde emanou a homologação da transação. Perceba-se que a sistemática da Súmula 259, do TST, leva até mesmo a esse contra-senso de sequer ouvir-se a autoridade judiciária que chancelou o acordo e que, em tese, indiscutivelmente está melhor inteirada do que ninguém acerca das circunstâncias em que foi alcançado. Aliás, até mesmo sob o plano de uma política judiciária que privilegie a excelência dos pronunciamentos decisórias afigura-se-me conveniente mudar de orientação a respeito. É forçoso convir que, em se sinalizando que o meio de impugnação de simples homologação de conciliação ou acordo é a ação anulatória, os juízes inferiores decerto se precatarão ainda mais antes de apor a respectiva chancela em qualquer avença que lhes seja noticiada, inclusive no afã de evitar mais um processo para o próprio órgão. De outro lado, não posso abster-me de apontar uma grave incongruência da Súmula 259, do TST, ao generalizar o cabimento da ação rescisória mesmo quando a dimensão da transação ou conciliação homologada seja superior ao objeto do processo. Recorde-se aqui o ensinamento de CARNELUTTI sobre lide integral e lide parcial, ao acentuar que nem sempre o litígio é trazido a juízo em sua integralidade. Dá-se que, às vezes, a lide submetida à apreciação judicial é parcial. Contudo, freqüentemente, como sabemos, a transação firmada pelas partes e homologada pelo juiz abrange parcelas não pleiteadas no processo, culminando o reclamante por outorgar quitação geral do contrato de emprego e não apenas das parcelas que constituem o pedido. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 25 DOUTRINA Está claro que há aí um transbordamento da transação em relação ao objeto do processo: em uma palavra, a lide é menor que o acordo homologado. Ora, seguindo-se os fundamentos jurídicos e lógicos que inspiraram a Súmula n° 259, do TST, neste caso a sentença homologatória de transação extingue apenas a lide parcial levada a juízo. Ou seja, a homologação, se tanto, levaria à extinção do processo “com julgamento do mérito” obviamente apenas no tocante aos pedidos efetivamente deduzidos. Não abrangeria evidentemente o que não se pediu no processo, que, por conseguinte, remanesceria até mesmo imune à coisa julgada material. No entanto, prevalecendo a lógica equivocada da Súmula n° 259, cabe ação rescisória, de forma genérica e incongruente, de toda sentença homologatória de acordo, ainda que obviamente não haja coisa julgada material sobre o que não se postulou no processo... Vale dizer: a generalidade e amplitude da malsinada Súmula n° 259, do TST, vai ao extremo de prodigalizar e tornar admissível ação rescisória até mesmo para infirmar coisa julgada inexistente, ao menos em parte ... Parece-me de clareza solar, contudo, que se o âmbito da transação, conquanto homologada judicialmente, é mais amplo que a lide posta em juízo, a homologação não o abrange. Logo, não há, a respeito, coisa julgada e, assim, em derradeira análise, quando menos esse caso desafia a ação anulatória do art. 486 do CPC, e não a rescisória para desconstituí-la. Por derradeiro, mas não menos importante, é de ressaltar-se que a jurisprudência cível sobre esse tema, tendo o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça à frente, é remansosa e pacífica: a sentença homologatória de transação não é rescindível por defeito ou nulidade da transação, comportando para tanto a ação anulatória do art. 486 do CPC. Em conclusão: com a máxima vênia, é imperiosa a revisão da Súmula n° 259, do TST, considerando-se cabível a ação anulatória do art. 486 do CPC, para impugnar conciliação ou transação meramente homologada por sentença. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 26 AS AÇÕES COLETIVAS E A REFORMA DO JUDICIÁRIO - O PODER NORMATIVO E O DISSÍDIO ECONÔMICO DE AMBAS AS PARTES* Ricardo Sampaio** INTRODUÇÃO Duas alterações constitucionais que estão a passar no Congresso Nacional chamam a atenção no Direito coletivo. Decorrem da chamada “Reforma do Judiciário”, erigido pelos políticos sempre de plantão à custa de notoriedade e de popularidade, de quando em quando, como a chamada “bola da vez”. A primeira é a imposição da anuência de ambas as partes, para o ajuizamento de dissídios coletivos de natureza econômica, com o desaparecimento do chamado “poder normativo”.1 A segunda diz respeito à greve em atividade essencial, que autoriza em caso de possível lesão ao patrimônio público o Ministério Público do Trabalho a ajuizar dissídio coletivo.2 - O DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA ECONÔMICA 1. NORMAS E CONDIÇÕES DE TRABALHO a) O Desaparecimento do Poder Normativo Desnecessário relembrar com minudência, no apuro de tempo e de espaço, a ouvintes e leitores tão preparados, o antigo conflito entre os prós e os contras do poder normativo - esta verdadeira faculdade de legislar - na Justiça do Trabalho. Melhor remeter a estudos percucientes, como o do sempre brilhante FLORIANO CORREA VAZ DA SILVA. Em antológico texto3, situa na corrente favorável o inigualável * Reflexões em Painel no Congresso da LTr. em São Paulo-SP, 25/jul/2000. ** Professor de Direito do Trabalho; Advogado; Juiz Aposentado; ex-presidente do TRT-9ª (Paraná). 1. Tal se faz mediante a seguinte redação ao § 2° do art. 115 da Constituição Federal: “Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou arbitragem, é facultado, às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho bem como as convencionadas anteriores. " 2. Através da seguinte redação ao §4° do art. 115 da Constituição Federal: “Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito. " 3. “O Poder Normativo da Justiça do Trabalho”, in “Curso de Direito Coletivo do Trabalho - Estudos em Homenagem ao Ministro Orlando Teixeira da Costa”, LTr. Ed., SP, 1998, págs. 390 e seguintes. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 27 DOUTRINA SÜSSEKIND, para quem “No prudente e adequado exercício de seu poder normativo, a Justiça do Trabalho vem realizando obra de notável repercussão socioeconômi " 4 ca... Do lado oposto, avultam muitíssimos e também relevantíssimos contrários, sempre ressaltando as inconveniências de conceder função “legislativa” ao Poder Judiciário e apontando as ínfimas conquistas dos trabalhadores com um tal sistema. Já um terceiro grupo coloca-se com prudência, em posição intermediária. Ao mesmo tempo em que vitupera algumas deficiências do “poder normativo”, leciona que sua eliminação total é inconveniente, melhor sendo aperfeiçoá-lo, vez que os conflitos não desaparecerão. O texto proposto pela Câmara dos Deputados, mediante um § 2° ao art. 115 da Constituição Federal, elimina na prática o instituto, ao não repetir a expressão constante do atual §2° do art. 114 da Carta de 1988, segundo o qual a Justiça do Trabalho pode “estabelecer normas e condições ”, b) Da Eficácia ou Ineficácia do Poder Normativo no Dissídio de Natureza Econômica Já defendeu o signatário, quando juiz do trabalho, a conveniência de manutenção do “poder normativo”, desde que aperfeiçoado. Forçoso é dizer, entretanto, que a prática de muitos anos convence que sua supressão na alteração constitucional em andamento em pouco ou nada prejudicará os interesses dos empregados, supostamente os maiores atingidos. A triste e dolorosa realidade é que os líderes sindicais, os juízes e os tribunais do trabalho, salvo honrosas exceções, são vítimas de uma estrutura cujas vigas já estalam ao peso de infinitas preocupações cotidianas. Em um quadro de desestímulo público à própria atividade judicante, e assoberbados por uma pletora de processos individuais como a caudal de um rio que não cessa de fluir, não têm nem tempo, nem aparelhamento técnico para um exercício mais fecundo do poder normativo. Em teoria, a norma satisfaz e é de larguíssima virtude. Na prática, foram pífias as conquistas dos trabalhadores, enquanto dependentes do poder normativo. Basta que se diga que continuamos a ter um dos piores salários mínimos do continente, senão o pior. As lideranças sindicais de um modo geral tampouco souberam se valer do instituto, muitas vezes preferindo o “jogo-de-cena” assembleiar, para que o ajuizamento do dissídio coletivo funcionasse, posteriormente, como as mãos de Pilatos, relegando à Justiça do Trabalho a culpa e o ônus da crucificação das reivindicações - quase sempre mal postas e deficientemente articuladas. Inumeráveis são as sessões de julgamento de dezenas, quando não de centenas de cláusulas de dissídios coletivos, em que se perde tempo com questiúnculas e penduricalhos tais como a utilização ou não de manteiga, no pão do lanche, ou quantos minu- 4. Artigo de FLORIANO VAZ, in ob. cit., pág. 398, seccionamos. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 28 DOUTRINA tos pode o trabalhador despender se utilizar a privada no horário de trabalho. Ao revés, cláusulas salariais e econômicas, e mesmo as sociais, fundamentais para um dia alçar o trabalhador a uma verdadeira condição de dignidade, são sistematicamente indeferidas - a mor das vezes em fundamentação sucinta, ou mesmo sem fundamentação alguma. Em outras centenas ou milhares de decisões, a própria Justiça veio abdicando da normatividade, ao ser cada vez mais exigente e detalhista com o ajuizamento de dissídios coletivos. Não raro, tal procedimento levou à frustração e à perda de tempo de mobilizações coletivas e de processos judiciais caríssimos, depois de meses ou anos de investimento, expectativa e esperança. Mesmo naqueles hoje raros casos em que se tem dado a análise meritual, a ossificação trazida pelos precedentes normativos, aliada à superficialidade de parcas conquistas, leva a ínfimos avanços. Tanto é assim que mesmo os mais laboriosos operadores do Direito têm dificuldade de se recordar, se reptados bruscamente, de alguma decisão recente no Brasil, em que o exercício do poder normativo representou um avanço para qualquer das categorias envolvidas. c) Das Conseqüências do Desaparecimento do Poder Normativo A alteração ora em andamento não terá qualquer impacto direto sobre os trabalhadores e os empregadores brasileiros, ao contrário do que poderão sustentar seus adversários. Não terá, por uma elementar razão: o poder normativo já morreu de morte lenta, agônica e homeopática. Aliás, esta forma de morte do instituto pela má aplicação, pelo desuso, ou pela ausência de ousadia, é extremamente comum no Brasil. O pensamento evoca, de repente, a ilustrar o que se afirma, o “mandado de injunção” do art. 5o, inc. LXXI, da Constituição Federal de 1988, que outro teria tornado o Brasil e sua prática legislativa. Se subsiste o poder normativo no texto constitucional, é apenas como um pálido espectro, como um velho teimoso e rabugento que se recusa a partir, mantido em balão de oxigênio por zelosos e até bem intencionados samaritanos, sempre na expectativa de salvá-lo - quando não, a si próprios! Na prática, estão agrilhoados ao medo da novidade e do futuro, resistindo a um mundo em mudança, como aquelas pessoas que vão colecionando quinquilharias na garagem, só porque um dia - sabe-se lá quando! podem delas precisar! Todo poder que não se exerce, ou que se exerce mal, está fadado a sucumbir. Não impressionam mais as sempre invocadas alegações de que este é um país muito grande, disperso e poroso; que a maioria dos milhares de sindicatos não tem as mínimas condições efetivas de negociar; que algumas categorias são inorganizadas em sindicatos; que a realidade do Oiapoque é diferente da do ABC, ou de que o diálogo entre o capital e o trabalho seria o da guilhotina com o pescoço. A objeção não se sustenta eticamente, pois parte do pressuposto de que todo agente produtor é na essência mau, arbitrário, explorador e “neoescravocrata”. Tampouco tem fundamento tecnológico, numa era de avanços diários nas comunicações, no conhecimento e na própria ciência e em sua dispersão. Não se precisa mais de 30 dias para a notícia da Proclamação da República ir do Rio de Janeiro a Cuiabá. Aí estão as novelas, a informática, a Internet, a conversa ao “pé-do-rádio”, o Ministério Públi- Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 29 DOUTRINA co, a OAB, o alto-falante nas praças das pequenas cidades, a panfletagem nas fábricas das grandes cidades, a “Voz do Brasil”, e até os pândegos mambembes e chinfrins, leoninos e roedores, de auditórios televisivos, a dizer, repetir, conscientizar e advertir as pessoas até a exaustão, sobre seus supostos “direitos”. É preciso romper com o mito do brasileiro “coitadinho”, “jeca”, “capiau”, ingênuo, ignorante, burro ou presa fácil da lábia, da esperteza e da sanha de mesquinhos, desumanos e avaros exploradores, cuja salvação está nas pias e intervencionistas mãos do Estado. Ora, o laborioso e dedicado Poder Judiciário do Estado não mais dá conta de solucionar milhões de cláusulas, neste enorme país, envolvendo milhares de dissídios coletivos, até porque nem tem a experiência, nem a formação para o comezinho cotidiano da atividade fabril, rural, comercial ou de serviços. 2. A CLÁUSULA DO AJUIZAMENTO DO DISSÍDIO ECONÔMICO EM “COMUM ACORDO” a) Constitucionalidade Outra inovação do novo dispositivo constitucional está em condicionar o ajuizamento de dissídio coletivo de natureza econômica à vontade e ao interesse de ambas as partes. A inovação é interessante, e parece perfeitamente possível de ser introduzida pela via da emenda constitucional, pois não viola qualquer das chamadas “cláusulas pétreas ", Fica no ar a dúvida para a solução quando de recusa - sempre possível - de uma das partes a associar-se com a outra, no peticionamento do dissídio. A renitência impossibilita “prima facie ” o ajuizamento do dissídio de natureza econômica, sem que se possa invocar o inc. XXXV do art. 5° da Carta Magna.5 É que o inc. IV do § 4° do art. 60 da Constituição proíbe a emenda a ela própria que implique em abolição dos “direitos e garantias individuais ”, o que não é obviamente a situação do dissídio coletivo. b) Virtual Extinção dos Dissídios Econômicos Como posta a alteração constitucional, porém, é possível dizer que, a par do “poder normativo”, há certo risco de quase extinção também dos dissídios coletivos de natureza econômica! Ou, pelo menos, o “enxugamento” substancial de suas cláusulas, com as categorias delegando ao Poder Judiciário tão-só o que lhes pareça extremamente relevante, ou inserto na capacidade técnica de solução pelo magistrado. Como uma das mais acerbas críticas ao poder normativo é justamente a dificuldade e a falta de meios para a Justiça compreender e destrinçar cláusulas do cotidiano do trabalho e dos intestinos das empresas e do mercado, pode-se em exercício de razoável e plausível futurologia especular as categorias centuplicarão seus esforços para um entendimento prévio, antes de qualquer acionamento judicial. Aliás, a conveniência do diálogo é tão velha quanto RUI BARBOSA, citado pelo inolvidável OCTAVIO MAGANO: “O que mais releva é que patrões e trabalhadores 5. “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito." Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 30 DOUTRINA se aproximem uns dos outros; é que, congraçando-se entre si, tornem cada vez menos necessária a interferência legislativa nas relações entre as duas classes. ”6 A verdade é que há um obstáculo a desestimular o ajuizamento de dissídio de mãos dadas. É que a parte final da novel redação do § 2° do art. 115, como aprovado, determina a obediência às cláusulas "convencionadas anteriores ”, Ao contrário de proteger a categoria dos trabalhadores, a menção expressa à estratificação das condições pretéritas pode contribuir para a relutância patronal ao risco do dissídio, digamos, “amigável”. Para a relutância puramente gratuita ou emulativa, entretanto, em caso de impasse que torna necessário, imprescindível ou inevitável o ajuizamento do dissídio, terá o Judiciário que encontrar solução, inclusive ressarcitória ou indenizatória, ainda que pela via da legislação infraconstitucional. A preocupação com o princípio da “boa-fé” na negociação coletiva encontra eco no direito comparado. Mencione-se a referência de JAIME CABEZA PEREIRO à jurisprudência espanhola, que “... há declarado expressamente que la buena fe requiere “no sólo contestar al requerimiento inicial, sino asistir a las reuniones...", concluyendo que "... quien no asiste a la constitución de la mesa sin motivo legal o abandona sin razón alguna las negociaciones, incumple los derechos que le impone la ley. ”7 Algo semelhante pode-se imaginar para a renitência gratuita ao ajuizamento comum do dissídio. Uma proposta, se não o fizer o legislador, é considerar o tema à luz da teoria do abuso do direito, consubstanciada indiretamente no art. 160, inc. I, parte final do Código Civil Brasileiro e na doutrina a respeito - e cujo detalhamento foge à síntese apertada deste trabalho. DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE Por derradeiro, e ainda que “en passant", algumas palavras são imprescindíveis quanto a outra inovação de vulto. Trata-se do § 4° do art. 115, proposto e pré-aprovado.8 Merece melhor estudo sobre a conveniência ou não, vez que aí subsiste algo do poder normativo e do intervencionismo estatal, embora para tutela de um bem maior, que é o bem público. Dentre todos os aspectos, o mais grave parece a total inconveniência de relegar a iniciativa do dissídio exclusivamente ao Ministério Público do Trabalho. Conquanto a relevância institucional do “Parquet", inscrita nos arts. 127 e seguintes, da Constituição Federal de 1988, e, assim, “essencial à função jurisdicional do Estado ”, não é ele 6. RUI BARBOSA, in “A Questão Social e Política no Brasil”, Ed. Organização Simões, 1951, pág. 81, referido por MAGANO, in “Limitações à Autonomia da Vontade Coletiva”, Revista “Trabalho e Doutrina”, vol. 20, Mar/1999, pág. 36. 7. in “La Buena Fe en La Negociación Colectiva”, Escola Galega de Administración Publica, Santiago de Compostela, 1995, pág. 233. 8. “Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho decidir o conflito." Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 31 DOUTRINA um bloco monolítico, nem tem o privilégio ou a iniciativa exclusiva das ações no sistema normativo brasileiro. Aliás, nem deve tê-la, em tema como a possibilidade de lesão à ordem pública! Do contrário, se e quando estiver na contramão da visualização destes prejuízos, nenhum outro órgão, instituição ou pessoa poderá provocar o Poder Judiciário, o que poderia ser calamitoso! Neste passo, é forçoso concordar com o extraordinário juiz e doutrinador GEORGENOR DE SOUZA FRANCO FILHO, que adverte quanto à multifacetada realidade brasileira, aconselhando a atribuição da iniciativa “também a outros segmentos da sociedade. ”9 É sempre conveniente recordar que um dos princípios da sociedade democrática é a desconcentração de poderes. A legislação brasileira tem exemplo palpável na Lei n° 8.078/90, com o art. 82 autorizando a legitimidade concorrente para a ação coletiva do art. 81, § 1o, do Ministério Público, de um lado, e, de outro, da União, dos Estados, dos Municípios, do Distrito Federal, das "entidades e órgãos da administração pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica " e das "associações legalmente constituídas há pelo menos 1 (um) ano ”, Sempre é útil relembrar, também, que o processo de impeachment do próprio Presidente da República, em 1992, partiu de iniciativa da prestigiosa Ordem dos Advogados do Brasil - OAB. Portanto, a se manter no Senado da República o dispositivo aprovado já na Câmara dos Deputados, convém que se repense a conveniência e a utilidade de centralizar e monopolizar a iniciativa de ajuizamento em mãos de uma única instituição, por mais relevante e séria que seja ela. CONCLUSÃO Em conclusão, podemos rapidamente dizer que: a) o poder normativo nos dissídios coletivos de natureza econômica está oficialmente extinto com a alteração proposta e aprovada na Câmara dos Deputados, desde que seja mantida no Senado; b) a extinção formal é apenas a ratificação do que já ocorre na prática, diante do desuso e do mau uso do instituto; c) ao contrário do que se imagina, poderá a extinção contribuir para a melhoria inevitável do diálogo entre as categorias profissional e econômica; d) a dificuldade para a relutância gratuita em ajuizamento de dissídio de natureza econômica mediante consenso das partes pode ser resolvida pela lei infraconstitucional, pela doutrina e pela jurisprudência, inclusive à luz das normas atuais sobre o abuso de direito', e) a manutenção das condições anteriores de trabalho dificulta a invocação da tutela jurisdicional; 9. in “A Reforma do Judiciário - O Futuro da Justiça do Trabalho”, palestra no II Congresso Brasiliense de Direito Constitucional, 28/out/1999, Brasília-DF. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 32 DOUTRINA f) não há violação de cláusula constitucional pétrea com a exigência de comum iniciativa das partes para o dissídio econômico; g) no dissídio de greve, é inconveniente, porque concentradora, atribuir exclusivamente ao Ministério Público do Trabalho a iniciativa de ajuizamento. Resta-nos acreditar que as modificações virão para melhor, visto que são inevitáveis. Concluo com as palavras do mestre ARION SAYÃO ROMITA, advertindo em paradigmático estudo, há três anos, que “... o Direito do Trabalho também se vê na contingência de se transformar, aderindo às novas realidades. O Direito do Trabalho integra o vigamento da crise e tem por dever sugerir medidas para resolvê-la. Por isso, deve desvencilhar-se das soluções rígidas típicas do passado característico da era industrial e adaptar-se às novas exigências da sociedade pós-industrial... ”10 O processo de mudanças pressupõe, todavia, a cautela de que tal se faça prioritariamente em benefício do homem e do trabalho e do trabalhador. Há que se ponderar, assim, também no imorredouro DARCY RIBEIRO, para quem “Tudo, nos séculos, transformou-se incessantemente. Só ela, a classe dirigente, permaneceu igual a si mesma, exercendo sua interminável hegemonia. Senhorios velhos se sucedem em senhorios novos, super-homogêneos e solidários entre si... ”n A inevitabilidade da mudança, porém, é um fato. Ou, aproveitando as palavras de PORTALIS: “É preciso mudar, quando a mais funesta de todas as inovações seria, por assim dizer, não inovar. ”12 10. in “Globalização na Economia e Direito do Trabalho”, LTr. Ed., 1997, pág. 55. 11. in “O Povo Brasileiro”, Companhia das Letras, 1995, pág. 60. 12. in ROMITA, in ob. cit., pág. 2. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 33 AS MUDANÇAS NO MUNDO: A GLOBALIZAÇÃO, OS PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO E O FUTURO DO TRABALHO Georgenor de Sousa Franco Filho* Sumário: I - As mudanças e seus problemas e os princípios do Direito do Trabalho; II - A incidência do princípio protetor ante as alterações nas relações de trabalho; III - O alcance do princípio da irrenunciabilidade e outros princípios relevantes: continuidade, razoabilidade, realidade e boa-fé; IV - Em defesa da dignidade da pessoa humana; V - Reflexões conclusivas. I - AS MUDANÇAS E SEUS PROBLEMAS E OS PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO A Revolução Industrial promoveu profundas mudanças nas relações de trabalho no século passado. Tivéssemos alguma testemunha daquelas alterações para prestar seu depoimento, certamente dela ouviríamos que muita gente ficou desempregada e sem qualquer proteção, quando Edison inventou a lâmpada e as fábricas de velas perderam boa parte do mercado consumidor; ou quando Ford colocou os automóveis nas ruas e as fábricas de carroças fecharam; ou quando Graham Bell pôs a funcionar o telefone e a telegrafia perdeu grande parte de sua mão-de-obra. No futuro, quando dobrar o primeiro século do terceiro milênio, alguma grave crise social deverá estar por aí, amiúde, desempregando, gerando novos conflitos. E alguém estará dizendo exatamente o que estou a falar agora. Este é o retrato cíclico da história da humanidade. Está escrito no Livro do Eclesiastes: “não há nada de novo debaixo do sol' (Ecle., 1:9). Vivemos a era do mundo globalizado, que é um fenômeno econômico que tem atingido a todos, sobretudo após o final da segunda Grande Guerra. Atravessamos a quarta globalização, como observado por Roberto Campos1, embora outras tantas se possam considerar, elencando Domenico De Masi uma dezena2. A primeira foi a do Império Romano, dominando o mundo conhecido do Oriente, a segunda, a das grandes descobertas dos séculos XIV e XV, no apogeu de Portugal e Espanha; a terceira, a do li * Juiz Togado do TRT da 8a Região, Doutor em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Professor de Direito Internacional e do Trabalho da Universidade da Amazônia, Membro da Academia Paraense de Letras, da Academia Nacional de Direito do Trabalho, da Sociedade Brasileira de Direito Internacional e da International Law Association. 1. CAMPOS, Roberto. A quarta globalização. Folha de São Paulo. São Paulo, ed. de 11.5.1997, pp. 1-4. 2. DE MASI, Domenico. O futuro do trabalho. Trad. Yadyr A. Figueiredo. Rio de Janeiro, José Olympio, 1999, p. 186 passim. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 34 DOUTRINA beralismo e das mudanças sociais do século XIX, geradoras, mais tarde, da doutrina social da Igreja, marcada pela Encíclica Rerum Novarum, de Leão XIII. A que vivemos registra a presença das transnacionais, a cosmossociedade de que fala Colliard3. A globalização é irreversível e quem não a aceitar será simplesmente excluído do mundo do comércio. Vivemos numa fase de grandes transformações muitas vezes apresentadas sem justificação ética, moral ou motivadamente justas. Essas mudanças são de tal ordem, de tal magnitude que, face a aceleração dos movimentos de integração, o próprio conceito de soberania flexibilizou-se e estamos vivendo, na União Européia, por exemplo, sobretudo após o Tratado de Maastricht, o que se chama soberania compartilhada, na qual os Estados, antes absolutos, compartilham sua soberania com um órgão supranacional4. Sem esquecer, em meio a todas essas alterações, a possibilidade de estarmos ante o que se poderia chamar de soberania globalizada ou de globalização da soberania, à medida que nos defrontamos com questões jurídicas de altíssima indagação, como aquela que vive a atualidade ante o pedido de extradição do ex-presidente do Chile, Augusto Pinochet, formalizado pela Justiça espanhola à Justiça do Reino Unido. Ou, ainda, igualmente alarmante, os perigosos meandros de uma alteração dos conceitos de soberania, pela influência de entidades econômicos governamentais, como o Fundo Monetário Internacional, e não-governamentais, com o Clube de Paris. Registra, dessarte, a globalização quatro graves problemas. Primeiro: a afirmação dos direitos de cidadania, concentrada nos movimentos migratórios e nas dificuldades de inserção do migrante na sociedade receptora, decorrência da xenofobia, ressaltando, no particular, a importância da Convenção internacional sobre a proteção do trabalhador migrante e seus familiares, adotada no âmbito das Nações Unidas, em 1990. Segundo: a multiplicação dos focos de conflitos, que se acentuam com o crescimento da economia informal, o aumento do número de jovens desempregados e as dificuldades de afirmação das minorias sociais e raciais. Terceiro: a falta de determinação política para encontrar meios efetivos de superação dessas dificuldades. Quarto: a expansão da influência legal anglo-saxônica, pragmática e flexível, que nem sempre é bem recebida pela cultura romano-germânica5. Hoje, não se fala mais em fordismo ou taylorismo. O próprio toyotismo japonês já começa a se alterar. As correntes são mais novas e mais modernas. E surge um novo ismo, que se caracteriza pela rapidez e pela eficiência. O mundo entra na era do gatismo, de Bill Gates, o criador da Microsoft6. 3. COLLIARD, Claude Albert. Institutions des relations internationales. 9ª ed., Paris, Dalloz, 1990, p. 952. 4. RAUPP, Klaus da Silva. Solução de controvérsias entre Estados-Partes do Mercosul. In: RODRIGUES, Horário Wanderley (org.). Solução de controvérsias no Mercosul. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 1997, p. 51. 5. FARIA, José Eduardo. Globalização x democracia. Folha de São Paulo. São Paulo, ed. 05.09.1997, p.1-3. 6. Cf. BLANPAIN, Roger. O futuro do acordo coletivo. In: Anais do Seminário Internacional de Relações de Trabalho. Brasília, MTb, 1998, p. 110. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 35 DOUTRINA Pois bem! neste mundo altamente influenciado pela tecnologia, no qual nosso país busca inserção, e nós, seus habitantes, procuramos encontrar nosso espaço, como ficam as relações de trabalho, e, sobretudo, os princípios que, histórica e doutrinariamente, informam o Direito do Trabalho? Onde sabemos que a proteção jurídica do trabalho, do momento inicial da concepção tutelar, cedeu lugar, desde meados dos anos 70, a uma concepção autotutelar, caracterizada pela flexibilização? Escreveu Américo Plá Rodriguez que “o Direito do Trabalho surge como conseqüência de uma desigualdade: a decorrente da inferioridade econômica do trabalhador. Essa é a origem da questão social e do Direito do Trabalho ”, acentuando, em seguida: “em todo o Direito do Trabalho, há um ponto de partida: a união dos trabalhadores; e há um ponto de chegada: a melhoria das condições dos trabalhadores. Direito individual e direito coletivo do trabalho são apenas caminhos diversos para correr o mesmo itinerário”7. Tendo essas manifestações como parâmetro, tentemos verificar como ficam alguns dos princípios que informam o Direito do Trabalho ante essas mudanças que se processam na atualidade. Essas alterações são sobretudo originárias de causas estruturais e conjunturais. Em nosso país, estas, as causas conjunturais, decorrem dos encargos sociais, das diferenças cambiais, das taxas de juros, da falta de investimento no campo. As estruturais são a globalização da economia, a falência do Estado, a rigidez da legislação trabalhista, a obsolescência do Direito. E quais são as alterações que verificamos, geradas por essas causas? Conjunturalmente, as crises econômicas; estruturalmente, as novas tecnologias. E a conseqüência? A necessidade de rever a postura dos homens de pensamento, dos cientistas sociais, dos dirigentes das organizações públicas e privadas, dos líderes políticos e comunitários. A partir daí, mediante debates de alto nível e com honestidade de propósitos, devemos buscar solução que atenda aos interesses de todos. Ora, esse quadro pincelar oferece uma macrovisão do mundo. Na sociedade atual, os parceiros sociais têm tentado encontrar meios para solucionar seus conflitos, suas divergências e suas necessidades. O trabalhador busca uma ocupação, onde possa obter recursos para sustentar a si e a sua família. Muitas vezes, abdica de certos privilégios e previsões legais, para poder sobreviver com o mínimo de dignidade. Por isso, não raro, se pode cogitar de flexibilizar as normas que protegem o trabalhador, para poder, ao cabo, garantir a sua sobrevivência. Deve, contudo, haver a preservação de um standard minimum, que lhe proporcione (ou, em muitos casos, restitua) a dignidade. Situados esses aspectos, vejamos os princípios que informam o Direito do Trabalho, partindo do elenco apresentado por Plá Rodriguez: protetor, irrenunciabilidade, continuidade, primazia da realidade, razoabilidade e boa-fé8. 7. PLÁ RODRIGUEZ, Américo. Princípios do direito do trabalho. Trad. Wagner D. Giglio. 2ª ed., São Paulo, LTr, 1993, p. 25. 8. PLÁ RODRIGUEZ, A.. Idem, p. 24 passim. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 36 DOUTRINA II - A INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO PROTETOR ANTE AS ALTERAÇÕES NAS RELAÇÕES DE TRABALHO De todos, um dos mais cogitados é o princípio protetor ou tutelar que se apresenta sob três formas: do in dubio pro operário, significando que, na incerteza, seja interpretado em prol do teoricamente mais fraco; do favor laboris, quando havendo mais de uma norma, aplica-se a mais favorável ao obreiro, como consagrado no art. 19,8, da Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT); e da condição mais benéfica, pelo qual a regra aplicável deve ser sempre a mais benéfica ao trabalhador. Como ensina Alfredo Ruprecht, o que se pretende é “criar uma norma mais favorável ao trabalhador para compensar desigualdades econômicas e fraqueza diante do empregador”9 e, do ponto de vista econômico, deve ser visto com abrandamento, com a prevalência do interesse comum. Ademais, - ainda o mestre argentino ensinando, - “seu alcance, evidentemente, não pode ser igual ao do começo da disciplina laborai, quando as normas eram poucas e dispersas e o julgador enfrentava muitas falhas e lacunas”10. É por isso que esse princípio “subsiste, mas restrito às novas realidades, ou seja, não será de aplicação pura e simples, mas tomando outros fatores em consideração: o interesse social, a produção nacional, sua influência na economia, etc.”n, devendo, agora, ser acrescentados os avanços tecnológicos. Dentro deste campo, sobreleva notar o problema da cibernética, com as novas tecnologias gerando o desemprego estrutural, modificando as relações de trabalho, a par de se estar verificando profunda mudança das características habituais dos contratos de trabalho, com o enfraquecimento do vínculo de subordinação, como apontado por Boissonnat12, e o surgimento de novas atividades ou o fortalecimento de antigas e esquecidas (conservadores do meio ambiente, habitat, serviços de saúde, assessoria, acolhimento, comércio de vizinhança, alimentação fora de casa, cuidado de pessoas isoladas, idosas e deficientes, processamento de dados, indústria de informação). Da mesma forma, o novo mundo do trabalho parece revelar os setores das atividades do futuro: computadores interativos, multimídia, audiovisual, cerâmicas, carros elétricos, tratamento de esgotos, pratos preparados, lazer, cultura, a par de atividades que devem dominar no amanhã: secretárias, profissionais da saúde, de hotelaria, de alimentação, técnicos em manutenção especializada, criativos, jornalistas. Sobreleva notar, neste aspecto, alguns aspectos de alta relevância. Os níveis de desemprego, no setor bancário, por exemplo, em nosso país, de 1986 a 1996, reduziram em 50%, e, até o ano 2000 corrente, diminuirão em mais 30%. Da mesma forma 9. RUPRECHT, Alfredo. Os princípios do direito do trabalho.Trad. Edilson Alkmin Cunha. São Paulo, LTr, 1995, p. 9. 10. RUPRECHT, A. Idem, p. 13. 11. RUPRECHT, A.; Ibidem, p. 23. 12. BOISSONNAT, Jean. 2015-Horizontes do trabalho e do emprego. Trad. Edilson Alkmin Cunha. São Paulo, LTr, 1998, pp. 207-8 passim. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 37 DOUTRINA como, até 2005, deve retrair-se o setor agrícola em 16%, e o setor industrial em 15%. Em compensação, cresce o setor terciário tendendo a aumentar em níveis de aproximadamente 62%13, inclusive em serviços de turismo, campo novo e que necessita ser explorado adequadamente no Brasil. Acentua Noam Chomsky o desvio da vanguarda tecnológica e industrial da indústria eletrônica do pós-guerra para a indústria e o comércio biológicos14, com a biotecnologia e a engenharia genética ganhando terreno e “tomando corpo ”, e passamos a conjugar novo verbo intransitivo de alcance profundamente temeroso, “clonar”, cujos efeitos e a gravidade a inteligência humana não permite, ainda, dimensionar. Com a informática, as atividades econômicas baseadas na informação (imprensa, cinema, som) passam a convergir para um único ramo, a digitalização, verificando- se, v.g., a proliferação de pequenas empresas de música15. O teletrabalho, outro fenômeno do século XX, mas que continuará a se difundir no século XXI, ocupava, até meados dos anos 90, oito milhões de trabalhadores nos Estados Unidos da América, 500 mil no Reino Unido, 150 mil na Alemanha, 100 mil na Espanha, e, segundo a OIT, na Europa, os serviços de processamento de dados são 53% executados por teletrabalhadores. Os números não ficam na atividade mais ligada à informática. Temos em redação e edição, 33%; em tradução, 32%; em contabilidade, 28%; em secretariado e em vendas e marketing, 23%, cada qual16, onde, embora aparentemente estranho, existe possibilidade de verificação da jornada, mediante formas tecnológicas de controle do tempo de trabalho. Este tema permite que se vislumbre muitas dificuldades, - aliás, existem mais dificuldades que facilidades neste mundo novo que está a se descortinar, - mas, felizmente, todas (ou quase) são superáveis. Estão a surgir plataformas mundiais de teletrabalho, sobretudo na índia e Tailândia, eis que é uma atividade cuja tecnologia básica resume-se a um telefone e um computador. É inevitável essa nova forma de atividade produtiva, cujos problemas e dúvidas ainda é cedo para apontar, como assinalado por De Masi17. Estamos, certamente, diante da globalização do trabalho. Nesta mesma linha, Frei Luís Sartori, em estudo preparatório para a Campanha da Fraternidade de 1999, iniciada na última quarta-feira, lembrou que “a construção de computadores, dos robôs, com sua quase infinita série de componentes irá exigir mão- de-obra abundante e especializada nesta nova linha de produção”18, o que poderá ser uma forma de amenizar esse problema. Note-se, todavia, que, enquanto isso não ocorre, os robôs estão desempregando os homens, seus inventores, a base de um robô para 13. PASTORE. José. Tecnologia e emprego. Brasília, CNI, 1998, p. 17. 14. CHOMSKY, Noan. A minoria próspera e a multidão inquieta. Trad. Mary Grace Fighiera Perpétuo. 2a ed., Brasília, Ed. UnB, 1997, p. 20. 15. In Trabajo; Revista de la OIT. Genebra, 19:10, mar.1997. 16. Cf. Trabajo: Revista de la OIT. Genebra, 19:24, mar. 1997. 17. DE MASI, D.. Ob. cit„ p. 268. 18. SARTORI, Frei Luiz. O desemprego mundial: causas e soluções. São Paulo, LTr, 1998, p. 11. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 38 DOUTRINA quatro homens. No Japão, existem 400.000 robôs, e, em nosso país, ainda possuímos apenas 1.00019. Assim, então, é preciso rever o ensino que vem sendo ministrado em nossas escolas, para minorar as distâncias sociais e as deficiências tecnológicas. Os pobres costumam ser direcionados para as escolas públicas, geralmente formando técnicos de duvidosa qualidade. Os ricos vão para caros liceus, onde podem obter melhor formação20. Afora isso, imperioso que as novas técnicas sejam ensinadas e uma formação mais real seja oferecida tanto aos jovens, como aos mais maduros, a fim de conservarem estes, e conquistarem aqueles, colocações no mercado de trabalho, na esperança de que os jovens possam obter com mais facilidade um lugar digno na sociedade e os assalariados idosos não sejam expulsos do sistema. Em suma, a educação é, sem dúvida, a base do progresso. Sem ela, certamente, tudo pode ser considerado perdido. III - O ALCANCE DO PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE E OUTROS PRINCÍPIOS RELEVANTES: CONTINUIDADE, RAZOABILIDADE, REALIDADE E BOA-FÉ O outro princípio sempre agitado e por vezes levado a certos extremos pouco recomendáveis é o da irrenunciabilidade que limita a autonomia da vontade. Na sua aplicação, devem ser admitidas exceções com a participação das entidades sindicais, quer através da transação, mediante concessões recíprocas; quer pela renúncia, com o abandono unilateral de certos direitos, com mais incidência no campo coletivo; quer, ainda, pela conciliação, que é o acordo celebrado com intervenção de terceiros, como ocorre no dia-a-dia da Justiça do Trabalho21. Esse princípio deve ser aplicado com moderação e racionalidade, sobretudo à vista do fenômeno sindical que vive o Brasil. É que adotamos, por via constitucional, a criticável unicidade sindical (art. 8°, II, da Constituição da República). Porém, na prática, vivenciamos uma pluralidade sindical oblíqua. Levamos 46 anos (de maio de 1942 a outubro de 1988) para ter 10.595 sindicatos, que obtiveram a outorga do Estado, através da carta sindical. Depois do Código Político Máximo de 1988, e somente no período entre fevereiro de 1990 e agosto de 1996, em seis anos portanto, dados da Coordenadoria de Registro Sindical do Ministério do Trabalho revelam que surgiram mais 5.377 sindicatos. Até abril de 1998, superava a casa dos 20.000 o número de processos de entidades de diversos graus em tramitação no Cadastro Nacional de Entidades Sindicais. 19. PASTORE, J. Ob. cit.., p. 18, nota 6. 20. FORRESTER, Viviane. Horror econômico. Trad. Álvaro Lorencini. São Paulo, Ed. UNESP, 1997, p. 75 passim. 21. RUPRECHT, A.. Ob. cit.. pp. 29-53 passim. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 39 DOUTRINA A responsabilidade sindical é grande. Por isso, devem especialmente os trabalhadores agir com cautela na criação de entidades dessa natureza. No Ministério do Trabalho, há pedido de registro para sindicatos de atividade no mínimo questionável, ou de denominação estranha. A título de exemplo, eis alguns: Sindicato dos Ministros Religiosos Evangélicos e Trabalhadores Assemelhados no Estado de São Paulo, Sindicato dos Proprietários de Cavalo (de âmbito nacional), Sindicato dos Proprietários de Veículos Particulares (também de âmbito nacional), Sindicato dos Trabalhadores na Economia Informal de Ribeirão Preto, Sindicato dos Jogadores, Professores, Árbitros e Empregados em Casa de Sinuca e Bilhar no Estado do Rio de Janeiro, Sindicato dos Guardadores e Lavadores Autônomos de Veículos Automotores de Ribeirão Preto e Região e o Sindicato das Empresas Optadas pelo Simples no Estado de Mato Grosso do Sul. Vamos além! Há absurdos assustadores em denominações que deixam entrever a dificuldade de saber afinal o que pretende o sindicato. Exemplo é o que segue, cuja leitura oral do seu nome demanda mais de 1,5 minuto: Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Ferro (Siderúrgicas), de Trefilação e Laminação de Metais Ferrosos, da Fundição, de Artefatos de Ferro e Metais em Geral, de Serralheria, de Proteção, Tratamento e Transformação de Superfícies, de Máquinas, de Balanças, Pesos e Medidas de Cutelaria, de Estamparia de Metais, de Móveis de Metal, Materiais e Equipamentos Rodoviários e Ferroviários, Fabricantes de Carrocerias para Ônibus e Caminhões, Viaturas, Reboques e Semi-Reboques, Locomotivas, Vagões, Carros e Equipamentos Rodoviários, Motocicletas, Motonetas, Bicicletas e Veículos Semelhantes, Artefatos e Metais não Ferrosos, Geradores de Vapor, Caldeiras e Assessorios (sic), de Parafusos, Porcas, Rebites, e Similares, de Tratores, Caminhões, Ônibus, Microônibus, Vans, Automóveis e Veículos Similares, de Peças para Automóveis, de Funilaria, de Forjaria, de Refrigeração, Aquecimento e Tratamento do Ar, de Preparação de Sucata Ferrosa e não Ferrosa, de Artigos de Equipamentos Odontológicos, Médicos e Hospitalares, e de Rolhas Metálicas, de Botijões de Gás Residencial e Industrial, e Similares, dos Municípios de Barra Mansa, Resende, Quatis, Porto Real, Itatiaia, Volta Redonda e Pinheiral - RJ22. Afora isso, surgem profissões estranhas de nomenclaturas mais estranhas ainda, a encobrir velhas e antigas atividades. Tramita no Congresso Nacional projeto de lei de autoria da então Deputada Federal Benedita da Silva, regulamentando o que pretendia chamar de auxiliar de serviços de administração residencial, que seria o futuramente antigo empregado doméstico23, ou o reconhecimento, desde 1975, da profissão de guardador e lavador autônomo de veículos automotores, que é o nomen juris do que o vulgo chama de flanelinha24, para ficar apenas nesses dois exemplos. 22. In Diário Oficial da União n° 141-E, Seção 1, de 26.07.1999, pp. 22954-60. 23. Essa denominação constava do Substitutivo do Senado ao Projeto de Lei da Câmara n° 41, de 1991 (originalmente PL n° 1.626/89). No Projeto de Lei n° 1.626-C, de 1989, o substitutivo não contempla mais essa denominação (Diário da Câmara dos Deputados, de 17.8.96, pp. 22954-5). 24. Trata-se da Lei n° 6.242, de 23.setembro. 1975. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 40 DOUTRINA Impende assinalar, neste ponto, que o Poder Executivo editou a Medida Provisória n° 1.986/99, ampliando os direitos que a Carta Magna de 1988 consignou, em numerus clausus, ao trabalhador doméstico (art. 7°, parágrafo único). Ao fazê-lo praticou duas inconstitucionalidades: uma formal, face a inexistência de urgência e relevância, exigidos pelo art. 62 da Constituição; outra de conteúdo, pela razão acima apontada23. Em situação dessa natureza, como a do flanelinha, surgem questionamentos, como, v.g., qual será a categoria com a qual poderão negociar, na eventualidade de um “dissídio coletivo”? E esse excesso de sindicatos poderia implicar prejudicar a sinceridade de propósitos dos interessados? Estaria a haver a desenfreada busca do código necessário para obter as vultosas importâncias oriundas da condenável contribuição sindical, que ainda subsiste no Brasil, apesar de se pretender revelar ampla a liberdade sindical? Seria possível admitir outras cláusulas alterando velhas conquistas dos trabalhadores? Eis problemas sérios, que estão a requerer cautela e cuidado dos interlocutores sociais. Os sindicatos amarelos estão aí e, ninguém duvide, há sindicatos multicores, mutantes, metamorfoseantes, que se adaptam conforme os interesses do momento e o sabor de determinadas oportunidades Esses aspectos devem ser considerados quando se cogita rever o princípio da irrenunciabilidade de direitos trabalhistas, cujos fundamentos, na linha traçada por Plá Rodriguez, são assentados no princípio da indisponibilidade, no caráter imperativo das normas trabalhistas (jus cogens), na ordem pública e na limitação da autonomia da vontade26. Não é absoluto eis que também existem direitos renunciáveis, dentre os quais as liberalidades patronais, certos excessos nos direitos subjetivos, e direitos que beneficiam o trabalhador como a venda de parte das férias. De outro lado, existem problemas: quais as normas realmente irrenunciáveis? São irrenunciáveis pelo fim a que visam, não havendo necessidade de uma declaração expressa do direito positivo, registrando inconvenientes em seu caráter absoluto, porque levaria ao incremento da litigiosidade. Outro princípio assinalado, e que o mundo moderno está questionando, é o da continuidade, decorrência de ser o contrato de trabalho de trato sucessivo, regra aplicável fundamentalmente aos trabalhadores, significando que o pacto laboral continua a viger apesar de alguns reveses. É a estabilidade, que, para Ruprecht, não existe, porque “.só há meios de proteção contra a dispensa”27. “A tendência atual do Direito do Trabalho é da continuidade da relação laboral ”, advertindo Ruprecht que “não se deve, todavia, entender como um direito de propriedade do emprego, mas simplesmente como uma esperança ou expectativa de mantê-lo”28. 25. A respeito, v. meu artigo A dupla inconstitucionalidade da medida provisória sobre empregado doméstico. In: Suplemento LTr. São Paulo, 36:009/00, jan.2000, pp. 37-9. 26. PLÁ RODRIGUEZ, A.. Ob. cit.. pp. 106-7. 27. RUPRECHT, A.. Ob. cit.. p. 63. 28. RUPRECHT, A.. Ob. cit.. p. 56 . Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 41 DOUTRINA Apresenta exceções, que são contempladas inclusive no Direito brasileiro do Trabalho, como o contrato de trabalho temporário (Lei n° 6.019, de 03 de janeiro de 1974), o contrato por prazo determinado (Lei n° 9.601, de 21 de janeiro de 1998), e a prestação de serviço voluntário (Lei n° 9.608, de 18 de fevereiro de 1998), que não gera vínculo empregatício, todos como fruto da modernização das relações de trabalho. O princípio da razoabilidade, ou racionalidade, significa o uso racional de direitos ou o cumprimento racional de obrigações. Neste particular, como lembrou o saudoso Ministro Orlando Teixeira da Costa, o direito alternativo, aplicado como procedimento para fazer a lei ser instrumento de realização da justiça social, “pode ser uma rica vertente da hermenêutica jurídico-trabalhista, capaz de efetivamente garantir a construção ou restauração de uma sociedade fundada na justiça social”29. O princípio da realidade decorre de que o Direito do Trabalho regula a atividade humana, e o contrato que se celebra é, na visão de De La Cueva, um contrato-realidade30, onde há a primazia dos fatos31, no pensamento de Lupo Hernández-Rueda. A boa-fé, segundo Plá Rodriguez, não é uma norma, mas um princípio jurídico fundamental32. Pode ser crença, que é uma conduta legítima sem prejudicar terceiras pessoas, ou, lealdade, no sentido de honestidade e honradez, que é o vigorante no Direito do Trabalho, apresentando-se por dois ângulos: subjetivo, que é a estima, e jurídico, que é a sua conduta exteriorizada. Deve existir entre ambas as partes e representa o valor ético do trabalho33. IV - EM DEFESA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA Desejo, ainda, acrescentar um outro princípio, referido por Ruprecht, o da dignidade humana, representado pela valorização do ser humano34. Neste ponto, devemos renovar a crença na necessidade de preservar a dignidade do ser humano, um dos princípios fundamentais da República do Brasil (art. 1°, III, da Constituição de 1988), e que não pode, nem deve, ser esquecido, máxime se recordamos que há mais de cinqüenta anos uma Declaração Universal pretendeu alertar para a importância dos Direitos Humanos. É imperioso, como acentua Arion Sayão Romita, um compromisso internacional em torno do pleno emprego, a fim de combater a pobreza, o desemprego e o subemprego, tão difundidos em todo o planeta35. O homem-trabalhador deve ser visto como o sujeito-fim e não o objeto-meio do desenvolvimento. Com efeito, não devemos pensar em criar mais direitos, mas sim a 29. COSTA, Orlando Teixeira da. O direito do trabalho na sociedade moderna. São Paulo, LTr, 1999, p. 46. 30. DE LA CUEVA, Mario. El derecho mexicano del trabajo (I). 6ª ed., México, Porrua, 1980, p.195. 31. Apud RUPRECHT, A.. Ob. cit., p. 81. 32. PLÁ RODRIGUEZ, A.. Ob. cit.. p. 269. 33. RUPRECHT, A Ob. Cit. pp. 87-8. 34. RUPRECHT, A Idem, p. 105. 35. ROMITA, Arion Sayão. Globalização da economia e direito do trabalho. São Paulo, LTr, 1997, p. 51. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 42 DOUTRINA dar garantia para a eficácia dos que já existem. Como alerta Norberto Bobbio, “o problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá- los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político”36, E, acrescenta: “não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro de garanti-los para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados”37. Nessa esteira, devemos ter coragem de adotar meios alternativos de trabalho, como a proposta do trabalho a tempo parcial, amplamente praticado na Europa, com jornada, em alguns casos (Volkswagen, na Alemanha, v.g.), reduzida a 28,8 horas/semanais38. Da mesma forma, como recordou o Ministro Orlando Teixeira da Costa, “não se pode repartir no Brasil os prejuízos da crise com quem vive em miséria absoluta ”39. O problema é mundial. Lembremos que a pobreza priva de dignidade 1.300.000.000 de pessoas, segundo dados do Relatório do Desenvolvimento Humano elaborado pelo PNUD, e outras 1.200.000.000 vivem sem água potável e 842.000.000 são analfabetos, sem esquecer as 120 milhões de crianças trabalhando desprotegidamente e os 37 milhões de desempregados, em um mar de dificuldades onde ainda deve haver lugar para a esperança. Temos todos de contribuir para a urgente saída dessa crise, que também começa a ser da consciência de cada qual. No Poder Judiciário, temos essa responsabilidade, que se divide harmonicamente com os demais operadores do Direito. Está a nossa Justiça do Trabalho afogada em milhares de ações, em todos os graus, com a pletora de recursos que a nossa legislação, lamentavelmente propicia à litigiosidade, permite. Como reduzir esses dados preocupantes? Acredito que apenas com a conscientização de que todos nós somos responsáveis pelo bem-estar da sociedade e que devemos, indistintamente, dar nossa contribuição para que esses óbices sejam superados. Vivemos em um mundo que está a sofrer graves mudanças. Creio que inexiste registro na História de alterações tão rápidas e profundas nas relações humanas. Neste meio, sobressai o papel do Judiciário, que está em crise e precisa ser reavaliado, mas não pode ser o responsável exclusivo pelos males da Nação. O que quero destacar é que todos temos de contribuir para a urgente saída dessa crise, que tomou conta do Poder Judiciário, e que também começa a ser da consciência de cada qual. Em nosso Poder, temos essa responsabilidade, que se divide harmonicamente com os demais operadores do Direito. Recordando o inolvidável brasileiro Ministro Orlando Teixeira da Costa40, desejo lembrar o que devemos esperar de cada um de nós. Do magistrado: simplicidade, oralidade, concentração do processo, sabedoria 36. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro, Campus, 1992, p. 24. 37. BOBBIO, N. Idem, p. 25. 38. Cf. Folha de São Paulo. São Paulo, ed. de 23.11.1997, pp. 1-23. 39. COSTA, O . T. da. Ob. cit., p. 47. 40. COSTA, O . T. da. Idem, p. 180. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 43 DOUTRINA na hora de julgar e humildade no instante de reconsiderar algum equívoco. Do Ministério Público: oficiar apenas quando efetivamente necessário, contribuindo para a paz e a harmonia sociais, e o mais rápido e adequado cumprimento do ideal de Justiça. Do advogado: a adoção da advocacia preventiva, e, nas ações relevantes, o abandono de teses processuais e da solução pela via indireta do direito adjetivo, pela aplicação direta do Direito substantivo controvertido. Importa, no que tange à Justiça do Trabalho propriamente dita, e, especificamente quanto ao processo do trabalho, que tem sofrido tantas alterações, em que todos procedamos a uma urgente e objetiva releitura do art. 769 da nossa cinqüentenária Consolidação das Leis do Trabalho. Em outras palavras, é preciso evitar, ao máximo, a aplicação exagerada e exacerbada das regras processuais civis, e retomar ao procedimento simples, direto e objetivo que o legislador de 1943 adotou na CLT, e que hoje ou não sabemos, ou não queremos saber, ou achamos melhor não saber. Optamos pelo complicado. Todos passamos a seguir o dito popular de que as coisas simples não têm valor. Bom mesmo é complicar. Chegamos a tal ponto de absurdo, que há até quem pensasse em, para melhorar as condições da Justiça do Trabalho, tomar o modelo de sucesso dos Juizados Especiais de Pequenas Causas e transplantá-lo para o Judiciário trabalhista. E diziam: “assim a Justiça do Trabalho será célere!”, Seria cômico se não fosse sério, mas estamos diante do quadro dantesco da criatura (os Juizados Especiais de Pequenas Causas) servir de fonte de inspiração ao seu próprio criador, porque foi no modelo da Justiça do Trabalho que foi colhida a inspiração para seu surgimento. E isso acabou a se concretizar, com a sanção da Lei n° 9.957, de 12 de janeiro de 2000, criando o procedimento sumaríssimo na Justiça do Trabalho, quando seria mais simples aplicar as próprias regras processuais da CLT e apenas subsidiariamente (supletivamente, complementarmente) o processo civil comum. Porém, - irão dizer alguns, - elas (as normas celetistas) estão ultrapassadas e inadequadas à realidade atual e aos avanços da modernidade. Sofisma! O que há é a incrível vocação de algumas pessoas de tornar complicado tudo o que é fácil e simples, de dificultar as coisas, de deixar para amanhã a solução dos problemas simples, até que eles se transformem em complexos, e, aí, gáudio de alguns, não possam ser resolvidos. Vejamos, no uso desse procedimento sumaríssimo se ele não acabará a transformar-se no ordinaríssimo de que falou o saudoso Haroldo Valladão, a referir-se ao similar do Código Buzaid. José Eduardo Faria assinala, quanto à crise que atinge a Justiça do Trabalho, que “tanto isso é verdade que o Judiciário enfrenta, atualmente, o desafio de recuperar sua função social — desafio esse que tem levado a magistratura a criar escolas de reciclagem cultural, a formular concepções alternativas de pautas hermenêuticas e a defender outras estratégias de desformalização do direito positivo e descentralização da aplicação dos códigos e das leis" 41. É preciso combater a inflação jurídica42, promovida pelo excesso de formalismo e pelo exagero legislativo, verdadeiro furor legiferante que emperra a máquina 41. FARIA, J. E. Os novos desafios da Justiça do Trabalho. São Paulo, LTr, 1995, pp. 23-4. 42. FARIA, J. E. Idem, p. 95. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 44 DOUTRINA judiciária e nega à pessoa humana o verdadeiro sentido de Justiça. Permite-lhe o acesso à Justiça, mas impede-lhe receber a prestação adequada, o que enseja “o risco da própria morte do Direito ”43. Afinal, os 'direitos sociais não podem simplesmente ser 'atribuídos ’ aos cidadãos; eles requerem do Estado um amplo e complexo rol de programas de ação e de políticas públicas dirigidas a segmentos específicos da sociedade - políticas essas cujo objetivo é fundamentar esses direitos e atender às expectativas por eles geradas com sua positivação”44. E não só do Estado, senão, como apontei acima, de todos os operadores do Direito. Está posta uma nova ordem econômica internacional que reduz os homens ao status de incluídos (cidadãos-servos) de uma economia globalizada e que se flexibiliza ou de excluídos (desempregados, subempregados e até os inempregáveis, que são os que não obtêm colocação porque lhes falta conhecimento especializado). A esses permito-me acrescentar os esquecidos, os párias, os miseráveis, os sem condição alguma, os que estão naquele estranho estágio por que passa um seguimento da sociedade -, se é que se pode chamar de sociedade, - reunindo pessoas (serão?) que nos circulam e que não vemos, ou fazemos que não vemos, ou realmente não queremos ver, ante a nossa incapacidade de, porque servos de uma cruel e terrível realidade, podermos emprestar meios de solução. Em recente artigo na imprensa mundial, Habermas assinalou que, ao contrário dos ordenamentos políticos, os mercados não podem, por exemplo, ser democratizados45. Essa democracia, a tradicional, a que começou direta, na Agora, em Atenas, a ensinada nos bancos escolares, é que deve dar sustento ao mundo de hoje. Os rumos do nosso pequeno mundo (globalizado e transnacionalizado), no entanto, parecem apontar para outra democracia: aquela em que prevalece a empresa, e não o homem; em que a técnica é substituída pela tecnologia, e aparece a tecnocracia’, em que o poderio econômico e o sucesso do empreendimento é que importam, e o bem-estar do ser humano, do homem-pessoa, que raciocina e tem sentimentos, é colocado em plano inferior. V - REFLEXÕES CONCLUSIVAS Esses eram alguns pontos que queria refletir. Esses são alguns dos caminhos que podem conduzir à paz social, à solidariedade, à dignidade, ao respeito pela pessoa humana, numa revisão dos princípios que informam o Direito material do Trabalho neste mundo globalizado e globalizante. Parafraseando Plá Rodriguez, este estudo não tem conclusão. Como afirmou o eminente mestre uruguaio, referindo-se a sua obra: “Este livro não deve ter conclusões. 43. FARIA, J. E. Ibidem, p. 96. 44. FARIA, J. E. Ibidem, p. 102 45. HABERMAS, Jürgen. Nos limites do Estado. Trad. José Marcos Macedo. Folha de São Paulo. São Paulo, ed. 18.7.1999, p. 5/5 Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 45 DOUTRINA (...) Limitou-se a expor aqueles princípios considerados fundamentais. Mas eles não estão enquadrados em moldura fechada e congelada. Não se pode descartar a possibilidade de incorporar outros, como resultado do próprio dinamismo da vida trabalhista ou como fruto das observações, críticas ou sugestões de quem aprofunde seu estudo ou discorde de suas afirmações ou desenvolvimentos. Cada princípio não representa um repertório acabado de soluções, nem sequer um elenco determinado de diretivas. São orientações fecundas, de grande riqueza potencial pelo variadíssimo número de aplicações possíveis" 46. Do meu lado, aspirei apenas a lançar semente e não a colher frutos. Auguro tê-la lançado em terreno fértil, como na parábola do semeador (Lc, 8,15). Para a colheita, há que haver muito esforço, dedicação e boa vontade. Afinal, nada se consegue sem esforço. Por isso, como escreveu José Saramago, “deve haver na minha cabeça, e seguramente na cabeça de toda agente, um pensamento autónomo que pensa por sua própria conta, que decide sem a participação do outro pensamento, aquele que conhecemos desde que nos conhecemos e que tratamos por tu, aquele que se deixa guiar por nós para nos levar aonde cremos que conscientemente queremos ir, mas que, afinal de contas, poderá ser que esteja a ser conduzido por outro caminho, noutra direcção, e não para a esquina mais próxima, onde um bando de perdizes nos espera sem que o saibam, mas sabendo nós, enfim, que o que dá o verdadeiro sentido ao encontro é a busca e que é preciso andar muito para alcançar o que está perto”. É isso, exatamente isso: “o que dá o verdadeiro sentido ao encontro é a busca e é preciso andar muito para alcançar o que está perto ”47. Com efeito, “grande é a messe e poucos os operários”, disse Jesus (Lc, 10:2), e os problemas apenas se avolumam. Essa a doença deste fim de milênio: criar problemas e querer fazê-los insolúveis para dar o que falar, e aparentar um falso valor às coisas que fazem. Por isso, lembrando o Filho do Homem, “não são os que estão bem que precisam de médico, mas sim os doentes” (Mt„ 9:12). Sejamos, nós, operadores do Direito, os médicos para contribuir para curar os males do mundo. Para isso, devemos continuar a nossa missão, com fé, esperança e amor, os três sentimentos que devem presidir a vida humana, sobretudo o maior deles, o amor, porque “Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele” (1 Jo, 4:16). Devemos lançar olhos e mente no maior de todos os livros, o Sagrado, o único texto que nos tira as dúvidas da vida e nos faz acreditar mais e mais no ser humano, pelo caráter transcendental de sua mensagem. No Livro do Eclesiástico, está assinalado que “antes de julgar, procura ser justo; antes de falar, aprende” (Eclo, 18:19). É o 46. PLÁ RODRIGUEZ, A. Ob. cit.. p. 279 47. SARAMAGO, José. Todos os nomes. São Paulo, Companhia das Letras, 1997, pp. 68-9. Rev, TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 46 DOUTRINA que devemos fazer todos, todos os dias de nossas vidas, para tentar, minimamente, contribuir para a melhoria das condições humanas de existência. Recordando Frei Luís Sartori, há que haver solidariedade entre os homens, a qual “nascida da fraternidade cristã, não admite excluídos, como os 'sem-emprego ’, os 'sem-terra', os 'sem-teto , os 'sem-voz ’, os 'sem-vez ’, os 'sem-voto ’, os 'sem- amor”48, aos quais devemos somar os sem-redes, os sem-telefone, os sem-rádio, os sem-televisão, os sem-carro, os sem-internet, os sem os confortos da modernidade. Mas, dentre todos, sobretudo, os sem-vez e os sem-amor, o vínculo da perfeição de que fala São Paulo na Carta aos Colossenses (Col, 3: 14), o sentimento de misericórdia de que necessita a humanidade, misericórdia que é exatamente amor, e que recomenda que se crie, urgentemente, um novo verbo: misericordiar, e, conjugando-o, devolver ao homem-pessoa o que lhe tem sido suprimido, e, assim, superar essa carência, restituindo-lhe o mínimo de dignidade, que pode ser sintetizada na palavra respeito. Vivemos - e convivemos - com um mundo (externo e internamente) repleto de crises, que Gramsci diz ser aquele momento em que o velho ainda não morreu e o novo ainda não nasceu. Temos, no particular, nos acostumado a ouvir que vivemos em crise. Externamente, há crise do petróleo, crise no leste europeu, crise de religiões, crise nas fronteiras dos países primeiro-mundistas, crise nos tigres asiáticos. Internamente, embora não exclusivamente brasileira, temos crise na educação, na saúde, na segurança, nos transportes, nas telecomunicações, no fornecimento de energia elétrica, no emprego, na infância, na maturidade, na família, nos poderes constituídos, na sociedade. Há crise para todo gosto e de todo gosto. O mundo em crise. Há países emergentes que mais parecem submergidos. Os desiguais são cada vez mais desiguais. Então, o que quero destacar é que todos temos de contribuir para a urgente saída dessa fase difícil de crises sucessivas e de desigualdades cada vez mais flagrantes. Essa carência é o mesmo que excluir o homem do mínimo de dignidade, que, volto a insistir, é sintetizável na palavra respeito. A questão é que o homem começa a se internacionalizar, globalizar, mundializar. E, infelizmente, a ter menos importância para a humanidade (paradoxo estranho) que a própria máquina que ele criou. Talvez aqui esteja o maior equívoco: ao criar a máquina, o homem, ser imperfeito, não o fez a sua imagem e semelhança, por isso corremos o risco de não conseguir alcançar o verdadeiro sentido de um verbo menos importante que misericordiar, e a que já me referi, mas que exige a nossa reflexão: clonar. Voltemos nosso olhar e nosso pensamento para o futuro do mundo. No momento em que a capacidade estatal de garantir a segurança dos cidadãos começa a ser rompida, em que a mundialização da economia enfraquece o Estado e começa a se questionar a existência mesma do Estado nacional, em que a soberania cede lugar a forças transnacionais que rompem todos os padrões de respeito pela pessoa humana, precisamos refletir sobre nós, as nossas instituições e o nosso futuro, antes que ele chegue e 48. SARTORI, Fr. L.. Ob. cit.., p. 58. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 47 DOUTRINA termine. A humanidade chegou ao ano 2000, que parecia tão distante. Nunca uma passagem de ano foi tão ansiosamente aguardada. Passadas as festas, devemos olhar para nós mesmos e verificar que ainda há esperança de superação das dificuldades e das crises, com o esforço primeiro individual, e depois do conjunto de seres humanos de boas intenções. Existem, ainda, e felizmente existem, pessoas realmente bem intencionadas. Continuemos a nossa missão, operadores do Direito, a buscar a garantia da manutenção do Estado Democrático de Direito e da dignidade do homem, com esforço e perseverança, juntos com São Paulo, na Carta aos Hebreus, com fé, que “é o fundamento da esperança, é uma certeza a respeito do que não se vê” (Heb, 11:1). E assim deve ser porque “não somos, absolutamente, de perder o ânimo para nossa ruína; somos de manter a fé, para nossa salvação!” (Heb, 10:39). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 48 O DIREITO AO TRABALHO NO CONJUNTO MAIS AMPLO DOS DIREITOS HUMANOS. ASPECTOS DE SUA PROTEÇÃO JURÍDICA NO DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO Marcus Moura Ferreira* Posto que seja algo muito singelo, este artigo é dedicado à memória de D. Hélder Câmara. Em vida, deu-se a cumprir o imperativo categórico de Kant: “age de modo a tratar a humanidade, não só em tua pessoa, mas na de todos os outros homens, como um fim e jamais como um meio”. 1. DIREITOS HUMANOS: CEGAS ESPERANÇAS? (BREVE ABORDAGEM DE SUA EVOLUÇÃO) Sendo Bobbio um desses espíritos luminosos que se tornam em larga consideração sempre que proferem uma palavra que seja sobre determinado assunto¹, ouçamo- * Juiz da 34ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. 1. Tome-se em termos tal asserção, evidentemente. As idéias são a força motriz da vida, mas não se deve atribuir a qualquer delas critério de predomínio absoluto e de perpetuidade; no seu universo rico e transformador, o talvez único valor absoluto é justamente o da sua pluralidade. Por melhor elaborada que seja uma qualquer representação do pensamento acerca de um tema determinado, tal não exclui outras possíveis formulações, submetendo-se todas elas ao confronto das divergências. Todo o sistema de crenças humanas, e a própria ciência, se constróem a partir da circularidade, do pluralismo e do embate de idéias. Dir-se-á que idéias existem, tão naturalmente aceitas por todos os homens, como a noção de justo, por exemplo, dada a sua posição central entre os valores humanos, que seriam assim absolutas. Mas aí se trata dos valores considerados em si mesmos, que se expressam em noções, concepções, idéias. Norberto Bobbio é um dos mais importantes pensadores da segunda metade do século XX e uma referência imprescindível para o estudo e o adensamento teórico dos direitos do homem. Nem por isso, suas concepções, embasadas em argumentação muito bem estruturada e altamente persuasiva, podem ser tomadas como verdades incontrastáveis. É questionável que relegue a plano secundário de interesse o aspecto alusivo aos fundamentos dos direitos humanos, pela razão de que os valores da convivência humana, indefiníveis e variáveis conforme as épocas históricas, não se justificam, mas assumem-se. Ora, o pragmatismo desse raciocínio obscurece a dimensão ética dos direitos fundamentais, a sua autonomia e prevalência sobre todos os demais direitos. Os fundamentos são indissociáveis das instituições humanas e essa inter-relação é a premissa para que se assumam os direitos, positivando-os e os exercendo. A eficácia dos direitos fundamentais depende, antes, que hajam sido conscientizados como direitos de todos os cidadãos, inscritos na consciência histórica da humanidade. Daí porque adquire inegável relevância a questão pertinente aos seus fundamentos. No caso dos direitos humanos, a sua razão justificativa será sempre a dignidade humana, no que esta encerra os atributos de especificidade do ser a que se refere (historicidade, liberdade, consciência ética, entre outras características reconhecidas pela filosofia e que constituem o fulcro da antropologia cultural). Em verdade, os direitos fundamentais e sua idéia reguladora têm um comprometimento inevitável com a anterioridade que lhe é ontológica: o próprio homem. E tal se compreende exatamente a partir dos fundamentos. A propósito do assunto, leia-se o artigo de Fábio Konder Comparato, “Fundamentos dos Direitos Humanos”, notá Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 49 DOUTRINA lo sugerir, ao leitor de uma de suas mais notáveis obras, este exercício tão elementar quanto persuasivo a respeito dos direitos humanos (tema a que o seu talento criador há décadas dedica o mais valoroso contributo): “Ler a Declaração Universal e depois olhar em torno de si. Será obrigado a reconhecer que, apesar das antecipações dos filósofos, das corajosas formulações dos juristas, dos esforços dos políticos de boa vontade, o caminho a percorrer é ainda longo. E ele terá a impressão de que a história humana, embora velha de milênios, quando comparada às enormes tarefas que estão diante de nós, talvez tenha apenas começado” 2. Diagnóstico, advertência e predição do futuro a um só tempo, estas cortantes palavras do grande filósofo e jurista realçam o estágio aflitivo, angustiante e, não raro, lamentável em que se encontram os direitos humanos, não exatamente em sua formulação, pois as declarações de direitos, teoricamente consideradas e no momento histórico em curso, atendem à essencialidade das aspirações sociais e às exigências dos povos, mas em sua inflexão real e prática sobre extensas e sofridas camadas da população dos quadrantes todos da terra. O problema da efetividade dos direitos humanos já nasce com as respectivas declarações, desde a edição dos documentos setecentistas (na França, Inglaterra e Estados Unidos), e atravessa as diversas gerações que se seguiram, de modo que hoje e sempre nos debatemos em permanente luta para que se tomem realidade os sonhos iluministas, o ideário inspirador da Declaração Universal de 1948 e os direitos econômicos e sociais. E as ameaças e ações supressivas dos direitos civis, políticos, econômicos e sociais provêm quase sempre do próprio Estado que os deveria assegurar, das ideologias autoritárias e elitistas e do predomínio do interesse econômico sobre todos os demais elementos do processo social. Some-se a isto um dado característico da contemporaneidade, que é o imobilismo conformista da sociedade de massa, que opera para despolitizar as questões fundamentais, retirando-lhes a sua dimensão substantiva, em estratégia alienante tão ao gosto do reformismo conservador dos tempos que correm. Mas seja qual for a atitude de pensamento que se possa ter a respeito da efetividade dos direitos fundamentais - do direito ao trabalho, em particular, tal conduta reclama que se examine o tema a partir de sua perspectivação histórica, sinteticamente que seja. Em verdade, o homem e suas instituições, na linha de evolução e continuidade do seu desenvolvimento, são em si e por si mesmos condicionados pelo processo histórico, por isso que não se lhes compreende o estágio atual se não se concede alguma reflexão a sua herança cultural. E como não se conhece, na idade moderna, reatividade tão intensa quanto a Revolução francesa, é para a Assembléia Nacional de 1789 que nos reconduzimos, pois ali se editou o grande ato do pensamento liberal em toda a sua trajetória, a conhecida Déclaration des droits de I’homme et du citoyen, em cujo vel abordagem filosófica e crítica, publicado em “Cultura dos Direitos Humanos”, org. por Maria Luiza Marcílio e Lafaiete Pussoli, São Paulo, LTr, 1998, págs. 53/74. 2. Cf. Norberto Bobbio, “A Era dos Direitos”, tradução de Carlos Nelson Coutinho, Rio de Janeiro, Edito ra Campus, 1992, págs. 45/46. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 50 DOUTRINA texto declaram-se a liberdade de todos os homens e a igualdade destes em direitos e proclamam-se os seus direitos naturais e imprescritíveis, com o que afirma a dignidade da pessoa humana3. A França foi berço de outras importantes declarações, sendo que a de 1793, durante o período revolucionário, preocupou-se em amparar, como bem observou o emérito Josaphat Marinho4, o direito ao trabalho, ao socorro público e à instrução, numa espécie, queremos crer, de antecipação do conteúdo social prevalente nos documentos editados no século XX, notadamente a partir da Constituição de Weimar, de 1919. E Lucien Jaume registra que “o direito ao trabalho constituiu, em 1848, tema de debate memorável”5. Ressalte-se ainda a de 1795, sobre cuja essência se detém Nicola Matteucci6, a estatuir ao lado dos “direitos” também os “deveres”, tendência que ganhou corpo no século XIX, tal qual se verifica nos Doveri dell 'uomo, de Mazzini, e na própria Constituição italiana, cuja primeira parte se denomina “Direitos e deveres do cidadão”, designativo análogo ao do Capítulo I, do Título II, da Constituição Brasileira “Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos”. Como a França revela uma inobscurecível vocação libertária, é natural que em seu solo se plantassem e, de certo modo, se imortalizassem as raízes mais fundas do ideário das declarações políticas e jurídicas a exalçar os mais importantes valores humanos. Mas é de justiça, em ligeira retrospecção histórica, que se registrem os precedentes dos Bill of rights das colônias americanas que se rebelaram em 1776 contra a Inglaterra e o Bill inglês de 1688, embora este último não aludisse aos direitos do homem, mas aos “direitos tradicionais e consuetudinários do cidadão inglês, fundados na common law”7. Não obstante as diversidades próprias de cada momento histórico em que estas e outras importante declarações se proclamaram, a nota característica de todas elas é a crença impreterível da civilização na dignidade humana, enquanto valor fundante de uma convivência pacífica, respeitosa e solidária entre as pessoas. 3. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão foi elaborada em consonância com a visão liberal e universal dos filósofos do século XVIII e segundo os interesses políticos da burguesia. Contrária em tudo aos princípios despóticos da monarquia, aos privilégios da aristocracia e à intolerância do clero, a Declaração foi, na realidade política daquele momento, a certidão de óbito do Antigo Regime. No que afirmou que “a fonte de toda soberania reside essencialmente na nação” modificou profundamente o conceito de Estado. Aliás, a mais expressiva conquista da Revolução Francesa foi exatamente a transformação do Estado dinástico no Estado moderno: nacional, liberal, secular e racional. Cf. Marvin Perry et al, especialmente o capítulo escrito por Margaret C. Jacob, in “Civilização Ocidental - Uma História Concisa”, tradução de Waltensir Dutra, São Paulo, Editora Martins Fontes, 1985, págs. 394/445. 4. Cf. MARINHO, Josaphat, “Constituição e Direitos Sociais”, in “Direito do Trabalho - Estudos em homenagem ao Prof. Luiz de Pinho Pedreira da Silva”, org. por Lélia Guimarães Carvalho Ribeiro e Rodolfo Pamplona Filho, São Paulo, Editora LTr, 1998, pág. 40. 5. Cf. JAUME, Lucien, “Les Déclarations des Droits de l’Homme”, apud Josaphat Marinho, ob. Cit. Pág. 40. 6. Cf. MATTEUCI, Nicola, “Dicionário de Política”, Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino; tradução de Carmen C. Varriale et al, Brasília, Editora Universidade de Brasília, 12ª edição, 1999, vol. 1, págs. 353/354. 7. Cf. MATTEUCI, Nicola, ob. cit. vol. 1, pág. 353. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 51 DOUTRINA Os direitos do homem classificam-se, segundo a conotação política e jurídica da tutela ou proteção que por meio deles se pretende alcançar, em civis, políticos e econômicos e sociais8, cada qual destes constituindo uma específica e complexa geração de direitos. Entretanto, operam de maneira interdependente e se agrupam em unidade fundamental de que se irradia o seu potencial, a incidir sobre todas as dimensões conhecidas do ser humano. Inicialmente, declaram-se os direitos civis em atitude de elementar respeito à personalidade moral da pessoa. Aí está o primeiro movimento, de primacial importância, no sentido moderno por que se compreendem as declarações de direitos. No seu âmbito, assegura-se o espaço vital da liberdade para o exercício dos próprios desígnios, em contraposição ao arbítrio do Estado, que se obriga desde então a não impedir ou dificultar essas manifestações de afirmação pessoal em todos os níveis - de pensamento, de crenças diversas, políticas, ideológicas e religiosas, de reunião, de atividade econômica e tantas quantas possam expressar a personalidade e o desejo do indivíduo de entrar em relação com o mundo. Trata-se de uma atitude cultural típica do século XVIII, marcado pelas idéias do grande apelo libertário que se propunha à construção de novas realidades humanas e de um mundo completamente novo, para cuja conformação o Estado concorre com uma petrificada passividade, limitando-se e abstendo- se, dada a concepção filosófica então dominante de que o direito natural antecede a toda e qualquer organização política e social. Daí o caráter tão afirmativo das esferas de liberdade pessoal e dos direitos que as asseguram. Sucede que os direitos de liberdade individual não bastam para o exercício compartilhado do poder político. A emergência dos grupos sociais contribui decisivamente para a formação do Estado democrático e representativo, no qual o poder decisório se desconcentra e se distribui por entre instâncias de representação da vontade popular. Propugnam-se e consolidam-se, em continuidade evolutiva, os direitos políticos. O sentido de liberdade adquire uma conotação transcendente da individualidade, para assegurar a participação do cidadão nas deliberações do Estado, por intermédio dos partidos políticos e pelo exercício do sufrágio universal. Assim se desenvolve, em torno dos direitos civis e políticos, a concepção filosófica, jurídica e política dos direitos do homem, com o conseqüente papel absenteísta atribuído ao Estado, até que os fatos abrem veredas novas ao movimento de idéias, já ao final da primeira guerra mundial. O social entra com grande força no horizonte da humanidade, a expressar o amadurecimento de exigências novas, múltiplas e complexas e a reclamar a presença ativa do Estado, como elemento insubstituível de organização das forças vivas da sociedade e de regulação da vida social. A Constituição de Weimar, de 1919, torna-se uma referência para o constitucionalismo democrático, 8. Já se está tratando, hodiernamente, de um outro grupo, o dos direitos difusos, transindividuais, cujo conteúdo material abriga os grandes temas da sociedade pós-idustrial, como o direito à proteção do ambiente ecológico. Como o presente artigo propõe uma reflexão localizada no campo dos direitos sociais e centrada no direito ao trabalho, faz-se aqui apenas esta restrita alusão aos direitos de última geração. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 52 DOUTRINA cumprindo o papel pioneiro de infundir racionalidade à organização do Estado e de proclamar, agora em tom e termos muito claros, ao lado dos direitos civis e políticos, os direitos sociais correspondentes às demandas da época. Esta Constituição, elevando-se sobre todas as demais que se promulgaram em um mesmo contexto histórico, revestiu-se de impressionante poder de influência e expansão, pela força renovadora de suas disposições9. Seguiu-se à segunda guerra um amplo movimento de solidariedade internacional e um grande esforço de cooperação para que se viabilizassem ações que promovessem os valores mais caros ao homem, profundamente atingidos pelos efeitos devastadores daquela conflagração mundial, que dissipou e nulificou quantos avanços haviam sido até então conquistados e incorporados à realidade política. Em 1948, tornou-se um compromisso internacional de extraordinária relevância, através da Assembléia Geral das Nações Unidas, sob a forma e denominação de “Declaração Universal dos Direitos do Homem”, documento altamente construtivo, corajoso e emancipatório, embora promulgado em período de graves inquietações, quando “dois terços da humanidade ainda viviam em regime colonial”10. Penetrando a questão social em seus artigos 22 a 28, declara os direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à dignidade da pessoa humana: direito ao trabalho, à escolha do trabalho, a condições satisfatórias de trabalho, à proteção contra o desemprego, ao salário digno, ao repouso, à liberdade sindical; ao lazer, a um nível de vida que assegure ao trabalhador e à sua família a saúde e o bem-estar, a alimentação, o vestuário, a moradia, a assistência médica e os serviços sociais necessários; direito à previdência e ao seguro social no caso de desemprego, enfermidade, invalidez, viuvez e velhice; direitos especiais à maternidade e à infância; direito à educação, à instrução técnica e profissional; à cultura e a uma ordem social e internacional em que os direitos fundamentais sejam plenamente efetivos, entre outras promulgações. É irrecusável a influência que a Declaração de 1948 exerceu, nos anos seguintes, sobre os ordenamentos jurídicos de diversos países da comunidade internacional. A conversão ou transposição daqueles valores para as Constituições dos Estados sobe- 9. Entre suas normas, a Constituição de Weimar decreta a necessidade de “proporcionar ao conjunto da classe operária um mínimo geral de direitos sociais” (art. 162); estabelece a competência da República federal para legislar sobre “direito operário” e “socialização das riquezas naturais e de empresas econômicas” (art. 7o, incisos 9o e 13); diz que a ordem econômica deve “garantir a todos uma existência humana digna” (art. 151); prescreve que “as energias do trabalho” ficavam “sob a especial proteção da República” (art. 157) e que o “conteúdo” e as “limitações” do direito de propriedade seriam “deduzidos da lei” (art. 153); sobre a função social da propriedade, definiu que o “seu uso deve constituir, ao mesmo tempo, um serviço para o mais alto interesse comum” (art. 153) (Josaphat Marinho, ob. cit. págs. 41/42). 10. Cf. ALVES, José Augusto Lindgren, “A Declaração dos Direitos Humanos na pós-modernidade”, in “Cidadania e Justiça”, Revista da Associação dos Magistrados Brasileiros, n. 5, 1998, pág. 6. Este autor relata que os países afro-asiáticos eram quase todos colônias ocidentais e não tiveram voz nas negociações que precederam a Declaração, sendo certo que os países socialistas se abstiveram na votação. Acrescenta a perspícua observação de que “os direitos consagrados pelo documento entraram gradativamente nas consciências de seus nacionais (dos países colonizados), auxiliando-os, inclusive, nas lutas pela descolonização” (pág. 9). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 53 DOUTRINA ranos, na segunda metade do século XX, constituiu um passo definitivo para a universalização dos direitos fundamentais. Àquela altura, despertadas as consciências, criaram-se em quase todo o mundo entidades de proteção dos direitos humanos, que já articulavam ações solidárias para submeter os governos dos Estados nacionais a critérios de aferição de sua legitimidade.11 No Brasil, uma extensão mais profunda de efeitos se instalou com a Constituição de 1988, que assumiu a feição das denominadas constituições abertas, pelo aspecto analítico e extenso de seu texto e a variedade das questões neste incluídas. Tal característica se reflete nos direitos fundamentais, que albergam valores de suma importância para a vida política, econômica e social do país. O constituinte assimilou em profundidade o critério de relevância constitucional, em razão do qual se constrói o sistema normativo sobre questões e temas essenciais, identificados em momentos diversos, inclusive durante o processo de elaboração da Carta.12 Em razão deste critério, a Constituição não apenas estatuiu os direitos fundamentais e consagrou o princípio democrático da solidariedade, como criou novos e importantes instrumentos processuais para efetivar aqueles direitos, como é o caso do mandado de injunção e da ação de inconstitucionalidade por omissão.13 Também por isso, a ordem constitucional vigente reconheceu a importância das formações sociais intermediárias, realidade viva do processo social brasileiro, e facilitou-lhes o acesso à jurisdição, atribuindo-lhes poderes de titularidade coletiva para a maior expansão possível dos direitos fundamentais.14 Assim, no cenário mais geral, é importante registrar que a Constituição brasileira de 1988, incidindo sobre uma porção da realidade mundial, repercute, amplifica e fortalece a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, o que não é pouco para o caráter proclamatório desta. Com efeito, destacam-se no texto constitucional os 11. A positivação, nas Constituições modernas, dos princípios contidos na Declaração de 1948 é um dado eloqüente sobre quão fundamentais são os valores que neles se contêm; logo que constitucionalizados, passam a ser princípios estruturantes e ordenadores do Estado Democrático. No Brasil, o fato de o legislador constituinte os ter exalçado ao plano constitucional (direitos individuais e coletivos, art. 5°; sociais, arts. 6° a 11, da nacionalidade, arts. 12 e 13; políticos e de organização partidária, arts. 14 a 17), para logo demonstra a sua historicidade e a força da soberania popular a impor limitações aos poderes constituídos do Estado, que dela dependem e em cujo nome atuam. E é de tal modo importante que se positivem ditos valores na Constituição que, a partir daí, até o aspecto semântico ganha uma dimensão nova e importante, tanto que é mais adequado falar-se em “direitos fundamentais do homem” em lugar da clássica denominação “direitos humanos”. E não se trata de mero jogo de palavras, mas de atitude concreta de pensamento e ação, capaz de expressar, em sua força vocabular, que não se está tratando mais de valores abstratos ou só conceituais, mas de norma constitucional positiva, concreta e real, verdadeiro núcleo do sistema de direitos e dos critérios de interpretação constitucional. Ao centro do sistema constitucional, os direitos fundamentais muito revelam do conteúdo ideológico-político do ordenamento, cuja compreensão é essencial para se articular a estrutura normativa com os valores reais da sociedade. 12. Cf. CITTADINO, Gisele, “Pluralismo Direito e Justiça Distributiva”, Rio de Janeiro, Editora Lumen Juris, 1999, pág. 16, nota de rodapé n. 26. 13. Tomaremos ao Mandado de Injunção e à Ação de Inconstitucionalidade por Omissão no item 5. 14. Tal conclusão se impõe da compreensão do art. 5°, XXI, e do art. 8°, III, da Constituição da República, entre outros dispositivos. Também deflui da magna importância que o texto constitucional deu ao Ministério Público, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (arts. 127 e seguintes). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 54 DOUTRINA seguintes princípios da organização estatal brasileira: (...)A República Federativa do Brasil (...) tem como fundamentos: I - a soberania; II- a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político (art. 1°). No art. 3°, explicitam-se estes princípio da República por meio dos seguintes “objetivos fundamentais”: “I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Em suas relações internacionais, o país rege-se pelos princípios enumerados no art. 4°, entre estes o da “prevalência dos direitos humanos”. E após exaustiva declaração dos direitos individuais e coletivos, no art. 5°, § 2°, dispõe que “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Em sua latitude e conceituação atual, os direitos individuais e coletivos estão assegurados no art. 5°; os sociais nos arts. 6° a 11; os da nacionalidade nos arts. 12 e 13; os políticos e de organização partidária nos arts. 14 a 17. A propósito, e em linha ainda retrospectiva, cumpre mencionar o quanto se internacionalizou, na última década, o debate sobre os direitos humanos, em virtude de conferências mundiais do mais alto significado, valendo destacar as de Viena (direitos humanos), do Cairo (sobre população), de Copenhague (sobre o desenvolvimento social), de Beijing (sobre a situação e os direitos da mulher) e a de Istambul (sobre os assentamentos humanos). De outra parte, há muito a lamentar, tão devastadores os desatinos praticados contra os direitos do homem. Os anos mais recentes testemunharam o genocídio em Ruanda, a limpeza étnica na Bósnia, no Kossovo, no Timor Leste e na Tchetchênia, a guerra limpa da Otan, e, no plano da desestruturação econômica e social, a “repetição a intervalos cada vez menores de desastrosas crises monetárias e financeiras”15, subproduto da globalização no que esta tem de mais convulsivo e perverso. No Brasil, os fatos sociais, infelizmente, não se conciliam com as declarações de direitos. Com efeito, a nota inexaurível dos direitos do homem é entre nós designada pela valência semântica da palavra fundamental (direitos e garantias fundamentais), a explicitar que tais direitos são mais importantes que todos os demais, como se lê em dicções centrais do texto constitucional, como referido, não constituindo exagero algum dizer-se que os direitos fundamentais são a ossatura do Direito Constitucional Positivo brasileiro, pelo evidente compromisso dos seus princípios e normas instituidores com as liberdades públicas e com a utopia16, pelo menos, das transformações so 15. Cf. Rubens Ricupero, “No apagar das luzes”, Folha de S. Paulo, 19.12.99. 16. Damos à palavra “utopia” o significado de algo que se deve tomar em conta como um desafio a vencer- se, um objetivo histórico a conquistar-se. Não tem razão de ser, para a radicalidade do processo de lutas e transformações sociais, o sentido comum e conformista que se atribui a tal palavra (fantasia, ilusão, sonho irrealizável). Como propõe José Eduardo Faria, a utopia deve ser vista “na sua dimensão constitutiva da realidade presente” (Cf. “Direito e Globalização Econômica - implicações e perspectivas”, São Paulo, Malheiros Editores. 1998, págs. 153/154). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 55 DOUTRINA ciais tão necessárias ao país. Mas isso, quase sempre, é ignorado e banalizado pelos poderes e órgãos públicos encarregados de promover a realização prática desses mesmos direitos. Não obstante o nível ótimo da Constituição de 1988, no que respeita à estruturação normativa dos direitos fundamentais, o que se vê, no campo e nas cidades, é a violação organizada, sistemática e repulsiva de todos os direitos e prerrogativas do cidadão, pela ação e omissão da sociedade mesma e dos entes públicos, geralmente dirigidas contra os pobres e miseráveis, tratados que sempre são como o rebotalho do gênero humano. A brutalidade do cotidiano se dirige geralmente contra negros, homossexuais, índios, presos, analfabetos, portadores de HIV, deficientes físicos e mentais, desempregados, crianças e despossuídos de direitos elementares, para os quais as palavras “direitos civis, políticos, econômicos e sociais” não têm qualquer significado real, já que os respectivos conteúdos não fazem parte de sua experiência vivida.17 É exatamente este o ponto em que nos encontramos: temos uma Constituição moderna, comprometida com os valores éticos e substantivos essenciais à realização das dimensões mais sensíveis do homem, e uma realidade cruel, que transita ao longe da superfície da ordem jurídica e das práticas que legitimam uma sociedade democrática e socialmente justa. O Estado brasileiro não se ocupa de criar uma dinâmica social nova e abrangente, de sorte a se poder afirmar que lhe cabe a decisiva responsabilidade pelo abismo que se formou entre os direitos positivados e a vida.18 Respondendo, à maneira de síntese, a questão proposta no título (cegas esperanças?), devemos dizer que as deliberações do espírito humano nem por isso se projetam na vida real, se não conseguem mobilizar as energias das pessoas e não criam um comprometimento da consciência mesma. É no campo da participação ativa da cidadania que se travam as batalhas dessa luta pela implementação prática dos direitos humanos. Não é obra da natureza, mas de gerações que se sucedem e são chamadas todo o tempo a optar diante da alternativa em que se desenrola o seu destino - ou se tomam livres e promovem o bem e a justiça ou se perdem nos caminhos obscuros da opressão. 17. É indispensável a leitura do livro “Democracia em pedaços -Direitos Humanos no Brasil”, de Gilberto Dimenstein, São Paulo, Companhia das Letras, 1996, baseado em relatórios da Human Rights Watch/Americas, para se compreender a gravidade do problema da violação dos direitos humanos no Brasil. Contendo dados atuais sobre a crise social, desnudando os caminhos da barbárie no país, desfazendo mitos e a desinformação muita vez proposital, a referida obra é um relato comovente ao tempo em que nos impele a tomar consciência e posição a respeito da proteção e efetividade dos direitos fundamentais. 18. O Estado é responsável pela situação referida, mas também o é a sociedade civil, até porque ambos são instituições inseparáveis. Boaventura de Souza Santos, sociólogo e jurista português de grande prestígio, trata da questão com a propriedade de sempre: “as transformações por que passaram recentemente as sociedades capitalistas aproximaram e interpenetraram de tal maneira o Estado e a sociedade civil que cada um deles se está progressivamente a transformar no duplo do outro (...) a distinção entre Estado e não-Estado torna-se cada vez mais problemática, tal como se torna cada vez mais difícil determinar onde acaba o Estado e a sociedade civil começa” (“O estado e o direito na transição pós-moderna”, Revista Humanidades, Brasília, Editora UNB, vol 7, pág. 273), Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 56 DOUTRINA 2. OS DIREITOS SOCIAIS E A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL AO TRABALHO Os direitos civis e políticos jamais terão o mínimo de efetividade se não forem antes atendidos pressupostos econômicos e sociais, capazes de satisfazer necessidades elementares de alimentação, educação, saúde, trabalho, previdência e outras tantas que o desenvolvimento das condições históricas incorpora gradualmente à condição humana. Os direitos econômicos e sociais dão conteúdo material e expressão de realidade aos direitos básicos de liberdade. Somam-se todos eles em interação dialógica e convergente, completam-se no conjunto dos direitos fundamentais da pessoa. No Brasil, as carências materiais são de tal ordem que afetam substancialmente a utilidade dos direitos essenciais de liberdade. Direitos individuais e coletivos somente se realizam, em condições satisfatórias, em sociedade democrática que seja capaz não menos do que isto - de erradicar a miséria. Em sua razão última, os direitos sociais postulam a realização da justiça social para reduzir radicalmente as desigualdades e nivelar as oportunidades de acesso aos bens materiais e incorpóreos essenciais à vida digna. Não obstante a interação a que nos referimos, e a interdependência entre os direitos civis e os sociais, é inegável que a incidência mais ampla destes últimos é um tanto mais complexa que a dos primeiros. Em que é precária a implementação dos direitos individuais básicos (pense-se no direito de não ser torturado nem submetido a tratamento desumano ou degradante, consolidado no art. 5°, III, da CF, em contraposição à violência policial praticada nas ruas e nas delegacias), ela ainda enfrenta menores dificuldades que a dos direitos econômicos e sociais. Em primeiro lugar, há um caráter de inegável transcendência em relação aos direitos de liberdade, pois esta é uma idéia tão consensual quanto universalmente aceita. Demais disso, como remarca Luis Roberto Barroso, no “Estado democrático de direito (última geração do modelo burguês)” “cristalizaram-se as diretrizes do liberalismo, que se impuseram sobre as forças derrotadas da aristocracia e da realeza”19, dado que põe em relevo o aspecto da herança cultural da liberdade individual a reproduzir-se em todos os ordenamentos jurídicos contemporâneos. Por fim, há uma questão de natureza operativa, qual seja a de que os direitos civis e políticos envolvem, geralmente, a abstenção do Estado ou de um terceiro para que se realizem, enquanto os direitos econômico-sociais, a fim de que possam criar uma base material para o desenvolvimento humano, dependem, genealogicamente, de condutas afirmativas do Estado, consubstanciadas em prestações positivas que lhe são atribuídas pela Constituição e pelas leis integradoras dos mandamentos fundamentais. A realidade é que não basta que se proclamem os direitos sociais, sob o plexo jurídico do sistema de direitos, se no aspecto da operatividade não se fizer presente a indispensável mediação estatal. 19. Cf. Luis Roberto Barroso, “O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas”, Rio de Janeiro, Editora Renovar, 1993, 2a edição, pág. 101. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 57 DOUTRINA No quadro normativo e institucional das democracias contemporâneas, um dos lugares centrais é reservado ao trabalho humano. Em seu sentido mais amplo, o trabalho, seja qual for o modo pelo qual se manifeste no universo da produção - físico, mecânico, técnico, intelectual - é a pedra angular da vida econômica e social, pois é através dele que o homem coloca sua energia dinâmica e criadora a serviço de si próprio, do seu semelhante e da coletividade20. Produzindo a riqueza e realizando a existência do homem, seu agente, o trabalho é a mais impressionante e inigualável força de transformação da Natureza, em processo que se desenvolve por etapas, desde as primitivas civilizações dos tempos históricos mais remotos, ao momento presente do mundo da comunicação, da informática e da tecnologia. Em seu historicismo, o trabalho será sempre o elemento central de ação do homem sobre a Natureza, em correlações incessantes e em movimento incansável de transformações. Se homem e Natureza são, reciprocamente, a consciência um do outro, o elemento dessa combinação é exatamente o trabalho, com toda a sua provisão de força. É claro que estamos a tratar do trabalho livre, mas não nos esqueçamos que o máximo de degradação já se fez sentir em longos períodos da trajetória humana, pelo estigma da escravidão institucionalizada de que o Brasil livrou-se tão tardiamente. Desgraçadamente, porém, o trabalho escravo ainda se faz presente no país, ostensivamente ou por dissimuladas maneiras, como noticia Gilberto Dimenstein em seu precioso livro a que antes nos referimos21. Fixemo-nos então na questão da proteção jurídica. Fato material-histórico, portanto pré-constitucional e legal, manifestação plena de essencialidade ao tempo em que é realidade vasta e complexa, ao trabalho humano deve destinar-se especialíssima tutela, que promova os valores sociais que dele resultam. A Constituição da República deu aos direitos sociais e ao trabalho, em particular, maior amplitude que as anteriores. Declara que “são direitos sociais a educação, a saúde, a proteção à maternidade e à infância, e a assistência aos desamparados” (art. 6°), os quais são melhor compreendidos e complementados no texto da “Ordem Social”, que se contém no Título VIII e em seus Capítulos (direitos relativos à previdência e assistência social, à cultura e ao desporto, à família, à criança, ao adolescente e ao idoso, ao meio ambiente, arts. 193 e seguintes). Enuncia, no art. 7°, o elenco dos direitos individuais dos trabalhadores urbanos e rurais, entre outros que visem à melhoria de sua condição social. Nos arts. 8° a 11, estatui os direitos coletivos dos trabalhadores, principalmente os de greve e de associação sindical. No Título da Ordem Econômica, distingue como princípio a “busca do pleno emprego” (art. 170, VIII), com o que pretende que o trabalho seja “a base do sistema econômico, receba o tratamento de principal 20. José César de Oliveira deu à literatura jurídica contribuição de inexcedível valor ao tratar do trabalho humano em todas as fases da história e da evolução do Direito do Trabalho. É indispensável a leitura do seu “Formação Histórica do Direito do Trabalho”, in “Curso de Direito do Trabalho-Estudos em Memória de Célio Goyatá”, org. por Alice Monteiro de Barros, São Paulo, LTr, 1994, págs. 29/93. 21. Ob. cit. especialmente o capitulo denominado “Trabalho Escravo”, págs. 163/177. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 58 DOUTRINA fator de produção e participe do produto da riqueza e da renda em proporção de sua posição na ordem econômica”, como anota, com a habitual proficiência, José Afonso da Silva22. A Constituição brasileira trata das grandes questões atinentes ao universo do trabalho, valendo ressaltar com que inquebrantável firmeza dispõe sobre a negociação coletiva (art. 7o, VI, XIII, XIV, XXVI; art. 8o, VI e art. 114, §§ 1o e 2o), cuidando também da liberdade sindical, da greve, da proteção contra a automação, da saúde dos trabalhadores, do trabalho da mulher e do menor, temas de real significado para o progresso social das relações de produção no país e de inegável atualidade para o Direito. 3. O DIREITO DO TRABALHO COMO DIMENSÃO NORMATIVA RELEVANTE E PARTICULARIZADA DO DIREITO SOCIAL AO TRABALHO. O PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO JURÍDICA O Direito nasce da realidade, do processo histórico e dos valores que, num dado momento, são positivados na ordem jurídica. Em áreas sensíveis, tem origem nas lutas e transformações sociais, na liberdade e na justiça social conscientizadas, na ruptura, quando isso é possível, dos padrões impostos pelos grupos de dominação, enfim, na busca permanente do que Roberto Lyra Filho chama de itinerário libertado23. O Direito é força operante se o seu conteúdo corresponder às realidades humanas. Assim, o sujeito de direito é, antes que tudo, o próprio homem tomado em sua dimensão jurídica; a relação jurídica se dá entre pessoas, sendo certo que a vida humana transcorre em permanente relação, sem a qual a ninguém seria dado reconhecer a própria individualidade24; a pessoa jurídica, que se contrapõe ao sujeito-homem, tem a sua conceituação completamente elaborada graças ao paralelo com a pessoa natural25. Ao condensar em princípios e normas as inumeráveis formas de conduta, o Direito encerra uma acepção globalizante. Não obstante sejam ilimitáveis as realidades jurídicas, à semelhança da vida social que lhe é subjacente, o certo é que regras e princípios, constitutivos de tais realidades, agrupam-se em sistema regulador e em unidade orgânica. Essa unidade, entretanto, não opera por si só. A realidade social, em constante processo de diferenciação, entra a dissecar o Direito em áreas extensoras e de inflexão 22. Cf. José Afonso da Silva, “Curso de Direito Constitucional Positivo”, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 6a edição, 2a tiragem, 1990, pág, 668). 23. Citado por José Geraldo de Souza Júnior, “Movimentos Sociais e Práticas Instituintes de Direito: Perspectivas para a Pesquisa Sócio-Jurídica no Brasil”, publicado em “Ensino Jurídico OAB -170 anos de cursos jurídicos no Brasil”, 1997, pág. 133. 24. Antônio Álvares da Silva ressalta o aspecto relacional da pessoa humana, como se colhe desta concisa, elegante e precisa afirmação: “Porém a Justiça está no meio. A paz se obtém quando seus pratos se equilibram e o justo verdadeiro é sempre a composição eqüítativa de interesses. Conforme lembra Artur Kaufman, a pessoa não é apenas objeto do ordenamento jurídico e das instituições humanas. Ela é essencialmente “relação”. Sua vida se forma em comunidade com os demais”. “Efetividade do Processo do Trabalho e a Reforma de Suas Leis”, Belo Horizonte, Editora RTM, 1997, pág. 67. 25. Cf. F. C. de Santiago Dantas, “Programa de Direito Civil” (“Aulas proferidas na Faculdade Nacional de Direito”, entre 1942 e 1945), Rio de Janeiro, Editora Rio, 1979, pág. 206. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 59 DOUTRINA jurídica; abrem-se, assim, no ordenamento, setores diversos, cada qual dotado de específica e inconfundível virtualidade, como que direito palpável, visível. Criam-se círculos de apropriação de matérias jurídicas próprias e autônomas, que se qualificam pela presença de sujeitos, relações jurídicas e pretensões, a se entrelaçarem todos no espaço em que cada área se constitui. A disciplina jurídica se forma e não é produto de elaboração artificiosa, mas uma tentativa de melhor compreender as variedades específicas que se surpreendem na unidade genérica do ordenamento jurídico26. Em movimento constante, de adaptação à realidade, de expansão dos próprios limites, de reconstrução teórica, de melhor aplicação prática, de evolução, a disciplina jurídica se faz agregar, como o corpo à alma, de um certo modo de ser, trata-se então de algo peculiar em que pontuam traços inconfundíveis, sob cuja inspiração se concebe o complexo normativo de tal ou qual setor jurídico e se aplica a sua preceituação. O Direito do Trabalho é bastante elucidativo do quanto dissemos até agora. A sua estruturação é densamente informada de princípios de proteção jurídica e de normas tutelares. Tais princípios e normas incidem sobre pressupostos do mais alto significado, a saber, o trabalho em sua transcendência e como fundamento da vida constitucional do país (CF, art. 1°, incisos III e IV; art. 170, caput e inciso VIII), o trabalhador, como fonte dessa energia criadora, e toda a problemática do trabalho. A proteção ao trabalho situa-se ao vértice dessa disciplina, ao lado de outros tantos institutos jurídicos. Todos estes atuam em unidade de ordenação lógica e são os valores dominantes por cujo intermédio se corporifica, juridicamente, um dos direitos sociais de mais intensa essencialidade. O Direito do Trabalho contém, portanto, a disciplinação jurídica do trabalho subordinado. É a dimensão particularizada da prestação laboral em regime de emprego. Por mais que se confirmem, das últimas décadas a esta parte, em relação ao emprego, mudanças profundas na sua concepção, no seu perfil, nas suas múltiplas formas, no seu exercício prático e, até, na sua própria existência, já que se antecipa, por razões preocupantes, mas ponderáveis, o seu fim tal como o conhecemos, o fato é que dele dependem ainda, e em grande escala, a economia mundial e a sobrevivência humana. Obviamente, a fenômeno de tamanha envergadura o Direito dedica a mais exaustiva atenção, captando os aspectos prismáticos de sua multifária realidade. É manifesto que o direito ao trabalho não se resume ao emprego, ao regime jurídico do trabalho subordinado, ao Direito do Trabalho. Todo tipo de atividade laboral é digna em si mesma e merece a necessária proteção jurídica. Certamente por isso, Celso Ribeiro Bastos, referindo-se ao art. 7°, critica o constituinte que teria confundido os direitos sociais com os trabalhadores que mantêm vínculo de emprego27. Mas a crítica é 26. Cf. Manoel Alonso Olea, “Introdução ao Direito do Trabalho”, tradução de C.A. Barata da Silva, Porto Alegre, Livraria Sulina Editora, 1969, págs. 9/10. 27. Cf. Celso Ribeiro Bastos, “Comentários à Constituição do Brasil”, Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martis, São Paulo, Saraiva, 1989, vol. 2, págs. 397/398. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 60 DOUTRINA um tanto demasiada. De um lado, a Constituição é expressa em incluir o trabalho como direito social (art. 6°), como fundamento da República (art. 1°, IV) e da Ordem Econômica (art. 170) e, de outro, não há como ignorar a relevância do emprego para a vida econômica e social. Ele é o próprio núcleo dos direitos individuais e coletivos dos trabalhadores, dispostos nos arts. 7° a 11. Na realidade, a Constituição soube dar coexistência, juridicamente bem equacionada, ao trabalho, enquanto direito social, e aos direitos dos trabalhadores, pois ambos são inseparáveis. De resto, em seus traços fundos, os princípios constitucionais alusivos ao trabalho ou são expressão política de postulados históricos do Direito do Trabalho, como a idéia de que o trabalho não é mercadoria, mas uma relação social de indisputável primacialidade, ou são a concretização de preceitos tutelares específicos, vincados há muito na legislação laboral, a que se deve atribuir a normatividade máxima, para que não se lhes suprimam os efeitos reguladores em plano infraconstitucional. Importam muito, para concretizar-se o direito fundamental de que se trata, os princípios de proteção do Direito do Trabalho. Releva então fixar o que são princípios e o que é proteção. Com efeito, a dogmática jurídica não se compreende sem se perscrutar os princípios que sobre ela caem. A ausência dessa compreensão é que fragiliza a concepção dos positivistas, que não se ocupam de outras tantas correlações do Direito, porque se satisfazem com a validade apenas das normas legais, o que é relevante, mas não deve excluir a consideração das exigências éticas e dos sistemas de valores que conduzem a praxis do homem em direção ao bem-comum. Como se sabe, as palavras têm várias acepções discerníveis. Não obstante os múltiplos sentidos, revelam sempre uma estrutura central e comum, que cada qual delas expressa diversamente. É uma questão de gênero e espécie. No interesse da síntese, pode-se dizer que a palavra princípio ou tem o significado de início e condição primeira de uma dada existência, ou de uma proposição ou formulação predominante na constituição de um elemento determinado. Miguel Reale se refere aos princípios como verdades fundantes de um sistema de conhecimento, a condicionar a validade das demais asserções que compõem dado campo do saber28 Os princípios se criam no mundo da cultura em seus incontáveis domínios e fornecem o indispensável suporte à tarefa, indissociável da evolução humana, de construir e reconstruir, em seu conjunto, as estruturas de vida segmentadas. E de princípios jurídicos pode-se dizer que são a projeção dessa idéia de fundamentalidade, por isso entram em todo o Direito para conferir-lhe racionalidade, direção e harmonia. Formulações preceptivas, os princípios integram a ordem jurídica, completando-a e corrigindo-lhe as distorções, a suprir bem o aplicador da norma contra as omissões e imperfeições desta, visando, enfim, ao sentido último de justiça. 28. Cf. Miguel Reale, “Lições Preliminares de Direito”, São Paulo, Editora Saraiva, 24a edição, 1999, pág. 305). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 61 DOUTRINA Aos princípios jurídicos se atribui, em diversas análises críticas e classificatórias, o caráter geral de abstração em grau relativamente elevado29. Não nos parece que seja isso aplicável em rigor, pois se certo princípio é condição da existência de alguma coisa, o existir dessa coisa qualquer é bastante para demonstrar a manifesta conformação real dele, o aspecto estruturante e concreto de sua elaboração e incidência, tanto que, modernamente, se lhe atribui o papel mesmo de norma jurídica, embora de natureza distinta das demais categorias de normas, como as regras jurídicas30. Com o determinar o sentido a imprimir-se à norma, tendo em conta os interesses que se objetivam em bens juridicamente considerados, razão por que não se lhes pode negar o caráter de também fonte do direito, os princípios têm um notável fundo exegético, dirigindo-se ao juiz na aplicação da lei, como há pouco asseveramos, com o que revelam força interpretativa capaz de esclarecer, orientar, complementar, vivificar e até, suprir o conteúdo real de uma regra dada, somando-se, portanto, ao grande esforço hermenêutico de atualização do Direito. Por seu turno, a palavra proteção, que é o ato de proteger, cuidar, socorrer, amparar, guardar, adquire realce para o Direito à medida em que signifique uma função jurídica, denotativa de defesa de bens e interesses. E somente se concebe em sua plenitude se lhe ajunta uma conotação especial que é a coerção, emanação do poder estatal para que se respeitem os efeitos da proteção às faculdades, interesses e bens jurídicos. Dito isto, princípios jurídicos especiais o Direito do Trabalho os tem, haja vista a sua especificidade e a realidade social sobre que atua. Ao centro, como já visto, o princípio da proteção, que se funda na necessidade de compensar-se a desigualdade econômica flagrante entre as partes no contrato de trabalho, desfavorável ao empregado; por isso, a este se reconhece a proteção jurídica em medida supostamente compensatória. Aí reside não só o princípio tutelar como a própria “raiz sociológica do Direito do Trabalho”, “imanente a todo o seu sistema jurídico”, na precisão de linguagem de Süssekind31. O princípio em foco revela-se por meios das seguintes diretivas: a) princípio pro operario, segundo o qual o juiz deve decidir, em caso de dúvida, em favor do empregado32, pela razão de “que a ordem jurídica, ao organizar, em apartado, as relações 29. Cf. J.J. Gomes Canotilho, “Direito Constitucional”, Coimbra, Editora Almedina, 1992, 5a edição, pág. 172). 30. Para o estudo aprofundado dos princípios jurídicos e sua estruturação sistemática, v. Canotilho, ob. cit., todo o Capitulo 2, da Parte II, págs. 171 e seguintes. Igualmente importante é a obra de Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena, “Princípios de Direito e Outros Estudos”, Belo Horizonte, RTM, 1997, págs. 11/54). 31. Cf. Arnaldo Süssekind et al, “Instituições de Direito do Trabalho”, São Paulo, LTr, 1991, vol. 1, pág. 128. 32. A jurisprudência trabalhista tem mitigado a tal ponto o in dubio pro misero que praticamente o reduziu a mera proclamação destituída de qualquer efeito. Contam-se inúmeros julgados que solucionam situações altamente controvertidas pela distribuição, entre as partes, do ônus probatório, sem outra qualquer consideração pelos princípios de tutela próprios do Direito laboral, em aplicação rigorosa de critério processual civil que sempre acarreta para o empregado a mais notória dificuldade para demonstrar as suas alegações, já na indicação das testemunhas, que geralmente dependem do emprego, como na Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 62 DOUTRINA entre empregado e empregador, teve em vista, primordialmente, a tutela do trabalho”, segundo a pontuação aguda de Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena33; b) princípio da norma mais favorável, cuja aplicação supõe a prévia concorrência de regras jurídicas, que se resolve pela aplicação da que for mais favorável ao trabalhador, ainda que isso importe a obliteração circunstancial da hierarquia legal; c) princípio da condição mais benéfica, que se desdobra do anterior para dar aplicabilidade precedente àquela condição contratual que melhor atenda ao interesse do empregado; d) princípio da irrenunciabilidade dos direitos, sem o qual todo o complexo de imperativos do Direito do Trabalho ruiria ao gesto de renúncia do seu destinatário, geralmente ditado por pressão econômica direta ou indireta, mas forte o bastante para reduzir-lhe a nada o poder de resistir. Por último, na seara ainda dos princípios especiais do Direito do Trabalho, a concorrer para que se assegure o máximo possível de efeitos ao direito fundamental de que se trata, referimo-nos também ao da primazia da realidade, pelo qual se prestigiam sempre a objetividade, a substância e a intenção manifesta, em lugar da aparência, da forma e da dúvida, para desvendar-se a situação real, em defesa do direito discutido34. É princípio caro ao Direito, uma vez que a índole deste é servir, tanto quanto possível, aos problemas reais. É útil ter aludido aos princípios de Direito do Trabalho, receptores que são do fluxo de proteção ao trabalho humano enquanto direito fundamental, com o propósito de os recolocar, modestamente embora, em círculo habitual de meditação sobre a temática jurídica, e para reconhecer-lhes, quando não mais se lhes dá a atenção devida, um domínio próprio que ainda ocupam, um locus, de onde jamais poderão ser expelidos, a não ser que se suprima toda a preceituação tutelar que deles deriva. 4. UMA QUESTÃO NOVA, DE HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL, APLICÁVEL AO TEMA: O PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. ATUALIDADE DESTA CLÁUSULA PARA A PROTEÇÃO DO DIREITO AO TRABALHO O uso indevido do poder, vale dizer, o abuso deste em suas diversas formas, constitui o pior de todos os males praticáveis pelo Estado. Controlar e regrar o exercício do poder, para proibir-lhe as exorbitâncias e os desvios, constitui um imperativo para que se assegure o postulado do Estado Democrático. Esse excesso de poder, contra o qual a sociedade democrática deve prover-se de meios eficazes de defesa, não se obtenção de outros elementos materiais, quase todos incluídos na esfera de domínio do empregador. Hoje, tal princípio se invoca apenas para criticar-se o sentido de proteção do Direito do Trabalho. É claro que as condições históricas mudam e a rapidez e a universalidade da informação oferecem ao trabalhador (especialmente ao trabalhador urbano) a maior possibilidade de discernimento, o que, entretanto, não autoriza desconhecer a permanência de sua sujeição à força econômica, a justificar, portanto, a incidência do princípio de proteção necessário ao reequilíbrio dos litigantes, Continuam pois existindo os supostos materiais justificadores de sua privilegiação jurídica. 33. Ob. cit., pág. 34. 34. Josaphat Marinho, ob. cit., pág. 47. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 63 DOUTRINA verifica somente na ilegalidade manifesta ou no abuso desabrido, qualquer que seja, do agente estatal, eis que ambos se põem a descoberto ao primeiro e mais elementar juízo de delibação; revela-se também, em certas situações, na discricionariedade do ato do administrador ou do legislador, sob cujo pretexto, eventualmente, ocultam-se restrições desmedidas e inaceitáveis a direitos fundamentais. Sobrevem, então, por construção doutrinária e jurisprudencial,35, o princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade, para dar garantia de incolumidade à estrutura, ao significado real, à extensão, ao alcance, aos efeitos, em suma, à compreensão dogmático-jurídica dos direitos civis, políticos, econômicos e sociais, colocando-se como parâmetro técnico e valorativo de enorme importância, indispensável à proteção do núcleo constitucional em que tais direitos se albergam. Trata-se, com efeito, de mecanismo capaz de aferir, presentes que sejam os seus requisitos, da racionalidade e da razoabilidade ou não de atos do poder público que possam implicar uma eventual interferência na fruição dos direitos fundamentais, visto que, em certas e específicas situações, a técnica de contrastar o ato normativo (a lei, principalmente) à Constituição não é bastante em si para decretar-se um juízo claro sobre a sua constitucionalidade. Como se sabe, não é incomum que o ato legislativo possa incorrer em imperfeição intrínseca, por desnecessário, inadequado ou exorbitante, de sorte a comprometer a sua relação “meio-fim”, em situação de excesso que produza restrição a direito fundamental, não obstante a aparente regularidade formal e material por que se exteriorize.36 Direitos fundamentais há que têm a sua operatividade, senão condicionada, dependente, pelo menos, da configuração que lhes possa dar o legislador da lei complementar ou ordinária. Sucede que o legislador, no preencher o espaço que se lhe reconhece para regulamentar os institutos jurídicos essenciais ao exercício dos direitos subjetivos, ou promove a maior otimização possível desses, em perfeita sintonia com o princípio da máxima eficácia dos direitos constitucionais, ou, de outro modo, conforma-lhes a latitude a uma certa medida ditada pela realidade, circunstancial que seja, 35. O Supremo Tribunal Federal tem se valido muita vez do princípio da proporcionalidade para decidir questões de invalidação de atos administrativos e de inconstitucionalidade de leis. E assim, contribui para se formar uma visão mais clara do referido princípio. Ainda faremos breve menção, no item em desenvolvimento, a algumas das decisões do STF, importantes para a compreensão do tema. 36. “A moderna teoria constitucional tende a exigir que as diferenciações normativas sejam razoáveis e racionais. Isto quer dizer que a norma classificatória não deve ser arbitrária, implausível ou caprichosa, devendo, ao revés, operar como meio idôneo, hábil e necessário ao atingimento de finalidades constitucionalmente válidas. Para tanto, há de existir uma indispensável relação de congruência entre a classificação em si e o fim a que ela se destina. Se tal relação de identidade entre meio e fim-“means-end relationship”, segundo a nomenclatura norte-americana - da norma classificatória não se fizer presente, de modo que a distinção jurídica resulte leviana e injustificada, padecerá ela do vício da arbitrariedade, consistente na falta de razoabilidade e de racionalidade, vez que nem mesmo ao legislador legítimo, como mandatário da soberania popular, é dado discriminar injustificadamente entre pessoas, bens e interesses na sociedade política”, consoante o elevado magistério de Carlos Roberto de Siqueira Castro, “O Devido Processo Legal e a Razoabilidade das Leis na Nova Constituição do Brasil, Editora Forense, 1989, pág. 157. Rev, TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 64 DOUTRINA não podendo, nesta última hipótese, saltar do terreno da razoabilidade para o da restrição pura e simples. Em concisão lapidar, Luis Roberto Barroso assim se refere ao conteúdo jurídico e aos requisitos do princípio em questão: “o princípio da razoabilidade permite ao Judiciário invalidar atos legislativos ou atos administrativos quando: a) não haja relação de adequação entre o fim visado e o meio empregado; b) a medida não seja exigível ou necessária, havendo meio alternativo para chegar ao mesmo resultado com menor ônus a um direito individual; c) não haja proporcionalidade em sentido estrito, ou seja, o que se perde com a medida é de maior relevo do que aquilo que se ganha”37. Questão recorrente, para bem exemplificar o tema, é o da rejeição, pelos tribunais, de discriminação, por motivo de idade ou outro qualquer, para inscrever-se em concurso público, diante do princípio normativo fundamental da isonomia. Entrementes, aceita-se eventual restrição, disposta em lei, que justifique a limitação de idade à vista de certa e consistente especificidade das atribuições da função, ou seja, pela aplicação de critério fundado de razoabilidade. Uma decisão do Supremo Tribunal Federal, publicada no DJU de 24.05.94, tendo sido seu Relator o Ministro Marco Aurélio, consigna que “em linha de princípio, impende entender que a Constituição reserva à lei estipular requisitos e condições ao provimento de cargos públicos, por via de concurso, também no que concerne a qualificações profissionais inclusive idade”, embora “as restrições da lei à admissão ao concurso para provimento de cargos ou ao exercício de ofício, decerto, não podem constituir obstáculo desarrazoado à aplicação dos princípios de acessibilidade de todos aos cargos públicos ou da liberdade para o exercício de ofício ou profissão”. O fundamento do princípio da proporcionalidade é a cláusula due process of law, em seu alcance substantivo (substantive due process), a permitir que o Juiz examine as leis e atos administrativos sob aspecto de sua racionalidade e razoabilidade, o que não lhe era permitido pela visão tradicional da teoria da separação de poderes38. A propósito, o Supremo Tribunal Federal, em diversos julgados pertinentes à questão, situa o fundamento constitucional da razoabilidade no art. 5o, LIV, da Constituição. Tome- se como exemplo o acórdão proferido nas Adin 966-4 e 958-3, nas quais se debateu a inconstitucionalidade de disposição da Lei 8.713, de 30.09.93, que estabeleceu normas para as eleições gerais de 03 de outubro de 1994, valendo destacar, pela relação direita com o aspecto ora abordado, o seguinte trecho do voto do Ministro Moreira Alves: “A Constituição em seu art. 5o, inciso LIV - e aqui trata-se de direitos não apenas individuais, mas também coletivos e aplica-se, inclusive, às pessoas jurídicas - estabelece que: ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. 37. Cf. Luis Roberto Barroso, “Entre a lei e a Justiça: O princípio da razoabilidade no direito brasileiro”, in AMAERJ notícias no 41 (órgão informativo da Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro). 38. C f. Luiz Roberto Barroso, idem ibidem. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 65 DOUTRINA Processo legal, aqui, evidentemente, não é o processo da lei, senão a Constituição não precisaria dizer aquilo que é o óbvio, tendo em vista, inclusive, o inciso II do art. 5° que diz: ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei. Esse princípio constitucional que tem a sua origem histórica nos Estados Unidos, lá é interpretado no sentido de abarcar os casos em que há falta de razoabilidade de uma norma. Por isso mesmo já houve quem dissesse que é um modo de a Suprema Corte americana ter a possibilidade de certa largueza de medidas para declarar a inconstitucionalidade de leis que atentem contra a razoabilidade”39. É interessante notar que o princípio da proporcionalidade, conquanto tenha ingressado com visível força na jurisprudência constitucional dos últimos anos, já se delineara, desde algumas décadas, em decisões do Supremo Tribunal. Veja-se, por exemplo, a ementa que se segue, alusiva ao Habeas Corpus n° 45.232, julgado em 21.02.68, sobre a inconstitucionalidade do art. 48 do Decreto-Lei 314/67 (Lei de Segurança Nacional), Relator o Ministro Themístocles Cavalcanti: “A inconstitucionalidade é decretada por ferir os arts. 150, caput e 150, § 35, da CF. porque as medidas preventivas que importam na suspensão dos direitos ao exercício das profissões e o emprego em empresas privadas tiram ao indivíduo as condições para prover a vida e a subsistência. O § 35 do art. 150, da Constituição de 1967, compreende todos os direitos não enumerados, mas que estão vinculados às liberdades, ao regime de direito e às instituições políticas criadas pela Constituição. A inconstitucionalidade não atinge as restrições ao exercício da função pública porque a legislação vigente sobre funcionários públicos, aplicável à espécie, assegura uma parte dos vencimentos dos funcionários atingidos pelo art. 48 do referido Decreto-lei. A inconstitucionalidade se estende aos parágrafos do art. 48, porque estes se referem à execução das normas previstas no artigo e consideradas inconstitucionais.”40. Ainda quando não seja restritiva de direito, e até concessiva, a lei deve atender a critério de razoabilidade, pena de incorrer, também aí, em vício de inconstitucionalidade, como decidiu o Supremo Tribunal em relação à Lei 1.897, de 05.01.89, do Estado do Amazonas, cujo art. 9o, § 2°, foi impugnado por conceder benefício pecuniário desarrazoado a servidor público inativo. Na ementa do acórdão proferido na Adin 1.1588, o Relator, Ministro Celso de Mello, consignou o seguinte: 39. O acórdão é em parte transcrito por Suzana de Toledo Barros, in “O Princípio da Proporcionalidade e o Controle ded Constitucionalidade das Leis Restritivas de Direitos Fundamentais”, Brasília, DF, Livraria e Editora Brasília Jurídica, 1996, pág. 121. Esta é uma das obras mais completas sobre o assunto; nela a autora faz exaustiva análise de todos os aspectos do princípio da proporcionalidade e de sua tormentosa aplicação. 40. RTJ 44, págs. 322-334. Suzana de Toledo Barros faz uma ampla análise do voto do Ministro Themístocles Cavalcanti a respeito da desproporcionalidade das medidas adotadas em caso de prisão em flagrante ou denúncia por crime definido como atentado à segurança nacional. Ob. cit., págs. 102/104. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 66 DOUTRINA “A norma legal, que concede a servidor inativo gratificação de férias correspondente a um terço (1/3) do valor da remuneração mensal, ofende o critério de razoabilidade que atua, enquanto projeção concretizadora da cláusula do substantive due process of law, como insuperável limitação ao poder normativo do Estado. Incide o legislador comum em desvio ético-jurídico, quando concede a agentes estatais determinada vantagem pecuniária cuja razão de ser se revela absolutamente destituída de causa”. Dito isto, é fácil atinar com a relevância do princípio da proporcionalidade para assegurar-se a integridade do direito ao trabalho e dos direitos subjetivos que o asseguram, em face do sistema constitucional. Nos tempos atuais, em que se apregoa e se promove a revisão do sistema normativo tutelar do trabalho, com o propósito de diminuir- lhe substancialmente o grau de proteção, tal princípio é utilíssimo para defender de intervenção indevida os “valores sociais do trabalho” (Constituição, art. 1°, IV), para que estes se não transformem em inútil declaração retórica41. A idéia de desregulamentar amplamente os direitos trabalhistas, e algumas práticas a ela correspondentes já em curso, na realidade visam ao desmonte do sistema legal de proteção ao trabalho e aos que o prestam em regime de emprego, para ao final projetar a relação capital x trabalho no plano do contratualismo, em conduta típica do modelo neoliberal, incidindo, exatamente aí, o caráter restritivo aos direitos subjetivos fundamentais, de natureza trabalhista, a exigir, portanto, o mais acurado exame de constitucionalidade das normas por cujo meio essas medidas se implementam, o que envolve o parâmetro da proporcionalidade em seus subprincípios de adequação, necessidade e razoabilidade. E tal reflexão, no campo do Direito Constitucional do Trabalho, cumprirá, em ordem primeira de relevância, ao Juiz do Trabalho, pela competência material que a Constituição lhe atribui para as questões ligadas ao trabalho. E como se traduz, em última análise, em ponderação de valores, a aplicação prática do princípio da proporcionalidade deve exigir do Juiz que este se empenhe em sua racionalidade crítica para não permitir que restrições do legislador se oponham, mesmo reflexamente, à eficácia plena dos direitos fundamentais e, em perspectiva, dos direitos constitucionalmente assegurados aos trabalhadores, sobretudo no momento atual em que o discurso, as práticas e as técnicas de controle social do neoliberalismo apropriam-se dos centros decisórios de poder político e, em nome de suposto equilíbrio macroeconômico, intentam reduzir ao mínimo, quando não pretendem extinguir, pura e simplesmente, o conteúdo social das estruturas normativas de proteção aos trabalhadores e assalariados, penosamente construídas nos últimos cinqüenta anos. É claro que não se deve entender daí que a 41. O mais perverso paradoxo gerado pelo modelo neoliberal é exatamente este: promove-se a desregulamentação dos mecanismos de proteção ao trabalho, não obstante a precariedade da situação em que vive e labuta a maioria dos trabalhadores, sendo o trabalho infantil um lamentável exemplo dessa degradação. Vale dizer: quanto mais necessária se torna a ampliação do sistema de proteção, tendo em vista a dramaticidade de situações como a do trabalho infantil e a do trabalho escravo, mais se quer desmantelar o mínimo ainda existente, em si mesmo precário. Rev, TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 67 doutrina aplicação do princípio em questão, na Justiça do Trabalho ou em qualquer outro setor do Judiciário, possa ser vista como uma porta aberta à intromissão da função jurisdicional nas demais funções estatais, de resto, expressamente vedada no art. 2o, da Constituição. Por certo que ordenar a vida social é atribuição do Poder Legislativo, mas os limites dessa atuação, para evitar que a lei inconstitucional opere a redução de direitos fundamentais, controlam-se pelo Poder Judiciário consoante critérios hermenêuticos fundados na própria Constituição, como é o caso do princípio da proporcionalidade. 5. MANDADO DE INJUNÇÃO E AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO: INSTRUMENTOS DE DEFESA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. UM PARADOXO DECISIVO: O SUPREMO TRIBUNAL RESTRINGE O MANDADO DE INJUNÇÃO A experiência constitucional brasileira, desde o primeiro momento de sua história, é eivada de promessas não realizadas, numa sucessão melancólica de frustrações que se acumularam a cada Constituição promulgada. É o divórcio do país real e do país legal, provocado, no plano dos direitos fundamentais, pela inoperância crônica do legislador, que não edita, como lhe compete, as normas indispensáveis à plena e máxima operatividade dos direitos constitucionais. E a falta desse direito infraconstitucional inviabiliza para sempre o exercício de direito ou liberdade ou prerrogativa constitucional, em omissão violadora da própria Constituição. No que respeita ao Direito Constitucional do Trabalho, são de todo lastimáveis os efeitos dessa conduta omissiva. Basta conferir algumas das dicções do texto constitucional, para se ter uma medida do problema: (relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa), “nos termos de lei complementar”; (proteção do salário) “na forma da lei (proteção do mercado de trabalho da mulher) "nos termos da lei”; (aviso prévio proporcional ao tempo de serviço) "nos termos da lei"; (adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas) "na forma da lei”; (proteção em face da automação), " na forma da lei", etc. (art. 7°). O art. 5o, ao enunciar os Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, é igualmente repleto de expressões que tais, o mesmo ocorrendo em quase toda a preceituação atinente à Ordem Econômica e Financeira, cuja relevância para os direitos sociais é de todo irrecusável, visto que se funda “na valorização do trabalho humano ", " tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social", etc. (art. 170). Não expedir medidas regulamentadoras dos direitos constitucionais é tão grave e tão inconstitucional quanto editar leis que violem a Constituição. O Direito - o Direito Constitucional mais que qualquer outro - existe para realizar-se, e “realizar a Constituição significa tornar juridicamente eficazes as normas constitucionais. Qualquer Constituição só é juridicamente eficaz (pretensão de eficácia) através da sua realização”, consoante a incisiva e esclarecedora lição de Canotilho42. 42. Cf. J.J. Gomes Canotilho, ob. cit. pág. 207. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 68 DOUTRINA É preciso ter claro que não se proscrevem apenas as ações ilegais, arbitrárias ou abusivas dos poderes públicos. Proscrevem-se também as omissões do poder político, pois estas são lesivas sempre que postergam a realização, para milhões de pessoas, de direitos fundamentais imposturáveis. Em verdade, a tradicional omissão dos poderes públicos na concretização dos direitos constitucionais sempre foi facilitada pela ausência, nas Constituições brasileiras, de instrumentos de proteção ao exercício daqueles direitos. Ao tempo da Constituinte, e mesmo antes dela, no âmbito da Comissão Afonso Arinos, debateu-se longamente sobre essa problemática questão, sendo inegável que a solução encontrada, de criar ações constitucionais destinadas “a garantir o cumprimento de preceitos constitucionais ainda não integrados por normas regulamentadoras que devem ser produzidas através de atuação direta do Poder Legislativo e/ou Executivo”43, deveu-se em grande parte à atuação de juristas de nítida feição progressista entre os que participaram ativamente do processo de elaboração do texto constitucional44. O Constituinte da atual Carta apercebeu-se do problema desde logo. Estava ciente de que a positivação dos direitos fundamentais era, como sempre, o início apenas de uma monumental batalha, cuja derrota antecipada somente não se decretaria se se criassem, concomitantemente, mecanismos capazes de promover a efetividade da Constituição em seu núcleo estruturante. Criaram-se então duas ações constitucionais, o mandado de injunção (art. 5°, LXXI) e a ação de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, § 2°). Examinemo-las em rápida passagem. Diz o art. 5°, inciso LXXI: “conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora tome inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”. Logo se percebe que a normativa se dirige a um ponto matricial: a omissão do legislador ordinário, tornando inócuo o direito assegurado na Constituição. Inércia tal pode e deve ser suprida pelo Poder Judiciário, no exercício da função estatal que lhe é própria de decidir questões concretas, conotada agora - essa atividade jurisdicional de um poder específico e altamente construtivo, que se concentra no Juiz para que este concretize, à vista do pedido e do ordenamento jurídico, o direito constitucional do impetrante, substantivando-o em medida que se revele adequada para proporcionar o atendimento satisfatório da pretensão de fruir tal direito. O Juiz competente elabora, portanto, a norma para o caso, para preencher a lacuna deixada pelo legislador, em 43. Cf. Regina Quaresma, O Mandado de Injunção e a Ação de Inconstitucionalidade por Omissão - Teoria e Prática, RJ, Editora Forense, 1995, pág. 1. 44. Cf. Gisele Cittadino, ob. cit. pág. 50, nota 79. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 69 DOUTRINA atenção à situação do impetrante, assim proferindo o que se poderia chamar de sentença normativa de injunção. Trata-se, pois, de ação constitucional de extraordinário alcance, a demonstrar o quanto a Constituição se preocupou em proteger a sua própria efetividade e o quanto quis fortalecer o Judiciário, entregando-lhe o poder de suprir, em cada situação concreta, a ação normativa exigível com que não se houve o Estado-legislador. Foi esse, sem dúvida, um dos lances de maior descortino e coragem da Constituição brasileira de 1988. No mesmo plano de proteção instrumental dos direitos constitucionais, aplicável ao trabalho enquanto direito fundamental, encontra-se a ação de inconstitucionalidade por omissão, de competência do Supremo Tribunal Federal. Diz o texto constitucional: “Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias”, como se vê do art. 103, § 2°. Ora bem, tendo o mandado de injunção a finalidade de assegurar prontamente o exercício do direito, para obviar a ausência de norma regulamentadora, a ação de inconstitucionalidade por omissão, de seu turno, tem por objetivo comunicar e advertir ao Poder competente para que pratique o ato tal (normativo ou administrativo) indispensável à eficácia plena de direito constitucional. Trata-se assim de instrumento de pressão política e jurídica, legitimamente exercida sobre o Poder que se omite e se coloca em mora em relação a qualquer dos direitos fundamentais, por isso que deve ser prontamente advertido da sua inação, com a força judicial de que se reveste a sentença do Supremo Tribunal, para que opere a medida reclamada. Em que pese o fato de inscrever-se a ação de inconstitucionalidade por omissão no contencioso jurisdicional abstrato do Supremo Tribunal Federal, tanto que tratada no art. 103, § 2°, da Constituição, isso não lhe retira o nítido caráter de medida de proteção aos direitos constitucionais, por isso que José Afonso da Silva considera-a análoga aos remédios constitucionais45. É como se estivesse prevista no art. 5°, entre os direitos fundamentais, porque em função destes é que foi instituída, sem nenhuma dúvida. É de lamentar-se que não se tenha logo atribuído ao Supremo Tribunal Federal a competência para normatizar a questão objeto da ação de inconstitucionalidade enquanto perdurasse a omissão do legislador, em medida que assim respeitasse a discricionariedade do Poder Legislativo e, no mesmo passo, atendesse ao interesse público de que se concretizem os direitos sociais o mais rapidamente possível, particularmente, o Direito Constitucional do Trabalho e sua amplíssima incidência sobre milhões de trabalhadores. Mas o que há de preocupante é o fato de o Supremo Tribunal Federal ter reduzido, em sua extensão prática, o mandado de injunção aos mesmos efeitos da ação de 45. Cf. José Afonso da Silva, ob. cit. pág. 47. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 70 DOUTRINA inconstitucionalidade por omissão, dele retirando a função essencial de garantia integradora do ordenamento jurídico, extremamente útil à efetividade dos direitos econômicos e sociais, especialmente considerável quando se trata dos direitos trabalhistas, cuja eficácia, em grande parte, depende da edição de normas regulamentadoras que não se editam quase nunca. Para se compreender a omissão legislativa, basta remarcar, a título de um só entre diversos exemplos que poderiam ser dados, a não regulamentação, já passados quase doze anos, do art. 7o, inciso I, da Constituição, sobre a “relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa”. Com efeito, tornou-se notório, desde o seu julgamento, o Mandado de Injunção no 107/90, de que foi Relator o Ministro José Carlos Moreira Alves. Neste caso, o Tribunal, por maioria, entendeu que o Mandado de Injunção tem por finalidade obter do Judiciário a declaração de inconstitucionalidade por omissão de Poder, órgão, entidade ou autoridade, aos quais se deve dar ciência desta situação para que adotem as providências necessárias, exatamente como ocorre com a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão. Com todo o respeito que temos ao Tribunal (Supremo por nome e definição, como a ele se referiu um dos seus mais eminentes juízes em todos os tempos, o Ministro Aliomar Baleeiro, permitindo-nos acrescentar que, com seus erros e virtudes, o Supremo Tribunal Federal é instituição republicana de primeira grandeza, que se eleva sobre as demais pelo papel de preeminência que lhe reserva a Constituição brasileira), a realidade é que ele reduziu a nada, praticamente, o Mandado de Injunção como instrumento processual e constitucional de proteção dos direitos fundamentais e do Direito Constitucional do Trabalho. Ora, comunicar a omissão a quem a está praticando constitui solução, no mínimo, inadequada, pois superpõe o mandado de injunção à ação de inconstitucionalidade por omissão, como se a Constituição houvesse criado duas vias para atingir a uma mesma finalidade, a par de constituir também uma solução transversa, já que o cidadão não tem legitimidade para a ação de inconstitucionalidade, mas a terá, obliquamente, através do Mandado de Injunção. Não surpreende assim que sobreviesse exaltada reação no meio jurídico àquela decisão. A José Carlos Barbosa Moreira coube a talvez mais veemente condenação: “Não podemos, de maneira alguma, e eu me escuso pelo tom enfático que talvez esteja dando a estas minhas últimas palavras, não podemos de maneira alguma franzir as sobrancelhas e distanciar-nos algidamente daquilo que a Constituição trouxe (falando especificamente do mandado de injunção). Não podemos sabotar a Constituição”46. 46. José Carlos Barbosa Moreira, apud Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira, in “Tutela Jurisdicional e Estado Democrático de Direito - Por uma compreensão constitucionalmente adequada do Mandado de Injunção”, Belo Horizonte, Editora Del Rey, 1997, pág. 180. O livro de Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira é uma das melhores e mais completas contribuições da doutrina brasileira ao tema, além de oferecer preciosos elementos para a compreensão da função jurisdicional à luz do paradigma do Estado Democrático de Direito. Ver ainda Sergio Reginaldo Bacha, “Mandado de Injunção”, Belo Horizonte, Editora Del Rey, 1998. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 71 DOUTRINA Em julgamentos posteriores, alguma coisa mudou, mas não o bastante para que o STF desse ao Mandado de Injunção a latitude que sempre se esperou desta ação para que se tornasse a guardiã das garantias constitucionais. De toda sorte, no MI 232/92, o Ministro Moreira Alves fixou o prazo de 180 dias para que se editasse norma regülamentadora e autorizou o impetrante a fruir o direito requerido se a omissão legislativa persistisse após aquele prazo. Situação semelhante se verificou no MI 283/91, de que foi Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, que deferiu o prazo de 60 dias para suprir- se a omissão legal, sendo certo que a não edição da norma regulamentadora importaria a satisfação, pelo impetrante, do direito invocado, mediante as condições fixadas pelo juízo de 1° grau47. Mas, data venia, estas decisões conferem aos impetrantes algo muito semelhante a uma “vitória de Pirro” (na perspícua expressão do Ministro Marco Aurélio, cuja posição no Tribunal, ainda minoritária a respeito da questão, confere a mais ampla efetividade ao Mandado de Injunção), pois em sua essência ainda obscurecem (menos ostensivamente talvez que o decidido no MI 107/90) o caráter substantivo do Mandado de Injunção, em razão do qual este remédio processual e constitucional deve viabilizar o exercício de direito fundamental tão logo presentes os requisitos de sua admissibilidade. É lamentável, mas a realidade é que as decisões do Tribunal não reconhecem a esta ação constitucional de primeiríssima relevância o que ela tem de contundente emanação do sistema democrático restaurado e ampliado pela Constituição de 1988 - a manifesta vontade do Constituinte de que se façam cumprir os direitos fundamentais, tanto assim que outorgou ao Supremo Tribunal uma espécie de Poder normativo para resguardar, no caso concreto, tais princípios e disposições. Em verdade, não se deu chance a que se testasse a eficácia do Mandado de Injunção, tão esperada quanto frustrada. A Constituição é um documento político e a sua aplicação deve atender aos anseios de emancipação da cidadania, sempre insatisfeitos e adiados. É inegavelmente uma decepção o ter-se criado uma ação especial para proteger o sistema de direitos constitucionais, vale dizer, para dar efetividade ao núcleo da própria Constituição, e, em contraposição, formar-se uma jurisprudência reducionista, que se recusa a infundir ao procedimento a maior densidade possível. Infelizmente, retirou-se do Mandado de Injunção toda a sua consistência e virtualidade operativa e decidiu-se pela não-realização do direito concretamente, ou seja, pelo adiamento do problema, o que sempre será uma solução ruim ou péssima para as questões sociais do país. Direitos econômicos e sociais, que dizem respeito a interesses de milhões de trabalhadores, poderiam ter sido implementados, até porque já se passaram quase 12 anos da promulgação da Carta, e permanece a inércia legislativa quanto à expedição de normas regulamentadoras da Constituição. É de se esperar que a reforma do Judiciário, em curso no Congresso Nacional, contenha algum adendo à norma do art. 5°, inciso LXXI, para, dizendo embora o que ali já está dito, expresse com mais incisiva dicção o caráter substantivo do Mandado de Injunção, para tornar irrefutável a concretização, por sentença, dos vários direitos 47. MI 107/90, RTJ 133; MI 232/92, RTJ 137; MI 283/91, RTJ 135. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 72 DOUTRINA fundamentais que a omissão dos Poderes públicos tem sonegado sistematicamente à cidadania brasileira. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Positivar, no texto da Constituição, os direitos fundamentais, com a perspectiva de se criar uma sociedade justa e solidária e um sistema normativo adequado a este objetivo, constituiu, por certo, uma etapa do mais alto significado para o processo de reconstitucionalização do país. Entretanto, não se tratava apenas de, vencido o autoritarismo de duas décadas, recobrar o funcionamento normal das instituições democráticas do Estado de Direito, mas de promover mudanças profundas e inadiáveis rumo à satisfação das mais crescentes, complexas e variadas demandas que caracterizam a sociedade em seu atual estágio. Para tanto, redefiniram-se competências institucionais; ampliaram-se as formas de participação política para incorporar os grupos e classes marginalizados; reconheceu-se às formações sociais em geral o caráter de instâncias de representação política e jurídica, para permitir-lhes maior acesso aos centros decisórios de poder; expandiram-se não somente os direitos civis e políticos, como os direitos sociais, principalmente estes, com a pretensão de que criem uma base material mínima indispensável para o desenvolvimento humano; fortaleceram-se os Poderes Legislativo e Judiciário e criou-se um Ministério verdadeiramente Público em lugar de um órgão burocrático e subalterno; enfim, redimensionaram-se as esferas privada e pública, de sorte que os paradigmas do Estado liberal e do Estado Social possam conciliar-se no Estado Democrático de Direito48, a que cumpre realizar, em última instância, o postulado de uma cidadania para todos, e não apenas para os que sempre se colocaram no topo da hierarquia de privilégios por eles mesmos estabelecida. Porém, redefinidos, pela Constituição de 1988, os objetivos e os atores essenciais da democracia brasileira, o certo é que o desenrolar desse novo e almejado quadro político-institucional ocorre sob o signo mundial de novas e fortemente desiguais relações de poder e dominação ditadas pela globalização e todo o seu potencial de transformações ideológicas, geopolíticas e econômicas, em processo de retomada, a partir dos anos oitenta, da hegemonia mundial dos EUA, mediante a estratégica e permanente expansão do capital financeiro como elemento dominante e referencial da nova ordem econômica a que se submetem dramaticamente países e economias dependentes. Esvazia-se assim o poder dos Estados nacionais, subordinam-se as decisões econômicas de cada país às diretrizes e normas emanadas de organismos internacionais e foros globais, implantam-se políticas cada vez mais agressivas de desregulamentação de direitos sociais (trabalhistas e de seguridade social, principalmente), 48. Para compreender-se o conceito de paradigma, que provém da filosofia da ciência de Thomas Kuhn, e o paradigma constitucional do Estado Democrático de Direito, leia-se o excepcional artigo de Menelick de Carvalho Netto, “O Requisito Essencial da Imparcialidade para a Decisão Constitucionalmente Adequada de um Caso Concreto no Paradigma Constitucional do Estado Democrático de Direito”, in “Direito Público - Revista da Procuradoria Geral do Estado de Minas Gerais”, Belo Horizonte, Editora Del Rey, 1999, vol. 1,n. 1.págs. 101/115. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 73 DOUTRINA despolitizam-se os mercados e as relações sociais para que isto facilite ao máximo a livre circulação de capitais, dissemina-se, em resumo, o neoliberalismo, versão radicalizada do pensamento econômico liberal, a dividir o mundo entre ilhas de riqueza e continentes de miséria e exclusão. Por óbvio, não estamos dizendo que o Brasil (ou qualquer outro país) devesse renunciar a sua integração na economia internacional, ou que pudesse realizar uma tal inserção sem considerar o efeito regulatório próprio de um sistema econômico globalizado. Não nos é dado desconhecer as importantes e profundas transformações no âmbito da concorrência, da competição, da qualidade de produtos e serviços, da importância das relações intercapitalistas. O dilema está no modo pelo qual se dá essa integração diante do caráter desigual das relações de poder entre nações ricas e pobres. A globalização tornou-se um processo de dominação financeira, com enorme capacidade de intervenção hierárquica nos demais processos sociais, por ela desorganizados e reduzidos a uma posição sempre secundária e dispersiva. É intuitivo que uma tal transformação operasse sensíveis mudanças no universo do trabalho humano49, O investimento do capital produtivo encontra-se de longe superado pelo capital financeiro e especulativo, o que afeta o crescimento econômico e agrava o problema do desemprego. No Brasil há um contingente imensurável de trabalhadores-empregados que sequer têm a carteira de trabalho anotada, fato constatado diariamente em reclamações na Justiça do Trabalho. À prática violadora de direitos elementares, somam-se aspectos mais estruturais, como o desemprego elevado, a enorme rotatividade de mão-de- obra e os baixos salários. Para logo se vê quão injustificável é o argumento, tantas vezes brandido, de que os direitos trabalhistas e os encargos decorrentes produziriam uma nociva combinação entre rigidez do mercado de trabalho e elevado custo do emprego. Por acaso, terá surtido efeito positivo a adoção do contrato de trabalho temporário e da demissão temporária, preconizados pelo Governo como instrumentos modernos e capazes de gerar empregos? A resposta é negativa, claro, e a realidade demonstra que estes e outros expedientes análogos somente fizeram eliminar direitos sem qualquer contrapartida em benefício dos trabalhadores. Não há como ser menos peremptório: a submissão do Brasil ao denominado “Consenso de Washington”, que é a “opinião partilhada pelo Departamento do Tesouro, pelo Federal Reserve e pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, pelos ministérios das Finanças dos demais países do Grupo dos Sete e pelos presidentes dos vinte maiores bancos internacionais permanentemente ouvidos pelos organismos multilaterais”50, faz desaparecer a pouco e pouco os direitos sociais em sua perspectiva transformadora e condena à marginalidade sócio-econômica milhões de pessoas ex- 49. Concernente aos efeitos da globalização e do neoliberalismo sobre o Direito do Trabalho e a Justiça do Trabalho, com amplitude e fundamentada reflexão crítica, a conferência do Ministro Carlos Alberto Reis de Paula, “O Papel da Justiça do Trabalho no Brasil”, publicada integralmente pela Revista do TRT da 3a Região, n. 59, págs. 53/62. 50. Cf. FARIA, José Eduardo, ob. cit. pág. 148. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 74 DOUTRINA pulsas do mercado formal de emprego, os sem renda, sem terra, sem teto, sem comida, sem coisa alguma. É a gente cujo grito já não se pode mais abafar. O desemprego, a concentração de renda, a desigualdade social, a pobreza estrutural não são fatalidades históricas, mas um desafio a enfrentar-se. A Constituição de 1988 já teria diminuído tamanhas distorções se nos déssemos (os Poderes Públicos, principalmente) a promover-lhe a efetividade, se aplicada fosse em todo o seu potencial de império. Como os governantes que se sucedem no poder buscam modificar a Constituição somente para ajustá-la aos objetivos de seus governos, geralmente ditados pelo interesse do capital financeiro internacional, os direitos econômicos e sociais nunca se assumem como direitos fundamentais e criam um sentimento de vazio e frustração, reduzindo a pouco mais que nada pretensões de igualdade social e de promoção da dignidade humana. Ou o Direito e, em sentido amplo, os seus operadores (os que o concebem em suas normas e os que o aplicam) se orientam por critérios de justiça social e distributiva, inclusive, ou continuamos a designar os trabalhadores como hipossuficientes, não lhes reconhecendo a sua dimensão social completa e irredutível, que é a cidadania. E a justiça que se lhes faz acaba sendo formal apenas, à moda tão acidamente criticada por João Mangabeira: “se a justiça consiste em dar a cada um o que é seu, dê-se ao pobre a pobreza, ao miserável a miséria, ao desgraçado a desgraça, que isso é que é deles... Mas bem sabeis que esta justiça monstruosa tudo pode ser, menos justiça”51. Ao que acrescentamos: e o que é do Estado e da sociedade, senão a responsabilidade direta e implacável por essa situação de crescente exclusão e desigualdade que nos impede de aspirarmos a ser uma nação civilizada e digna? Em linha de arremate, que já se vai longe esta digressão: a trajetória dos direitos humanos é ao mesmo tempo majestosa e dramática. Aliás, a marcha da história nunca é linear, mas acidentada, entrecortada de avanços e recuos. As instituições e seus valores subjacentes podem corresponder aos melhores ou piores desígnios do homem. Os direitos humanos, fundados na dignidade, na ética e na solidariedade, correspondem aos mais elevados propósitos da humanidade. E mesmo que a realidade se afaste tanto dessa inspiração, aqui e alhures, é imperativo prosseguir-se na luta pela sua afirmação e efetividade. Os direitos humanos não são uma dádiva, mas o resultado de um longo e penoso processo de lutas assumidas e travadas pela humanidade. Lutas sempre recomeçadas a cada perda ou ameaça, permanentes e contínuas, até que se comprometa com o seu ideal a consciência moral dos homens. E o Direito é processo dentro deste processo de conquistas, pois a sua concretização geralmente decorre das lutas sociais; seu papel transformador deve ser o de assegurar à “vontade democrática” que esta transite da “periferia” para o “centro” do poder decisório52. Daí a razão para que se aprofunde ao máximo a extensão dos efeitos jurídicos que a Constituição possa produzir 51. Citado por Lyra Filho, “O que é Direito”, São Paulo, Editora Brasiliense, 1999, pág. 21. 52. A respeito, ver Gisele Cittadino, ob. cit., pág. 211, especialmente a referência à idéia de Jürgen Habermas de que “a vontade democrática dos cidadãos deve sair da “periferia” e, atravessando as “comportas” dos procedimentos estabelecidos pelo Estado Democrático de Direito, exercer influência e controle Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 75 DOUTRINA em direção à efetividade dos direitos fundamentais, tarefa que cumpre, em plano de indiscutível importância, ao Poder Judiciário, pelo papel ativo que lhe destinou a ordem constitucional vigente.53 sobre o “centro”, isto é, sobre o parlamento, os tribunais e a administração pública”. Tb. Roberto Lyra Filho, citado por José Geraldo de Souza Júnior, ob. e pág. cit. 53. Entenda-se: o processo de aprofundamento da Constituição não deve situar-se no Judiciário, apenas. É de todo necessário que sé amplie ao máximo o contingente de intérpretes da Lei Fundamental, para que dele participe a sociedade em seus diversos segmentos, com a consequente incorporação de fatores materiais de toda ordem, que fazem a vida comunitária. Em grande parte, a efetividade da Constituição e de todo o seu sistema de direitos depende visceralmente da idéia ou representação que uma determinada comunidade faça a respeito da ordenação jurídica sob cuja disciplina se encontra. É a partir daí que se vivifica o conceito de constituição material. Para que seja triunfante esse objetivo, é importantíssimo que se crie e se fomente todo o tempo um grande debate constitucional, a envolver todas as camadas sociais, com a decidida participação da mídia, o único instrumento capaz de promover uma ampla interlocução. É isto, exatamente, o que não ocorre no Brasil, por isso que a Constituição, em vez de ser aplicada, é retalhada no Congresso Nacional, sem que a cidadania seja chamada a opinar. Opinião pública, em sociedades pluralistas e democráticas, forma-se no debate público sobre os temas importantes para permitir um maior e mais efetivo controle social das ações do Estado. Entre nós, o governo, o Congresso e as instância decisórias e de influência política preferem à relevância do debate as pesquisas de mera aferição de uma opinião pública a que não se concedeu a oportunidade de ser esclarecida; à noite, comunicam-se os resultados das pesquisas pelo Jornal Nacional. Por esse modo a Constituição não se instala no imaginário das pessoas, não é refletida nem assumida como Lei Fundamental incorporadora dos valores essenciais de uma comunidade histórica concreta; não se cria o tão necessário sentimento constitucional (expressão tão cara a Pablo Lucas Verdú), que expressa uma cidadania ativa e participante. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 76 INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 94, CAPUT, 111, § 2o, E 115 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL RESPOSTA A CONSULTA Ives Gandra da Silva Martins* CONSULTA " Conforme contato mantido com V. Exa, tenho a honra de encaminhar-lhe material remetido pela Vice-Presidência da Associação dos Magistrados Brasileiros afeta à área trabalhista, envolvendo os desdobramentos da Emenda Constitucional n° 24/99, que extinguiu a representação classista na Justiça do Trabalho. Como anteriormente mencionado, tem-se em mira interesse dos magistrados trabalhistas, mas com repercussão para toda a magistratura nacional, o que motivou a AMB a procurar insigne Professor e Jurista como V. Exa” RESPOSTA Em termos de breve resposta à consulta, e não de parecer ou opinião legal, respondo à questão formulada pela Associação Brasileira dos Magistrados sobre a proporcionalidade das vagas dos Tribunais Regionais do Trabalho a serem preenchidas por membros do Ministério Público e da Advocacia, em face da Emenda Constitucional n° 24/19991. Creio, nada obstante a relevância reconhecida pelo eminente Ministro Pertence à matéria, ao conceder medida liminar em mandado de segurança impetrado pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho contra a indicação, pelo Presidente da República, de magistrado de carreira para preencher vaga deixada por egresso do * Professor emérito da Universidade Mackenzie, em cuja Faculdade de Direito foi titular de Direito Econômico e de Direito Constitucional. 1. Manoel Gonçalves Ferreira comenta: " Quinto constitucional. Nos tribunais mencionados, um quinto dos lugares haverá de ser preenchido fora da carreira que é a magistratura. Com isto se pretendeu injetar nos tribunais o fruto da experiência haurida em situações outras que a do juiz. Conforme deflui da Constituição, um quinto dos lugares será preenchido de advogados e de membros do Ministério Público, com notório merecimento, idoneidade moral e dez anos pelo menos de efetiva atividade profissional. Note-se, porém, que a Constituição vigente não dá aos advogados um décimo dos lugares nem aos membros do Ministério Público outro décimo, nem estabelece a alternância das nomeações, conforme estava na E.C. n° 16/65 (art. 18, V); ou na Constituição de 1946 (art. 124, V). Quis o constituinte, apenas, que, em qualquer tribunal, um quinto do todo fosse preenchido por advogados e membros do Ministério Público, não importando que nesse quinto houvesse maioria de advogados ou de membros do Ministério Público. Será, todavia, contrário à Constituição que somente advogados ou somente membros do Ministério Público venham a compor o quinto constitucional. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 77 DOUTRINA Ministério Público, no TRT da 15a Região, entendo que a questão não se reveste da complexidade que se lhe pretende outorgar, após a E.C. n° 24/19992. O quinto constitucional é garantido pelo artigo 94 da C.F., cuja dicção se segue: “Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros, do Ministério Público, com mais de 10 anos de carreira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com mais de 10 anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes. Parágrafo único. Recebidas as indicações, o tribunal formará lista tríplice, enviando-a ao Poder Executivo, que, nos 20 dias subseqüentes, escolherá um de seus integrantes para nomeação. ” Antes da E.C. n° 24/1999, essa norma prevalecia, sem qualquer espécie de contestação, para os Tribunais Trabalhistas, independente do fato de sua composição hospedar os juízes classistas3. A lei orgânica da Magistratura houve por bem fixar o principio da alternância. Nomeado, por exemplo, um membro do Ministério Público, a vaga seguinte será de advogado. E assim por diante” (Comentários à Constituição Brasileira de 1988, vol.2, Ed. Saraiva, 1992, p. 200). 2. O despacho de S. Exa é o seguinte: “Cuida-se de mandado de segurança requerido pela Assoc. Nac. dos Proc. do Trabalho, com pedido liminar, que visa a impedir a nomeação pelo Sr. Presidente da República, de juiz togado do TRT/15ª Região (Campinas), com base em lista tríplice de juízes do trabalho de 1° grau: é que, cuidando-se do provimento de vaga resultante da aposentadoria de juiz oriundo do Ministério Público, entende a impetrante -com base no art. 115, parágrafo único, c/c art. 111,I, da Constituição - que a nomeação deveria fazer-se dentre integrantes de lista de Procuradores do Trabalho, organizada conforme o procedimento estabelecido no art. 94 da Lei Fundamental, nada importando, no ponto, a extinção pela E.C. 24/99 dos cargos de juízes classistas dos Tribunais trabalhistas, Entendeu ao contrário o TRT que, com a extinção dos classistas e conseqüente redução numérica de sua composição, nela, a participação de juízes escolhidos dentre advogados e membros do Ministério Público há de ser igualmente diminuída, de modo a corresponder a um quinto do total, nos termos da regra geral do art. 94 da Constituição. A controvérsia, logo se percebe, é relevante e intrincada. E ainda que a temida nomeação, na pendência do processo, não gere fato juridicamente irreversível, entendo ser de inequívoca conveniência dos interessados e da máquina judiciária que não se viabilize a investidura de juiz sub judice. Defiro, pois, a liminar, para que se abstenha o Sr. Presidente da República da nomeação questionada até a decisão definitiva do mandado de segurança” (M.S. 23.647-7-Distrito Federal, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 08/03/2000). 3. O artigo 115estava assim redigido antes da E.C.n.24/1999: “Os Tribunais Regionais do Trabalho serão compostos de juízes nomeados pelo Presidente da República, sendo dois terços de juízes togados vitalícios e um terço de juízes classistas temporários, observada, entre os juízes togados, a proporcionalidade estabelecida no art.111, § 1°, I", tendo merecido de Celso Ribeiro Bastos o seguinte comentário: “Os membros do Tribunal Regional do Trabalho são denominados de “juízes” e são constituídos por magistrados de carreira, advogados, membros do Ministério Público do Trabalho e de juízes classistas temporários. Ressalvados os classistas, os outros recebem a denominação de juízes togados vitalícios, cuja proporcionalidade deverá necessariamente obedecer à proposição do art. 111, § 1°, I, do texto constitucional. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 78 DOUTRINA Após a extinção da representação classista, não mais havendo possibilidade de indicações para cargos dessa natureza, que deixaram de existir, o artigo 94 continuou, a meu ver, a reger toda a composição dos Tribunais Judiciais, exceção feita à dos Tribunais Superiores, ou seja STF, STJ, TSE, TST, TSM. No Supremo Tribunal Federal, a escolha não se submete a nenhum critério de origem; o STJ impõe o terço constitucional para o Ministério Público e Advocacia; o TST enumera, em numerus clausus, os Ministros que são egressos da Advocacia e do Ministério Público, o mesmo ocorrendo com o TSE; e o STM admite em sua composição cinco civis, que devem preencher os requisitos de notório conhecimento jurídico e ilibada reputação. O inciso II do parágrafo único do artigo 104 faz remissão ao artigo 94, como forma de indicação alternada de integrantes do Ministério Público e da Advocacia para composição do terço constitucional do STJ, e não para definição de proporcionalidade. Ao contrário, para composição dos quadros dos Tribunais Regionais do Trabalho, o artigo 94 é elencado como forma de indicação (115 inciso II) e de proporcionalidade (115 caput)4. O artigo 111, § 2o, modificado pela E.C. n° 24/1999, passou a ter a seguinte dicção: “§ 2o O Tribunal encaminhará ao Presidente da República listas tríplices, observando-se, quanto às vagas destinadas aos advogados e aos membros do Ministério Público, o disposto no art. 94; as listas tríplices para o provimento de cargos destinados aos juízes da magistratura trabalhista de carreira deverão ser elaboradas pelos Ministros togados e vitalícios”, vinculando à observância da proporcionalidade prevista no artigo 94 a composição dos Tribunais Regionais do Trabalho conforme remissão constante do caput do artigo 115, assim redigido este último: " Art. 115 Os Tribunais Regionais do Trabalho serão compostos de juízes nomeados pelo Presidente da República, observada a proporcionalidade estabelecida no § 2°do art. 111". Aqui cabe um esclarecimento essencial. A anterior dicção do artigo 115 fazia clara referência ao preenchimento das vagas respeitando-se " a proporcionalidade estabelecida no artigo III, § 1°, I”, enquanto a atual redação retira a proporcionalidade do artigo III, § 1o, I (numerus clausus para indicação dos juízes togados do TST) e refere-se, apenas, à proporcionalidade do § 2o do artigo III, que, por seu lado, determina a obediência ao Os juízes do Tribunal Regional do Trabalho serão nomeados pelo Presidente da República, fazendo por justificar o dispositivo que prevê ser este ato privativo do Chefe do Executivo (art. 84, XVI, da C.F.)” (grifos meus) (Comentários à Constituição do Brasil, vol. 4, tomo III, Ed. Saraiva, 1997, p. 442). 4. O inciso II do parágrafo único do art. 104, da Constituição Federal, tem a seguinte dicção: “II. um terço, em partes iguais, dentre advogados e membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e Territórios, alternadamente, indicados na forma do art. 94” (grifos meus). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 79 DOUTRINA " disposto no artigo 94 ”5. Pelo novo discurso da Lei Maior, o artigo 111, § 2°, é utilizado como ponto referencial - não para efeitos de explicar a proporcionalidade de participantes no TST, pois esta explicação compõe o próprio caput do art. 111-, mas para inequívoca referência à composição proporcional do TRT, que deve ser realizada nos termos do artigo 94. Antes da E.C. n° 24/1999 o problema não se colocava, pois o quinto era rigorosamente respeitado, em face do acréscimo dos juízes classistas. A partir da E.C. n° 24/1999, a meu ver, o problema também não se coloca, pois o que determina o artigo 115 é que a proporcionalidade do artigo 94 seja mantida, pois só de proporcionalidade cuidou o artigo 115 ao referir-se ao art. 111, § 2°. E, também a meu ver, claramente deixou de referir-se à proporcionalidade do artigo 111, § 1°, I (pretérita redação) para referir-se à proporcionalidade do artigo 94 (redação atual)6. Ora, não há como pretender que a proporcionalidade prevista pela E.C. n° 24/1999 e definida pelo artigo 94 - que deve ser observado - seja afastada para se adotar outra proporcionalidade que já não é mais referida pelo texto constitucional (artigo 111, § 1°, inciso I, no passado, 111, caput, no presente)!!! É bom repetir que, na redação anterior, a proporcionalidade do artigo 115 vinculava-se ao artigo 111, § 1°, I, ou seja, à proporcionalidade do TST. Na redação atual, 5. Pinto Ferreira lembra que: “O STF já decidiu que “os juízes que integrem, pelo quinto, os Tribunais de Alçada, somente concorrem às vagas no Tribunal de Justiça correspondentes à classe dos magistrados” (RTJ, 92:460). Em conseqüência de tal julgado, os juízes dos Tribunais de Alçada, provenientes das corporações da OAB e do Ministério Público, não conservam mais a sua vinculação às corporações de que provieram para o acesso ao Tribunal de Justiça. Foi assim superada a interpretação que o STF dava anteriormente à matéria, concretizada em diversos julgados (RTJ, 66/631; 67:630). 4°) Somente o Tribunal de Justiça pode elaborar a lista tríplice que contém os nomes dos advogados e dos membros do Ministério Público, sendo inconstitucionais as disposições que atribuam esta competência a outros órgãos estranhos ao Poder Judiciário (Rep. 813-BA, 1970, in José Celso de Mello Filho, Constituição Federal anotada, 2a ed., São Paulo, Saraiva, 1986, p. 396). 5°) O STF decidiu que “não é inconstitucional o preceito da organização judiciária que determina que, na formação do quinto destinado a advogados e membros do Ministério Público no Tribunal de Justiça, se compute como unidade a fração superior a meio” (RT, 282:870)” (Comentários à Constituição Brasileira, 4° vol., Ed. Saraiva, 1992, p. 16). 6. O artigo 94 cuida exclusivamente da proporcionalidade e seu parágrafo único da forma de nomeação, tendo José Cretella Jr. assim o comentado: “31. Preenchimento dos lugares pelo quinto constitucional: Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto (a) de membros do Ministério Público, com mais de 10 anos de carreira, e (b) de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com mais de 10 anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes. 32. Escolha do integrante para nomeação: Recebidas as indicações, o Tribunal - o TRF, os Tribunais dos Estados, e o do Distrito Federal- formará agora lista tríplice, enviando-a ao Chefe do Poder Executivo, que, dentro de 20 dias, escolherá um dos integrantes para a nomeação. Temos, no caso de cada nomeação, o chamado ato administrativo complexo e discricionário, porque se aperfeiçoa com a participação de dois órgãos, o indicador dos nomes, o órgão da respectiva classe, e o Chefe do Poder Executivo” (IV Comentários à Constituição 1988, Forense Universitária, 1992, 1a ed., p. 3022/3023). Rev. TST, Brasília, vol. 66, n.º 3, jul/set 2000 80 DOUTRINA deixou de vincular-se ao artigo 111, § 1o, I, que passou a ser o caput do artigo 111 - ou seja, à proporcionalidade da composição do TST- para adotar-se a composição a que se refere o artigo 94 válido para os demais Tribunais. Se quisesse manter a mesma proporcionalidade, o artigo 115 continuaria fazendo referência ao artigo 111 caput e não ao § 2o, que impõe a obediência ao artigo 94 da Constituição Federal, quanto à proporcionalidade das indicações do Ministério Público e Advocacia. Em outras palavras: houve substancial alteração do discurso constitucional para manter o quinto constitucional não mais como referência à composição do TST (artigo 111, caput), que continua com numerus clausus, mas com referência ao artigo 94 da Constituição Federal7. Se a referência ao artigo 94 dissesse respeito apenas à forma alternativa para indicações, como pretende a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, ela seria despicienda, pois tal matéria já está prevista no inciso II do próprio art. 115, que estabelece a observância do artigo 94 para indicação dos membros do Ministério Público e da Advocacia que deverão compor o TRT8. Como o caput cuida de proporcionalidade e como o § 2° do artigo 111 manda obedecer ao artigo 94 - que cuida da proporcionalidade de 1/5 - e como antes da E.C. n° 24 tal proporcionalidade já era de 1/5 em face dos juízes classistas, não há como entender que não deva tal proporcionalidade ser obedecida, nos termos do expressamente mencionado art. 94, para se adotar a de 1/3 do caput do artigo 111, não mais referido no artigo 115, como o era antes da E.C. n° 24/1999. Em termos diversos, o art. 115 manda ser obedecido não o caput do artigo 111, mas o § 2° deste artigo, cujo referencial de proporcionalidade não é de 1/3, mas de 1/5, pois estabelecida pelo artigo 94 da Constituição Federal9. 7. Francesco Ferrara (“Interpretação e aplicação das leis”, 2a ed., Coimbra, 1963, p. 129) esclarece que para o intérprete mais perigoso que o apego à letra da lei é forçar exegese, colocando no texto o que lá gostaria que estivesse ou de lá retirando o que não lhe agradasse. 8. É também esta a interpretação de Celso Bastos ao comentar o dispositivo: “O § único, que recebeu nova redação com o advento da E.C. n. 24/99, enumera em dois incisos os magistrados integrantes do Tribunal Regional do Trabalho. O terceiro inciso foi revogado pela referida emenda, não mais prevendo a representação classista na Justiça do Trabalho. Foram eliminados, portanto, aqueles juízes indicados em listas tríplices pelas diretorias das federações e dos sindicatos com base territorial na região. No primeiro inciso do parágrafo sob comento, a lei determina que a escolha seja alternada entre os magistrados promovidos por merecimento e antigüidade. O texto expressa de forma total o sentido das suas palavras, não se fazendo mister maiores comentários. Quanto aos advogados e membros do Ministério Público do Trabalho, será obedecida a regra do " quinto constitucional”, prevista no art. 94. Essa regra visa a mesclar o Tribunal com profissionais de outras áreas, também possuidores de conceitos do mundo jurídico, aproximando ainda mais suas decisões dos anseios da sociedade organizada” (grifos meus) (Comentários à Constituição do Brasil, 4° vol., tomo III, ob. cit. p. 447). 9. Wolgran Junqueira lembra que o artigo 94 apenas cuida do quinto constitucional: “Trata este artigo do denominado quinto dos advogados e membros do Ministério Público. Terão direito nos Tribunais Regionais Federais, nos Tribunais dos Estados e do Distrito Federal e Territórios. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº3, jul/set 2000 81 DOUTRINA Como último aspecto, é de se lembrar que a referência é apenas ao artigo 94, que disciplina o quinto constitucional, e não a seu parágrafo único, este sim cuidando da forma de indicação. Há de se interpretar a Constituição como ela foi elaborada, fazendo com que prevaleça a intenção do constituinte de manter a relação de proporcionalidade do caput do artigo 115 vinculada exclusivamente à proporcionalidade do artigo 94, único mencionado no § 2o do artigo 11110. Desta forma, entendo que, a partir da E.C. 24/1999, deve ser adotada para preenchimento das vagas dos Tribunais Regionais do Trabalho a proporcionalidade prevista no artigo 94, destinando-se 1/5 das vagas aos egressos do Ministério Público e da Advocacia. S.M.J. São Paulo, 19 de julho de 2000. Serão indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação da respectiva classe. Quando a vaga pertencer aos membros do Ministério Público, seis serão indicados, para um deles ser nomeado. Quando a vaga pertencer aos advogados, seis serão os indicados e, um nomeado. A lista sêxtupla para o preenchimento do quinto reservado ao Ministério Público e aos advogados não poderá ser heterogênea, isto é, três advogados e três membros do Ministério Público ou, vice-versa. Há que ser homogênea, três advogados ou três membros do Ministério Público. Para ambos, se exige 10 anos de prática forense. Deverão os advogados estar advogando; não basta que tenham condições para advogar, assim como os membros do Ministério Público deverão estar em exercício. Os aposentados não poderão. O quinto a que se refere o texto será para qualquer Tribunal. Há que se entender, não só o de Justiça, que é o órgão máximo, como qualquer outro de segunda instância ou instância superior à primeira” (Comentários à Constituição de 1988, vol. 2, Julex Livros, 1a ed. 1989, p. 706). 10. Carlos Maximiliano lembra que; “Não se resolve contra a letra expressa da Constituição, baseado no elemento histórico ou no chamado Direito natural. Cumpre-se o que ressalta dos termos da norma suprema, salvo o caso de forte presunção em contrário” (Hermenêutica e aplicação do direito, Forense, 9ª. ed. 1979, pp. 309/310). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 82 ADEQUAÇÃO DO NÚMERO DE JUÍZES DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO EM VIRTUDE DE EXTINÇÃO DA REPRESENTAÇÃO CLASSISTA POR EMENDA CONSTITUCIONAL. INTERPRETAÇÃO DO TST QUE DESTINA A VAGA PERTENCENTE A MEMBROS DA ADVOCACIA A JUIZ TOGADO. IMPOSSIBILIDADE Clémerson Merlin Clève* Sumário: A Consulta; O Parecer; I - A composição do Tribunal Regional do Trabalho no regime constitucional anterior; II - A composição do Tribunal Regional do Trabalho na Emenda Constitucional n° 24/99; 1. A interpretação da Emenda Constitucional n° 24/99 pelo TST, adotada pelo TRT/PR; 2. A interpretação da Emenda Constitucional n° 24/99 pelo ilustre advogado Edésio Franco Passos; 3. Breves comentários sobre as interpretações anteriores. Fixação das balizas constitucionais para a compreensão do caso; 4. Limites do poder constituinte derivado; a) Poder Constituinte Derivado e Cláusulas Pétreas; b) A alteração do número de membros dos tribunais inferiores e o principio da separação dos poderes; c) A busca de um núcleo essencial do princípio da separação dos poderes; 5. A reserva de lei e o espaço de conformação do legislador; 6. A obra do poder constituinte derivado e a proibição do retrocesso; 7. A problemática da interpretação constitucional; 8. Conclusões; III - Resposta ao quesito. A CONSULTA O Doutor Edgard Cavalcanti da Albuquerque, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Paraná, consulta-me a respeito da manifestação do Tribunal Superior do Trabalho sobre a forma de provimento do cargo de juiz togado daquele Tribunal Regional em virtude de aposentadoria de juiz oriundo da classe dos advogados. Interpretando a Emenda Constitucional n° 24/99, o egrégio TST entendeu que a extinção da representação classista junto aos Tribunais Regionais do Trabalho importou a supressão dos cargos àquela categoria destinados pela Lei n° 8.492/92 com a conseqüente diminuição dos membros do Tribunal. Diante do quadro, aceitou-se que os cargos privativos de membros da OAB e do Ministério Público deveriam ser preenchidos por juízes de carreira até a adequação ao quinto constitucional. Inconformado com a decisão daquele colendo Tribunal, consulta-me sobre a matéria. Há, portanto, um único quesito demandante de resposta. * Titular da Faculdade de Direito da UFPR. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 83 DOUTRINA O PARECER I - A COMPOSIÇÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO NO REGIME CONSTITUCIONAL ANTERIOR Antes da Emenda Constitucional n° 24, o art. 115 da Constituição Federal dispunha que: “Art. 115. Os Tribunais Regionais do Trabalho serão compostos por juízes nomeados pelo Presidente da República, sendo dois terços de juízes togados vitalícios e um terço de juízes classistas temporários, observada, entre os juízes togados, a proporcionalidade estabelecida no art. 111, § 1o, I. Parágrafo único. Os magistrados dos Tribunais Regionais do Trabalho serão: I - juízes do trabalho, escolhidos por promoção, alternadamente, por antigüidade e merecimento; II - advogados do Ministério Público do Trabalho, obedecido o disposto no art. 94; III - classistas indicados em listas tríplices pelas diretorias das federações e dos sindicatos com base territorial na região.” Por sua vez, o art. 111, § 1o, I, referido no caput do art. 115 para o cálculo da proporcionalidade entre os juízes togados estabelecia: “§ 1o O Tribunal Superior do Trabalho compor-se-á de vinte e sete Ministros escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos, nomeados pelo Presidente da República após aprovação pelo Senado Federal, sendo: I - dezessete togados e vitalícios, dos quais onze escolhidos dentre juízes de carreira da magistratura trabalhista, três dentre advogados e três dentre membros do Ministério Público do Trabalho.” A Lei n° 8.492, de 20.11.92 que alterou a composição do Tribunal Regional do Trabalho do Paraná, aplicando as normas constitucionais, dispôs: “Art. 1o - O Tribunal Regional do Trabalho da 9a Região, com sede em Curitiba - PR, tem sua composição aumentada para vinte e oito juízes, sendo 18 togados vitalícios e dez classistas temporários, respeitada a paridade de representação. Parágrafo único. Dos cargos de juízes togados vitalícios constantes deste artigo doze são destinados à magistratura trabalhista de carreira, três à representação da Ordem dos Advogados do Brasil e três à representação do Ministério Público do Trabalho.” Com efeito, a composição dos Tribunais Regionais do Trabalho obedecia ao seguinte: (I) dois terços de juízes togados e um terço de juízes classistas, segundo a caput do art. 115. Dentre os juízes togados, seguia-se (II) a proporcionalidade prevista na regra constitucional de composição do Tribunal Superior do Trabalho onde de dezessete Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 84 DOUTRINA togados e vitalícios, onze eram escolhidos dentre juízes de carreira da magistratura trabalhista, três dentre advogados e três dentre membros do Ministério Público do Trabalho, segundo o caput do art. 115 que remetia ao art. 111, § 1 °, I. Isto é, numa conta aproximada, entre juízes togados, dois terços seriam compostos por juízes de carreira e um terço por juízes oriundos da OAB e do MPT. Por sua vez, dentre todos os juízes do Tribunal, (III) os advogados e membros do MPT representavam um quinto, segundo o disposto no art. 94, referido expressamente pelo inciso II do art. 115. Foi assim que, ao estabelecer o número de 28 (vinte e oito) juízes componentes do Tribunal Regional do Trabalho do Paraná, a Lei 8.492/92 seguiu a proporcionalidade prevista na Constituição de 1988 na destinação das vagas e dos cargos de juízes togados e classistas. Conforma a regra (I) - 2/3 de togados e 1/3 de classistas - destinou 18 vagas para os togados e 10 vagas para os classistas (um terço de 28 seria exatamente 9,3). Conforme a regra (II) - entre os juízes togados, 2/3 de juízes de carreira e 1/3 de advogados e membros do Ministério Público do Trabalho segundo a proporção constitucional fixada para o Tribunal Superior do Trabalho - destinou-se 12 vagas para os juízes de carreira, três para os advogados e três para os membros do Ministério Público do Trabalho ( um terço de 18 é exatamente 6). Conforme a regra (III) - entre todos os juízes do Tribunal, 1/5 de advogados e membros do Ministério Público do Trabalho destinou-se 6 vagas para advogados e membros do Ministério Público do Trabalho ( um quinto de 28 corresponde exatamente a 5,6). Com efeito, como se pode imediatamente perceber, o preceito (III) inscrito no inc. II do art. 115 confirmava a regra (II) definida no caput do art. 115 que remetia ao art. 111, § 1°, I. Em outras palavras, os advogados e membros do Ministério Público do Trabalho representavam (III) 1/5 dos juízes de todo o tribunal e, ao mesmo tempo, (II) aproximadamente, 1/3 dos juízes togados. A composição do Tribunal Superior do Trabalho, vale lembrar, era utilizada como parâmetro para o cálculo da proporcionalidade entre os juízes togados justamente porque essa categoria não compunha todo o tribunal e não para o cálculo do número de juízes do Tribunal. Assim, o fato da Lei 8.492/92 destinar 10 vagas para os juízes classistas decorria somente do cálculo da proporção constitucional em relação ao número total de membros estabelecido pela mesma Lei. Era mera coincidência a circunstância do número de classistas do TRT do Paraná coincidir com o número de classistas do TST, definido expressamente na Constituição. II - A COMPOSIÇÃO DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO NA EMENDA CONSTITUCIONAL N° 24/99 A Emenda Constitucional n° 24/99 deu nova redação ao art. 115, da Constituição Federal: “Art. 115. Os Tribunais Regionais do Trabalho serão compostos de juízes nomeados pelo Presidente da República, observada a proporcionalidade estabelecida no § 2° do art. 111. Parágrafo único. Os magistrados dos Tribunais Regionais do Trabalho serão: Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 85 DOUTRINA I - juízes do trabalho, escolhidos por promoção, alternadamente, por antigüidade e merecimento; II - advogados e membros do Ministério Público do Trabalho, obedecido o disposto no art. 94; III - (Revogado pela EC n°24/99)” Por sua vez, o § 2° do art. 111, referido pelo caput do art. 115 para o cálculo da proporcionalidade entre os juízes do Tribunal, dispôs: “§ 2° O Tribunal encaminhará ao Presidente da República listas tríplices, observando-se, quanto às vagas destinadas aos advogados e aos membros do Ministério Público, o disposto no art. 94; as listas tríplices para o provimento de cargos destinados aos juízes da magistratura trabalhista de carreira deverão ser elaboradas pelos Ministros togados e vitalícios.” De uma rápida leitura, já se depreende que, agora, os Tribunais Regionais do Trabalho são compostos exclusivamente por juízes togados, vedada a participação dos classistas que, antes representavam 1/3 do Tribunal. Entre todos os juízes do Tribunal, (I) 1/5 são advogados e membros do Ministério Público do Trabalho, segundo o art. 94, da CF, a que faz referência tanto o inc. II do art. 115 quanto o § 2° do art. 111 e (II) 4/5 são juízes de carreira devido à extinção dos classistas e a permanência da proporção de 1/5 de advogados e membros do Ministério Público do Trabalho. Portanto, ao estabelecer uma nova proporcionalidade para o cálculo da composição do Tribunal, a Emenda Constitucional n° 24 (I) não faz referência à proporção de juízes togados do TST que servia de parâmetro na distribuição de cargos de juízes togados do Tribunais Regionais (o artigo 115 mandava observar entre os juízes togados a proporcionalidade estabelecida no art. 111, § 1º, 7), justamente porque estes não representam mais 2/3 do Tribunal mas, agora, a sua totalidade, (II) continua a estabelecer no inc. II, do art. 115 a regra de que 1/5 de todos os membros do Tribunal são advogados e membros do Ministério Público do Trabalho, (III) extinguiu a categoria dos classistas, mediante a supressão do inc. III, do art. 115. 1. A interpretação da Emenda Constitucional n° 24/99 pelo TST, adotada pelo TRT/PR Com a aposentadoria de juiz togado do tribunal regional do Trabalho do Paraná, que ocupava vaga destinada aos membros da Advocacia, o Tribunal Superior do Trabalho viu-se na contingência de resolver sobre o procedimento para o provimento daquele cargo a partir das alterações provocadas pela Emenda Constitucional n° 24. A decisão foi comunicada à DD. Juíza Presidente da Tribunal Regional do Trabalho da 9a Região por ofício do Exm° Sr. Dr. Wagner Pimenta, Ministro Presidente do TST: “Acuso o recebimento de correspondência enviada por V. Exa, datada de 15/12/99, pela qual V. Exa consulta o Tribunal Superior do Trabalho a respeito de questão surgida após a promulgação da Emenda Constitucional n° 24/99. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 86 DOUTRINA Informo-lhe que o Tribunal Pleno desta Corte, reunido em 17/12/99, examinando o caso que lhe foi submetido, esclareceu que, após a promulgação da aludida Emenda Constitucional, e a conseqüente redução do número de membros dos Tribunais Regionais do Trabalho, as vagas destinadas à OAB e ao Ministério Público do Trabalho deverão se ajustar à atual composição dos TRTs. Assim, no caso do Tribunal Regional do Trabalho da 9a Região, que sofreu redução de 18 membros, 4 (quatro) vagas destinam-se ao Ministério do Trabalho e à OAB, enquanto 14 (quatorze) aos magistrados e carreira. Portanto, a vaga decorrente da aposentadoria do Juiz Luiz Felipe Haj Mussi, egresso da OAB, deverá ser preenchida por juiz do trabalho, que também ocupará a próxima vaga aberta em relação à representação do Ministério Público do Trabalho, quando, então, a situação do quinto constitucional se regularizará.” Adotando a decisão do Tribunal Superior do Trabalho, o Tribunal Regional do Trabalho da 9a Região, mediante ofício do Dr. Lauremi Camaroski, Juiz Vice-Presidente no exercício da Presidência do TRT/PR, comunicou-a à Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Paraná. Cumpre citar trecho do ofício: “A redução do número de juízes desta Corte, com a conseqüente limitação das vagas destinadas a essa importante e fundamental instituição, não condiz com a necessária modernização e efetivação da Justiça. Como é do seu conhecimento, o movimento processual na Justiça do Trabalho do Paraná há muito reclama a ampliação deste TRT, inclusive com a imprescindível elevação do número de juízes que compõem o Tribunal. Sabendo que esta não é uma questão afeta apenas ao Tribunal, mas que atinge todos os jurisdicionados, espero poder contar desde já com a colaboração desta instituição, reconhecidamente indispensável à administração da justiça, a fim de sensibilizar o legislador nacional quanto à imperiosa necessidade de se ampliar o número de julgadores em 1o e 2o graus.” Da leitura da decisão do Tribunal Superior do Trabalho, depreende-se que a interpretação foi no sentido de que a supressão dos classistas pela Emenda Constitucional n° 24 importou a direta supressão das vagas destinadas àquela categoria pela Lei n°8.492/92. Ou seja, ao revogar o inciso III do art. 115 da Constituição Federal o poder constituinte derivado teria acabado por revogar tacitamente o art. 1o da Lei n° 8.492/92 na parte que destinava 10 vagas do Tribunal aos juízes classistas. Por conseguinte, a diminuição de vagas do Tribunal de 28 para 18 - teria determinado uma modificação das vagas dos juízes togados: (I) como os juízes de carreira agora representam 4/5 do Tribunal, a eles devem ser destinadas 14 vagas (um quinto de 18 corresponde a 3,6); (II) como os juízes oriundos da advocacia e do Ministério Público do Trabalho representam 1/5 do Tribunal, a eles devem ser destinadas 4 vagas. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 87 DOUTRINA 2. A interpretação da Emenda Constitucional n° 24/99 pelo ilustre advogado Edésio Franco Passos Inconformada com a decisão do Tribunal Superior do Trabalho que destinou vaga de membro da Ordem dos Advogados do Brasil à categoria dos juízes togados em virtude de interpretação da Emenda Constitucional n° 24/99 em contraste com a Lei n° 8.492/92, a Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Paraná, solicita ao ilustre advogado Edésio Franco Passos a elaboração de parecer sobre o caso em exame. O parecer foi no sentido de: “a) A vaga e cargo destinados a membro da OAB pela Lei n° 8.492 são privativos de advogado; neste sentido, a orientação do TST - acatada pelo TRT - em determinar o preenchimento da vaga e cargo destinado a OAB a ao MPT por juiz do trabalho não tem sustentação na Emenda Constitucional n° 24, nem na Constituição Federal ou lei ordinária, além de afrontar a Lei 8.492/92; b) Poderá ocorrer a declaração de vacância do cargo de juiz do trabalho oriundo da OAB, para adequação imediata ao art. 94 da CF; nesta hipótese, o cargo não seria preenchido por inexistência de previsão legal ou constitucional; c) No caso de insistir o TST e/ou o TRT/PR em preencher a vaga e o cargo destinados à OAB, observar, adequar e aplicar a excepcionalidade constitucional para a composição do TST, por analogia, mantendo a composição de 3 vagas a OAB e 3 vagas ao MPT, até nova norma constitucional que discipline a questão na reforma do Judiciário ou decisão do Supremo Tribunal federal; nesta hipótese, seria iniciado o procedimento de indicação de lista sêxtupla pela OAB/PR; d) Desde já oficiar a OAB federal para posicionar-se sobre a matéria, ao TST e ao TRT para reexame da decisão, reconsiderando o encaminhamento anterior, sustando de imediato o preenchimento da vaga até reexame da questão; e) Provocar o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal, que poderá ser requerido conjuntamente pelo TST, TRT/PR, OAB/PR e Federal e MPT; f) No caso de não aplicação de qualquer das hipóteses supra referidas, mantendo o TST e o TRT/PR a orientação atual de preencher vaga e cargo destinados a OAB, estudar a conveniência de medida judicial junto ao STF e, caso ocorra a decisão do TRT/PR em preencher a vaga, estudo da conveniência de interpor medida judicial visando a sustação do ato até decisão de mérito pelo STF.” Da leitura do parecer em tela, depreende-se que o ilustre advogado acatou a decisão do Tribunal Superior do Trabalho no sentido de que a supressão dos classistas pela Emenda Constitucional n° 24 importou a direta supressão das vagas destinadas àquela categoria pela Lei n° 8.492/92. Porém, embora sustentando em idêntica hipótese, alcançou diversas conseqüências. Com a supressão das vagas dos classistas e a necessidade de adequar a composição do Tribunal Regional do Trabalho à proporcionalidade prevista na Emenda Constitucional n° 24, sustentou as seguintes possibilidades: Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 88 DOUTRINA (I) a declaração de vacância do cargo de juiz oriundo da Ordem dos Advogados do Brasil e o seu correspondente não preenchimento a fim de adequar-se ao quinto constitucional. Nesta hipótese, estar-se-ia diminuindo mais um cargo de juiz do Tribunal. De forma a totalizar dezessete. A distribuição, logicamente, acabaria por concretizar-se da seguinte forma: 13 juízes de carreira, 2 juízes oriundos da Ordem dos Advogados do Brasil e 2 juízes oriundos do Ministério Público do Trabalho (já que 1/5 de dezessete corresponde a 3,4). Por sua vez, outra solução seria possível: (II) aplicar a proporcionalidade prevista para a composição do TST - que é de 1/3 - no preenchimento dos juízes do Tribunal Regional do Trabalho, de forma que seriam 12 juízes de carreira, 3 juízes da Ordem dos Advogados do Brasil e 3 juízes do Ministério Público do Trabalho. 3. Breves comentários sobre as interpretações anteriores. Fixação das balizas constitucionais para a compreensão do caso Como se pode perceber, a interpretação levada a cabo pelo Tribunal Superior do Trabalho, pelo Tribunal Regional do Trabalho e pelo ilustre parecerista Edésio Franco Passos partiram da idêntica premissa: ao suprimir a representação classista a Ementa Constitucional n° 24/99 teria imediatamente suprimido as vagas destinadas pela Lei n° 8.492/92 àquela categoria. Partindo desta premissa, a interpretação do Tribunal Superior do Trabalho parece não conflitar com o texto constitucional. Ora, a Emenda Constitucional n° 24/99 é cristalina em fixar a proporcionalidade de 4/5 para juízes de carreira e 1/5 para juízes oriundos da Ordem dos Advogados do Brasil e do Ministério Público do Trabalho. Se o poder constituinte derivado suprimiu as vagas fixadas pelo legislador ordinário, nada mais exato que a vacância de juiz oriundo da categoria dos advogados importe o preenchimento por juiz de carreira a fim de se chegar à matemática constitucional: 14 juízes de carreira, 2 juízes da OAB e 2 juízes do MPT. Todavia, partindo da mesma premissa, a interpretação do ilustre parecerista, Doutor Edésio Franco Passos, data venia, não pode prosperar. A primeira solução apontada seria duvidosa inconstitucionalidade porque não há como sustentar, direta ou indiretamente, que a Emenda Constitucional tenha importado supressão de vaga destinada pela Lei aos juízes do quinto constitucional. Se a Emenda é clara ao estabelecer o quinto constitucional para os juízes oriundos da OAB e do MPT - repetindo esta disposição duas vezes: no caput do art. 115 e no inc. II do art. 115 - e se a premissa é a de que foram extintos os cargos dos classistas, não há como suprimir a vaga dos advogados sob pretexto da impossibilidade de transferi-la aos juízes de carreira. Quando uma emenda constitucional altera a proporção na composição de um Tribunal e isto acarreta a supressão da vagas fixadas pela lei, é possível, e às vezes, até imprescindível que as vagas de uma categoria sejam transferidas a outra. Afinal, a lei destina vaga conforme uma determinada proporção constitucional. A alteração da proporção constitucional pode acarretar a alteração de destinação da vaga. O importante é, portanto, o respeito pela lei ou pelo administrador da proporção constitucional. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 89 DOUTRINA A segunda solução apontada pelo parecerista também pode trazer inconvenientes. Aplicar o terço constitucional para a composição dos Tribunais Regionais implica, com o devido respeito, com o devido respeito, a subversão, numa interpretação contra a letra da Constituição, do quinto constitucional. O intérprete não pode, a pretexto de interpretar normas constitucionais abertas1, atribuir sentidos incompatíveis com o espaço de interpretação normativo2. Como salienta CANOTILHO, “os aplicadores da Constituição não podem atribuir um significado (=sentido, conteúdo) arbitrário aos enunciados lingüísticos das disposições constitucionais, antes devem investigar (determinar, densificar) o conteúdo semântico, tendo em conta o dito pelo legislador constitucional (= legislador constituinte e legislador da revisão). Isto significa que a tarefa de interpretação, lingüisticamente considerada, é fundamentalmente a investigação do dito na lei constitucional (= indagação da mens legis da teoria objectiva na hermenêutica tradicional).”3 Ora, se o dito pelo poder constituinte derivado foi um quinto de juízes da categoria da OAB e do MPT na composição dos Tribunais Regionais do Trabalho não se pode “ler” um terço constitucional. Assim, deixar de aplicar emenda constitucional “até nova norma constitucional que discipline a questão na reforma do Judiciário ou decisão do Supremo Tribunal Federal” significaria desconsiderar o caráter cogente das normas constitucionais e sua suprema hierarquia na pirâmide normativa. Parece que a solução para o presente caso rejeita tanto uma interpretação literal da Constituição (a supressão do inciso III do art. 115 equivale à supressão das vagas destinadas pela lei aos classistas) quanto uma interpretação contra a letra da Constituição (que suprima vaga destinada a membro da OAB a fim de adequar-se ao quinto constitucional ou aplique o terço constitucional do TST aos Tribunais Regionais do Trabalho). Tendo em vista que as emendas constitucionais sujeitam-se ao controle de constitucionalidade - ao contrário das normas constitucionais do poder constituinte originário - e, por isso, devem ser interpretadas de forma a respeitar a identidade da ordem constitucional veiculada nas cláusulas pétreas, será necessário revelar (I) qual a interpretação da Emenda Constitucional n° 24/99 compatível com os limites do poder constituinte derivado. Em segundo lugar, identificar (II) se a emenda constitucional configura uma norma plurissignificativa, que possibilitaria ao legislador ou ao intérprete mais de uma interpretação possível. 1. Na acepção de José Joaquim Gomes Canotilho, que se reconduz à abertura vertical, ou seja, a caráter geral e indeterminado de muitas constitucionais que, por isso mesmo, se ‘abrem’ à mediação legislativa concretizadora. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 2.ed. Coimbra: Almedina, 1999. P. 1106. 2. “Considera-se como espaço de interpretação o âmbito dentro do qual o programa normativo (= medida de ordenação expressa através de enunciados lingüísticos) se considera ainda compatível com o texto da norma”. CANOTILHO, e. ed., op. cit., p. 1129. 3. CANOTILHO, 3.ed. op. cit., p. 1135. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 90 DOUTRINA Nesta medida, será necessário tecer comentários a respeito (I) dos limites do poder constituinte derivado e (II) das peculiaridades da interpretação constitucional. 4. Limites do poder constituinte derivado A supressão da representação classista nos Tribunais Regionais do Trabalho por meio de emenda à Constituição Federal envolve a análise dos limites ao poder constituinte derivado explicitados no art. 60, § 4°, que proíbe as emendas tendentes a abolir: I- a forma federativa de Estado, II- o voto direto, secreto e universal e periódico, III- a separação dos poderes, IV - os direitos e garantias individuais. Em outras palavras, é imperioso realizar o cotejo entre poder constituinte derivado e cláusulas pétreas a fim de analisar a constitucionalidade da Emenda Constitucional n° 24/99. a) Poder Constituinte Derivado e Cláusulas Pétreas Tanto a fiscalização da constitucionalidade como a reforma constitucional são garantias constitucionais, enquanto institutos destinados a assegurar a “supremacia permanente da Constituição”4. A questão da reforma constitucional implica, necessariamente, o problema dos limites à mudança constitucional. O poder constituinte derivado, porque criado pela Constituição e regulado por ela quanto ao modo do seu exercício, deve ser compreendido dentro de determinados parâmetros. Como ensina Jorge MIRANDA, a função do poder de reforma não é a de fazer Constituições, mas possibilitar a preservação da identidade e continuidade da Constituição considerada como um todo.5 A afirmação das de cláusulas pétreas no sistema brasileiro exige a aceitação de certas notas características da função reformadora: (I) limitabilidade e imprescindilidade dada a necessidade de ordenação do processo de atualização das normas constitucionais frente às novas conjunturas, sem a aniquilação do seu perfil essencial; (II) insuperabilidade em face da impossibilidade de modificação ou remoção das regras constitucionais que dispõem sobre as cláusulas de limites (processo de dupla reforma). Daí o art. 60, § 4°, veicular limites materiais explícitos, não excluindo a presença de limites implícitos ou tácitos.6 A vedação ao processo de dupla reforma constitui limite material implícito, sabendo-se que o elenco dos limites expressos à reforma não menciona o próprio sistema de reforma. E aqui se explica a insuperabilidade antes destacada.7 4. Na feliz expressão de Carlos Ayres Brito. A Reforma Constitucional. Separata El Derecho Publico de Finales de Siglo: una perspectiva iberoamericana. Madrid : Civitas. 5. MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional: introdução à teoria constitucional. 2.ed. Coimbra : Coimbra, 1988. Tomo II, pp. 165-166. 6. HORTA, Raul Machado. Estudos de Direito Constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 1995., p. 124. 7. Carlos Ayres Brito, Pontes de Miranda, Nelson de Souza Sampaio, José Gomes Canotilho ao contrário de Jorge Miranda. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 91 DOUTRINA Os limites expressos (art. 60, § 4°) cumprem o papel de explicitação e certificação dos limites inerentes da revisão. Eles são uma espécie de interpretação autêntica (porque feita pelo próprio poder constituinte) dos limites intrínsecos da revisão.8 O art. 60, § 4o, não garante propriamente a intocabilidade dos preceitos constitucionais concernentes á forma federativa de Estado, voto direto, secreto universal e periódico; separação dos poderes; direitos e garantias individuais, mas de certos princípios ou regimes materiais. A Constituição não retira estas matérias do campo de atuação do poder constituinte derivado. Estão vedadas as emendas tendentes a abolir as cláusulas do art. 60, § 4°, e não propriamente as emendas que tenham por objeto a forma federativa de Estado, voto direito , secreto, universal e periódico, separação dos poderes e direitos e garantias individuais. Assim, a forma federativa de Estado não pode ser abolida pelo poder reformador, embora as regras constitucionais que informam o princípio federativo possam ser alteradas desde que não impliquem ruptura com o que se entenda por essencial à federação. Ora, tanto as emendas como a revisão “cumprem a mesma função de reformar para corrigir, e não a de ‘reformar’ como procedimento juridicamente espúrio de descontinuidade ou ruptura constitucional”.9 Para o que aqui interessa, cumpre ponderar que a forma de composição dos Tribunais do Trabalho não consta do art. 60, § 4°. Justamente por isso, a sua reformabilidade será possível desde que não afete de modo a abolir (e aqui tem-se vedação de uma espécie qualificada de afetação que é aquela com finalidade de destruir, aniquilar, descaracterizar o núcleo essencial da Constituição) a forma federativa de Estado, o voto secreto, universal e periódico, a separação dos poderes e os direitos e garantias individuais. O que está em jogo é se a Emenda Constitucional n° 24/99 (i) está relacionada a algum dos princípios que constituem as cláusulas pétreas e (ii) em caso afirmativo, se a alteração advinda pode implicar quebra da identidade de algum dos princípios intangíveis. b) A alteração do número de membros dos tribunais inferiores e o princípio da separação dos poderes O art. 96, inc. II, letra a, confere aos específicos órgãos do Poder Judiciário a iniciativa reservada para o procedimento legislativo que trate da alteração do número de membros dos tribunais inferiores. O tema toca diretamente na colaboração dos poderes no processo legislativo, pois, neste caso, ao Poder Judiciário caberá a iniciativa legislativa, ao Poder Legislativo, a discussão e aprovação do projeto e ao Poder Executivo, a sanção ou veto e promulgação. O sistema de corresponsabilidade e interdependência no 8. CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituição. Coimbra : Coimbra, 1991., p. 301. 9. BRITO, Carlos Ayres. A reforma constitucional: a reforma constitucional e sua intransponível limitabilidade. Separata El Derecho Publico de finales de siglo: una perspectiva iberoamericana. Civitas : Fundación BBV. p. 89. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3,jul/set 2000 92 DOUTRINA processo legislativo participa da idéia do balanço e controle recíproco dos poderes que informam o princípio da separação dos poderes. O princípio da separação dos poderes, expressamente afirmado no art. 2o - são os poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário - e elevado à condição de cláusula pétrea dá suporte ás regras constitucionais que regulam as relações entre os poderes no desempenho de suas funções precípuas. Como salienta JOSÉ AFONSO DA SILVA, o princípio fundamenta-se em dois elementos: (I) especialização funcional no sentido de que cada órgão é especializado no desempenho de uma função - ao Poder Legislativo a função legislativa, ao Poder Executivo a função executiva, ao Poder Judiciário, a função jurisdicional; (II) independência orgânica que significa ausência de meios de subordinação.10 Na Constituição de 1988, a regra constitucional que autoriza a participação do Poder Judiciário na função legislativa mediante a previsão de iniciativa reservada de lei que altere o número de membros dos Tribunais inferiores encontra fundamento no principio da separação dos poderes, revelado como princípio de colaboração onde cada um dos poderes, a par do desempenho de sua função típica, interfere nas outras funções atipicamente num elo de freios e contrapesos. A iniciativa reservada ao Poder Judiciário insere-se no método de “deslocamento parcial da atividade legislativa para outros titulares, aos quais as Constituições contemporâneas permitem, através de técnicas e de procedimentos apropriados, o exercício de competência legislativa”.11 Porém, a circunstância do art. 96, inc. II, letra a, encontrar base de fundamento no princípio da separação dos poderes (não no voto direto, secreto, universal e periódico; não nos direitos e garantias individuais porque ligada ao sistema organizatório)12 10. SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional. 9.ed. São Paulo : Malheiros, 1993. 11. HORTA, op. cit., p. 562. 12. O tema da iniciativa reservada no processo legislativo está ligado também a uma outra cláusula pétrea: a forma federativa do Estado. O Supremo Tribunal Federal declarou que o tema da observância, pelos Estados-Membros, das normas constitucionais federais sobre processo legislativo “envolvem o alcance do poder constituinte decorrente que é atribuído aos Estados.” (ADIMC1087/RJ. Relator: Ministro Moreira Alves. Julg: 01.02.95. tribunal Pleno. Diário da Justiça da União, 07.abr.l995,p. 1782-01, p. 1) A Suprema Corte tem decidido que o “modelo estruturador do processo legislativo, tal como delineado em seus aspectos fundamentais pela Carta da República, impõe-se enquanto padrão normativo de compulsório atendimento, à observância incondicional dos Estados-Membros”. (ADIMC 1254/RJ. Relator: Minsitro Celso de Mello, Julg: 14.jun.1995. Tribunal Pleno. Diário da Justiça da União, 18.ago.95, p. 24894, v.1796-01; ADI 1434/SP. Relator: Ministro Celso de Mello. Julg. 20.08.96. Tribunal Pleno. Diário da Justiça da União, 22.ago. 1996, p. 45684, v. 1851 -01, p. 141). Nesta linha, “as regras do processo legislativo federal, especialmente as que dizem respeito à iniciativa reservada, são normas de observância obrigatória pelos Estados-Membros. Precedentes do STF”. (ADIMC 1568/ES. Relator: Ministro Carlos Velloso. Julg: 26.mai.1997. Tribunal Pleno. Diário da Justiça da União, 20.jun. 1997, p. 28468, v. 1874-3, p. 434). A Suprema Corte posiciona-se, portanto, no sentido de que “ a cláusula de reserva pertinente ao poder de instauração do processo legislativo traduz postulado constitucional de observância compulsória, cujo desrespeito - por envolver usurpação de uma prerrogativa não compartilhada- configura defeito jurídico insanável. As normas restritivas inscritas no art. 63 da Constituição Federal aplicam-se ao processo de formação das leis instaurado no âmbito dos Estados- Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 93 DOUTRINA não garante, por si só, a sua imodificabilidade. É preciso algo mais: a regra constitucional deve participar do núcleo essencial do princípio em questão na medida em que a sua alteração sinalize tendência a aboli-lo. c) A busca de um núcleo essencial do principio da separação dos poderes O deslinde do assunto requer o prévio instrumental da compreensão do núcleo essencial do “princípio da separação dos poderes”. Como se sabe, os princípios são os fundamentos das regras jurídicas e têm uma idoneidade que lhes permite “ligar” ou cimentar objetivamente todo o sistema constitucional.13 São normas jurídicas de “otimização”, compatíveis com vários graus de concretização, consoante os condicionalismos fácticos e jurídicos enquanto as regras são normas que prescrevem imperativamente uma exigência (impõem, permitem ou proíbem) que é ou não é cumprida.14 Nesta ótica, os princípios não seguem a lógica do “tudo ou nada”, permitindo o balanceamento entre valores e interesses.15 Carmem Lúcia ANTUNES ROCHA alude à “poliformia principiológica”: a substância política ativa dos princípios faz com que as alterações das instituições políticas e sociais atinjam o seu sentido e alcance.16 Esta abertura é responsável pela maior vulnerabilidade das normas principiológicas às mutações constitucionais, ou seja, ao “evoluir permanente do sentido da ordem constitucional para o efeito de acompanhar a ordem e o progresso”17. É por isso que se o núcleo essencial do princípio da separação dos poderes é condição sine qua non para o implemento de um sistema de limites ao poder constituinte derivado, também este núcleo essencial não foge às novas compreensões constitucionais em face de renovadas necessidades sociais. Afinal, “a identidade da constituição não significa a continuidade ou permanência do ‘sempre igual’ pois num mundo sempre dinâmico a abertura à evolução é um elemento estabilizador da própria identidade”18. Desde esta perspectiva, derivada dos deslocamentos teóricos mais recentes em matéria de Direito Constitucional, é que se deve extrair do texto constitucional um núcleo intangível do princípio da separação dos poderes funcionalmente adequado a preservar a Constituição. Membros”. (ADIMC 805/RS. Relator: Ministro Celso de Mello. Julg: 26.nov. 1992. Tribunal Pleno. Diário da Justiça da União, de abr. 1994, p. 7225, v. 1793-3, p. 513). Por aí, vê-se a amplitude da importância do tema no contexto dos limites do poder constituinte derivado. 13. CANOTILHO, 2.ed., op. cit., p. 175. 14. CANOTILHO, 2.ed., op. cit., pp. 173-174. 15. CANOTILHO, 2.ed., op. cit., p. 174 16. ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. Princípios Constitucionais da Administração Pública. Rio de Janeiro : Renovar, 1997. 17. Ver o nosso livro A Fiscalização Abstrata no Direito Brasileiro. 2.ed. São Paulo : RT, 1999. 18. CANOTILHO, 2,ed., op. cit., p. 1142. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 94 DOUTRINA Ensina José Joaquim GOMES CANOTILHO19, em lição também adequada ao Direito brasileiro, que em geral o núcleo essencial do princípio da separação dos poderes é entendido como: [...] “a nenhum órgão podem ser atribuídas funções das quais resulte o esvaziamento das funções materiais especialmente atribuídas a outro. Quer dizer: o princípio da separação exige, a título principal, a correspondência entre órgão e função e só admite excepções quando não for sacrificado o seu núcleo essencial. O alcance do princípio é visível quando com ele se quer traduzir a proibição do ‘monismo do poder’, como o que resultaria, por ex., da concentração de ‘plenos poderes’ no Presidente da República, da concentração de poderes legislativo no executivo e na transformação do legislativo em órgão soberano executivo e legiferante.” Por conseguinte, uma emenda constitucional estaria, certamente, a ferir o princípio da separação dos poderes quando (I) transferisse para um poder a função constitucional precípua de outro quebrando com a especialização funcional, (II) ou, em outro sentido, (II) estabelecesse um sistema de interferência entre poderes que fosse além dos fins constitucionais de freios e contrapesos de forma a afetar a independência funcional de cada um. A função precípua do Judiciário é a jurisdicional. Possível exceção ao monopólio da jurisdição exercida pelo Judiciário substancia a competência atribuída ao Senado Federal para o julgamento de algumas autoridades pela prática de crime de responsabilidade,20 Assim, quando o Judiciário participa da função legislativa mediante a iniciativa reservada exerce função atípica e acidental. Nada obstaria, em princípio, eventual emenda constitucional que transformasse a iniciativa reservada em iniciativa facultada. O núcleo essencial do princípio da separação dos poderes garante que não se atribua a um órgão exterior ao Poder Judiciário a competência jurisdicional para quebrar a especialização funcional. Porém, eventual emenda que suprimisse a iniciativa reservada de vez ou para um determinado caso concreto seria, no mínimo, de duvidosa constitucionalidade, ou seja, entraria numa zona cinzenta em que a mácula ao núcleo intangível do princípio da separação dos poderes seria, no mínimo, potencial. Como salienta José Joaquim GOMES CANOTILHO, “permanece em aberto o problema de saber onde começa e onde acaba o núcleo essencial de uma determinada função.”21 Logo, entender que a supressão dos classistas pela Emenda Constitucional n° 24 importa a direta supressão das vagas anteriormente destinadas àquela categoria pela Lei n°8.492/92 equivale a postular que o próprio poder constituinte derivado dispõe de competência para alterar o número de membros do Tribunal Regional, que é um 19. CANOTILHO, 2.ed., op. cit., p. 704 20. Ver o nosso artigo, Poder Judiciário: autonomia e justiça. Revista Synthesis, São Paulo, n. 18, p. 66, 1994. 21. CANOTILHO, 3.ed., op. cit., p. 517. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 95 DOUTRINA Tribunal inferior. Ora, para este caso concreto, o poder constituinte derivado teria afastado o incidência do art. 96, inc. II, letra a, violando a iniciativa reservada do Poder Judiciário para dispor sobre a matéria. Quando a emenda Constitucional n° 24/99 extingue as vagas dos classistas e diminui o número de membros do Tribunal Regional do Trabalho, está a suprimir a iniciativa reservada do Poder Judiciário para alterar o número de membros de Tribunal inferior, entrando em direta colisão com o núcleo essencial do princípio da separação dos poderes. Esta interpretação põe em risco o princípio da separação dos poderes afirmado pelo poder constituinte originário como cláusula pétrea e, nesta medida, põe em cheque a própria constitucionalidade da Emenda Constitucional n° 24/99. Dir-se-á, eventualmente, que a Emenda Constitucional n° 24/99 suprimiu as vagas dos classistas junto ao Tribunal Superior do Trabalho e diminuiu expressamente o número de membros daquele Tribunal. O § 1o do art. 111 da CF dispunha que o Tribunal Superior do Trabalho era composto por vinte e sete Ministros e o inciso II dispunha que dez seriam classistas temporários. A Emenda Constitucional n° 24/99 alterou o número total para dezessete e suprimiu o inciso I e II do art. 111 que se referia à distribuição de vagas entre os juízes togados e classistas. Logo, se o poder constituinte derivado pode alterar o número de membros de Tribunal Superior, nada obsta que faça o mesmo em Tribunal inferior. Afinal, quem pode o mais, pode o menos. Trata-se de exercício argumentativo que merece pronta refutação. A competência para dispor sobre o número de membros do Tribunal Superior do Trabalho não integra a iniciativa reservada do Poder Judiciário - perceba-se que o art. 96, inciso II, letra a refere-se somente aos tribunais inferiores - mas a esfera do próprio poder constituinte. É por isso que a própria Constituição dispõe diretamente sobre o número de membros dos Tribunais Superiores e do Supremo Tribunal Federal. Nesta sede, o poder constituinte derivado pode alterar o número de membros fixado pelo próprio poder constituinte originário, desde que esta alteração não sinalize tendência a abolir a competência jurisdicional do Tribunal. Quanto aos tribunais inferiores, a Constituição não se refere, nem antes nem depois da Emenda Constitucional n° 24/99, a número de membros. Em se tratando de Tribunais inferiores, a Constituição estabelece somente a categoria de juízes que deve integrar o tribunal e a proporção entre eles na distribuição das vagas. Cabe ao legislador ordinário, obedecida a iniciativa reservada ao Poder Judiciário, dispor sobre o número de membros do tribunal inferior conforme a proporção constitucional. Com efeito, a supressão dos classistas no Tribunal Superior do Trabalho acarreta conseqüências diversas da supressão dos classistas nos Tribunais Regionais do Trabalho. No Tribunal Superior do Trabalho o poder constituinte derivado pode suprimir diretamente a vaga e, conseqüentemente, diminuir o número de membros do Tribunal fixado, originariamente, pela própria Constituição. Todavia, em se tratando de Tribunal inferior, o poder constituinte derivado somente pode alterar a categoria de juízes que integram o Tribunal e a correlata proporção entre eles, mas não pode alterar diretamente o número de membros do Tribunal, Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 96 DOUTRINA que depende de processo legislativo a ser instaurado mediante iniciativa exclusiva do Judiciário. Afinal, se o poder constituinte originário confere ao Poder Judiciário iniciativa reservada de lei, o poder constituinte derivado não pode, sob pena de grave violação do princípio de separação dos poderes, substituir-se ao legislador ordinário fazendo tábula rasa da iniciativa reservada do Poder Judiciário. Logo, revela-se maculada com o vício da inconstitucionalidade interpretação no sentido de que a emenda constitucional teria alterado o número de juízes do Tribunal Regional do Trabalho. Aliás, ainda que fosse possível a interpretação nesta sede contestada, é imperioso ressaltar que a Emenda Constitucional n° 24/99 efetivamente não alterou o número de membros dos Tribunais Regionais do Trabalho. Ora, no caso do TST, o poder constituinte previu expressamente tal diminuição no § 1° do art. 111: de 27 para 17 Ministros. Já no caso dos Tribunais Regionais, a emenda simplesmente revogou o inc. III, do art. 115 que previa, na composição dos Tribunais, a presença dos juízes classistas, sem alusão a números. Não houve, portanto, revogação das leis que fixam o número de membros dos Tribunais Regionais do Trabalho. 5. A reserva de lei e o espaço de conformação do legislador A iniciativa legislativa constitui sempre manifestação de um poder22 que dá início ao procedimento legislativo com vista à modificação ou inovação da ordem jurídica preexistente. A alteração do número de membros dos tribunais inferiores, como foi salientado, integra a iniciativa reservada do Poder Judiciário. Com a iniciativa reservada, o Poder Judiciário exerce função atípica participando da função legislativa nos moldes de um Estado onde a rígida separação dá lugar a uma importante colaboração entre os poderes.23 Nesta idéia, está também implícito o principio constitucional da reserva de lei. Mediante o art. 96, inc. III, letra a, o poder constituinte originário coloca a matéria - alteração do número de membros dos tribunais inferiores - sob a reserva de lei. Segundo José Joaquim GOMES CANOTILHO: “Através do conceito de reserva de lei (Vorbehalt des Gesetzes) pretende-se delimitar um conjunto de matérias ou de âmbitos materiais que devem ser regulados por lei ('reservados à lei’). Esta ‘reserva de matérias’ significa, logicamente, que elas não devem ser reguladas por normas jurídicas provenientes de outras fontes diferentes da lei (exemplo: regulamentos). Ainda por outras palavras: existe reserva de lei quando a Constituição prescreve que o regime jurídico de determinada matéria seja regulado por lei e só por lei, com exclusão de outras fontes normativas.” 22. Ver o nosso livro A Atividade Legislativa do Poder Executivo. São Paulo : RT, 1993. p 94 23. Ver nosso livro, Atividade Legislativa..., op. cit., p. 96. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 97 DOUTRINA Nesta medida, o Tribunal Superior do Trabalho não pode, mediante ato administrativo normativo (resolução), invadir a competência do legislador ordinário para alterar o número de membros do Tribunal. Note-se que a Resolução Administrativa n° 665/99 considera que “com a extinção da representação classista, todos os cargos vagos de Ministros e juízes Classistas não ocupados por titulares não são passíveis de provimento”. Adiante, no § 4° estabelece: “É vedado o provimento das vagas decorrentes da extinção da representação classista pela convocação de juízes de primeiro grau para os Tribunais Regionais.” Afinal, se um ato administrativo detivesse o condão de dispor sobre matéria que se encontra sob reserva de lei estar-se-ia aceitando a violação aos princípios (I) da primazia ou da preeminência da lei, (II) da precedência da lei, (III) da acessoriedade dos atos administrativos, (IV) do congelamento da categoria, (V) da identidade própria do ato administrativo, (VI) da colaboração necessária entre a lei e os atos administrativos.24 6. A obra do poder constituinte derivado e a proibição do retrocesso A doutrina é uníssona em afirmar que a Constituição de 1988 elevou o acesso à Justiça à categoria de direito fundamental no inciso XXXV e LXXIV do art. 5o. Substancia, assim, importante direito fundamental que garante a realidade do cumprimento pelo Poder Público dos direitos assegurados na Lei Fundamental. Nesta medida, o acesso à Justiça do Trabalho configura garantia fundamental para o cumprimento dos direitos sociais enumerados no Capítulo II, do Título II, da Lei Fundamental. Tratando-se de um direito fundamental, o acesso à Justiça do Trabalho submete-se ao regime específico dos direitos, liberdades e garantias plasmados na Constituição. O regime jurídico, em questão, implica a emergência das seguintes notas caracterizadoras: (I) aplicabilidade direta das normas que os reconhecem, consagram ou garantem (art. 5o, § 1°); (II) vinculatividade das entidades públicas e privadas (preâmbulo); (III) reserva de lei do Congresso (impossibilidade de lei delegada, medida provisória) para sua restrição (art. 68, § 1°, II); (IV) princípio da proporcionalidade como princípio informador da atividade legislativa, inclusive das leis restritivas a direitos e garantias (art. 5o, LIV); (V) princípio da salvaguarda do núcleo essencial (princípio implícito do Estado de Direito); (VI) limitação da possibilidade de suspensão nos casos de estado de sítio e estado de defesa (art. 136, § 1°, I e 139); (VII) garantia contra o poder de emenda à Constituição (limite material ao poder de reforma constitucional) restritiva do conteúdo dos direitos individuais (art. 60, § 4°, IV). O Excelentíssimo Juiz Vice-Presidente no exercício da Presidência do TRT teve oportunidade de salientar que “a redução do número de juízes desta Corte, com a conseqüente limitação das vagas destinadas a essa importante e fundamental instituição, não condiz com a necessária modernização e efetivação da Justiça. Como é do seu 24. Em outro lugar (Atividade Legistaltiva..., op. cit., p. 253-237), tive a oportunidade de destacar estes princípios na relação entre a lei e o regulamento, podendo ser aplicados também em ralação aos atos administrativos em geral. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 jul/set 2000 98 DOUTRINA conhecimento, o movimento processual na Justiça do Trabalho do Paraná há muito reclama a ampliação da estrutura deste TRT, inclusive com a imprescindível elevação no número de juízes que compõem o Tribunal. Neste contexto destacado pelo Juiz Vice-Presidente no exercício da Presidência do TRT, a diminuição dos membros dos Tribunais Regionais do Trabalho está a comprometer a efetividade do direito de acesso à Justiça do Trabalho, notadamente, no item (VII) do regime jurídico dos direitos fundamentais -garantia contra o poder de emenda à Constituição (limite material ao poder de reforma constitucional) restritiva do conteúdo dos direitos individuais (art. 60, § 4o, IV). Ora, o acesso à Justiça do Trabalho é restringido quando se diminuem as condições de uma Justiça apta a decidir e resolver os conflitos em tempo hábil. Já tive oportunidade de afirmar em outro lugar que: “Afirme-se: não basta haver Judiciário; é necessário haver Judiciário que decida. Não basta haver decisão judicial; é necessário haver decisão judicial justa. Não basta haver decisão judicial justa, é necessário que o povo tenha acesso à decisão judicial justa. O acesso à decisão judicial constitui importante questão política. Não há verdadeiro Estado democrático de direito quando o cidadão não consegue, por inúmeras razões, provocar a tutela jurisdicional. (...) É necessária, também, a ampliação dos juízos e varas, levando o juiz até o povo (o juiz, como o artista da canção de Milton Nascimento, deve ir aonde o povo está).”25 Assim, a interpretação da Emenda Constitucional n° 24/99 no sentido de que a supressão da representação classista significa a direta supressão das vagas a ela destinadas pela lei importa verdadeiro retrocesso social já que diminui a efetividade de um direito social tão caro em nossa sociedade: o acesso à Justiça do Trabalho. Canotilho destaca que a idéia da vedação do retrocesso social: “(...) também tem sido designada como proibição de ‘contra-revolução social’ ou da ‘evolução reaccionária’. Com isto quer dizer-se que os direitos sociais e econômicos (ex.: direitos dos trabalhadores, direito à assistência, direito à educação), uma vez obtido um determinado grau de realização, passam a constituir, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjetivo. A ‘proibição do retrocesso social’ nada pode fazer contra as recessões e crises econômicas (reversibilidade fática), mas o princípio em análise limita a reversibilidade dos direitos adquiridos (ex.: segurança social, subsídio de desemprego, prestações de saúde), em clara violação do principio da proteção da confiança e da segurança dos cidadãos no âmbito econômico, social e cultural, e do núcleo essencial da existência mínima inerente ao respeito pela dignidade da pessoa humana.”26 25. CLÈVE, Clèmerson Merlin. Temas de direito constitucional (e de teoria do direito). São Paulo: Acadêmica, 1993. pp. 51 e 53. 26. CANOTILHO, 3ª ed., op. cit., p. 326. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 99 DOUTRINA Com efeito, ao suprimir a representação classista sem interferir no número de membros do Tribunal, a emenda acaba por destinar as vagas anteriores aos juízes de carreira, juízes que passaram pelo teste mais democrático do nosso sistema: o concurso público. Ora, se a “validade de uma constituição decorre de sua eficacidade”27 o sentido da supressão da representação classista está em resolver um problema de legitimação dos juízes e não em dificultar ainda mais o acesso à Justiça do Trabalho. Sim, é verdade que a Emenda Constitucional n° 24/99 suprimiu as vagas dos classistas junto ao Tribunal Superior do Trabalho. Mas este Tribunal tem uma competência diversa da dos Tribunais Regionais, que estão muito mais próximos dos cidadãos. Concorde-se, então, que aumentando o número de juízes de carreira na composição dos Tribunais Regionais do Trabalho, a emenda concretiza a obra do poder constituinte. Inserida nos limites próprios ao poder de reforma, cumpre a função de adequar a Constituição às exigências do seu tempo. Um tempo que reclama uma nova visão do princípio da imparcialidade dos juízes-juízes imparciais e não juízes classistas, juízes sem vínculos prévios com classes sociais, juízes preocupados com a efetividade da Justiça. 7. A problemática da interpretação constitucional Segundo José Joaquim Gomes Canotilho, “interpretar constituição é uma tarefa que se impõe metodicamente a todos os aplicadores das normas constitucionais (legislador, administração, tribunais). Todos aqueles que são incumbidos de aplicar e concretizar a constituição devem: (1) encontrar um resultado constitucionalmente ‘justo’ através da adoção de um procedimento (método) racional e controlável; (2) fundamentar este resultado também de forma racional e controlável (Hesse). Considerar a interpretação como tarefa significa, por conseguinte, que toda norma é ‘significativa’, mas o significado não constitui um dado prévio; é, sim, o resultado da tarefa interpretativa.”28 O intérprete da Constituição tem um compromisso de levar a cabo sua tarefa interpretativa (I) de forma a evitar contradições (antinomias, antagonismos) entre as normas constitucionais (princípio da unidade da Constituição)', (II) dando primazia aos critérios ou pontos de vista que favoreçam a integração política e social e o reforço da unidade política (princípio do efeito integrador)-, (III) atribuindo à norma constitucional o sentido que maior eficácia lhe dê (principio da máxima efetividade); (IV) coordenando e combinando os bens jurídicos em conflito de forma a evitar o sacrifício total de uns em relação a outros (princípio da concordância prática ou da harmonização) e, por fim, (V) dando prevalência aos pontos de vista que, tendo em conta os pressupostos da constituição (normativa) contribuem para uma eficácia ótima da Lei Fundamental (princípio da força normativa da constituição). No caso concreto, está-se perante duas interpretações da Emenda Constitucional n° 24/99: (I) a supressão da representação classista importa a imediata supressão 27. BRITO, op. cit., p. 106. 28. CANOTILHO, 3ª ed., op. cit., p. 1133. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 100 DOUTRINA dos cargos destinados à categoria pelo legislador ordinário; (II) a supressão da representação classista importa somente a alteração da proporção constitucional na composição do Tribunal, inalterado o número de juízes, salvo a hipótese do TST. A primeira interpretação, como foi afirmado, embora não atente contra a letra da Constituição (I) favorece o surgimento de uma antinomia entre a obra do poder constituinte originário, notadamente o princípio da separação dos poderes, e a obra do poder constituinte derivado, infringindo o princípio da unidade da Constituição; (II) não favorece a integração político-social porque dificulta, ainda mais, um direito social caro ao Estado democrático de direito como o acesso à Justiça do Trabalho, importando retrocesso social, infringindo o princípio do efeito integrador, (III) não atribui à norma constitucional o sentido de maior eficácia porque não fortalece e sim compromete a modernização e efetividade da competência jurisdicional do Tribunal Regional do Trabalho, infringindo o princípio da máxima efetividade-, (IV) não combina, de forma adequada, os bens jurídicos, princípio da imparcialidade dos juízes e acesso à Justiça do Trabalho que devem ser harmonizados na interpretação da emenda constitucional e, por isso, afeta o princípio da concordância prática ou harmonização-, (V) por todas estas razões, não contribui para uma eficácia ótima da Constituição, segundo o princípio da força normativa da Constituição. Com efeito, o próprio direito constitucional aceita a possibilidade de interpretações conformadoras, que possam salvar dispositivos normativos eventualmente passíveis de impugnação. Neste ponto, advoga-se que a Emenda Constitucional n° 24/99 sofra o que a doutrina e a jurisprudência mais modernas chamam de interpretação conforme (corretiva, ajustadora). A experiência jurídica tem demonstrado que sempre que exista dúvida a respeito da compatibilidade de uma lei com a Constituição, deve-se preferir a interpretação afinada com o sentido da Lei Fundamental, inclusive, se for possível, formulando-se uma interpretação conforme a Constituição. Como tivemos oportunidade de dizer em outro lugar: “A interpretação conforme a Constituição, conhecida pelas Cortes Constitucionais européias, mais do que uma técnica de salvamento da lei ou do ato normativo (doutrina americana), consiste já numa técnica de decisão. Assim, em homenagem aos princípios da presunção de legitimidade das leis e da supremacia da Constituição, interpreta-se o ato impugnado conforme a Constituição. ‘Oportunidade para a interpretação conforme a Constituição existe sempre que determinada disposição legal ofereça diferentes possibilidades de interpretação, sendo algumas delas incompatível com a Constituição.’ A ‘interpretação conforme’ é técnica conhecida do Supremo desde antes da Constituição de 1988.”29 No caso em tela, é conforme a Constituição uma interpretação segundo a qual o art. 115, caput, inciso III, do art. 115 alterados pela Emenda Constitucional n° 24/99 não implicam diminuição dos membros dos Tribunais Regionais do Trabalho, mas somente alteração da proporção constitucional a ser utilizada para a composição dos 29. CLÈVE, A fiscalização..., op. cit., p. 263. Rev. TST, Brasília, vol. 66,nº 3, jul/set 2000 101 DOUTRINA membros daquele Tribunal. Com a extinção dos classistas, os juízes de carreira passam a representar quatro quintos do Tribunal. Permanece inalterada, portanto, a representação dos juízes oriundos da Ordem dos Advogados do Brasil e do Ministério Público do Trabalho que continuam a representar um quinto (1/5) dos membros de todo o Tribunal. Na redação anterior, a Constituição referia-se ao quinto constitucional no inciso II do art. 115, que remetia ao art. 94. Perceba-se que, agora, a Emenda Constitucional 24/99 refere-se ao quinto constitucional mais de uma vez: o caput do art. 115 faz referência ao § 2o do art. 111 e o inciso II do art. 115 ao art. 94. Sim, porque uma interpretação que aceite a diminuição do número de membros do Tribunal com a extinção da representação classista resulta em interpretação ofensiva do princípio da separação dos poderes, ferindo, ademais, o direito fundamental de acesso à Justiça do Trabalho, motivo pelo qual deve ser descartada, preferindo-se a primeira, ajustada aos comandos constitucionais. 8. Conclusões Diante de todo o exposto, cumpre apresentar as conclusões: 1. As emendas constitucionais, enquanto obra do poder constituinte derivado, submetem-se ao controle de constitucionalidade. Por essa razão, a sua interpretação está condicionada ao respeito da identidade constitucional plasmada nas cláusulas pétreas (art. 60, § 4o, da Lei Fundamental). 2. Emenda constitucional não pode alterar o número de membros dos Tribunais Regionais do Trabalho, sob pena de violação do art. 96, II, “a”, da Lei Fundamental e conseqüente mácula ao princípio da separação dos poderes, que é cláusula pétrea no Direito Constitucional brasileiro (art. 60, § 4o, III). 3. Ato administrativo normativo, de competência do Poder Judiciário, não pode invadir espaço reservado pelo poder constituinte originário ao legislador ordinário, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da reserva da lei. 4. O poder constituinte derivado não pode diminuir o número de membros dos Tribunais Regionais do Trabalho sob pena de ofensa ao direito fundamental de acesso à Justiça do Trabalho, que também é cláusula pétrea no Direito brasileiro (art. 60, § 4o, IV), e correspondente retrocesso social. 5. Diante de norma plurissignificativa, o intérprete deve privilegiar a interpretação que seja conforme a Constituição e não conduza à declaração de inconstitucionalidade da norma. Este é justamente o caso da Emenda Constitucional n° 24/99. Devem ser refutadas as seguintes interpretações, porque conduzem à inconstitucionalidade da emenda: (I) a supressão da representação classista importou a supressão das vagas destinadas pela lei àquela categoria, com a conseqüente diminuição do número de membros do Tribunal; (II) a supressão da representação classista exige a aplicação do terço constitucional na composição do Tribunal no que se refere à representação dos membros da Ordem dos Advogados do Brasil e do Ministério Público do Trabalho. 6. Privilegiando a interpretação que não conduz à inconstitucionalidade da emenda, mas sua conformidade ao projeto do poder constituinte originário tem-se que Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 102 DOUTRINA a Emenda Constitucional n° 24/99 alterou somente a forma de composição dos Tribunais Regionais e a correlata proporção na composição de seus membros. 7. Com a extinção da representação classista, os juízes de carreira passam a representar quatro quintos (4/5) do Tribunal, enquanto os advogados e membros do Ministério Público do Trabalho permanecem com a proporção inalterada de um quinto (1/5). Assim, do número de 28 juízes previsto pela Lei n° 8.492/92, 22 serão juízes de carreira, 3 juízes indicados pela Ordem dos Advogados do Brasil e 3 juízes derivados do Ministério Público do Trabalho. III - RESPOSTA AO QUESITO Ao único quesito formulado pelo consulente, cumpre responder não. Os cargos privativos de membros da OAB e do Ministério Público do Trabalho não podem ser preenchidos por juízes de carreira justamente porque a supressão da representação classista junto aos Tribunais Regionais do Trabalho pela Emenda Constitucional n° 24/99 não importou supressão das vagas destinadas àquela categoria pela Lei n° 8.492/92. Permanecendo inalterada a representação dos advogados e membros do Ministério Público do Trabalho, não há necessidade de adequação destas categorias ao quinto constitucional. Os cargos privativos da Ordem dos Advogados do Brasil e do Ministério Público do Trabalho não podem ser preenchidos por juízes de carreira, já que estes preencherão as vagas anteriormente destinadas aos classistas. É preciso salientar, contudo, que no presente parecer parte-se de pressuposto distinto daquele que orientou a tese esposada pelo TST. Todavia, faz-se necessário esclarecer que, se aquele pressuposto estiver correto, também corretas as respectivas conclusões. Este é o parecer, s.m.j. Curitiba, 05 de abril de 2000. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 103 AS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA COMO NOVO PARADIGMA PARA O DIREITO DO TRABALHO Raimundo Simão de Melo* Sumário: 1. Introdução; 2. Novos paradigmas para o Direito do Trabalho; 3. Finalidade das Comissões de Conciliação Prévia; 4. Algumas questões de ordem prática; 4.1 Criação e instalação das Comissões de Conciliação Prévia; 4.2 Estabilidade provisória dos membros eleitos pelos empregados; 4.3 A conciliação prévia obrigatória; 4.4 Alcance do efeito liberatório do termo de conciliação; 4.5 Âmbito de aplicação da conciliação prévia; 4.6 Cobrança de taxa pelos serviços de conciliação; 4.7 Participação do advogado nas Comissões de Conciliação Prévia; 5. Algumas conclusões; 6. Bibliografia consultada. 1. INTRODUÇÃO Depois de mais de dois anos de discussão tornou-se lei (Lei n° 9.958, de 12 de janeiro de 2000) proposta de criação de Comissões de Conciliação Previa de dissídios individuais do trabalho, apresentada pelo Tribunal Superior do Trabalho. A referida Lei 9.958/2000, como se observará no desenrolar deste trabalho, introduziu alterações significativas na Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, criando os artigos 625-A a 625-H, além de alterar a redação dos artigos 876 e 877, estes, para permitir a execução direta na Justiça do Trabalho, dos títulos executivos extrajudiciais que mencionam. As alterações legais trazidas por essa lei são significativas, a partir do momento em que facultam a criação das Comissões de Conciliação Prévia de dissídios trabalhistas individuais, com outras alterações conseqüenciais na vida de trabalhadores, empregadores, juízes, membros do Ministério Público e advogados, e, conseqüentemente, nas relações de trabalho, sempre pautadas no nosso sistema pelo corporativismo e pelo paternalismo estatal, cujas marcas têm origem no Estado Novo varguista. As mudanças introduzidas pela Lei n° 9.958/2000, sobretudo a obrigatoriedade da conciliação prévia como pressuposto para o ajuizamento de reclamação trabalhista, sem dúvida já estão causando perplexidade entre os operadores do Direito do Trabalho, e, para alguns, pelos seus impactos, preconceitos e rejeição, o que é natural, pois é inerente à natureza humana a objeção a mudanças, pela preferência à manutenção do status quo. Ou seja, prefere-se que as coisas fiquem como sempre foram, pois ao contrário haverá necessidade de alterações quanto a procedimentos e até mesmo no tocante a interesses particularizados. Procurador Regional do Trabalho/15a Região/Campinas. Professor de Direito e Processo do Trabalho. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 104 DOUTRINA A partir daí, em especial no campo legal, é natural que inconsciente ou até mesmo conscientemente, criem-se empecilhos ao desenvolvimento de institutos novos, com interpretações as mais variadas, o que não é difícil de acontecer no campo do Direito, cuja ciência, controvertida por excelência, por isso, diferencia-se da ciência matemática, onde dois mais dois são sempre quatro. Quanto à lei em comento, aspectos que, como nos parece, prometem suscitar maiores indagações são aqueles que se referem à obrigatoriedade da conciliação prévia, como pressuposto para ingresso em juízo, já considerado inconstitucional por alguns interpretes, o efeito liberatório do termo de conciliação, a estabilidade provisória dos membros eleitos pelos empregados, o âmbito de aplicação da conciliação, a cobrança de taxa pelos serviços prestados pela comissão, a participação do advogado nas sessões da comissão, entre outros que com certeza surgirão no decorrer da sua aplicação prática. Nosso objetivo em rápidas considerações é, em especial, examinar essas delicadas questões à luz do sistema jurídico pátrio e da realidade brasileira quanto à solução dos conflitos trabalhistas individuais, na busca de novos paradigmas para o Direito do Trabalho; para tanto, levaremos em conta como questão fundamental o fato de que “a lei não pode dar as costas” à realidade, mas, a ela adaptar-se, o que norteará nossas respostas sobre o conteúdo do princípio do livre acesso à jurisdição ou direito de ação, o alcance do chamado efeito liberatório geral do termo de conciliação, a partir da análise do art. 625-E, parágrafo único, da CLT etc., etc. 2. NOVOS PARADIGMAS PARA O DIREITO DO TRABALHO Muito se tem discutido a respeito dos novos rumos do Direito do Trabalho para o próximo milênio. Uns defendem a sua flexibilização; outros a sua extinção radical com volta ao contrato civil clássico, enquanto uma terceira corrente preconiza a sua modernização na busca de novos paradigmas para adaptação ao resultado das estruturais mudanças globais que vêm atingindo sem trégua todas as nações do mundo. O certo é que não mais se pode conceber a existência de um Direito do Trabalho de 50 anos atrás. As empresas vêm-se modernizando, os processos tecnológicos estão sendo implementados de forma absolutamente veloz e com isso ceifando milhões de postos de trabalho que antes eram regidos por uma relação de emprego clássica; categorias profissionais estão desaparecendo, como os bancários, os gráficos etc., enquanto outras surgem, porém, incrementadas por outros modelos, como as de prestação de serviços de toda espécie. Por conta disso temos o aumento incontrolável da massa de trabalhadores informais, uns em decorrência da característica da própria atividade que é incompatível com a subordinação clássica, enquanto outras que continuam sendo de emprego, entram a reboque nessa informalidade, com conseqüências desastrosas para a economia do país e para a própria sociedade. Tratando da modernização do contrato de trabalho no contexto globalizado, preleciona Nelson Mannrich1: 1. A modernização do contrato de trabalho, pp. 86/87. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 105 DOUTRINA As mudanças no cenário econômico mundial envolvem mais de uma revolução. Entre elas destaca-se a tecnológica, representada pelo avanço da informática, microeletrônica e biotecnologia. Quando se fala em tecnologia, faz- se referência à produção automatizada, onde a interferência do homem é inexistente ou mínima, e as tarefas repetitivas são substituídas por processos integrados, na onda da Terceira Revolução Industrial, verificada a partir dos anos 50. A utilização de novas tecnologias abriu espaço a novas formas de trabalho, com uso intensivo da microeletrônica e do trabalho a distância ou teletrabalho e intensificação do trabalho a domicilio, produzindo-se a habilidade no controle do sistema produtivo e não mais a habilidade no uso de máquina ou ferramenta. Na busca de adequação à nova realidade começam a surgir novos modelos ou paradigmas para o Direito do Trabalho brasileiro, sendo exemplos mais recentes no campo material as chamadas cooperativos de trabalho ou de mão-de-obra, os consórcios de empregadores e a intermediação de mão-de-obra por sindicatos. No âmbito da instrumentalização do Direito material temos hoje o denominado termo de ajustamento de conduta tomado ordinariamente pelo Ministério Público do Trabalho e a mais recente novidade que são as Comissões de Conciliação Prévia, cuja criação foi facultada pela Lei n° 9.958/2000, motivo central destas breves reflexões. 3. FINALIDADE DAS COMISSÕES DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA Diz o artigo 625-A, in fine, da CLT, que as Comissões de Conciliação Prévia têm a atribuição de tentar conciliar os conflitos individuais de trabalho entre patrões e empregados. Essa atribuição é extremamente importante na busca da solução extrajudicial dos conflitos individuais de trabalho, ao lado da função jurisdicional do Estado, e não como substitutivo desta. A possibilidade de criação das Comissões de Prévias ocorre num momento de real estrangulamento da capacidade jurisdicional trabalhista. Não que a função jurisdicional não seja importante, muito pelo contrário. Essa função é primordial e indispensável nos regimes democráticos de direito em que se torna pertinente a existência de válvulas de escape para se desafogar o Judiciário e permitir-lhe que preste a tutela respectiva de modo célere e eficaz, o que só pode ser concretizado quando o número de demandas, entre outros fatores, for razoavelmente aceitável e compatível com a capacidade de trabalho dos magistrados e demais atores responsáveis pela prestação jurisdicional trabalhista. Aqui não se pretende criticar a Justiça do Trabalho, a qual já prestou bons serviços ao modelo brasileiro de relações de produção, pois veio atender às duas realidades: a falta de diálogo entre empregados e empregadores e o autoritarismo patronal2, mas, 2. Cf. ROBORTELLA, Luiz Carlos Amorim, Mediação e arbitragem - solução extra-judicial dos confli tos do trabalho, in Rodolfo Pamplona Filho (coord.), Processo do trabalho — estudos em homenagem ao professor José Augusto Rodrigues Pinto, p. 206. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 106 DOUTRINA ao contrário, alertar para a necessidade de se aproveitar esta importante oportunidade de se lhe resgatar o verdadeiro papel como órgão especializado na solução de questões trabalhistas. Quando falamos em questões trabalhistas já estamos pensando numa Justiça que deverá aparelhar-se para conciliar e julgar não somente as questões decorrentes da tradicional relação de emprego, mas qualquer outra pendência resultante das relações de trabalho latu senso, como as providenciárias, acidentárias, do pequeno empreiteiro, os crimes contra a organização do trabalho, disputas de representação sindical etc., porque é ela o ramo do Judiciário mais vocacionado, pela experiência acumulada nos seus mais de 50 anos de existência, para dar a melhor solução para esses conflitos. Para isso, no entanto, é preciso que se lhe diminuam esse número assustador de demandas individuais sobre questões que estão muito mais afeitas à capacidade das partes. Não tem mais cabimento à entrada do terceiro milênio levar-se à Justiça do Trabalho pedidos de solução de simples questões disciplinares, pagamento de horas extras, intervalos de repouso, adicionais de insalubridade, etc., cujos valores arrecadados, depois de vários anos, são em muitos casos inferiores ao que o Estado desembolsa, como têm demonstrado várias estatísticas sobre os custos do processo trabalhista. Esse dinheiro gasto indevidamente pode muito bem ser aplicado agora com equipamentos, informatização e aparelhamento da Justiça trabalhista. Além disso, está implícita outra finalidade paralela das Comissões de Conciliação Prévia, que é, diminuindo-se o número de ações individuais, propiciar a concreção do procedimento sumaríssimo3, pois este, embora razoavelmente estruturado pela Lei 9.957/2000, só terá eficácia quando se tiver um número menor de reclamações; aliás, como se sabe, os dois projetos de lei - das comissões e do procedimento sumaríssimo foram discutidos conjuntamente, cujo objetivo final de ambos era encontrar fórmulas para permitir à Justiça do Trabalho atuar de forma célere e eficaz, pois como mais uma vez alerta Robortella, outrora o empregado ameaçava o patrão com uma reclamação na Justiça do Trabalho; na atualidade, o patrão é que o ameaça com a demorada solução judicial, fruto das deficiências do sistema judiciário4, levando o empregado reclamante a aceitar acordos judiciais irrisórios, motivados pela premente necessidade de sobrevivência e pela expectativa de longa demora na solução judicial do conflito. Mas não é só isso: essas comissões, que em princípio têm a função de buscar conciliar os conflitos individuais de trabalho, servirão para estabelecer o diálogo direto e imediato entre patrão e empregado, não só no tocante aos conflitos individuais, mas 3. Nesse sentido manifestou-se o Presidente do C.TST, min. Wagner Pimenta, lembrando que a rapidez que se espera da Justiça do Trabalho só poderá ser alcançada, no entanto, com o funcionamento simultâneo das comissões de conciliação prévia, nos locais de trabalho ou nos sindicatos. Só assim se poderá descongestionar o Judiciário trabalhista e permitir que as causas sejam decididas com a rapidez que todos desejam (http://www.tst.gov.br/ASCS/noticias.html). 4. Op. cit., p. 207. Rev, TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 107 DOUTRINA também referentemente aos coletivos, como ocorre nos Núcleos Intersindicais de Conciliação Trabalhista que atuam em algumas regiões do país5, inclusive esclarecendo empregados e empregadores sobre seus direitos e obrigações, além de outros objetivos que lhes são inerentes6. Com efeito, o mais importante de tudo é que as referidas comissões efetivarão realmente a representação direta dos trabalhadores nos locais de trabalho e tenderão a melhorar as relações entre empregados e empregadores; esse paradigma há muito vem inspirando os modelos internacionais de modernas relações de trabalho, pois é certo que o representante dos trabalhadores nos locais de trabalho terão melhores condições, pela convivência diária entre patrões e empregados e conhecimento direto dos fatos, de encontrar soluções mais rápidas e efetivas para os problemas surgidos no dia-a-dia das relações laborais, o que supera em qualidade qualquer modelo tradicional de sindicalismo que em muitos casos já não corresponde mais às aspirações e necessidades dos trabalhadores. A representação dos trabalhadores nos locais de trabalho representa a mais completa liberdade sindical, pois tal, como preconizada pelo Direito internacional e pelas democracias modernas é aquela que contempla de forma unitária e indissolúvel o direito à ação coletiva a partir dos locais de trabalho, mediante inclusive uma objetiva legislação nesse sentido, em face da natural e até compreensível resistência dos empregadores7. Com isso, estar-se-á também prevenindo a ocorrência de conflitos, o que é bom para a empresa, que evita futuros passivos trabalhistas e diminui o custo final dos processos, os quais, se forem até o TST, triplicam o seu valor com relação ao que é devido ao empregado. Por isso, no setor financeiro, onde já se vem experimentando com sucesso os órgãos de conciliação de conflitos individuais de trabalho, a filosofia patronal é no sentido de, apurando-se que o valor pleiteado pelo empregado é realmente devido, 5. Cf. VASCONCELLOS, Antonio Gomes e GALDINO Dirceu, Núcleos intersindicais de conciliação trabalhista, pp. 141/142. 6. São objetivos específicos do NINTER: a) solucionar conflitos trabalhistas de menor complexidade e valor através da institucionalização privada da MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM VOLUNTÁRIAS; b) prestar a assistência sindical prevista no art.477/CLT; c) diagnosticar permanentemente os problemas trabalhistas locais com vista à melhoria, racionalização e aperfeiçoamento das relações de trabalho locais através do estimulo à negociação coletiva conducente à modernização e adequação da legislação trabalhista às peculiaridades regionais; d) incentivar a boa-fé nas relações de trabalho e o cumprimento de direitos trabalhistas por trabalhadores e empregadores através da conscientização e esclarecimento dos mesmos; e) conscientizar e informar trabalhadores e empregadores acerca de matérias trabalhistas de seu interesse; f) promover o diálogo e o intercâmbio entre Sindicatos e Justiça do Trabalho locais, através de ações conjuntas com fim de alcançar os objetivos do Núcleo (Antonio Gomes Vasconcelos, Os núcleos intersindicais como agentes de transformação das relações de trabalho e da administração da Justiça - aspectos processuais, in Márcio Túlio Viana e Luiz Otávio Linhares Renault (coords.), O que há de novo em processo do trabalho, pp. 330/331. 7. Cf. SIQUEIRA, José Francisco Neto, Liberdade sindical e representação dos trabalhadores nos locais de trabalho no Brasil - Obstáculos e desafios, 25. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 108 DOUTRINA o mesmo é pago na sua totalidade, o que ainda resta barato para o empregador; somente quando houver divergência e dúvida é que o pleito se submete à transação8. Para o trabalhador é bom, porque este terá seus direitos respeitados, ou quando não, reparados com mais rapidez e segurança. Isso é importante não só para estabelecer uma cultura educativa negocial mas também para criar verdadeira parceria entre patrão e empregado, sepultando a filosofia do conflito, que tem dominado a nossa cultura e leva esses atores sociais ao enfrentamento muitas vezes como verdadeiros inimigos, quando na verdade, embora cada um tenha interesses próprios e inerentes aos seus papéis, devem encarar-se como parceiros num processo de produção cada vez mais complexo e competitivo. Eis, em breve análise, a finalidade das Comissões de Conciliação Prévia, que deve servir de norte para o enfrentamento das questões correlatas à sua executoriedade prática, a seguir analisadas, como a sua constituição, a estabilidade dos membros eleitos pelos empregados, a cobrança de taxa pelos serviços prestados, a constitucionalidade da obrigatória conciliação e o efeito liberatório do termo de acordo obtido, entre outros. 4. ALGUMAS QUESTÕES DE ORDEM PRÁTICA A possibilidade de criação de Comissões de Conciliação Prévia pela Lei 9.95 8/2000 significa importante novidade porque pode vir a representar uma verdadeira revolução no sistema de relações de trabalho, até então marcado pelo corporativismo clássico, baseado exclusivamente na proteção estatal. Para o seu êxito, no entanto, precisamos enfrentar muitos problemas, desde aqueles de cunho filosófico, ideológico e corporativista, até os de ordem processual e procedimental9. Porém, há duas alternativas: manter o modelo atual, sempre pensando que o Estado, com a sua máquina burocrática e ultrapassada, ainda é o melhor defensor do trabalhador ou então apostar em mecanismos novos, que, para atingir resultados positivos, inexoravelmente terão que superar alguns preconceitos - até naturais, porque toda mudança significativa provoca rejeição. Preferimos a segunda alternativa, porque, por princípio, entendemos que é melhor errar por ação do que por omissão. Os problemas são muitos, mas com bom senso e precaução podemos enfrentá-los, tendo como norte o interesse público geral que, como estabelece o artigo 8°, da CLT, deve sempre prevalecer sobre o interesse de classe ou particular. 8. Cf. ROSSI, Alencar, em palestra proferida no Ministério Público do Trabalho da 15ª Região, em Campinas, em 13/03/2000, no Seminário promovido pelo Sindicato das empresas de transportes coletivos de Campinas, sobre Comissões Prévias de Conciliação e o procedimento sumaríssimo. 9. Cf. CASTELO, Jorge Pinheiro, Comissão de conciliação prévia - filosofia, ideologia e interesses envolvidos na Lei, inconstitucionalidades, perplexidades e situações especificas - limitações, exceções e alternativas, p. 446. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 109 DOUTRINA 4.1 Criação e instalação das Comissões de Conciliação Prévia Estabelece o artigo 625-A da CLT que as empresas e os sindicatos podem instituir Comissões de Conciliação Prévia, de composição paritária, com representantes dos empregados e dos empregadores, com a atribuição de tentar conciliar os conflitos individuais do trabalho. Acrescenta o § único que as comissões referidas no caput deste artigo poderão ainda ser constituídas por grupos de empresas ou ter caráter intersindical. Do disposto na lei decore que quatro são os tipos de Comissão de Conciliação Prévia, a saber: a) de empresa; b) por grupo de empresas; c) empresa/sindicato e d) intersindical. Na empresa a comissão pode ser instituída por livre decisão patronal, sem qualquer interferência sindical, salvo para fiscalizar a eleição dos representantes dos trabalhadores, conforme assegura o art. 625-B da CLT. Essa comissão terá uma composição mínima de 2 e máxima de dez representantes, sendo metade eleita pelos empregados e a outra metade indicada pelo empregador. À comissão de grupo de empresas aplicam-se as mesmas regras a que se submetem as comissões de empresa, podendo, no entanto, envolver empresas da mesma ou de atividades variadas. Tudo vai depender da decisão dos empregadores interessados. A comissão empresa/sindicato será constituída por consenso entre o sindicato profissional e uma ou várias empresas, mediante normas estabelecidas em acordo coletivo de trabalho. É o acordo coletivo que vai definir as normas sobre tais comissões, como o número de representantes, estabilidade, eleição dos membros, etc. A comissão intersindical também será constituída por decisão consensual entre patrões e empregados, da mesma forma que a comissão empresa/sindicato, apenas com a diferença de amplitude, porquanto nesta os interlocutores são os sindicatos profissionais e patronais e a sua abrangência pode referir-se a uma única ou a várias categorias econômicas e profissionais. Tudo, mais uma vez, vai depender da disposição das partes10. Embora quatro sejam os tipos de comissão, a mais importante, em termos de objetivo a ser alcançado, é a comissão por empresa, porque os representantes são eleitos no local de trabalho pelos companheiros. Tais representantes são, em tese, os mais legítimos, porque vivenciam diariamente os problemas nos locais de trabalho, têm melhores condições para buscar soluções adequadas e condizentes com a realidade e anseio dos companheiros e do próprio empregador. Não obstante isso, já se vê na prática com mais intensidade a criação de comissões intersindicais, sob o argumento de que os sindicatos profissionais precisam, pelo menos num primeiro momento, ter maior controle sobre as comissões para evitar que tais instrumentos convertam-se em meios contrários aos interesses dos trabalhadores, o que pode ocorrer com as comissões criadas e controladas pelas empresas, apenas para resolver seus problemas de passivo trabalhista. 10. Cf. PASSOS, Edésio, Alterações na CLT - Leis n°s 9.957 e 9.958/2000, passim. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 110 DOUTRINA Outra preocupação diz respeito à formação dos conciliadores eleitos pelos trabalhadores, que realmente é necessária para um melhor desempenho do papel que lhes é atribuído. Assim, quanto maior o número de comissões, maior serão as dificuldades de preparação de quadros. Só o tempo, no entanto, dirá qual o melhor tipo de comissão e sobre os mais graves problemas que decorrerão de cada um deles, sendo certo, porém, que nenhuma comissão pode destinar-se a atender os interesses econômicos das empresas nem políticos dos sindicatos, principalmente daqueles que não representam dignamente as respectivas categorias e, agora, sentem-se ameaçados pela atuação de uma possível representação verdadeira dos trabalhadores. De qualquer forma é salutar que qualquer que seja o tipo de comissão, a sua criação, constituição e normas regimentais decorram do consenso entre patrões e empregados, se se quiser mesmo utilizar-se desse instrumento como forma de modernização das relações de trabalho. 4.2 Estabilidade provisória dos membros eleitos pelos empregados O artigo 625-B, incisos e §§, tratam da estabilidade provisória dos membros titulares e suplentes eleitos pelos empregados para a comissão de empresa ou de grupo de empresas, de cujas peculiaridades trataremos neste item. De acordo com tais disposições, somente os representantes dos empregados, titulares e suplentes, são detentores da estabilidade provisória. Essa garantia visa à proteção individual daquele que se candidata ao cargo de represente dos trabalhadores, diante das eventuais ameaças de demissão ou outros tipos de perseguição em razão do exercício da função de conciliador, pois é preciso que o conciliador aja com liberdade para bem desempenhar o seu mister. Mas também tem finalidade coletiva perante a categoria dos trabalhadores, porque tais representantes estão a serviço dos seus companheiros de trabalho. Embora o § 1° do art. 625-B da CLT diga que é vedada a dispensa dos representantes titulares e suplentes dos empregados na comissão, até um ano após o término do mandato, que é de um ano, essa garantia, por óbvio, inicia-se com a candidatura e vai até um ano após o término do mandato, se eleito, ou até a conclusão do processo eleitoral, para aqueles que não se elegerem. Não teria sentido imaginar uma estabilidade apenas a partir da posse. À hipótese, por analogia, aplica-se o mesmo entendimento a respeito da garantia de emprego do dirigente sindical e do cipeiro, conforme estabelecem os artigos 8o, inciso VIII, e 10°, inciso II, letra “a”, da CF e das DCT, respectivamente, porque tanto aqueles como os membros da comissão de conciliação têm papel de representação da categoria profissional, sendo, portanto, o objetivo da garantia proteger os mesmos. É importante notar que a lei desta vez foi clara ao assegurar tal garantia também aos suplentes (§ 1° do art. 625-B da CLT), para evitar alguns anos de discussão na doutrina e jurisprudência, como ocorreu com os suplentes da CIPA, que somente depois de muitas divergências assentou-se o entendimento no TST, pelo Enunciado 339 e no STF, por vários julgados, preconizando a extensão da estabilidade ao suplente . Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 111 DOUTRINA O prazo do mandato, como estabelece a lei, é de um ano, sendo permitida uma única reeleição, o que é salutar para evitar o encastelamento no posto que, a pretexto de maior experiência, pode acarretar desvirtuamento no exercício correto do cargo. Isto, no entanto, refere-se à reeleição sucessiva, ou seja, caso haja um interregno entre um e outro mandato pode um mesmo membro ocupar o cargo de conciliador por mais de duas vezes, conforme é o entendimento com relação ao cipeiro, cujo artigo 164, § 3°, da CLT também fala de uma reeleição. Como se vê, não gozam da garantia os representantes indicados pelo empregador. Em princípio parece lógico não terem estes garantia no emprego em razão do cargo, porque são indicados pelo empregador. No entanto, pensamos que tal garantia deveria ser estendida a todos os membros da comissão para que realmente a conciliação fosse realizada com total liberdade e assim o seu objetivo seria atingido mais facilmente, pois o verdadeiro conciliador não pode representar interesses nem de uma nem de outra parte; a sua posição deve ser neutra, o que na hipótese não acontecerá porque pelos menos os membros indicados pelo empregador estarão a ele vinculados e subordinados, sendo natural, como regra, a sua parcialidade no dia-a-dia das funções. Exemplo já consagrado no nosso sistema diz respeito aos representantes dos empregadores nas CIPAs (Comissões Internas de Prevenção de Acidentes), os quais, com raríssimas exceções, representam verdadeiramente os interesses do empregador e deixam de cumprir o seu verdadeiro papel, que é defender e prevenir o meio ambiente do trabalho, cujo resultado são os altos índices de acidentes do trabalho que colocam o Brasil no 10° lugar no ranking mundial em infortúnios do trabalho. A melhor solução para nós seria diminuir o número máximo de membros, de dez, e assegurar a todos os integrantes da comissão a referida garantia, o que, sem nenhum problema, pode ser feito pela empresa ou grupo de empresas que têm liberdade para estabelecer o número de membros de dois até dez. Quando se tratar de comissão de empresa/sindicato ou intersindical, a solução e adequação do problema dependerão exclusivamente das tratativas levadas a efeito no acordo ou na convenção coletiva de trabalho. Com efeito, a lei somente cuidou de assegurar à estabilidade provisória e demais procedimentos para as comissões criadas pela empresa ou por grupos de empresas unilateralmente, com o objetivo de não prejudicar os trabalhadores. Para as demais comissões criadas mediante negociação coletiva, a lei (Art. 625-C da CLT) deixou ao livre-arbítrio das partes a fixação do número de membros, estabilidade, prazo do mandato, reeleição, forma do escrutínio, etc., o que é salutar e representa importante confiança depositada nas partes, cujo resultado final dependerá evidentemente do bom-senso e amadurecimento das mesmas. Os detentores da estabilidade provisória de que trata o § 1° do artigo 625-B da CLT somente poderão ser dispensados se cometerem falta grave, nos termos da lei. Isto significa que somente após decisão final da Justiça do Trabalho que julgue procedente inquérito ajuizado pela empresa, é que esta poderá dispensar o trabalhador membro da comissão. Para tanto, terá que ajuizar inquérito para apuração de falta grave, no prazo de trinta dias a partir da suspensão do empregado, caso esta ocorra, ou, Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 112 DOUTRINA imediatamente à ciência da falta cometida, se este permanecer no emprego. O procedimento adotado será o do artigo 853, e seguintes, da CLT, conforme orientação jurisprudencial do TST (Precedente n° 114 da SDI) e do STF (Súmulas 197 e 403). Mediante o poder geral de cautela, que é conferido ao juiz pelo CPC (art. 798) e pela Constituição Federal (art. 5o, inciso XXXV) e, especialmente, pelo inciso X do artigo 659 da CLT, ao juiz do trabalho, pode este, conforme o caso, conceder medida liminar de reintegração de membro de Comissão de Conciliação Prévia, até decisão final da ação que discuta a alegação de falta grave. 4.3 A conciliação prévia obrigatória Da análise dos artigos 625-D e §§ 2o e 4° e 625-H da CLT decorre clara a determinação do legislador no sentido de que, havendo Comissão de Conciliação Prévia, Comissão Sindical ou Núcleo Intersindical de Conciliação Trabalhista em funcionamento na localidade do conflito, qualquer demanda (leia-se reclamação trabalhista) somente será levada à Justiça do Trabalho depois de submetida a um desses órgãos, ou seja, havendo órgão conciliador na localidade do conflito, este deverá ser submetido à conciliação prévia, o que significa dizer que o legislador criou, além de outros já existentes, mais um pressuposto processual ao ajuizamento da ação trabalhista individual. Com efeito, diz a Constituição Federal, inciso XXXV, do art. 5o, que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, consagrando, assim, o chamado direito de ação como pressuposto fundamental do princípio da legalidade. Daí pretenderem alguns inquinar a Lei n° 9.958/2000 de inconstitucional, entendendo que a tentativa de conciliação prévia obrigatória representa vedação ao direito de acesso à Jurisdição. De nossa parte, ressalvando o devido respeito por tais manifestações, entendemos que inexiste na espécie qualquer mácula de inconstitucionalidade. É que a juntada à petição inicial de declaração de tentativa de conciliação frustada, como documento indispensável à propositura da ação (art. 283 do CPC), significa apenas mais um pressuposto processual, o qual, não atendido, leva ao indeferimento da petição inicial, depois de esgotado o prazo assinado pelo juiz para o cumprimento de tal providência (art. 284 CPC)11. 11. É salutar que o juiz assine prazo ao autor para que junte aos autos a prova de que se submeteu à conciliação prévia; neste caso a conciliação tanto pode já ter ocorrido como ser realizada após o ajuizamento da reclamação, sendo necessário para tanto que o autor informe o fato ao juiz para que este sobreste o feito pelo prazo necessário à tentativa compositiva extrajudicial. Para melhor atender a um dos objetivos da Lei, que é a celeridade processual, seria de bom alvitre que se fizesse um saneador da petição inicial, o que, no novo procedimento sumário é indispensável, embora a Lei não o exija expressamente, para, observando-se a falta da certidão negativa de conciliação ou de outro documento indispensável, a secretaria da Vara trabalhista expedir notificação ao autor desde já para o cumprimento da providência, sem prejuízo da designação da audiência inicial, se for o caso, pois como se sabe, na maioria das Varas Trabalhistas esta não está sendo realizada em prazo muito curto. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 113 DOUTRINA A exigência desse pressuposto, no entanto, não significa vedação ao direito de ação, porque ao legislador infraconstitucional está reservada a competência para criar pressupostos processuais, desde que os mesmos não impeçam o exercício do direito de ação12. No caso, a juntada da certidão negativa de conciliação corresponde a um pressuposto processual de validade da relação processual, que é a petição inicial apta para o conhecimento da demanda13. Como doutrina Vicente Greco Filho14, é um simples pressuposto objetivo que significa a existência de fato impeditivo, como ocorre com o compromisso arbitrai (art. 267, inciso VII). Desta forma, a decisão que extinguir o feito por indeferimento da petição inicial, como é obvio, não resolverá a lide, nem entrará sequer na análise das condições da ação, cabendo, portanto, a sua repetição desde que se corrija o defeito que levou à extinção do feito. Isso, todavia, nunca foi considerado como empecilho e muito menos como vedação ao exercício do direito de ação. Exemplo de efetiva vedação a esse direito, que envergonhou o nosso país, ocorreu na fase da ditadura militar, com a edição do Ato Institucional n° 5, de 13/12/1968, cujo artigo 11 estabelecia peremptoriamente que ficavam excluídos de qualquer apreciação judicial todos os atos praticados de acordo com aquele ato institucional e seus atos complementares, bem como os respectivos efeitos, o que nem de longe configura a hipótese vertente. No caso da presente lei, o que se requer é a mera tentativa de conciliação prévia, ou seja, que o autor submeta sua demanda previamente ao órgão conciliador existente na localidade (se existente, uma vez que a sua constituição não é obrigatória), o qual terá o prazo de dez dias para tentar a conciliação, ressalvando-se dessa exigência os motivos impeditivos relevantes, justificados na petição inicial (§ 3° do art. 625-D da CLT), hipótese em que o autor estará liberado da juntada de declaração negativa de conciliação. Também, para não prejudicar o empregado, teve o legislador o cuidado de suspender o prazo prescricional durante o período de tramitação da conciliação (CLT, art. 625-G). É preciso, portanto e sem rodeios, compreender-se sobre o verdadeiro conteúdo do acesso à jurisdição, o qual não se identifica com a mera admissão ao processo ou possibilidade de ingresso em juízo. Para que haja efetivo acesso à Justiça é indispensável que se garanta ao autor e ao réu meios concretos e eficazes para a solução justa do conflito levado a juízo. E isso, como é notório, não vem ocorrendo, como regra geral, na Justiça do Trabalho, quando o trabalhador procura a reparação dos seus direitos trabalhistas; é, pois, inaceitável que uma demanda de natureza alimentar demore cinco, 12. GRECO, Vicente Filho, Direito processual civil brasileiro, vol. I, p. 58. 13. NERY, Nelson Júnior e Rosa Maria Andrade Nery, Código de processo civil comentado, nota 5 ao art. 267, IV, p. 474. 14. Op. cit., vol. 2, p. 58. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 114 DOUTRINA seis ou mais anos para ser solucionada e, em muitos casos, sem resultado prático no que diz respeito à execução, que significa, na verdade, a concretude da prestação jurisdicional. Isso, sim, representa realmente não simples empecilho, mas verdadeira denegação da tutela jurisdicional, a qual para ser justa e concreta tem que ser célere. O processo, como ninguém pode negar, é um instrumento de aplicação do Direito material violado, o qual, não cumprindo o seu papel, torna-se um instrumento inútil e até odiado pelo jurisdicionado, que vê o seu direito tornar-se algo ineficaz. Aqui é oportuna a lição de Norberto Bobbio15, quando alerta para o fato de que uma coisa é falar dos direitos do homem, direitos sempre novos e cada vez mais extensos, e justificá-los com argumentos convincentes; outra coisa é garantir-lhes uma proteção efetiva. Para a efetividade do processo como instrumento de concreção do Direito material e pressuposto do direito de ação, é indispensável a observância das regras que consubstanciam o devido processo legal, para que possam as partes participar intensamente da formação do convencimento do juiz, em pé de igualdade16. Isso, também, em regra geral, não vem ocorrendo no nosso tradicional processo do trabalho, onde a desigualdade das partes é patente, e o autor, premido pela necessidade de obter verba alimentar e, sem condições de bancar a longa espera pela solução jurisdicional, é obrigado a aceitar acordos prejudiciais e até vexatórios, que atentam não só contra o direito de ação, mas, contra a própria dignidade da pessoa humana, tudo por causa da avalanche de ações individuais que tumultuam o Judiciário e provocam a insuportável demora da solução estatal. O Direito, para cumprir sua função, precisa ser operacional e funcional, devendo, para tanto, buscar alternativas válidas e eficazes numa retrospectiva de valores, cujo exemplo são as novas formas de solução dos conflitos trabalhistas fora do Judiciário, como alternativa válida para a efetivação do direito positivo material violado. Um dos princípios das nulidades processuais é a existência de prejuízo factível e concreto. No caso de tentativa de conciliação prévia, qual prejuízo estaria sofrendo o autor? A espera de dez dias, que é o prazo atribuído à Comissão Prévia para tentar a negociação (CLT, art. 625-E)? Não, isso não pode ser considerado como um prejuízo, a ponto de macular de inconstitucional a referida norma legal. Primeiro, porque ele não é obrigado a aceitar a conciliação; segundo, porque o exíguo prazo de dez dias para tramitação da conciliação é absolutamente insignificante diante do tempo que terá o trabalhador que esperar pela solução judicial; terceiro, porque se deve considerar a conciliação extrajudicial não como um substitutivo da função jurisdicional, mas, como uma alternativa colocada à disposição das partes para a solução rápida, simples e barata dos seus conflitos, fora da esfera judicial. 15. A era dos direitos, p. 63. 16. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini e DINAMARCO, Cândido R., Teoria Geral do Processo, p. 36. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 jul/set 2000 115 DOUTRINA Ademais disso, é de se salientar que a criação dos órgãos de conciliação por trabalhadores e empregadores é facultativa17 (CLT, art. 625-A), como também é facultativa a convenção de arbitragem no nosso sistema jurídico (art. 114 da Constituição e Lei n° 9.307/96), o que já é suficiente para afastar qualquer inconstitucionalidade. Por oportuno, cabe lembrar a existência, no nosso sistema jurídico, de alguns pressupostos processuais semelhantes, que, não obstante isso, nunca foram inquinados de inconstitucionais. Eis alguns deles: a) a prévia negociação coletiva como pressuposto para o ajuizamento da ação de dissídio coletivo (arts. 114, § 2o, da CF e 616, §§ 2o e 3o, da CLT); b) o transcurso de um ano para o ajuizamento da ação revisional de dissídio coletivo (CLT, art. 876); c) o esgotamento das instâncias desportivas privadas nos casos de disciplina e competições, nos termos da lei (CF, art. 217, § 1o)18 e d) o depósito prévio de 5% sobre o valor da causa, para o ajuizamento da ação rescisória no cível (CPC, art. 488, inciso II). A conciliação, tanto quanto a arbitragem, são formas equivalentes jurisdicionais, como diz Carnelutti, e, optando as partes por elas, não há falar em qualquer inconstitucionalidade, porque, como é preciso ressaltar, a negociação coletiva foi prestigiada pela Constituição, que para sua validade promoveu o sindicato como partícipe obrigatório do seu processo, como condição de validade da avença (art. 8o, inciso II). Assim, se as partes negociam coletivamente a criação da Comissão Conciliatória, como instrumento prévio para tentativa da solução do conflito individual fora do Judiciário (e não obrigação), nenhuma inconstitucionalidade existe capaz de macular a sua efetivação. Pertinentes são as manifestações seguintes, em apoio ao que até aqui sustentamos com relação à constitucionalidade das Comissões de Conciliação Prévia e do respectivo termo negativo de conciliação, este, como pressuposto para o ajuizamento da reclamação trabalhista individual: A mediação, por outro lado, deve ser instituída de modo a se transformar em condição " sine qua" em ajuizamento de qualquer ação judicial. Não se estará com isso, vedando o acesso ao Judiciário, mas sim condicionando-o à ausência de acordo. Realmente, a garantia constitucional de acesso ao Judiciário não se tem traduzido, na prática, em direito à prestação jurisdicional concreta do Estado, dada a lentidão dos processos, tornando-se, muitas vezes, fórmula vazia de sentido19. A pretensa inconstitucionalidade, vislumbrada por alguns, na obrigatoriedade da passagem prévia da demanda perante a comissão de conciliação, não tem qualquer 17. No nosso entendimento, pedagogicamente e para quebrar a cultura antinegocial, a criação das Comissões de Conciliação Prévia deveria ser obrigatória pelo menos para empresas a partir de 50 empregados, como constava do projeto original, como ocorre na Argentina, para todos os conflitos, conforme Lei n° 25.573/95, art. 1°. 18. Nelson Nery Junior, Princípios do processo civil na Constituição Federal, p. 95, 19. Cf. ROBORTELLA, Luiz Carlos Amorim, Mediação e arbitragem - solução extra-judicial dos conflitos do trabalho, in Rodolfo Pamplona Filho (coord.), Processo do trabalho - estudos em homenagem ao professor José Augusto Rodrigues Pinto, p. 217. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 116 DOUTRINA procedência. As comissões de conciliação prévia não constituem óbice ao acesso ao Judiciário, assegurado pelo art. 5°, XXXV, da Constituição Federal, na medida em que são apenas instâncias prévias conciliatórias, em que a comissão deve dar resposta à demanda em 10 dias (CLT, art. 625-F), o que, de forma alguma, representa óbice ao acesso ao Judiciário. O próprio Supremo Tribunal Federal, em questão análoga, referente à imposição, por lei, da necessidade do postulante de beneficio comunicar ao INSS a ocorrência do acidente, como condição da ação indenizatória, com vistas a uma possível solução administrativa da pendência, entendeu que não há inconstitucionalidade na criação da condição (cfr. RE 144.840-SP, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 02.04.96, informativo n° 25 do STF). Assim, não há que se pretender seja inconstitucional a passagem obrigatória dos litigantes na comissão conciliatória prévia. Assim, a nova lei exige que, nas localidades ou empresas onde houver comissão de conciliação prévia instituída, o empregado apresente sua demanda à comissão para apreciação prévia (CLT, art. 625-D), constituindo a exigência pressuposto processual paro o ajuizamento de ação trabalhista, caso não seja bem sucedida a conciliação. A negociação prévia passará a ser exigida tanto para os dissídios coletivos quanto para os dissídios individuais, como forma de se prestigiar as soluções autônomas dos conflitos trabalhistas20. Sem mesmo querer discutir a validade e obrigatoriedade da fase administrativa anterior à judicial, o que me parece não ser, em principio, inconstitucional, pois preserva-se o direito de apreciação pelo Poder Judiciário da lesão, exigindo-se, apenas, fase prévia de conciliação, o que me parece inconstitucional é a exigência discriminatória, em razão da faculdade de imposição das referidas Comissões21. A verdade é que, diante da crise com que nos deparamos do Judiciário Trabalhista, assolado com demandas e mais demandas, sem qualquer outra válvula de escape, a necessidade de meios alternativos, mesmo que obrigatórios e prévios, é cristalina, mormente diante da "cultura judicial” até o momento vigente. A triagem que a conciliação extrajudicial pode propiciar, nesse caso, é de grande valia para a solução do problema. E uma vez garantido o direito de ação para os casos em a conciliação se mostre infrutífera, ou mesmo, para a anulação de eventuais transações viciadas, afasta definitivamente a alegação de inconstitucionalidade da exigência22. A exigência legal do empregado somente poder acionar a Justiça do Trabalho, após submeter a demanda à Comissão Prévia de Conciliação existente na localidade, poderá gerar discussão quanto a sua inconstitucionalidade, ante o direito de acesso ao Judiciário garantido constitucionalmente. Entretanto, entendemos que não há inconstitucionalidade, pois o que a Constituição garante é o direito de demandar, sendo 20. GANDRA, Ives da Silva Martins Filho, A Justiça do Trabalho do ano 2000: As Leis n°s 9.756/1998, 9.957 e 9.958/2000, a Emenda Constitucional n° 24/1999 e a reforma do Judiciário, p. 166. 21. MACIEL, José Alberto Couto, Comentários à Lei n° 9.958, de 12 de janeiro de 2000, p. 178. 22. HADAD, José Eduardo, As comissões de conciliação, o procedimento sumaríssimo e a crise do Judiciário Trabalhista, p. 189. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 117 DOUTRINA o direito de ação condicionado ao preenchimento de certos requisitos que podem ser estabelecidos em lei infraconstitucional23. Veja-se, também sobre o tema, as importantes opiniões de Eduardo Gabriel Saad24, Estêvão Mallet25, entre outros doutrinadores renomados. Pelo exposto, concluímos este item afirmando a inexistência de inconstitucionalidade quanto à conciliação prévia obrigatória nos dissídios individuais trabalhistas, ressaltando, por necessário, que ofensa ao direito de ação está de fato ocorrendo quando o Estado não presta a tutela jurisdicional de forma adequada, eficaz e justa, o que é hoje uma realidade insofismável no âmbito trabalhista, com reconhecido prejuízo para o trabalhador. De qualquer modo, a passagem do empregado pela conciliação prévia representa, acima de tudo, um ato pedagógico na busca do diálogo direto entre empregado e empregador, visando a concretização de importante paradigma para as modernas relações de trabalho. 4.4 Alcance do efeito liberatório do termo de conciliação O parágrafo único do art. 625-A da CLT estabelece que o termo de conciliação é título executivo extrajudicial e terá eficácia liberatória geral, exceto quanto às parcelas expressamente ressalvadas. Qual, a partir da redação do dispositivo acima, o alcance da expressão eficácia liberatória geral? Numa leitura apressada e por interpretação meramente gramatical, é possível que se chegue a um entendimento de que essa liberação é geral quanto ao contrato de trabalho, ou seja, se patrão e empregado assinarem um termo de acordo perante a comissão ou outro órgão conciliador, nada mais poderá aquele pleitear perante a Justiça do Trabalho. Outro entendimento possível é o de que a eficácia liberatória é geral, alcançando as partes, mas apenas quanto ao objeto discutido e avençado perante o órgão conciliador. Ficamos com o segundo entendimento. Isso porque o processo de interpretação meramente filológico ou gramatical é, como ensina Carlos Maximiliano, o menos compatível com o progresso, por ser o mais antigo e apegar-se às palavras, o que, tanto no Direito como em tudo, caracteriza a falta de maturidade do desenvolvimento intelectual. E, concluindo suas lições sobre a interpretação gramatical, chamando-a de retrógrada e judaica, diz o festejado jurista que nunca será demais insistir sobre a crescente desvalia do processo filológico, incompativelmente inferior ao sistemático e ao 23. FIGUEIRÒA, Narciso Júnior, As recentes alterações na legislação trabalhista-Leis n°s 9.957 e 9.958 de 12 de janeiro de 2000, p. 200. 24. Comissões de Conciliação Prévia - teoria e prática, p. 42. 25. Primeiras linhas sobre as comissões de conciliação, pp. 444/445. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 118 DOUTRINA que invoca os fatores sociais, ou o Direito comparado. E ainda: Saber as leis é conhecer-lhes, não as palavras, mas a força e o poder, isto é, o sentido e o alcance respecti- 26 VO . Ao contrário da utilização do processo meramente gramatical, como ensina Miguel Reale27, o primeiro cuidado do hermeneuta contemporâneo consiste em saber qual a finalidade social da lei, no seu todo, pois é o fim que possibilita penetrar na estrutura de suas significações particulares. O que se quer atingir é uma correlação coerente entre "o todo da lei ”e as " partes " representadas por seus artigos e preceitos, à luz dos objetivos visados e que o fim da lei é sempre um valor, cuja preservação ou atuação o legislador teve em vista garantir, armando-o de sanções, assim como também pode ser fim da lei impedir que ocorra um desvalor. Assim, ao invés de se fixar na leitura e na interpretação gramatical isolada de um dispositivo, deve-se valer dos processos orgânico, sistemático e finalístico, para numa compreensão geral, alcançar o verdadeiro objetivo da lei, que é sempre um valor nobre. A nobreza das Comissões de Conciliação Prévia está exatamente em encontrar fórmulas adequadas e rápidas de solução de conflitos individuais de trabalho, de maneira equilibrada, sem acarretar prejuízos a uma ou a outra parte; essa nobreza não seria alcançada se se entendesse que a conciliação de um conflito qualquer seria suficiente para quitar o contrato de trabalho! Ademais, como pertinentemente alerta o juslaboralista Amauri Mascaro Nascimento, o Direito do Trabalho deve ser interpretado segundo a jurisprudência axiológica ou de valores, cumprindo ao aplicador determinar os interesses que a norma jurídica visa dirimir e, pondo um em confronto com o outro, avaliá-los, de acordo com os juízos que se deduzem da lei ou que chegaram ao seu conhecimento. Nessa escala de valores, não é possível deixar de reputar os sociais como mais importantes que os individuais, os coletivos mais importantes que os particulares28. Ora, é indiscutível que um dos fins das Comissões de Conciliação Prévia é aproximar as partes da relação de trabalho - empregado e empregador - na busca de um acordo que represente um resultado bom para ambos; não foi visado pelo legislador o objetivo de proteger uma das partes em detrimento da outra. Desta forma, seria desarrazoado entender que o empregado que buscou a comissão para solucionar um conflito trabalhista envolvendo horas extras, por exemplo, após compor-se com seu empregador, durante ou após a rescisão contratual, estaria impedido de pleitear perante a Justiça do Trabalho ou mesmo na própria comissão, outros direitos oriundos do contrato de trabalho, que não foram levados em conta quando da avença. Imagine-se a hipótese em que a conciliação envolva a anulação de uma punição disciplinar, por exemplo, uma suspensão de três dias e, depois, o empregado venha a reclamar equiparação salarial com um outro colega de trabalho, deparando-se com a 26. Hermenêutica e aplicação do Direito, p. 122. 27. Lições preliminares de direito, pp. 285/86. 28. Curso de Direito do Trabalho, p. 187. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 119 DOUTRINA alegação de que, com aquela avença anterior, houvera dado quitação geral ao seu empregador de todos os direitos trabalhistas!! Não é minimamente razoável a defesa desse entendimento!!! Agora, de outro lado, pense-se na situação em que o empregador se concilia com seu empregado perante a comissão, com relação à pretensão de diferenças salariais pela equiparação com outro companheiro de trabalho e, tempos depois, terá que enfrentar uma reclamação trabalhista sobre o mesmo objeto discutido e o juiz, procurando “um ponto de equilíbrio”, após julgar a reclamação procedente e para evitar enriquecimento ilícito do empregado, autorizaria simplesmente a compensação com o valor recebido perante a comissão. Também seria desarrazoado, no nosso entender, porque o primeiro ponto a ser levado em conta com relação à atuação das comissões é a valorização e o prestígio do resultado por ela conseguido, quer dizer, é preciso que se dê credibilidade ao termo de conciliação, sem privilégio para nenhuma das partes. Aliás, para maior segurança, as partes poderão, inclusive, ser acompanhadas por advogado29 perante o órgão conciliador, desde que este se conscientize de que o fórum da comissão é simples e informal, portanto, diferente daquele da Vara Trabalhista, cujos entraves procedimentais representam um dos motivos da lentidão da prestação jurisdicional. Assim, como regra, deve-se entender que a eficácia do termo de conciliação é realmente geral, porém, com relação ao objeto discutido e avençado, não permitindo que o empregado volte a discutir pleitos já solucionados perante a comissão, pois aquele, em termos, adquire “força de coisa julgada” entre as partes, só autorizando o controle judicial por meio de ação anulatória ou nos embargos à execução do título extrajudicial decorrente, quando for o caso30. Mas, por exceção, é possível imaginar-se a hipótese em que o empregado dispensado por justa causa, venha a se compor com seu ex-empregador, perante o órgão de conciliação, não só com relação às verbas rescisórias, mas também envolvendo demais direitos decorrentes do contrato de trabalho mantido, mediante quitação geral; tal avença, desde que expressamente consignada no teimo de conciliação, com a ressalva de quitação geral, é válida, porque o empregado, esclarecido pela comissão e ou por seu advogado, caso presente, não tendo dúvida e agindo espontaneamente - já que ninguém é 29. A nobre classe dos advogados, à qual já pertenci com muito orgulho, responsável em boa parte pelo êxito dos órgãos conciliadores trabalhistas, precisa conscientizar-se e conscientizar o advogado de que a importância do seu papel não está apenas na atuação judicial, mas também e sobretudo na atuação preventiva de orientação e assessoria aos seus clientes. 30. Sempre será cabível a reapreciação, na via jurisdicional, da legitimidade dos atos formativos dos títulos extrajudiciais, sendo ampla, conseqüentemente, a matéria de defesa dos embargos do executado (CPC, art. 745)....A nota característica dos títulos extrajudiciais, sejam eles produzidos pelo poder negocial dos particulares, sejam eles originários de ato de autoridade, consiste, portanto, na sujeição dos seus atos constitutivos ao controle de validade (relação de conformidade entre norma individual e norma geral) pelo Poder Jurisdicional do Estado..., pertencendo ao domínio do direito material a disciplina dos requisitos formais e substanciais dos atos jurídicos que a Lei processual arrola como títulos executivos extrajudiciais (Teori Albino Zavascki. Título executivo e liquidação, pp. 111/112). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 120 DOUTRINA obrigado a fazer acordo perante aquele órgão, mas apenas deve tentar a conciliação não pode procurar a Justiça do Trabalho para pleitear aquilo que diretamente pactuou na comissão, sob pena de ser considerado como litigante de má-fé e ter que responder pelas sanções decorrentes. Também como litigante de má-fé deve ser considerado o empregador que nos embargos à execução do termo de conciliação se opuser sem razão plausível à execução do mesmo. Insistimos, agora com mais ênfase, que qualquer ato jurídico se submete ao controle judicial, quando viciado, porém, mediante as vias adequadas, que no caso serão a ação anulatória e os embargos à execução. Na esteira do nosso entendimento, estabelece o § 2° do art. 477 da CLT que o instrumento de rescisão ou recibo de quitação, qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ter especificada a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu valor, sendo válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas parcelas. Também sobre o assunto temos jurisprudência dos Tribunais Trabalhistas, consubstanciada no Enunciado 330 do TST assim vazado: A quitação passada pelo empregado, com assistência de entidade sindical de sua categoria, ao empregador, com observância dos requisitos exigidos nos parágrafos do art. 477 da Consolidação das Leis do Trabalho, tem eficácia liberatória em relação às parcelas expressamente consignadas no recibo, salvo se oposta ressalva expressa e especificada ao valor dado à parcela ou parcelas impugnadas. A Lei n° 9.958/2000, de índole trabalhista, deve ser interpretada à luz da jurisprudência de valores e da valorização do trabalho humano, não sendo, por isso, possível estabelecer-se um entendimento que afronte os princípios informadores do Direito do Trabalho, como o protetivo e o da irrenunciabilidade, criando-se subterfúgios para inverter contra o trabalhador os prejuízos decorrentes31. Assim, a inversão da lei, afirmando uma eficácia liberatória geral, exceto quanto às parcelas expressamente ressalvadas, não pode ter nenhuma validade, devendo mesmo ser declarada inconstitucional incidenter tantum. A leitura desse dispositivo (CLT, art. 625-E, parágrafo único) frise- se, deve ser exatamente ao contrário: o termo de conciliação tem eficácia geral quanto às parcelas negociadas e quitadas expressamente. Neste caso, há uma diferença fundamental em relação ao problema da quitação de verbas rescisórias, nos termos do art. 477, § 2°, da CLT e Enunciado 330/TST. É que, quanto ao pagamento das verbas rescisórias, perante o sindicato, delegacia regional do trabalho ou na empresa, não há nenhuma negociação entre empregado e empregador, mas apenas o pagamento pela empresa, daquilo que entende ser devido ao empregado, justificando-se, assim, maiores cuidados quanto aos efeitos liberatórios do termo, que 31. Sustenta Jorge Pinheiro Castelo que a vulnerabilidade econômica do trabalhador supera qualquer tipo de assistência, razão pela qual a quitação somente pode ter validade com relação àquilo que foi pago (CF. Comissão de conciliação prévia - filosofia, ideologia e interesses envolvidos na Lei, inconstitucionalidades, perplexidades e situações especificas - limitações, exceções e alternativas, p. 447). Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 121 DOUTRINA só podem atingir mesmo os valores pagos e discriminados. O contrário ocorre com o termo de conciliação perante os órgãos conciliadores, o qual tem outra característica em face da negociação entabulada entre patrões e empregados, com assistência dos seus representantes e de advogados, se assim o quiserem, quando o trabalhador não é obrigado a aceitar o acordo; porém, aceitando-o, tem que estar ciente de que tal ajuste, quanto à parcela negociada - e só quanto a esta tem efeito liberatório geral. Não se argumente, como vem se tornando até um modismo, com a chamada flexibilização ou modernização do Direito do Trabalho, em nome das quais, para alguns, tudo é válido; embora essa modernização seja necessária e a criação das Comissões de Conciliação Prévia represente esse anseio, tal não pode servir de pretexto para se institucionalizar uma possibilidade de negação dos direitos trabalhistas em decorrência da atuação dos órgãos conciliadores extrajudiciais, os quais, assim, já teriam nascido viciados e condenados à inutilidade; caso venha a prevalecer o entendimento da liberação geral de conformidade com a simples interpretação gramatical da lei, os sindicatos certamente passarão a orientar os trabalhadores no sentido de não aceitarem qualquer acordo perante tais órgãos conciliadores, a eles submetendo-se apenas para obter o termo negativo para instruir a reclamação trabalhista, tornando-os apenas mais um entrave burocrático na vida daquele que busca o cumprimento dos seus direitos. É preciso, para prestigiar e incentivar a solução extrajudicial dos conflitos trabalhistas, ser razoável quanto à interpretação dos instrumentos legais que lhes dão sustentação, nem protegendo o empregado com dogmas, nem, por outro lado, afrontando e sacrificando princípios protetores de valores essenciais da pessoa humana do trabalhador, este, que em regra, continuará sendo a parte mais fraca na relação de trabalho. 4.5 Âmbito de aplicação da conciliação prévia Compreende o âmbito de aplicação da lei das Comissões de Conciliação Prévia sujeitos e objeto. Os sujeitos são os empregadores e os trabalhadores lato sensu. Quanto aos trabalhadores, em brilhante trabalho sobre o tema, entende Jorge Pinheiro Castelo que a Lei 9.958/2000 aplica-se somente aos “empregados com registro em carteira” e com contrato em vigor32. Discordamos, data venia, do ilustre jurista. É que a lei (artigo 625-A da CLT) não restringe sua aplicação da maneira sugerida, como também não foi este o seu objetivo. Como nela expresso, têm as Comissões de Conciliação a atribuição de tentar conciliar os conflitos individuais de trabalho, sendo certo que estes surgem entre empregador ou tomador de serviços e empregados com contrato em vigor e aqueles cuja relação já se extinguiu, bem como outros pretensos empregados que procuram o reconhecimento de um vínculo de emprego e, em conseqüência, o pagamento de verbas legais e convencionais decorrentes. Esta é a realidade diária da Justiça do Trabalho, onde, como é sabido e consabido, o maior número de reclamações surge exatamente dos ex-empregados, daí dizer-se com razão que a Justiça do Trabalho é a Justiça dos desempregados. 32. Op. cit., p. 450. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 122 DOUTRINA Respondendo se pode a Comissão Previa de Conciliação apreciar pedido de vínculo empregatício, sustenta Eduardo Gabriel Saad33 com exemplo do suposto representante comercial que durante bom tempo atuou como se fosse empregado, sendo que recebendo a comissão tal reclamação e tentando uma conciliação não estará violando nenhum dispositivo legal, entendimento este com o qual concordando inteiramente. Ora, se um dos objetivos principais da lei foi diminuir o número assustador de demandas trabalhistas, não teria sentido que a lei se aplicasse apenas aos trabalhadores com contrato em vigor, os quais como se sabe e o ilustre jurista reconhece no seu trabalho, não têm qualquer garantia de emprego, fato este que o inibe para reclamar seus direitos violados na vigência do contrato de trabalho, quer perante a comissão, quer perante a Justiça do Trabalho. De outro lado, seria discriminação odiosa vedar ao trabalhador sem contrato em vigor ou sem registro em carteira (exatamente aquele que procura o reconhecimento de uma relação de emprego e o pagamento de direitos violados) a atuação das comissões. É nesse momento em que ele mais necessita de uma proteção rápida na solução dos seus direitos, a qual, como se sabe, não é obtida com rapidez perante o Judiciário. Aliás, como ressalta constantemente o Professor Renato Rua de Almeida, em suas aulas dos cursos de mestrado e doutorado da PUC/SP, é preciso urgentemente que haja maior preocupação com o trabalhador desempregado, pois, por tradição, quase tudo hoje em termos de proteção trabalhista gira em torno do empregado com carteira assinada, enquanto inúmeros outros trabalhadores desempregados ou que estão na informalidade ficam à margem das mais importantes decisões sobre os seus interesses. Desta forma é realmente urgente a necessidade de mudança de postura de todos aqueles que atuam o direito laboral com relação aos “sem carteira”, porque esse contingente de trabalhadores aumenta a cada dia não somente no nosso país como também nos países de primeiro mundo. Os sindicatos, por outro lado, também terão que mudar de postura, transformando-se em sindicatos dos trabalhadores latu senso, ao invés de permanecerem com a postura de representar apenas os trabalhadores com carteira assinada, repita-se, espécie em decadência. Desse modo, entendemos que qualquer trabalhador tem o direito de submeter sua demanda a uma Comissão de Conciliação Prévia, se existente na localidade da prestação dos seus serviços, porque a lei não proíbe e sobretudo porque não foi seu objetivo restringir a atuação das comissões. Amauri Mascaro Nascimento34 sustenta há muito tempo35 que também é da competência da Justiça do Trabalho a solução de questões decorrentes da fase pré-contratual, 33. Comissões de Conciliação Prévia - teoria e prática, p. 28. 34. Curso de Direito do Trabalho, pp. 354/355. 35. Hoje esse entendimento está muito mais consagrado a partir do momento em que o STF passou a interpretar o art. 114 da CF de forma ampliativa, no sentido de que à determinação da competência da Justiça do Trabalho não importa que dependa a solução da lide de questões de direito civil, mas sim, no caso, que a promessa de contratar, cujo alegado conteúdo é o fundamento do pedido, tenha sido feita em razão da relação de emprego, inserindo-se no contrato de trabalho. (Ac. Pleno - Conflito de Jurisdição n°? 6.959 - Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 22.05.91, p. 1259). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 123 DOUTRINA exemplificando duas hipóteses: a) o empregado que permanece alguns dias na empresa fazendo teste e depois não é admitido, surgindo daí um conflito, entendendo o trabalhador que chegou a haver uma relação de emprego e, a empresa, que ele apenas estava sendo experimentado no exercício de algumas funções para as quais foi considerado inapto; b) a troca de correspondências entre empregador e pretenso empregado, em que aquele faz promessa de emprego que vem a ser aceita por este, que em razão disso pede demissão no emprego anterior e a nova relação não se efetiva por vontade do empregador, com conseqüências prejudiciais evidentes para o trabalhador. Assegura o ilustre juslaboralista que as questões entre trabalhador e potencial empregador não deixam de ser trabalhistas se ocorrem antes do início da prestação de serviços. São questões pré- contratuais, da fase da formação do contrato. Ora, se tais questões são da competência da Justiça do Trabalho, mesmo diante de algumas divergências, com maior razão poderão e deverão ser submetidas à comissão na busca de uma solução rápida que atenda os interesses de ambas as partes, porque quanto à solução extrajudicial de conflitos, a mais importante característica é a da informalidade e quebra de rigidez, porque o que interessa é a solução imediata do conflito. Ademais, o conciliador, como é obvio, não exerce função jurisdicional típica, sendo apenas um mediador, um conselheiro, um auxiliar das partes na busca de um consenso sobre o conflito. Quanto ao objeto, entendemos que, de acordo não só com a Lei n° 9.958/2000, como também com todo o nosso ordenamento jurídico, são compatíveis com a conciliação prévia todas as demandas que envolvam interesses ou direitos meramente privados (artigo 1.035 do CCB), passíveis de conciliação e transação entre trabalhadores e empregadores, ficando excluídos os que envolvam interesse público, entendendo-se com tal aquele que ultrapasse a esfera meramente individual das partes, ou seja, aquele interesse de repercussão social. Tais interesses ou direitos, à evidência, não ficam ao talante das partes. Para exemplificar podemos citar como questões que refogem à conciliação prévia, no âmbito individual, as referentes à proteção e defesa do meio ambiente do trabalho, sobre salário mínimo, trabalho da criança (que é proibido) e do adolescente (que é permitido mediante restrições), duração do trabalho, contribuições previdenciárias, imposto de renda, etc., e, é claro, qualquer interesse coletivo ou difuso, no caso, por falta de legitimidade do trabalhador para defendê-lo. Também refogem do âmbito de atuação das comissões as questões urgentes, como aquelas que requeiram concessão de liminares, antecipação de tutela etc., como estabelece o § 3° do artigo 625-D da CLT, ao referir-se a motivo relevante, cujo objetivo é evitar que pereçam direitos dos trabalhadores. Com efeito, se é certo que a lei foi concebida para a solução de conflitos individuais, de outra parte não se pode afastar a possibilidade, porque a lei não veda e o bom- senso aconselha que um interesse coletivo seja submetido à conciliação perante a comissão. Imagine-se a hipótese em que os trabalhadores de uma determinada empresa estejam em greve e a comissão interna ou intersindical da localidade, em razão dos bons serviços que vem prestando, seja procurada pelas partes para ajudar na conciliação e de fato se obtenha um acordo. Ora, não haverá nenhuma problema, porque o que Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 124 DOUTRINA interessa é a solução do litígio e as partes, no caso, empresa e sindicato profissional, são livres para procurar o conciliador que quiserem. Aliás, seria ótimo que tal ocorresse, como hoje já vem ocorrendo nos núcleos intersindicais de Patrocínio (MG), de Patos de Minas (MG) e de Maringá (PR), que já apresentaram resultados extraordinários, diminuindo de forma sensível a procura pelo Judiciário trabalhista, tanto com relação às questões individuais como as coletivas, como asseguram Antônio Gomes de Vasconcelos e Dirceu Galdino36. O certo é que, se de um lado não se pode permitir que as Comissões de Conciliação Prévia convertam-se em mecanismos prejudiciais aos interesses dos trabalhadores, de outro, é preciso que haja boa vontade e não se criem empecilhos ao desenvolvimento de um novo mecanismo de representação nos locais de trabalho, movido, muitas vezes, por interesses particulares, de classe ou corporativos, até porque, ao Judiciário cabe coibir os abusos e eliminar os vícios que certamente surgirão no dia-a-dia dessas comissões. 4.6 Cobrança de taxa pelos serviços de conciliação Nada diz a lei sobre a cobrança de taxa pelos serviços prestados pelas Comissões de Conciliação Prévia, assegurando apenas no § 2° do artigo 625-B da CLT que o tempo despendido pelos conciliadores na atividade de conciliação será computado como tempo de serviço para todos os efeitos legais. O dispositivo acima refere-se à comissão de empresa ou de grupo de empresas, cujos membros, em regra, são empregados, embora nada impeça que sejam indicadas pelo empregador outras pessoas de fora do seu quadro funcional. De qualquer forma, além do pagamento dos salários ou outras verbas, existem despesas com a manutenção das comissões, como, por exemplo, com equipamentos, material etc. A pergunta que se faz é se essas comissões podem cobrar dos trabalhadores e dos empregadores alguma taxa pelos serviços prestados. Com efeito, estabelece o § 7o do artigo 477 da CLT que o ato de assistência na rescisão contratual será sem ônus para o trabalhador e empregador. Com base neste dispositivo, aqui aplicado em parte por analogia, entendemos que pelos serviços de conciliação prévia não devem ser cobradas taxas dos trabalhadores, sendo as despesas decorrentes, de responsabilidade da empresa ou empresas, quando a comissão for constituída unilateralmente e, destas e dos sindicatos profissionais e patronais, quando se tratar de comissão empresa/sindicato ou intersindical, quando o instrumento normativo de criação estabelecerá sobre a forma de rateio dessas despesas. Isto porque, como reconhecido, os mais interessados hoje em tais comissões são as empresas, que com isso esperam diminuir e até eliminar custos com reclamações trabalhistas, enquanto que os sindicatos profissionais recebem contribuições sindicais obrigatoriamente descontadas de todos os integrantes da respectiva categoria para manter o chamado sistema confederativo. Porém, o maior receio reside na possível mercantilização de tais comissões, 36. Núcleos intersindicais de conciliação trabalhista, passim. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n 3, jul/set 2000 125 DOUTRINA como já se tem notícia, o que é lamentável porque se tal fato se confirmar esse que poderá tornar-se importante instrumento como canal verdadeiro de comunicação entre trabalhador e empregador perderá a sua finalidade como órgão de representação dos trabalhadores nos locais de trabalho. No entanto, a partir do momento em que houver cobrança de taxa pelos serviços de conciliação prestados pelas aludidas comissões (aliás, essas comissões nem personalidade jurídica têm para emitir recibos de cobrança!), estas37 se equiparam aos demais prestadores de serviços no mercado de consumo e se submetem às regras inscritas no Código de Defesa do Consumidor (art. 14), respondendo objetivamente sozinhas ou em conjunto com as empresas, conforme o caso, pela deficiência ou defeitos dos serviços, ou seja, por eventuais prejuízos causados aos trabalhadores que se utilizarem dos seus serviços, conforme assegura Jorge Pinheiro Castelo38. 4.7 Participação do advogado nas Comissões de Conciliação Prévia Com acuidade assevera Estêvão Mallet39 que a participação de advogados na sessão de tentativa de conciliação não é obrigatória. Não poderá em hipótese alguma, porém, ser impedida ou obstada, já que é direito do advogado, munido de poderes especiais, ingressar livremente “em qualquer assembléia ou reunião de que participe ou possa participar o seu cliente”, conforme assegura o artigo 7°, inciso VI, letra d, da Lei 8.906/94. Com efeito, entendemos que o advogado tem função muito importante para o desenvolvimento das comissões de conciliação, desde que deixe de lado qualquer ranço corporativista e entenda que mais importante que ajuizar inúmeras ações individuais ou defender os empregadores nessas ações será a função preventiva de orientação destes e dos empregados nas aludidas comissões, serviço este que começará antes mesmo da procura pelo órgão conciliador, pois assim o trabalhador já irá àquele órgão bem informado sobre seus direitos e não correrá o risco de sofrer prejuízos. Também durante a sessão de conciliação será importante a função do causídico, orientando o seu cliente como o faz perante a Vara do Trabalho, desde que se conscientize de que o fórum da comissão é simples e informal, onde não há contraditório nem julgamento, mas apenas tentativas de conciliação do litígio, portanto, diferente daquele da Vara Trabalhista, cujos entraves procedimentais representam um dos motivos da lentidão da prestação jurisdicional. É preciso, ademais, romper-se dogmas e entender- se que a importância do papel do advogado não está apenas na atuação judicial, mas também extrajudicialmente, sobretudo na atuação preventiva de orientação e assessoria aos seus clientes. 37. Na verdade, responderão seus membros, uma vez que não se lhe reconhece personalidade jurídica. 38. Comissão de conciliação prévia- filosofia, ideologia e interesses envolvidos na Lei, inconstitucionali dades, perplexidades e situações especificas - limitações, exceções e alternativas, pp. 454/455. 39. Primeiras linhas sobre as comissões de conciliação, p. 442. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 126 DOUTRINA 5. ALGUMAS CONCLUSÕES a) O aumento do número de conflitos individuais de trabalho e a demora da solução jurisdicional são fatos indiscutíveis que reclamam por mudanças imediatas nas formas de solução de tais conflitos, mediante ruptura da dogmática arraigada no nosso sistema de relações de trabalho, voltada para a atuação estatal como solução ideal; b) As Comissões de Conciliação, bem como outros órgãos de conciliação, terão o objetivo de solucionar os conflitos individuais de trabalho de menor complexidade, de forma simples, rápida e barata e aproximar os atores sociais do trabalho, patrão e empregado, na busca de novas formas de convivência, passando da costumeira conflitualidade para a necessária parceria; d) Para que esse objetivo seja alcançado reclama- se empenho dos trabalhadores e empregadores quanto à implementação dos órgãos conciliadores, paciência, bom senso e muita compreensão jurídica dos aplicadores do Direito do Trabalho, em especial dos juizes, procuradores do trabalho e advogados, que precisarão mesmo se desgarrar de velhos dogmas processuais que pouco têm contribuído para a efetividade do processo e do direito material violado; c) Por isso e pelo que demonstramos, não há espaço para a alegação de inconstitucionalidade da norma legal do art. 625-D da CLT, que exige a conciliação prévia como pressuposto processual ao ajuizamento da reclamação trabalhista individual. Inconstitucional afigura-se o sistema processual que possibilita a eternização das demandas judiciais, como obstáculo ao verdadeiro direito de ação; d) O efeito a se atribuir ao termo de conciliação respectivo é de eficácia geral, porém, quanto às parcelas negociadas e quitadas expressamente; e) As Comissões de Conciliação Prévia, como demonstramos antes, ao lado de outros mecanismos de solução de conflitos trabalhistas, representam importante paradigma para o Direito do Trabalho, não somente no tocante à solução dos conflitos individuais de trabalho, mas em especial com relação à efetivação de um dos mais importantes aspectos da liberdade sindical, que é a representação real dos trabalhadores nos locais de trabalho. 6. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ALMEIDA, Renato Rua de. A estabilidade no emprego num sistema de economia de mercado. Revista LTr. São Paulo: LTr, ano 63, n° 12, pp. 1600/1604. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos, 11. ed., tradução de Carlos Nelson Coutinho. 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Classificação segundo a origem; 2. Classificação segundo a obrigatoriedade; 3. Classificação segundo o objeto; 4. Classificação segundo os efeitos; II - Princípios aplicáveis às alterações objetivas do contrato; 1. Princípios informativos aplicáveis; a) Princípio da inalterabilidade contratual; b) Princípio do direito de resistência obreiro; c) Princípio do jus variandi empresarial; 2. Contradição aparente entre os princípios informativos; 3. Compatibilização entre os princípios informativos; 4. Critérios autorizativos do jus variandi empresarial; Referências bibliográficas. Alterações contratuais objetivas são aquelas que atingem o conteúdo do contrato de trabalho; caracterizam-se por afetar, modificando, cláusulas integrantes desse contrato. Classificam-se tais alterações objetivas segundo distintos parâmetros de comparação. Os mais significativos parâmetros eleitos pela doutrina são a origem, a obrigatoriedade, o objeto e os efeitos das alterações examinadas, possibilitando a construção de distintas tipologias de alterações objetivas do contrato empregatício. 1. CLASSIFICAÇÃO SEGUNDO A ORIGEM O parâmetro da origem da alteração contratual conduz ao encontro de dois tipos centrais de modificações objetivas do contrato: as oriundas de norma jurídica (alterações normativas) e as oriundas da vontade unilateral ou bilateral das partes contratuais (alterações meramente contratuais). As primeiras (alterações normativas) decorrem de diplomas normativos do Estado (Constituição, leis, medidas provisórias, por exemplo), neste grupo incluindo-se a sentença normativa (alterações normativas heterônomas). Decorrem ainda as alterações normativas de instrumentos normativos coletivamente negociados, como a convenção, o acordo e o contrato coletivo de trabalho (alterações normativas autônomas). Já as alterações meramente contratuais são aquelas que resultam do exercício unilateral da vontade das partes - em geral, exclusivamente do empregador-, como se passa, em regra, com os dispositivos do regulamento empresário (alterações unilaterais). Também podem resultar da conjugação de ambas vontades contratuais (alterações bilaterais). * Doutor em Filosofia do Direito (UFMG) e Mestre em Ciência Política (UFMG). Juiz do Trabalho em Minas Gerais. Professor (graduação e pós-graduação) de Ciência Política da UFMG (1978-1992) e de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da UFMG (1993-2000). Atual Professor (graduação e pós-graduação) de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da PUC-MINAS. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 129 DOUTRINA 2. CLASSIFICAÇÃO SEGUNDO A OBRIGATORIEDADE O parâmetro da obrigatoriedade da alteração contratual conduz ao encontro de dois tipos centrais de modificações objetivas do contrato: as imperativas (ou obrigatórias) e as voluntárias. Imperativas (ou obrigatórias) são alterações que se impõem às partes contratuais, independentemente de sua vontade e de as alterações produzirem efeitos favoráveis ou desfavoráveis a qualquer das partes. De maneira geral, são imperativas as alterações decorrentes de norma jurídica - como as derivadas de lei (chamadas também alterações legais). Também são imperativas, em geral, as mudanças resultantes de instrumento normativo negocial coletivo ou de instrumento normativo judicial (estas duas últimas chamadas também alterações normativas). Voluntárias são as alterações decorrentes do exercício lícito da vontade pelas partes contratuais, não se impondo necessariamente a ambas. É claro que as alterações unilaterais do contrato incidem impositivamente sobre a vontade da contraparte contratual, uma vez que foram formuladas por um único dos sujeitos do contrato. Neste quadro, sendo o contrato empregatício um pacto de adesão, o habitual é que as alterações contratuais voluntárias unilaterais tenham origem na figura do empregador, impondo-se sobre a parte contratual obreira. De todo modo, tecnicamente, as alterações voluntárias distinguem-se em alterações bilaterais (provindas da vontade consensual das partes) ou unilaterais (provindas da vontade unilateral de um dos sujeitos do contrato, em geral o empregador). 3. CLASSIFICAÇÃO SEGUNDO O OBJETO O parâmetro do objeto das alterações contratuais em exame conduz ao encontro de três tipos básicos de modificações do contrato: as qualitativas, as quantitativas e as circunstanciais. Alterações qualitativas são aquelas que dizem respeito à natureza das prestações. São modificações que envolvem, pois, o próprio caráter da prestação ou situação contratual enfocada. Ilustram tal modalidade as alterações que atingem o tipo de trabalho, de função, etc. Alterações quantitativas são aquelas que dizem respeito ao montante das prestações. São modificações que envolvem, pois, a expressão numérica tradutora da extensão da prestação enfocada. Ilustram esta modalidade as alterações que atingem a intensidade do trabalho ou da jornada ou, ainda, o montante do salário, etc. Alterações circunstanciais são aquelas que dizem respeito à situação ambiental ou organizativa referente às prestações contratuais. Ilustram esta modalidade as modificações que atingem o local de trabalho, a forma de contraprestação salarial (salário utilidade versus salário em moeda, por exemplo).1 1. A respeito da principal alteração objetiva circunstancial do contrato (a alteração de local de trabalho), consultar artigo deste autor “A Transferência Obreira no Brasil: regras e efeitos jurídicos”, in Revista do Tribunal Superior do Trabalho, ano 66, n° 1, jan.- março/2000, Brasília/Porto Alegre:Síntese, pp. 151-159. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 130 DOUTRINA 4. CLASSIFICAÇÃO SEGUNDO OS EFEITOS O parâmetro dos efeitos das alterações contratuais em exame conduz ao encontro de dois tipos básicos de modificações do contrato: as favoráveis ao empregado e as desfavoráveis ao empregado. As alterações favoráveis, por traduzirem um patamar de direitos superior ao padrão normativamente fixado, tendem a ser sempre válidas. Apenas não o serão caso agridam a norma proibitiva insuplantável do Estado - ainda que trazendo uma aparente vantagem tópica para o trabalhador isoladamente considerado. As alterações desfavoráveis ao empregado tendem, em geral, a ser tidas como ilícitas (art. 468, CLT). Apenas não o serão quando estiveram autorizadas pela ordem jurídica heterônoma ou autônoma trabalhista. As quatro situações-tipo permissivas do exercício lícito do jus variandi pelo empregador, já examinadas, ilustram, significativamente, as hipóteses de modificações desfavoráveis válidas existentes no direito brasileiro. No tocante às tipologias acima, merece uma análise pormenorizada a classificação construída em torno do objeto das alterações perpetradas. Nesta linha, passa-se ao estudo das alterações qualitativas, quantitativas e circunstanciais do contrato de trabalho. II - PRINCÍPIOS APLICÁVEIS ÀS ALTERAÇÕES OBJETIVAS DO CONTRATO A dinâmica das alterações objetivas dos contratos empregatícios submete-se à regência de alguns princípios informativos do Direito do Trabalho. Na medida em que cumprem os princípios o central papel de fachos iluminadores à compreensão da ordem jurídica, sua análise propiciará que melhor se compreendam as possibilidades e limites abertos pelo direito às modificações nas cláusulas integrantes dos contratos de emprego. 1. PRINCÍPIOS INFORMATIVOS APLICÁVEIS Três princípios trabalhistas aplicam-se à dinâmica das alterações do contrato de trabalho (alterações objetivas, enfatize-se). Trata-se do princípio da inalterabilidade contratual, com a correlata vedação a alterações lesivas implementadas; também o princípio do direito de resistência obreiro (jus resistentiae); finalmente, o princípio do jus variandi empresarial. Os três princípios - dotados de aparente assincronia entre si - harmonizam-se para estabelecer parâmetros orientadores do potencial de rigidez e de mutabilidade deferido pela ordem jurídica ao contrato de trabalho. O primeiro é princípio basilar do ramo laboral especializado, oriundo da velha matriz civilista e adequado às especificidades do Direito do Trabalho: o princípio da Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 131 DOUTRINA intangibilidade ou inalterabilidade do contrato (pacta sunt servanda), com a correlata regra de vedação a alterações contratuais lesivas ao obreiro (art. 468, CLT). O segundo princípio - conexo ao anterior - é o que assegura a existência de um direito de resistência (jus resistentiae) do empregado perante ordens ilícitas ou irregulares do empregador. O terceiro princípio, finalmente, é o que informa sobre a prerrogativa (juridicamente limitada, é bem verdade) de adequação e redirecionamento da prestação laboral contratada (o chamado jus variandi), que a ordem jurídica assegura ao empregador no transcorrer do contrato (art. 2o, caput, CLT; art. 1°, IV, in fine, CF/88). Examine-se, em destaque, cada um desses princípios convergentes ao tema das modificações objetivas do contrato de trabalho. a) Princípio da inalterabilidade contratual O presente princípio, oriundo do Direito Civil, expresso pelo velho aforismo pacta sunt servanda, informa que os acordos firmados pelas partes são inamodificáveis ao longo do prazo de sua vigência, impondo-se ao cumprimento fiel pelos pactuantes. É bem verdade que esse princípio jurídico geral já sofreu claras atenuações no próprio âmbito do Direito Civil, através da fórmula rebus sic stantibus. Por essa fórmula atenuadora, a inalterabilidade contratual não seria absoluta, podendo ser suplantada por uma compatível retificação das cláusulas do contrato ao longo de seu curso. Essa possibilidade surgiria caso evidenciado que as condições objetivas emergentes durante o prazo contratual - condições criadas sem o concurso das partes - provocaram grave desequilíbrio contratual, inexistente e impensável no instante de formulação do contrato e fixação dos respectivos direitos e obrigações. Tais circunstâncias novas e involuntárias propiciariam à parte prejudicada, desse modo, a lícita pretensão de modificação do contrato. O princípio geral da inalterabilidade dos pactos celebrados sofre, porém, complexa adequação ao ingressar no Direito do Trabalho2. Em primeiro lugar, a noção de inalterabilidade relativiza-se caso confrontada com alterações favoráveis ao trabalhador, uma vez que elas tendem a ser sempre permitidas e até incentivadas (art. 468, CLT). Em contrapartida, a mesma noção se torna rigorosa e quase inflexível, se contraposta a alterações desfavoráveis ao trabalhador - que tendem a ser vedadas pela normatividade justrabalhista (arts. 444 e 468, CLT). Em segundo lugar, a atenuação civilista do princípio geral examinado, propiciada pela fórmula rebus sic stantibus, tende a ser genericamente rejeitada pelo Direito do Trabalho, que coloca sob ônus do empregador os riscos do empreendimento (art. 2o, caput, CLT). A Jurisprudência tem reiteradamente esclarecido, a esse propósito, que 2. A respeito desse processo de adequação dos princípios jurídicos gerais quando incorporados pelo Direito do Trabalho, consultar a obra deste autor, introdução ao Direito do Trabalho, 2ª ed., São Paulo: LTR, 1999, no tópico “Princípios Jurídicos Gerais Aplicáveis ao Direito do Trabalho. Adequações” (pp. 146-149). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 132 DOUTRINA no conceito desses riscos inscreve-se a profusão legislativa que sempre caracterizou a tradição jurídica e administrativa brasileira, com as modificações econômicas e monetárias daí advindas (ilustrativamente) “Plano Bresser”, “Plano Verão”, “Plano Collor”, “Plano Real”, etc.). Não obstante o critério geral do art. 2° da CLT e a interpretação jurisprudencial referida, é inquestionável que a legislação trabalhista tendeu, em certo momento histórico, a incorporar, larga mente, aspectos expressivos da fórmula rebus sic stantibus, reduzindo, assim, os riscos trabalhistas empresários por seu empreendimento. De fato, o artigo 503 da CLT autorizava a “redução geral dos salários dos empregados da empresa” em casos de “prejuízos devidamente comprovados”. A Lei n° 4.923/65, por sua vez - não por coincidência, oriunda de período autocrático da vida política e jurídica do país - também veio permitir a redução salarial obreira em situações objetivas adversas do mercado para o empregador, deferindo, inclusive, a este meios judiciais para alcance de sua pretensão reducionista. A Carta de 1988, entretanto, eliminou essa incorporação da fórmula rebus sic stantibus. De fato, ao fixar a regra geral da “irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo” (art. 7°, VI, CF/88), derrogou tais normas permissivas, condicionando quaisquer condutas de redução salarial à negociação coletiva sindical (arts. 7°, VI, e 8°, VI, CF/88). O princípio da inalterabilidade contratual, com seu efeito conseqüente de vedação às modificações contratuais lesivas, surge como o primeiro critério informativo relevante à análise da dinâmica das alterações contratuais objetivas no Direito do Trabalho. b) Princípio do direito de resistência obreiro O princípio do jus resistentiae obreiro informa a prerrogativa do empregado de opor-se, validamente, a determinações ilícitas oriundas do empregador no contexto da prestação laborativa. É princípio específico ao contrato de trabalho, “derivando diretamente do uso irregular do poder diretivo patronal”.3 Em ordens jurídicas, como a brasileira, em que o empregado não tem assegurada garantia geral de emprego (há apenas garantias especiais, como a do dirigente sindical, da gestante, etc.),4 o jus resistentiae torna-se, na prática, mitigado, uma vez que o risco do rompimento do contrato pelo empregador inibe eventual posição defensiva do empregado em face a determinações abusivas recebidas. De todo modo, ainda assim o princípio desponta como um segundo fator - ao lado do critério de inalterabilidade contratual - a privilegiar a perspectiva protetiva dos interesses obreiros na dinâmica das alterações contratuais objetivas no Direito do Trabalho. 3. Márcio Túlio Viana, Direito de Resistência, São Paulo: LTR, 1996, p. 421. 4. O art. 7°, I, da Carta Magna, que menciona essa garantia geral, tem sido interpretado pela jurisprudência do país (inclusive STF) como norma não auto-executável, inábil, portanto, a produzir eficácia imediata enquanto não surgir a lei complementar referida no mesmo dispositivo constitucional. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 133 DOUTRINA c) Princípio do jus variandi empresarial O princípio do jus variandi informa o conjunto de prerrogativas empresariais de ordinariamente ajustar, adequar e até mesmo alterar as circunstâncias e critérios de prestação laborativa pelo obreiro, desde que sem afronta à ordem normativa ou contratual, ou, extraordinariamente, em face de permissão normativa, modificar cláusula do próprio contrato de trabalho. O jus variandi é corolário do poder diretivo concentrado no empregador no contexto da relação de emprego, configurando-se, ao mesmo tempo, como concretização desse poder diretivo (caput do art. 2° da CLT: o empregador dirige a prestação de serviços). Classifica-se o jus variandi em ordinário e extraordinário, conforme o objeto de sua atuação.5 O jus variandi ordinário concerne à alteração unilateral de aspectos da prestação laborativa não regulados quer por norma jurídica heterônoma ou autônoma, quer pelas cláusulas do respectivo contrato de trabalho. Traduz a dimensão mais comum e diversificada do jus variandi empresarial, tendo como “campo próprio, específico ... exatamente o da prestação de serviços”.6 Essencialmente, é “instrumento de modulação da prestação de serviços”,7 atuando em campo e matérias não previamente reguladas pelo contrato ou por norma jurídica.8 Como bem exposto por Márcio Túlio Viana, “Campo do jus variandi é o espaço em branco entre as cláusulas, onde nada se previu especificamente. Ali o empregador se movimenta, preenchendo os vazios de acordo com a sua própria vontade.(...). E por ser assim, talvez se possa dizer - por paradoxal que pareça - que a originalidade do contrato de trabalho está um pouco ‘fora’ dele, no poder de se exigir o que não se ajustou. (...) Entenda-se: como ocorre com o poder diretivo em geral, o jus variandi tem fonte no contrato: é contratado. Mas se realiza através da vontade de um só, exatamente por se situar num campo em que a outra vontade não se expressou de antemão”.9 Pelo jus variandi ordinário, de maneira geral, ajustam-se, modulam-se ou se alteram aspectos não essenciais da relação entre as partes.10 Contudo, tais aspectos segu- 5. A distinção está feita com maestria por Márcio Túlio Viana em Direito de Resistência, São Paulo: LTR, 1996, p. 226-227 e 247-249. Ver também anterior referência a essa distinção pelo mesmo autor em seu artigo “Fundamentos e Tendências do Jus Variandi”, Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, ano 26, vol. 47/50, Belo Horizonte: TRT-MG, pp. 41-49. A doutrina, porém, comumente distingue entre o jus variandi normal e o excepcional. A respeito consultar Simone Cruxên Gonçalves, Limites do Jus Variandi do Empregador, São Paulo : LTR, 1997, pp. 60-62. 6. VIANA, Márcio Túlio, Direito de Resistência, cit., p. 219. 7. VIANA, M.T., Direito de Resistência, cit., p. 217. 8. VIANA, M.T., Direito de Resistência, cit., pp. 214-215. 9. VIANA, M.T., “Fundamentos e Tendências do Jus Variandi”, Revista do Tribunal Regional do Traba lho da 3a Região, ano 26, vol. 47/50, Belo Horizonte: TRT-MG, 1988 a jun. de 1991, p. 42. Grifos no original. 10. “El ejercício recae siempre sobre aspectos secundários o accidentales de la relación” (Carlos Posi, Manual Práctico del Ius Variandi, Buenos Aires: David Grinberg Libros Jurídicos, 1995, p. 15). Ou Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 134 DOUTRINA ramente têm importância instrumental à dinâmica e evolução empresariais.11 O jus variandi extraordinário, por sua vez, concerne à alteração unilateral de cláusulas do contrato de trabalho, provisoriamente ou não, em situações genérica ou especificamente autorizadas pela ordem jurídica heterônoma ou autônoma trabalhista. Traduz dimensão excepcional e pouco diversificada do jus variandi do empregador atingindo de modo permanente ou provisório o contrato de trabalho ajustado. Atua, portanto, em campo e matérias previamente reguladas pelo contrato ou por norma jurídica. Como se percebe, o princípio do jus variandi empresarial também desponta como fator atuante no contexto das alterações objetivas do contrato de trabalho - embora com sentido inverso aos dois princípios precedentes (que visam à tutela de interesses obreiros na relação de emprego). Aqui o enfoque favorece a perspectiva empresarial no comando da relação laborativa e contratual. 2. CONTRADIÇÃO APARENTE ENTRE OS PRINCÍPIOS INFORMATIVOS A identificação desses três princípios traz consigo um evidente problema: é que parece clara a ocorrência de certo paradoxo - ou, pelo menos, certa tensão - entre o princípio da inalterabilidade contratual objetiva e lesiva ao trabalhador (com o princípio informador do jus resistentiae obreiro) e a garantia jurídica do jus variandi ao empresário (em especial o jus variandi denominado extraordinário). Inquestionavelmente, enquanto os dois primeiros princípios apontam na direção da inviabilidade de alterações contratuais lesivas ao empregado, o terceiro princípio indica a possibilidade de ocorrência de algumas variações contratuais desfavoráveis, a serem validamente implementadas pelo empregador. Como enfrentar-se essa aparente assincronia de princípios? 3. COMPATIBILIZAÇÃO ENTRE OS PRINCÍPIOS INFORMATIVOS O direito, como se sabe, afirma-se como um todo lógico, um conjunto sistemático e coordenado de institutos, princípios e normas; a idéia de incoerência interna entre seus componentes é inassimilável à própria noção do direito. Por essa razão, cabe ao estudioso do fenômeno jurídico encontrar a fórmula hábil a compatibilizar tais princípios aparentemente inconciliáveis que se projetam sobre a dinâmica das alterações objetivas do contrato de trabalho. ainda Simone Cruxên Gonçalves: “As variações impostas pelo empregador não podem atingir as cláusulas legais ou contratuais (individual ou coletiva) que regem o pacto laboral, apenas os aspectos superficiais que o envolvem. Tais aspectos podem referir-se a tempo, modo e lugar da prestação de serviço” (In Limites do Jus Variandi do Empregador, São Paulo: LTR, 1997, pp. 49-50. Observação em parênteses no original). 11. O jus variandi deve ser utilizado “na medida das necessidades da empresa”, sendo inválido seu uso “arbitrário, caprichoso, imotivado, discriminatório ou persecutório” (Márcio Túlio Viana, Direito de Resistência, cit., pp. 226 e 223, respectivamente). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 135 DOUTRINA Essa compatibilização constrói-se de acordo com a seguinte fórmula compreensiva da ordem jurídica: prevalece, na qualidade de princípio motor e norma geral, a regra da inviabilidade de alterações contratuais lesivas ao empregado, socorrida tal regra pelo direito de resistência obreiro às modificações ilícitas do contrato empregatício. O exercício do jus variandi empresarial, desse modo, despontará como válido apenas na medida em que se mantiver nas fronteiras do jus variandi ordinário corretamente exercido (isto é, não atingindo cláusulas contratuais e nem desrespeitando normas jurídicas); e na medida em que, no exercício do jus variandi extraordinário, ou não afrontar a regra geral dominante (isto é, não produzindo alterações contratuais lesivas) ou promover modificações contratuais eventualmente desfavoráveis ao obreiro nos estritos limites da autorização direta ou indireta contida na ordem jurídica normativa trabalhista. A fórmula de compatibilização aqui enunciada prevê, topicamente, cinco situações-tipo de autorização normativa ao exercício do jus variandi. Trata-se, em suma, dos critérios autorizativos do jus variandi empresário no Direito brasileiro. 4. CRITÉRIOS AUTORIZATIVOS DO JUS VARIANDI EMPRESARIAL A primeira situação-tipo concerne à autorização conferida, explícita ou implicitamente, pela ordem jurídica heterônoma estatal à implementação, pelo empregador, de modificações no modo e circunstâncias da prestação laborativa que não estejam contratualizadas e nem sejam regidas por norma jurídica. Trata-se, como já visto, das alterações decorrentes do chamado jus variandi ordinário. Neste grupo, portanto, não se encontram efetivas modificações, permanentes ou transitórias, em cláusulas do contrato de trabalho. A princípio, não comportariam, pois, efetivas alterações objetivas do contrato de trabalho. A segunda situação-tipo concerne à autorização conferida pela ordem jurídica à implementação, pelo empregador, de modificações em cláusulas contratuais trabalhistas, mas desde que elevando as condições de pactuação da força laborativa obreira. Trata-se, portanto, de alterações contratuais favoráveis - que não são, obviamente, vedadas pelo Direito do Trabalho (reajuste espontâneo de salário; redução de jornada sem redução salarial, etc.). As demais situações-tipo englobam alterações contratuais que podem, diretamente ou indiretamente, provocar prejuízos ao trabalhador (embora, obviamente, nem sempre). Englobam, desse modo, alterações desfavoráveis, que rompem com a regra geral de vedação às modificações lesivas ao obreiro. Nesse quadro, a terceira situação-tipo concerne à autorização conferida, explícita ou implicitamente, pela ordem jurídica heterônoma estatal à implementação, pelo empregador, de modificações excepcionais e transitórias em cláusulas do contrato de trabalho, para enfrentamento de necessidades empresariais da mesma natureza. É o que ocorre, por exemplo, com alterações unilaterais do contrato, implementadas a título Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 136 DOUTRINA inequivocamente excepcional, em situações de emergência, resguardado sempre o caráter fugaz, transitório, da modificação, em contextos evidenciadores de que a recusa do empregado em acatar a ordem lançada implicaria em absoluta falta de colaboração. Em tais situações, o princípio da lealdade contratual e o dever de colaboração no âmbito da prestação de serviços dariam suporte jurídico ao exercício do jus variandi12 Obviamente que está-se referindo a alteração contratual excepcional e provisória que não afete fundamentalmente a índole da prestação pactuada e que não provoque redução salarial, evidentemente. A quarta situação-tipo concerne à autorização conferida, explícita ou implicitamente, pela ordem jurídica à implementação, pelo empregador, de modificações em cláusulas contratuais, de modo permanente ou transitório, em situação de necessidade empresarial, como exercício do chamado jus variandi extraordinário. Neste grupo encontram-se alterações contratuais claramente lesivas ao obreiro - mas autorizadas por lei. A CLT apresenta diversas dessas situações-tipo: parágrafo único do art. 468 (que trata da reversão); art. 461, § 4° (que trata da alteração funcional de trabalhador, em face de deficiência física ou mental, em contexto de programa previdenciário para a recuperação do obreiro); art. 61, § 1° (que trata da determinação de sobrejornada por motivo de força maior ou para consecução de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar manifesto prejuízo); art. 469, § 3° (que (rata da alteração de local de trabalho); art. 450 (que trata da determinação para ocupação interina, pelo obreiro, de cargo de comissão ou da substituição provisória de colega). Na mesma linha, a Lei n° 3.207/57, que autoriza a transferência da zona de trabalho do empregado vendedor (art. 2°, § 2° da Lei n° 3.207/57 - este diploma censura, porém, a redução da zona de trabalho do vendedor viajante ou pracista, desde que importe em redução de salário: §1° do mesmo art. 2° da Lei n° 3.207/57). No presente grupo encontram-se também alterações contratuais inferidas da ordem jurídica heterônoma estatal pela prática jurisprudencial do país. Algumas súmulas do Tribunal Superior do Trabalho são claramente sugestivas de tais alterações. Ilustrativamente, o Enunciado 265, TST (que trata da supressão do adicional noturno habitual, havendo troca de horário de trabalho); também o Enunciado 291, TST (que trata da supressão das horas extras e adicional habituais, caso suprimida, na prática, a sobrejornada); finalmente, o Enunciado 248 (que trata da supressão do adicional de insalubridade ou de periculosidade habituais, caso afastadas as circunstâncias insalubres ou perigosas). A quinta situação-tipo concerne à autorização conferida pela ordem jurídica autônoma negociada (convenção coletiva ou acordo coletivo do trabalho) à implementação, pelo empregador, de modificações em cláusulas contratuais, de modo permanente ou transitório. A Constituição de 1988 se reporta a tais situações em seu art. 7o, incisos VI (redução de salário), XIII (jornada de trabalho e compensação) e XIV (jornada em 12. Colaboração e lealdade à empresa são dois importantes deveres obreiros que a doutrina entende resultar do contrato de emprego. Simone Cruxên Gonçalves, por exemplo, cita quatro deveres: obediência, fidelidade, colaboração e diligência. In ob.cit., pp. 42-45. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 137 DOUTRINA turnos ininterruptos de revezamento). É claro que aqui a autorização provinda da norma coletivamente negociada não é absoluta, nem pode ser tão abrangente a ponto de permitir o descumprimento do conteúdo legal mínimo imperativo do contrato de trabalho - conforme esclarecido pelo princípio da adequação setorial negociada13. Excluídas, desse modo, essas cinco situações-tipo permissivas do exercício lícito do jus variandi pelo empregador (ordinário ou extraordinário), a regra da vedação a alterações contratuais lesivas ao obreiro prevalece sobre o jus variandi empresarial14. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DELGADO, Mauricio Godinho, Alterações Contratuais Trabalhistas, São Paulo: LTR, 1999, , Introdução ao Direito do Trabalho, 2a ed., São Paulo: LTR, 1999. GONÇALVES, Simone Cruxên, Limites do Jus Variandi do Empregador, São Paulo: LTR, 1997. POSI, Carlos, Manual Práctico del Ius Variandi, Buenos Aires: David Grinberg Libros Jurídicos, 1995. VIANNA, Márcio Túlio, Direito de Resistência, São Paulo: LTR, 1996, p. 421. _________, “Fundamentos e Tendências do Jus Variandi", Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3o Região, ano 26, vol. 47/50, Belo Horizonte: TRT/MG. 13. A respeito de tal princípio, consultar a obra deste autor, Introdução ao Direito do Trabalho, 2ª ed., cit., pp. 163-165. 14. Para maior reflexão sobre o tema das mudanças do contrato de trabalho (objetivas e subjetivas), consultar o livro deste autor Alterações Contratuais Trabalhistas, São Paulo: LTR, 2000. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 138 CONTRATOS DE TRABALHO RURAL E AGRÁRIOS Saulo Emídio dos Santos* Sumário: 1. Introdução; 2. O contrato de trabalho rural; 3. Os contratos agrários; 4. A correlação dos contratos agrários e de trabalho; 5. Conclusão. 1. INTRODUÇÃO O tema fica delimitado à caracterização dos diversos tipos de trabalho rural, os que configuram pacificamente vínculo de emprego, os que não configuram (ou melhor, os agrários) e os que se situam em uma zona de uma certa interseção com acirradas controvérsias a respeito. Far-se-á análise dos elementos de identificação de cada tipo de contrato, logicamente diferenciando uns dos outros. Por fim, serão destacadas as conseqüências desta diferenciação. Pois bem, o intervencionismo do Estado nas relações de trabalho subordinado não é antigo, tendo se iniciado após a Revolução Industrial e ganhado corpo, particularmente no Brasil, durante a primeira metade deste século. O Estado brasileiro houve por bem intervir também, porém bem mais recentemente, a partir dos anos sessenta, nas relações de trabalho agrário. O intervencionismo no trabalho subordinado (sob ordens do patrão) foi provocado pela chamada questão social, entendida esta como o tenso conflito entre patrões e empregados, onde a liberdade contratual ensejava a exploração dos trabalhadores. Esta mesma questão social foi aliada da denominada questão agrária, para, juntas, provocarem o intervencionismo estatal através das normas de direito agrário, identicamente para evitar a exploração de trabalhadores na livre negociação agrária. Ao criar o direito do trabalho, o Estado se preocupou em proporcionar condições mínimas de vida digna para o trabalhador, mas resguardando, aqui e acolá, a produtividade e a lucratividade da empresa. Ao criar o Direito agrário, particularmente as normas sobre contratos agrários, o Estado se preocupou, do mesmo modo, em assegurar condições mínimas de vida digna aos que usam e exploram temporariamente a terra alheia, mas igualmente exigindo produtividade racional destes. Vê-se que, em ambas as mencionadas oportunidades de intervencionismo estatal, o legislador pretendeu valorizar o ser humano e o seu trabalho, bem como incrementar o crescimento econômico. Esta compatibilização da livre iniciativa com a proteção ao trabalhador está explicitada no artigo 170 da Constituição. Nessa intervenção estatal temos as normas tutelares sobre os contratos de trabalho rural e os contratos agrários. Em todos eles, a relação jurídica é sempre a de alguém que trabalha em imóvel rural que não lhe pertence. As diferenças residem na forma de prestação do trabalho, na de auferir o respectivo rendimento e na distribuição dos riscos do insucesso. Dependendo de tais diferenciações, o contrato se situa no direito do trabalho ou no direito agrário. * Juiz do TRT da 18ª Região. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 13 9 DOUTRINA 2. O CONTRATO DE TRABALHO RURAL O contrato de trabalho, o regido pelo Direito do Trabalho, tem como principais elementos de diferenciação a subordinação hierárquica do obreiro ao produtor rural e detenção por este, de forma exclusiva, dos riscos do empreendimento econômico. Como ensina PLÁ RODRIGUES, é a alteridade, tradução do termo espanhol ajenidade que significa alheabilidade, a qualidade de ajeno (alheio), dando a idéia de que o empregado trabalha por conta e risco alheios, ou seja, por conta e risco do empregador. Estes dois elementos - o poder hierárquico e o risco - estão ligados por intenso nexo causal. Se é o produtor quem assume a álea do processo produtivo, é natural que tal responsabilidade esteja baseada na prerrogativa de poder conduzir a forma de execução do trabalho. O lucro, por isso, deve variar em proporção direta com a eficiência da administração. Sendo assim, toda vez que o obreiro trabalhar por conta do produtor, com remuneração isenta de risco, por um período que exceda e idéia de eventualidade, estará sob o abrigo da legislação trabalhista. É interessante salientar que a subordinação nem sempre decorre de uma ostensiva direção hierárquica, nas tarefas em que o empregado é capaz de se ativar sem administração constante. Ela decorre, neste caso, da circunstância de o trabalhador atuar por conta e risco do produtor rural, integrado no empreendimento econômico como peça do fator trabalho. A subordinação varia inversamente proporcional ao grau de especialização técnica do empregado. 3. OS CONTRATOS AGRÁRIOS Os outros contratos que envolvem trabalho rural, porém não alcançados pela legislação trabalhista, são os regidos pela legislação agrária. Há os dois nominados em lei (Estatuto da Terra), de parceria e de arrendamento, e há os inominados. Estes últimos, conforme o artigo 39 do Regulamento dos contratos agrários (Decreto n° 59.566/66), devem obedecer, no que couber, às mesmas regras destinadas á parceria e ao arrendamento rural, as quais se resumem na exigência de se dar ao imóvel a sua função social (produção eficiente, direta e pessoal, preservacionista dos recursos naturais e com bem-estar social para exploradores e demais trabalhadores). Pode-se imaginar como inominado, por exemplo, um contrato em que o agricultor recebe a terra bruta para desbravar, plantar, auferir o lucro e em seguida devolver com pastagem formada. Poderíamos chamar este ajuste de cessão da terra para uso e forma. Existem também os contratos de produção integrada, pelos quais as indústrias financiam, orientam e fornecem insumos aos produtores rurais, mediante exclusividade na compra da produção, com compensação com aqueles bens e serviços fornecidos. Aqui não se trata de uso da terra alheia por trabalhador, mas é um contrato de nítido interesse agrário. Pode-se mencionar, também, o contrato de comodato. Aqui eu abro um parêntese para dizer que já é hora de o direito agrário positivo tratar desses contratos inominados, os quais proliferam na prática cotidiana do fenômeno sócio-econômico, devendo fazê-lo de uma maneira mais objetiva e específica, porque neles também se encontram cláusulas leoninas, como é o caso, por exemplo, da Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 140 DOUTRINA produção integrada, entre produtor e indústria, onde esta impõe preços e condições, além de exigir exclusividade na compra dos produtos. Os contratos agrários nominados sofrem marcante dirigismo legal através do Estatuto da Terra e de outros dispositivos normativos que tratam do uso e da posse temporária da terra. Como contratos legalmente dirigidos que são, prescindem de forma, nem precisando ser escritos. Aliás, quase toda relação jurídica muito dirigida pela lei não necessita de forma solene. O dirigismo estatal sobre os contratos agrários se dá através de cláusulas obrigatórias que protegem os contratantes mais fracos economicamente, ou sejam, o parceiro e o arrendatário que utilizam a terra alheia. A lei, no mesmo diapasão, tacha de nula de pleno direito qualquer cláusula contratual que pretenda estipular renúncia ou desrespeito às garantias mínimas asseguradas na mesma legislação. Esse protecionismo legal se manifesta, notadamente, através das seguintes garantias, dentre outras: 1 - prazos mínimos de vigência dos contratos, com prorrogação necessária à ultimação da colheita; 2 - direito de preferência para aquisição do imóvel ou para renovação do contrato; 3 — aviso prévio de seis meses para a rescisão; 4 - limite máximo para o preço a ser pago ao arrendador e para a percentagem do parceiro outorgante (dono) no produto da parceria; 5 - regras sobre a estipulação dos preços dos produtos; 6 - destinação de casa para moradia e área para atividade hortifrutigranjeira de subsistência para o parceiro outorgado; 7 - proibição de labor gratuito para o titular do imóvel, de exclusividade para venda da colheita, etc. 4. A CORRELAÇÃO DOS CONTRATOS AGRÁRIOS E DE TRABALHO Vê-se que os contratos agrários, no aspecto jurídico protetivo, guardam alguma semelhança com os contratos de trabalho, isto porque, repita-se, eles giram em torno da mesma questão social. Não se quer dizer, entretanto, que eles, mesmo quando entabulados e executados regularmente, possam ter a mesma natureza empregatícia. São os desvirtuamentos que os confundem. No aspecto fático, isto é, no mundo da prática verificada cotidianamente no meio rural, eles podem se assemelhar e se confundir mais ainda, algumas vezes por malícia de uma das partes, mais muitas vezes por ingênua boa-fé. O contrato de arrendamento, embora com pouca freqüência, pode encobrir uma relação empregatícia, quando o suposto arrendatário sofre interferência administrativa do arrendador (subordinação) e este último chama para si o risco do insucesso na produção. Tudo depende das circunstâncias de fato envolvendo cada questão concreta. Já a parceria é a que mais comumente é utilizada para mascarar vínculo de emprego. O dono da terra, para evitar os encargos trabalhistas e o emaranhado de formalidades burocráticas que cercam o registro de um empregado, bem como o trabalhador, Rev. TST, Brasília, vol. 66, ns 3, jul/set 2000 141 DOUTRINA por necessidade ou por interesse na possibilidade de ganhar mais, entabulam uma relação de trabalho em que o primeiro cede ao segundo a terra para cultivo, combinando a partilha de produção, mas entrando o obreiro apenas com a sua mão-de-obra. Isso geralmente deságua em relação empregatícia por dois motivos: 1 ° - a lei exige que o parceiro cultivador tenha um mínimo de lastro econômico (capital), obrigando-o a arcar com o ônus de parte do custeio (fertilizantes, inseticidas e despesas na criação de animais). Ele não pode, então, ser hipossuficiente; 2° - sendo ele hipossuficiente, os evidentes adiantamentos pagos pelo dono de terra, ou qualquer outra ajuda de subsistência, não serão ressarcidos em caso de frustração da colheita. Esta situação configura assunção do risco pelo proprietário e o obreiro acaba tendo trabalhado por conta daquele, o que caracteriza subordinação. Existem inúmeras outras modalidades de contratação no meio rural, as inominadas, que podem ou não configurar relação de trabalho protegida pela Consolidação das Leis do Trabalho. Há os peões que trabalham remunerados por dia, diretamente para os fazendeiros ou agenciados por empreiteiros. Se este trabalho se dá por um ou outro dia, é eventual e não gera vínculo. Mas se é prolongado por um período de tempo que afaste o caráter de eventual, haverá o vínculo. As empreitas também são muito comuns na sazonalidade das atividades agropecuárias. Há empreitas para bater pastos, para fazer cercas, aceiros, limpeza de lavouras, colheitas, etc. Quando elas são contratadas e executadas nos moldes do direito civil, com autonomia e risco do empreiteiro, não há problema. Se este, porém, é aquinhoado com repetidas empreitas e as executa pessoalmente e sob a supervisão do fazendeiro, pode-se vislumbrar nisto o salário por tarefas e incidirá a legislação trabalhista. São muitas, enfim, as situações e nem sempre é fácil estabelecer a diferenciação em casos concretos. O que importa é que, em cada caso levado às barras da Justiça, os detalhes dos fatos são os que ensejam um convencimento a respeito. Se se concluir que o trabalho prestado gerou vínculo empregatício, à luz da lei, torna-se absolutamente irrelevante o rótulo contratual que as partes tenham dado ao caso. Incidirá, forçosamente, a legislação trabalhista. É interessante salientar, por último, que o direito está evoluindo para, num futuro não longínquo, uniformizar as regras de proteção aos trabalhadores do campo, atuando eles como empregado ou não. O artigo 17 da Lei n° 5.889/83, a lei que especifica as peculiaridades jurídicas do trabalho rural, determina que as suas disposições sejam estendidas, no que couber, aos trabalhadores que não tenham vínculo empregatício. O Decreto n° 73.626/74, regulamentando aquela lei, dispõe que o cabimento de tal extensão diz respeito à jornada de trabalho, labor noturno, restrição ao trabalho do menor e outras normas compatíveis com o tipo da atividade. Dentro desta mesma tendência, o direito positivo brasileiro adotou a igualdade entre empregados rurais, parceiros, arrendatários e até pequenos proprietários, além de outros de mesmo nível econômico, isto para efeitos de enquadramento sindical como trabalhadores rurais. Esta igualdade já constava do Decreto-Lei n° 1.166/71 e parecia, em principio, ter se incompatibilizado com o princípio da liberdade organizacional dos sindicatos, instituído pela Constituição de 1988. Todavia, o parágrafo único, do art. 8o, Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 142 DOUTRINA da mesma carta Magna, dispõe que esta liberdade organizacional se aplicaria aos sindicatos rurais nas condições que a lei estabelecesse, o que torna aceitável a tese da recepção do Decreto-Lei n° 1.166 pela Carta Magna. E, com efeito, como que reafirmando as disposições do Decreto-Lei n° 1.166/71, veio a lume, em abril de 1993, o Decreto Legislativo n° 05, do Congresso Nacional, aprovando a Convenção n° 141, da Organização Internacional do Trabalho (LTR 93-I). Esta norma de direito internacional, que é fonte formal de direito interno quando aprovada pelo país membro da OIT, preceitua a liberdade, autonomia, incentivo e fortalecimento das entidades de trabalhadores rurais. E, para efeito de definição do que seja trabalhador rural, repita-se, agrupa na mesma categoria os assalariados, parceiros, os arrendatários, os pequenos proprietários e outros. Há, todavia, um enorme inconveniente neste agrupamento de empregados e pequenos empregadores rurais na mesma categoria sindical. Compreende-se que todos eles tenham comunhão de interesses em reivindicar do governo mais e melhores serviços e obras públicas, além de outras atuações que não possam gerar conflitos de interesses entre eles. No relacionamento tipicamente trabalhista, porém, tanto no plano individual como no coletivo, a entidade sindical jamais estará plenamente à vontade para a defesa dos interesses dos empregados rurais porque no seio da categoria estão pequenos empregadores (os parceiros, os arrendatários, os pequenos proprietários, etc.). Estes nunca vão lutar por vantagens trabalhistas que lhes trarão mais ônus. 5. CONCLUSÃO O que se pode dizer é que, dentro do universo do trabalho rural, existem várias espécies de contratos, a saber: 1° - O contrato de trabalho do empregado; 2° - A parceria, mais parecida como uma sociedade entre o dono da terra e o agricultor, onde este último trabalha por conta própria e divide a produção com o outro; na parceria em que o parceiro outorgado concorre apenas com a mão-de-obra, há presunção juris tantum de que ela seja falsa (contrato de trabalho); 3° - O arrendamento, mais parecido com uma locação de imóvel, onde o arrendatário explora a terra, por conta própria, e paga ao dono o preço combinado; 4° - Outros contratos atípicos ou de direito comum, como a empreitada, a locação de serviço, a produção integrada, a cessão de terra para forma, o comodato, etc. Urge que o direito agrário positivo, atualizando-se com a realidade, regulamente tais contratos. Destas quatro categorias contratuais mencionadas, a primeira, a do contrato de empregado, indiscutivelmente gera direitos trabalhistas. As demais, quando os contratos são estipulados e realmente executados dentro das condições fáticas previstas em lei, não atraem a aplicação generalizada da legislação trabalhista, mas das normas próprias do direito agrário, do direito civil e do direito do trabalho que com elas sejam compatíveis (art. 17 da Lei n° 5.889/73). Estas mesmas categorias, todavia, quando desvirtuadas na forma de cumprimento dos contratos, de maneira que as reais condições de trabalho se enquadrem no modelo legal de empregado, atrairão a aplicação da legislação trabalhista, mesmo que as cláusulas estejam explicitando em sentido contrário. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n°3, jul/set 2000 143 O TRABALHADOR RURAL E A NOVA PRESCRIÇÃO Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena* 1.Não que a temática seja espinhosa ou complicada, mas a sua abordagem impõe sistematização, um método organizativo de focos e patamares sejam quanto a fontes legais, sejam quanto a conceitos. A fonte básica que gerará toda uma construção jurisprudencial vem da Emenda Constitucional n° 28/2000, que deu nova redação ao inciso XXIX do art. 7°, e revogou o art. 233 da Constituição Federal de 1988, cuja redação, em vigor desde o dia 25 de maio de 2000, é a seguinte: “XXIX - ação quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho.” Conseqüentemente, foram revogadas as letras a e b do aludido inciso, que estabeleciam a distinção dos prazos prescricionais entre trabalhadores urbanos e rurais. Para estes últimos as pretensões eram imprescritíveis desde o início do contrato de trabalho. Mas as peças desse resultante jogo de xadrez devem ser previamente dispostas a fim de que se possam acionar os seus movimentos e se aquilatar a sua força operativa. 2. De um primeiro jato, vê-se o pesquisador diante do quadro da intertemporalidade das leis e logo lança à mesa, em proveito específico, o art. 2°, e seu § 1°, da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei n° 4.657, de 4 de setembro de 1942), verbis: “Art. 2° - Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue. § 1° - A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.” No que se refere ao item XXIX do art. 7° constitucional, a revogação operou-se aberta e formalmente pela primeira hipótese do § 1° acima citado e, no tocante ao art. 233, embora tivesse sido expressamente mencionado na Emenda, a revogação se transmuda em absorção extintiva, já que a sucessão de prazos e medidas situados “de cinco em cinco anos” fez estes desaparecerem, tomada óbvia a impraticabilidade das formalidades previstas no dispositivo e em seus parágrafos, já que, no plano formal da norma (discutir-se-á o plano material e eficacial adiante), os tempos “de cinco em cinco anos” deixaram de existir, como que ora transmudados e consubstanciados nos “últimos” cinco anos de que trata o novo preceito. * Juiz do TRT da 3" Região. Aposentado. Professor das Faculdades de Direito da UFMG e da PUC/MG. Aposentado. Advogado em Belo Horizonte. Membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 144 DOUTRINA 3. Qualificada a regra do art. 2°, e seus §§, da Lei de Introdução ao Código Civil, como regra de sobredireito (Überrecht- direito que regula direito) que rege a vida temporal das leis, no mundo das relações jurídicas que aqui se referem, vê-se que os arts. 912 e 916 da CLT como que se subsumem, aglutinados em uma operação congeminada, no preceito constitucional do art. 7°, XXIX, prefigurando-se os dois artigos consolidados como dois peões que se aventuram em ir à frente nos primeiros lances, ressalvando-se que a chamada à cena de tais dispositivos não importa, a priori, em uma qualquer tomada de posição conclusiva para o desfecho do tema. Assim estão redigidos: “Art. 912 - Os dispositivos de caráter imperativo terão aplicação imediata às relações iniciadas, mas não consumadas, antes da vigência desta Consolidação. (...) Art. 916 - Os prazos de prescrição fixados pela presente Consolidação começarão a correr da data da vigência desta, quando menores do que os previstos pela legislação anterior” (verbis). Dificilmente se poderá fugir dos prismas conceituais e dinâmicos que resultam da conjugação de todos os preceitos legais (inclusive, a fortiori, o constitucional) até aqui trazidos à cena no quanto eles se entrelaçam e reciprocamente atuam como forças geradoras de um processo hermenêutico interligado. O art. 912, ao mesmo tempo em que se irmana com o art. 2o, § 1o, da Lei de Introdução ao Código Civil e com ele se entrecruza, no ponto-momento em que a sua norma passa a ter eficácia, nele abre uma vertente mas em realidade dele não se divorcia ao tomar como suporte fático de sua “aplicação imediata” as relações “iniciadas” mas “não consumadas” antes da “vigência” da Consolidação. Esse artigo, o 912/CLT, já vem impregnado de um compromisso e de uma teoria de direito intertemporal, com força retrooperante, quando aponta e abarca as relações a que se aplica, aquelas constituídas mas não ainda acabadas no tempo-momento passado da entrada em vigor da CLT. Em contrapartida e pari passu, não teve essa explicitude a Emenda Constitucional n° 28/2000, mas em sua implicitude não se pode negar que a norma dela resultante também se volta para tempos-trabalho percorridos no passado, redimensionando-os para fins do lapso prescricional, com a sua fixação em cinco anos. Ambas as normas, o art. 912/CLT e o atual n° XXIX do art. 7o constitucional, como é curial, todavia e icto oculi, regem fatos-suportes da mesma natureza, os conformados e preenchidos no continuum da relação de emprego apanhado em seu preteritum. O que cabe examinar é se os fatos-suportes por eles abarcados, embora tenham a mesma índole, correm na mesma direção ou se eles se cruzam, e se, em sendo ou não distinto o seu start (o seu dies a quo), deverão ser submetidos a um mesmo tratamento hermenêutico. Por sua vez e além disso, é inegável que a Emenda Constitucional fixou para os trabalhadores rurais um prazo prescricional menor que o anterior, do art. 7o, XXIX, b Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 145 DOUTRINA (o de cinco anos), quando, por este item, cabia a prescrição somente dois anos depois de extinto o contrato. O ponto de intersecção dos arts. 916 da CLT e o novo preceito constitucional trazido pela Emenda Constitucional n° 28, conquanto normas legais de plano hierárquico não coincidente, é que dificilmente se poderá dispensar a esta última tratamento diverso do princípio jurídico consagrado no primeiro, qual seja, o princípio da aplicação imediata da nova norma constitucional, que passa a reger os contratos de trabalho nos mesmos parâmetros dispostos no art. 912, da Consolidação das Leis do Trabalho. A título ilustrativo, basta se lembre a incisiva passagem de Pontes de Miranda: “O princípio jurídico fundamental é o da incidência imediata da nova Constituição. Se o legislador constituinte prefere que se regule a transição, cabe-lhe dizê-lo explicitamente, ou, pelo menos, implicitamente”1. Nesta vertente é que o problema se torna mais delicado e exige um atento esquadrinhamento. 4. A prescrição é uma forma jurídica de se adquirirem ou de se extinguirem direitos, que tem como elemento-suporte de movimento exclusivamente o decurso tempo, pontuado em dois momentos: o dies a quo, o do começo da contagem do respectivo prazo e o dies ad quem, o de sua exaustão. Em outra obra, Pontes de Miranda expõe com clareza: “No suporte fáctico da regra jurídica sobre prescrição há de haver a pretensão, ou a afirmação de existir, e o tempo, de cujo decurso depende a incidência da regra jurídica. Para o legislador, há o problema técnico - de técnica legislativa, portanto de iure condendo - que consiste em se escolher o tamanho do elemento-tempo. Não se pode dizer que se hajam obtido critérios científicos: o fundamento fixativo é, quase sempre, histórico, reporta-se, por conseguinte, a momento em que se criou a pretensão, ou a ação, ou a momento posterior que alterou a primitiva extensão temporal”2. Ainda que se admita que a fixação dos prazos prescricionais atém-se, predominantemente, a “fundamentos históricos” - o que seria melhor dizer a concepções ideológicas históricas. Jamais se poderá negar que ela, como preceito regulador da vida jurídica e do trânsito das relações jurídicas em geral, se assenta no interesse público e está carregada do imperativus da lei que somente admite seja excepcionada nos casos por ela mesma excepcional e taxativamente previstos. Oscar Tenório abre, na equação, um desdobramento de todo pertinente, quando, ao aludir virtualmente aos suportes integrantes das relações jurídicas que preenchem o mundo jurídico, diz que 1. MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1968, t. VI, p. 370 - grifos, do Autor. 2. MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1955, t. VI, p. 113, n° 7 Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 146 DOUTRINA “o tempo é um dos pressupostos da norma jurídica”3, e isto o faz depois de sentenciar com propriedade e singeleza: “O fenômeno jurídico se processa em determinada área e em determinado tempo.”4 Como modo de ser das coisas (e não ser, como afirmara Kant5), o tempo integra obviamente o seu devir, como acontece nas relações de trabalho, que são de natureza continuativa. Em se tratando, portanto, de contratos, cuja execução perdura no tempo, como o contrato de trabalho, ainda que por prazo determinado - e não os chamados contratos instantâneos6 - é da maior importância sejam observados tais contratos no que se refere à sua regência legal, ou seja, qual a lei que no tempo se lhes aplica, se a da conclusão do contrato ou a de sua execução e término, recebendo-se com reserva a doutrina tradicional, segundo a qual “A lei que regula o contrato, dentro do país ou no estrangeiro, é sempre e invariavelmente, a respeito da forma e da capacidade dos contratantes, a que vigorava ao tempo em que foi concluído, ainda que outra posterior venha a se opor à sua existência”7, A essa passagem acresce, logo adiante, o consagrado civilista: “Regulam igualmente pela lei do contrato os fatos que se apresentarem em sua execução”8, como uma decorrência do disposto no art. 6° da Lei de Introdução ao Código Civil, repetido em sucessivas Constituições Federais (hoje, art. 5°, XXXVI), pelo prestígio do “ato jurídico perfeito” e do “direito adquirido”, artigo esse que, em seu § 1°, já define o “ato jurídico perfeito” como aquele “já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou”. 5. Em termos de perspectiva histórica, desnudos e sem ambages, a lei que encurtou o prazo prescricional para os rurícolas não alcança os contratos pactuados antes de sua vigência, mas somente aqueles que tiverem início a partir dela, ou seja, a partir de 25 de maio de 2000, Se o contrato de trabalho, como um todo, perdura no tempo e se preenche de regras formal e substancialmente imperativas, o tratamento do decurso prescricional das prestações que nele se sucedem abebera sua primeira fonte de incidência no art. 912 da CLT, que teve por escopo apanhar desde logo todas aquelas relações de trabalho, embora anteriores, que perduraram até à sua vigência, cuja hipótese mais éclatante é a do 3. TENÓRIO, Oscar. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1955, p. 191, n° 335. 4. TENÓRIO, 1955, p. 190, n° 332. 5. Cf. CAMPOS, Carlos. O Mundo como Realidade. Belo Horizonte: Cardai, 1961, p.50 et seq. 6. Cf. GOMES, Orlando. Contratos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1971, pp. 82-4, n° 58. 7. MENDONÇA, M. I. Carvalho de. Doutrina e Prática das Obrigações. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1956, t. II, pp. 259-60, n° 597. 8. MENDONÇA, 1959, p. 260. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 147 DOUTRINA tempo de serviço e seu cômputo, aplicando-se, de imediato, os arts. 451,452 e, particularmente, o art. 453, por força do qual foram atraídos para o quadro da Consolidação também aqueles contratos a prazo anteriores a ela, firmados ainda ao tempo da Lei n° 62, de 1935. Não se pode negar que, se a direção da norma do art. 912/CLT teve em vista a tutela do trabalhador, menos certo não é que tal preceito veio consagrar o princípio da unicidade do contrato e de seus efeitos, independentemente da superveniência de outra lei que o alterasse. Na estrutura do ordenamento jurídico não se presume qualquer antinomia e ainda que alguma possa ocorrer, cabe ao aplicador da lei dispensar ao caso o tratamento que mais torne consentânea a suposta lei dissonante com os princípios básicos que sustentam a coerência desse ordenamento, no que toca especialmente a direitos e garantias das partes em seus negócios jurídicos. Seria uma incongruência se se aplicasse o art. 916 da CLT tout court sem atentar-se para o princípio da retrooperância do citado art. 912, que apanha situações jurídicas também anteriores à vigência do corpo de leis nela compreendidas. Mais pernicioso ainda será o simplismo de pinçar a regra prescricional do art. 916, pura e simplesmente, para fazer por ela manipulado o art. 7°, XXIX, da Constituição Federal, sem ir mais longe e sem avaliar outros fundamentais dados, além da substanciação do art. 916, tais como: a) em sua literalidade teleológica, o art. 916, como um numerus clausus, dirige-se especificamente “aos prazos de prescrição fixados pela presente Consolidação”, enquanto a prescrição que intercepta a relação de trabalho está regulada por lei constitucional, fonte e hierarquia diversas; b) se a nova regra prescricional veio a benefício do empregador rural, a seca aplicação do art. 916 da CLT acabaria por acarretar uma desigualdade de tratamento diante do que antes se passou com o art. 912, a benefício dos trabalhadores e aí estaria o intérprete em dissonância com o princípio da igualdade de tratamento para as mesmas partes do contrato, em irreverência ao art. 5°, caput, da Constituição Federal e mais; c) a Emenda Constitucional foi impulsada por níveis mais altos ainda, em reverência ao princípio da igualdade de tratamento, agora focado para a relação de emprego, em sua unidade conceitual, que abarca todos os trabalhadores e todos os empregadores - os do campo e os urbanos -, extinguindo a diversidade de posições jurídicas entre uns e outros quanto à prescrição, aplicável a um contrato da mesma natureza. Na escorreita colocação de Francisco Campos, o tratamento distônico fere o princípio da igualdade específica quando discrimina pessoas, fatos, negócios ou atos entre os quais existe identidade ou igualdade de condições gerais, por pertencerem a uma mesma classe, categoria ou ordem''9. A captação do art. 5° constitucional ganha maior relevância na igualdade dos prazos prescricionais, o que robustece a posição do intérprete ao aplicar de imediato o 9. CAMPOS, Francisco. Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1956, v. 2, p. 20-grifos, nossos. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 148 DOUTRINA preceito inovador, curvado aos princípios da razoabilidade e ao teleológico, a finalidade político-jurídica de igual garantia de direitos para as partes de um mesmo contrato10. O princípio da igualdade tornou-se o princípio cardinal no Estado de Direito, como vis atractiva da construção do ordenamento jurídico e que hoje é realçado em algo mais do que a formal e estrita igualdade na aplicação da lei, para altear-se, como sintoniza Canotilho, em um princípio maior e mais abrangente, o da igualdade na aplicação do direito, que, segundo o renomado constitucionalista, “é mais do que uma positivística igualdade de aplicação da lei: é igualdade através da lei. Igualdade nos encargos (igualdade na tributação, igualdade nas medidas legais, ingerentes na liberdade e na propriedade), assinalou a doutrina liberal; igualdade nas vantagens (ex.: igualdade nas subvenções) assinala a doutrina do Estado Social”11. Como resultado da proibição do arbítrio12, dir-se-ia, melhor, vedação ao arbítrio, imprime-se nítido o princípio fundamental da igualdade, no Estado Social de Direito, na direção pautada pela ordem jurídica em dimensionar através de cortes iguais os momentos de aquisição e de perda de direitos pelo decurso do tempo, que decorram de normas gerais e de status iguais, quando reunidas na regulamentação de uma mesma relação jurídica constituída pelos mesmos fatos-suportes formadores (vejam-se, in casu, os arts. 2o e 3o da CLT e arts. 2° e 3o da Lei n° 5.889, de 08.06.1973). En passant, concordante com o primado do teleológico na interpretação constitucional, é o escólio de Francisco Campos, coincidente com Black. “Demais, como instrumento político que é, a constituição deve ser interpretada liberalmente, de maneira a favorecer a atuação dos seus princípios e facilitar os fins que teve em vista atingir com o seu estabelecimento”13. No Estado social de direito, a tutela do trabalho figura como um postulado fundamental - ein Grundrecht -, que se assenta sobre princípios gerais de não-discriminação, como conteúdo da norma constitucional e providos, como regra de direito, de eficácia imediata - unmittelbar geltendes Recht.14, Ainda no curso desse procedimento exegético - last but not the least - é inquestionável que não se pode apagar como dado de avaliação o art. 233/CF 1988: a operação hermenêutica, na área da prescrição trabalhista do rurícola, complicou-se muito quando o reformador constituinte, conquanto cheio de obviedades, aboliu expressamente o art. 233 da Carta de 88. 10. Cf. LINARES QUINTANA, Segundo V. Tratado de Interpretación Constitucional. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1998, p. 273 et seq. e 559 et seq. 11. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador. Coimbra: Coimbra Editora, 1994, p. 380-1, n° 4.2.2. 12. CANOTILHO, 1994, p. 382. 13. CAMPOS, 1956, v. 1, p. 416-grifos, nossos. 14. Cf. BECKER, Franz. Grundzüge des öffentlichen Rechts. 5. Aufl. München: Franz Vahlen, 1992, p. 53, § 7° e 56 et seq. n° III. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 149 DOUTRINA Ao chamar expressamente à cena esse preceito constitucional, o reformador constituinte arremeteu-se primeiramente ao art. 7°, XXIX, e logo em seguida, senão concomitantemente, atraiu para o seu campo de revogação os períodos contratuais “de cinco em cinco anos” que pontuavam os contratos de trabalho do campo e, em lance implicitamente ponderado, atirou-os na revogação no mesmo momento em que o fazia com a prescrição indeterminada. A conotação dos cinco anos atuais e dos “cinco em cinco anos”, em apropriação hermenêutica correta, adveio irrefutável. Se o prazo “de cinco em cinco anos” anteriormente em vigor, através do qual se facultavam em acerto quitações periódicas de débitos trabalhistas e se tal prazo, inegavelmente tem natureza preclusiva15, é patente que não se pode afastar da aplicação do atual XXIX do art. 7° da Constituição, também seu ligamem-função com aqueles prazos anteriores, prazos esses que ingressaram no objeto da Emenda e que, na verdade, também se consubstanciou em um só, o dos últimos cinco anos ora em vigor. Há mais porém: o que se quer dizer é que, já penetrando os umbrais da exegese constitucional, a qual, aqui, não pode deixar de ser presidida pela interpretação sistemática, fica impraticável ao aplicador, ao deparar o novo prazo prescricional do n° XXIX do art. 7° da CF/88, afastar de seu campo interpretativo que o novo preceito absorveu também um pressuposto mensurável temporal, ao incluir para excluir, no mesmo ato, o art. 233 da Carta, com os seus “de cinco em cinco anos”. De um modo ou de outro, comprometeu-se o reformador constituinte ao trazer para a sua Emenda também esses tempos-suportes “de cinco em cinco anos”, porque a prescrição atual não poderia alcançá-los apenas parcialmente, apanhando uns e deixando de apanhar outros. A assim pensar, estaríamos caminhando pelo abstruso. Acolhem-se aqui, com toda a propriedade, a advertência e a trilha abertas por Black: “Presume-se que o legislador não visou a um absurdo ou que absurdas conseqüências pudessem decorrer da edição da lei. Tal resultado poderá ser evitado se os termos do ato o admitem através de uma razoável construção do estatuto - It is presumed that the legislature does not intend an absardity, or that absurd consequences shall flow from its enactements, Such a result will therefore be avoided, if the terms of the act admit of it, by a reasonable construction of the statute ”16. No caso, nada seria mais esdrúxulo que entender não aplicável aos contratos de trabalho em curso a regra da nova prescrição e que eles permaneceriam sendo regidos pela regra anterior e que a prescrição somente se consumaria dentro em vinte, trinta ou quarenta anos, aplicando-se secamente a mens do art. 916 da CLT, alheando-se o intérprete de toda a confluência legal e exegética ora exposta. 15. Cf. MIRANDA, 1955, p. 11, n° 14, 113, n° 5, 121,147, in fine. 16. BLACK, Henry Campbell. Handbook on the Construction and Interpretation of the Laws. 2. ed. St. Paul: West Publishing, 1911, p. 129. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 150 DOUTRINA O que se quer dizer é que, virtualmente ou não, o novo prazo de cinco anos, do n° XXIX do art. 7°/CF, está impregnado, quanto à sua eficácia, do prazo anterior “de cinco em cinco anos” que nele teleologicamente se consubstanciou. 6. Para se tomar uma direção razoável na condução do tema, pode-se partir de um princípio axiomático bem reelaborado por Pontes de Miranda: “A imprescritibilidade é excepcional. A prescrição submetem-se todas as pretensões, inclusive as que correspondem a direitos reais, ao direito de família e ao direito de sucessões”17. Integrante da ordem pública a prescrição, os prazos nela previstos somente podem ser modificados por lei, “nem diminuídos nem aumentados por negócio jurídico”18, ao que adiciona o inconfundível jurista pátrio: “Nenhuma pretensão imprescritível pode tornar-se, negocialmente, prescritível... Isso não importa em que se não possa fixar, à vontade, o vencimento de alguma obrigação, pois, aí, o começo, segundo a lei, supõe esse vencimento”19. O plano da investigação, no tema, deverá abstrair-se do nível negocial e do interesse particular das partes (o empregado e o empregador) mas deverá manter-se na esfera estritamente legal e, em caráter de principalidade, na constitucional. Ao supor o aplicador do direito que está atrelado ao art. 916 da Consolidação das Leis do Trabalho (e ainda que se abstraia do inafastável contágio de seu art. 912), não poderá jamais descurar ele que a prescrição trabalhista, em sua regra fundamental, emana da Constituição Federal, que, no correto magistério de Livio Paladin “representa a fonte suprema, condicionante de qualquer outro ato ou fato normativo, sem ser nunca condicionada - rappresenti la fonte suprema, condizionanti ogni altro atto e fatto normativo, senza esserne mais condizionata" 20. Sem qualquer pitada de ironia, pode-se perguntar: reger-se-á a exegese da Emenda Constitucional n° 28 pela norma ordinária do art. 916 da CLT? Acontece que, como lei superior, não só a aplicação da lei constitucional sobreleva à das demais leis do ordenamento, que lhe são formal e materialmente subordinadas, mas também a força de expansividade de uma Constituição, sobre gerar suas próprias regras, rege-se por princípios que dela se dessumem, que a enfeixam como um todo harmônico. Obviamente, partem delas as diretrizes que governam as demais regras do ordenamento em sua inteireza conceptual. 17. MIRANDA, 1955, p. 127-8. 18. MIRANDA, 1955, p. 278, n° 1. 19. MIRANDA, 1955, p. 280, n° 3.; vide, ainda, p. 113, último período. 20. PALADIN, Livio. Diritto Costituzionale. 3. ediz. Padova: CEDAM, 1998, p. 154, n° 10; cf. no mesmo sentido, o clássico MORTATI, Constantino. Istituzioni di diritto pubblico. 8. ediz. Padova: CEDAM, 1969, t. 2. p. 315, n° 92 e 321, n° 95 e SCHLAICH, Klaus. Das Bumdesverfassungsgericht. 3. Aufl. München: C.H.Beck’sche, 1994, p. 8-9, ns. 11 e 12. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 151 DOUTRINA Na linha do tema aqui desenvolvido, não será exaustivo voltar ao magistério de Pontes de Miranda, quando incisivamente diz que: “Ao direito constitucional corresponde, como sobredireito, o direito intertemporal. A Constituição incide desde logo. Tendo de ser superior às leis ordinárias, corta o que lhe é contrário no presente e no futuro... O princípio fundamental é o da incidência imediata da nova Constituição”21. Parte-se, pois, do primeiro dado axiomático: a lei constitucional, originada da Emenda Constitucional 28, de 25 de maio de 2000, aplica-se imediatamente e tem como padrão exegético retor o princípio mais geral e fundamental do art. 5°, caput, da Constituição de 1988, que é a igualdade de todos os trabalhadores no que toca à força vinculante, cujas pretensões e direitos devem obedecer a um prazo comum de prescrição. Perseverar no espírito da lei (constitucional) anterior ou procrastinar o mais possível a aplicação da lei nova (a Emenda 28/2000) importaria isto em arremeter-se o intérprete contra o princípio formal da aplicação imediata da lei constitucional e contra seu conteúdo finalístico que é o de eliminar distorções nos prazos de garantia e de extinção dos direitos dos trabalhadores em geral. 7. A contextura conceituai e perspectivista acima deduzida, que elimina quaisquer posições preconceituosas no tratamento do tema da atual prescrição trabalhista geral, permite que agora se volte a questão para sua linha de especificidade, ou seja, o seu desenvolvimento à luz direito intertemporal propriamente dito. Como um contrato de trato sucessivo e de índole continuativa, o contrato de trabalho dura no tempo e se compõe de prestações sucessivas, que podem manter-se as preajustadas como as ulteriormente modificadas ou pelas partes ou por norma coletiva ou mesmo pela lei. In genere, a lei que se aplica ao negócio jurídico é a lei do tempo de sua constituição, princípio geral este que se extrai do art. 6°, § 1°, da Lei de Introdução ao Código Civil, já citado e como se infere da doutrina tradicional, aqui exemplificada nas passagens de Carvalho de Mendonça e de Oscar Tenório, também acima lembradas. Intocáveis pela lei nova são os requisitos da constituição do negócio jurídico observados segundo a lei revogada. Inúmeros são os contratos, porém, que se formam e se iniciam à luz de uma lei mas que, por sua natureza de contratos continuativos, passam a subordinar-se ao comando de outra ou outras leis posteriores, que a eles igualmente se aplicam e sobre os quais incide uma regra prescribente. Neste cenário é que se digladia a doutrina jurídica, diante do qual ao operador do direito assomam momentos de perplexidade que o fazem derivar para decisões as mais desencontradas, muitas delas contraditórias, impulsadas muitas delas elas de um espírito sectário, que envolve a declaração de prescrição de alto teor de subjetivismo ou de politicidade, em favor da parte que o juiz supõe seja a contratualmente mais fraca 21. MIRANDA, 1968, v. VI, p. 369-70 - grifos, do Autor. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 152 DOUTRINA ou carente de maior tutela jurídica, como, in casu, o trabalhador, conquanto legislador já tenha sob tais ângulos balizado os pressupostos e os prazos de fixação da prescrição. A pendência jurídica transita, em seu momento crucial, na superveniência de lei que reduz o prazo da prescrição (que é exatamente o caso aqui versado), sob risco de aplicação retroativa da lei nova e da lesão a um direito adquirido. Devem-se a Paul Roubier as bases da moderna doutrina de direito intertemporal que distingue efeito retroativo e efeito imediato da lei, deixando claro que o primeiro é aplicação no passado e, o segundo, aplicação no presente. Ensina o consagrado mestre: “Se a lei pretende aplicar-se a fatos concluídos (facta praeterita) ela é retroativa; se ela pretende aplicar-se a situações em curso (facta pendentia), é necessário estabelecer uma separação entre as partes anteriores à data da mudança da legislação, que não poderiam ser atingidas sem retroatividade e as partes posteriores, para as quais a lei nova, que deve aplicar-se, não terá senão um efeito imediato - Si la loi prétend s' appliquer à de faits accomplis (facta praeterita) elle est rétroactive; si elle prétend s' appliquer à des situations en cours (facta pendentia), il faudra établir une séparation entre les parties antérieures à la date du changement de législation, que ne pourraient être atteintes sens rétroactivité, et les parties postérieures, pour lesquelles la loi nouvell, si elle doit s'appliquer, n ‘aura jamais qu 'un effet immédiat”22. Como lembra bem R. Limongi França, “A questão se coloca sobretudo em face dos facta pendentia, pois com relação ao facta praeterita sempre haveria retroatividade, ao passo que relativamente aos facta futura não há retroatividade possível”23. Se tormentosa foi a evolução da doutrina do direito adquirido, que, segundo Gabba, teve sua melhor base conceitual em Savigny, como aquele direito “objeto da senhoria individual”, o que o afasta das expectativas, dos direitos expectados24, não menos verdade é que a vida dos direitos e suas garantias se tomaram mais questionáveis com a mudança das leis e com o advento e a abundância dos chamados contratos sucessivos ou continuativos, os quais, em sua dinâmica e em sua própria autonomia, se compõem de atos-fatos em série (Handlungen, como os enuncia Spangenberg, lembrado por Gabba25), que se afluem aos borbotões e se aglutinam para compor o negócio jurídico em seu complexo total (ultima ratio, como um todo incindível). 22. ROUBIER, Paul. Le Droit Transitoire. 2. ed. Paris: Dalloz et Sirey, 1960, p. 177. 23. FRANÇA, Limonge. Direito Intertemporal Brasileiro. 2. Ed. São Paulo: Revistados Tribunais, 1968, p. 423. 24. Cf. GABBA, C.F. Retroattività delle Leggi. 3. ediz. Torino: Unione Tipográfico-Editrice, 1891, v. I. pp. 184-7. 25. GABBA, 1891, p. 186 Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 153 DOUTRINA Roubier, em lances de clareza, ora fala em “situações jurídicas que se formam por um estado de fato contínuo, que deve prolongar-se às vezes por longo tempo em sua duração”, como “um estado de fato contínuo - un état de fait continu”, ou “situações jurídicas que se formam (ou se extinguem) pela reunião de vários elementos sucessivos os quais se colocam por diferentes degraus de duração - les situations juridiques qui se forment (ou s’éteignent) par la réunion de plusieurs éléments successifis lesquels se placent à des échelons differents dans la durée”26. Os contratos sucessivos ou se preenchem por fatos uniformes, dotados de uma única idoneidade jurídica para a composição do direito ou se preenchem de fatos diversos cujos contornos jurídicos também se especificam quanto às fontes de sua legitimação à sua exigibilidade e a seus efeitos. Quando o art. 912 da CLT remete a “relações iniciadas mas não consumadas”, tem em vista exatamente a diversidade dos direitos, em sua formação e em seu acabamento no curso do contrato de trabalho, compendiando-os em uma só e única relação, como se fosse ela o fato-padrão gerador de direitos, pretensões e ações. Não fora isto se os fatos jurídicos componentes do contrato de trabalho pudessem atomizar-se e autonomizar-se como se não fossem interligados para fins de composição de um contrato uno e fossem considerados cada um de per si como geradores de direitos também autônomos, não se suporia nunca a aplicação do art. 912 da CLT nem a aquisição nem a permanência, no tempo, dos direitos dos trabalhadores que retrotraíram a relações anteriores a 1° de maio de 1943. Roubier mesmo, palmilhando veredas jurisprudenciais expressivas, distinguiu as duas hipóteses de duração do prazo de prescrição: o de quando a lei nova o alonga e o de quando a lei nova o reduz. E expõe: “No caso de a lei nova prolongar o prazo para prescrever, a prescrição deve ser continuada até que o novo prazo seja concluído, contando-se, naturalmente, o prazo previsto na lei anterior - dans le cas où la loi nouvelle allonge le délai requis por prescrire, la prescription doit être continuée jusqu'à ce que le nouveau délai soit achevé, en comptant naturellement le temps couru sous la loi anteriéure”27. E, de outro lado, depois de ponderar que a lei nova que reduz o prazo de prescrição não pode aplicar-se ao “período em curso - sem arriscar ser retroativa” - opina com sua reconhecida autoridade: “O melhor sistema consiste em adotar-se o prazo reduzido da lei nova do dia de sua entrada em vigor. Todavia, se o prazo fixado pela lei antiga devia findar antes do novo prazo descontado a partir da lei nova, manter-se-ia a aplicação da lei antiga; há aí um caso de sobrevivência tácita desta lei, porque seria 26. ROUBIER, 1960, p. 294 e nota 1, in fine. 27. ROUBIER, 1960, p. 300. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 154 DOUTRINA contraditório que uma lei, cujo fim é o de reduzir o prazo de prescrição, resultasse em o prolongar - Le meilleur système consite à faire courir le délai abrégér résultant de la loi nouvelle du jour de l'entrée en vigueur de cette loi. Toutefois, si le délai fixé par la loi ancienne devait prendre fin avant le délai nouveau décompté à partir de la loi nouvelle, on maintiendrait l' application de la loi ancienne; il y a là un cas de survie tacite de cette loi, parce qu' il serait contradictoire qu'une loi dont le but est d’abréger la prescription, aboutisse à l’alion»28 ger . Como que advertindo, acrescenta: “e há um caso de sobrevida tácita desta lei (a antiga), porque seria contraditório que uma lei cujo fim fosse abreviar a prescrição a levasse ao alongamento — il y a là un cas de survie tacite de cette loi, parce qu ’ il serait contradictoire qu'une loi dont le but est abréger la prescription, aboutisse à l'allonger’’29. . Dentro do tema aqui desenvolvido, basta se exemplifique: a um contrato de trabalho rural que perdurou trinta anos sob a égide da lei antiga (CF. art. 7°, XXIX, letras a e b) e oito anos na vigência da Emenda Constitucional 28, fracionar-se-ia o prazo de prescrição, para aplicar-se a lei nova sobre os últimos oito anos e se preservariam os trinta anos passados (não prescritos), ou, então, far-se-ia começar a contagem da prescrição (à moda antiga) da data da lei nova (da Emenda), o que, da mesma maneira levaria ao absurdo de a Emenda Constitucional (que tem aplicação imediata) somente vir a ter efetiva eficácia daqui a trinta ou mais anos... Volta-se ao absurdo! Tão tormentoso se afigura o problema que a construção jurisprudencial sedimentada do Tribunal Superior do Trabalho oscila entre a consideração diversificada (interna corporis) e a consideração unitária ou não fracionada do contrato de trabalho para fins de declaração de prescrição, distinguindo entre pretensões fundadas em lei e pretensões de natureza negocial e em situações jurídicas específicas, cada direito fundado em prestação autônoma ou não. Em manifestações que não se situam no plano da prescrição aqui tratada - já que aqui se versa a prescrição sob o ângulo da extinção do contrato e seus efeitos sobre ele como um todo, abre-se um parêntesis à jurisprudência sedimentada do Tribunal Superior do Trabalho, em que o princípio da aplicação imediata da lei ganha variadas faces diante de cada situação jurídica por ele alcançados, não se abstraindo da prescrição intercorrente, seja quando ocorrem alterações consensuais ou negociais ou lesivas a dispositivo legal como se vê, até em fatos jurídicos precluentes, como nos Enunciados 207, 223 (274 e 275), especialmente 294, 308 (aplicação imediata da norma constitucional, que ampliou a prescrição de 02 para 05 anos, “não atingindo pretensões já alcançadas pela prescrição bienal, quando da promulgação da Constituição de 1988”), 326 (prescrição total se jamais paga a complementação de aposentadoria), 327 (diferença 28. ROUBIER, 1960, p. 300. 29. ROUBIER, 1960, p. 300. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 155 DOUTRINA de complementação de aposentadoria, quando não é atingido “o direito de ação, mas, tão somente, as parcelas anteriores ao biênio”), 350 (começo da prescrição de sentença normativa - a partir de seu trânsito em julgado - ver o equívoco, quando as partes podem reclamar ainda em curso a ação coletiva ou vigente uma lei...). Mas Paul Roubier, em rasgo premonitório desse fenômeno da aplicação imediata da lei perante os contratos de efeito continuativo e de execução diferida, depois de prestar justas homenagens a Merlin, então procurador geral junto à Corte de Cassação, rechaça-lhe o critério de aplicação proporcional de duas leis que se sucedem no curso de um mesmo contrato, como “duas leis em presença, cada uma pela parte correspondente à duração escoada sob seu império... Este sistema não tem somente o inconveniente de conduzir a cálculos por vezes complicados, ele parece ter sido imaginado como um expediente para esta hipótese (a redução do prazo prescricional), pois não se atina porque não deveria ele ser aplicado também quando a lei nova estende o prazo - les deux lois en présence, chacune pour la partie correspondant à la durée écoulée sous son empire... Ce système n 'apas seulement l' inconvenient d’aboutir à des calculs parfois compliqués; il semble avoir été imaginé comme un expédient dans cette hypothèse, car on ne voit pas pourquo, il ne devrait pas être appliqué aussi dans le cas où la loi nouvelle allonge le délai”30. O texto, especialmente em sua parte final, mostra o risco que corre a jurisprudência trabalhista brasileira de adotar pesos e medidas diferentes para a hipótese de encurtamento e para a hipótese de dilatação do prazo prescricional. O princípio da não-contradição, que, se inobservado, redundaria no arbítrio em se tratando da ambivalente contraposição conceituai das partes do contrato de trabalho, tem como paradigma no Direito do Trabalho brasileiro a aplicação da regra do art. 916 da CLT, que sempre se entendeu em harmonia com o seu art. 921, harmonia esta que não poderia ser afetada, sob pena de ruptura do princípio maior da isonomia na posição jurídica dos contratos de trabalho diante do contexto legal pertinente ao direito transitório, que refoge a pressupostos concretos-individuais de fatos relativos às prestações e contraprestações ocorrentes nesses contratos. 8. Sabe-se que o prazo prescricional começa a correr com o nascimento da pretensão e que a pretensão tem dupla conceituação: a de direito material e de direito processual, como acentua Hillach, autor aliás de corte processualista: “O conceito de pretensão da lei processual (der ZPO) não é conforme o do § 194 do Código Civil (BGB), para o qual é o direito de alguém exigir de outrem um fazer ou um não fazer. A ordenança processual civil criou um conceito próprio de pretensão. Todo o litígio compõe-se do objeto da lide ou pretensão, que se faz atuar - Der Begriff des Anspruchs der ZPO deckt sich nicht mit dem Anspruch gemäss § 194 BGB, der das Recht ist, von einem anderen ein Tun oder Unterlassen zu verlangen. Die ZPO hat einen Begriff des Anspruchs 30. ROUBIER, 1960, p. 301. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 156 DOUTRINA geschaffen. In jedem Rechtsstrei wird zwar ein Streitgegentand oder Anspruch geltend gemacht”31. É da maior importância que não se envolva o operador do direito em lamentáveis equívocos, fazendo recair a prescrição sobre a pretensão exatamente quando ela se bifurca entre direito material e direito processual, mas como se fosse um instituto exclusivamente processual para começar a sua contagem no curso da ação, do momento da entrada em vigor da Emenda 28/CF e, aí, aplicá-la como se não tratasse de regra processual mas de direito material, retroagindo-a desde então ao contrato antes extinto. A aplicação imediata da nova lei processual, que apanha os processos em curso e passa a reger-lhes os atos subseqüentes, nada tem a ver com a aplicação da lei nova, que modifica os prazos da prescrição, que tem sua contagem retrooperante a partir da extinção do contrato e não de algum ato-momento processual em que se esteja discutindo direito a ele relativo. No processo há, sim, é preclusão, a versão processual do instituto da prescrição mas que emerge tão-somente no e do iter processual e nele se exaure (CPC, art. 473). Preclusão nada tem a ver com a vida jurídica do contrato em seu leito material nem a atinge per se. Não é o estar de repente sob a luz da lei nova que se aplica uma regra prescricional, pois o curso da prescrição já foi sustado com a propositura da ação (CPC, art. 219 e CLT, art. 837 et seq.). Em direito aplicado, exemplar é a Súmula 445, do Supremo Tribunal Federal: “A Lei 2.437, de 07.03.1955, que reduz prazo prescricional, é aplicável às prescrições em curso na data de sua vigência (01.01.56), salvo quanto aos processos então pendentes”. A aludida lei teve por campo de aplicação justamente relações jurídicas e situações jurídicas que perduram no tempo, sempre com efeitos continuativos, como está pressuposto nos arts. 177, 481, 551, 619, 760, 698, 817 e 1.772 (ações pessoais e reais, sucessão, usucapião, posse, hipoteca, anticrese, etc.). 9. A questão não é tão simples, não comporta soluções apriorísticas nem matemáticas. Sua procura deve iniciar-se por um fluxo de bom-senso, partindo-se dos pressupostos, segundo os quais a ordem jurídica é um todo harmônico, que cobre o contexto social dentro de princípios finalisticamente orientados que tendem à evolução, ao bem-estar e ao equilíbrio na distribuição dos interesses que se intercambiam nesse contexto. Voltar a Emenda 28, de maio de 2000, aos anos que a precederam e ser ela aplicada como se prescrição rural não houvesse, isto sim, retroagir a um tempo-contrato anterior ao fato-suporte nela previsto. Da mesma forma aplicar o novo prazo prescricional a contratos extintos antes da data da promulgação da Emenda 28 significará imprimir-lhe uma força retroativa, 31. HILLACH, Alexander. Handbuch des Streitwertes. 2. Aufl. Köln-Berlin: Carl Heymanns. 1954, p. 6, n° II e 1. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 157 DOUTRINA formalmente atentatória ao princípio da sucessão e da eficácia das leis no tempo, fazendo-se com que ela alcance períodos e épocas dentro nos quais ela ainda não existia. Irrelevante, no caso, é que haja processos em curso ao tempo da entrada em vigor da Emenda 28, e a prescrição por ela preconizada não será ela aplicada se a relação de trabalho litigiosa já se havia extinguido antes da sua vigência. Não se confundam como acima foi nitidamente escandido - prescrição e preclusão. Na hipótese, o plano processual não contagia nem transmuda o plano material, em que se formaram e se extinguiram os direitos objeto da ação. Pouco importa que um contrato de trabalho de mais de vinte anos se tenha extinguido meses depois da entrada em vigor da Emenda 28. A prescrição terá por vis atractiva e critério de incidência, mesmo o curto período final do contrato sob a lei nova, que o apanha por inteiro como um só suporte de direito e obrigações, compendiados no ato-fato de sua rescisão. A prescrição a aqui declarar será a qüinqüenal. Inconcebível, no caso, é proporcionalidade sugerida por Merlin, com o que não só se estaria caindo no arbítrio assim como se poderia estar misturando suportes-tempo diferentemente limitados por leis que se sucederam. Não se há de esquecer que na confluência heterônoma das leis e das situações jurídicas, em última instância, o princípio da razoabilidade e da coerência devem ser as normas reitoras da operação decisória, com o que, além do mais, não se cairá no risco de se proferirem julgamentos conflitantes e aleatórios em casos-hipóteses que, em seu contexto legal, não se diversificam. A criatividade (em sua face alternativa) só pode catalogar-se como um critério perscrutador de produção adicional do direito e naquilo que cometem ou permitem os centros conformadores da ordem jurídica, a despeito de essa criatividade , ser, mesmo nos sistemas codificados modernos, a mais rica esfera de complementação tópica daquilo que por Ulpiano foi universalmente qualificado como jus, que é a ars boni et aequi. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 158 TRADING BLOCKS E POLÍTICA TRABALHISTA Octavio Bueno Magano* Sumário: 1- “Trading Blocks”; 2. Nafta; 3. Zona de livre comércio; 4. Nafta e GATT; 5. Disciplina trabalhista; 6. Nafta e Mercosul; 7. Quadro institucional; 8. Novas perspectivas; 9. Harmonização de sistemas trabalhistas; 10. Conclusões. 1. “TRADING BLOCKS” Entre os vários tipos de “trading blocks” existentes no mundo, o NAFTA se caracteriza como zona de livre comércio. Trata-se do tipo de bloco em que supostamente a integração dos países que o compõem é menos intensa do que nas demais modalidades, visto que o escopo de cada qual é o de eliminar tarifas e outras barreiras comerciais entre eles existentes, sem alterar, porém, tarifa para outros países não integrantes da zona. Degrau mais elevado na escala de integração ocupa a união aduaneira, porque os países que a integram, além do compromisso de reduzir tarifas internas, visam ao estabelecimento de tarifa comum externa. Na categoria de união aduaneira inseriu-se a União Européia, a partir de 1968. Em nível superior de integração, comparativamente à união aduaneira, coloca- se o mercado comum, em que, além da eliminação de barreiras internas e o estabelecimento de tarifa comum para os países não membros do bloco, preconiza-se ainda a livre movimentação de capitais e serviços, entre os países membros. Nessa categoria enquadra-se o Mercosul, consoante claramente se infere da leitura do art. 1° do Tratado de Assunção, de 26 de março de 1991, que o estabeleceu: “Art. 1° - Os Estados Partes decidem constituir um mercado comum, que deverá estar estabelecido a 31 de dezembro de 1994 e que se denominará Mercosul.” “Este mercado - continua o preceito - implica a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países...” No ápice da escala de integração, situa-se a união econômica e monetária que compreende não apenas a adoção de políticas comuns de comércio mas também a criação de paridade monetária e eventualmente a criação de moeda comum. Nessa categoria se coloca a União Européia, instituída pelo Tratado de Maastricht, de 7 de fevereiro de 1992. Isso é o que se deduz da leitura de seu artigo 2°, assim redigido: “Art. 2° - A comunidade tem por missão o estabelecimento de um mercado comum, duma união econômica e monetária e da adoção de políticas ou de ações co- * Professor Titular de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 159 DOUTRINA muns (...) tendentes à promoção de um desenvolvimento harmonioso e equilibrado de atividades econômicas no conjunto da Comunidade, um crescimento durável e não inflacionário, incluindo o meio ambiente, um alto degrau de convergência de atuações econômicas, um nível de emprego e de proteção social elevado, a melhoria do nível e da qualidade de vida, a coesão econômica e social e a solidariedade entre os Estados Membros. 2. NAFTA O tratado conhecido como NAFTA foi assinado no dia 17 de dezembro de 1992, da parte dos Estados Unidos, pelo Presidente George Bush, da parte do México, pelo Presidente Carlos Salinas de Gortari e da parte do Canadá, pelo Primeiro Ministro Brian Mulroney. Trata-se de tratado envolvendo três países do hemisfério Norte, com população correspondente a 370 milhões de pessoas e mercado ao nível aproximado de 7 trilhões de dólares. Esse tratado foi precedido pelo FTA, negociado entre os E.E.U.U. e o Canadá, a partir de 1987 e assinado em 1988. O NAFTA constituiu expansão desse não apenas por envolver terceiro associado mas também por abranger mais itens, como, por exemplo, o da propriedade industrial, o do transporte terrestre, o da comercialização de produtos agrícolas, o da implantação de mecanismos de arbitragem, etc. A expansão em causa há de se entender ainda no sentido de aumento da comercialização entre países cujo intercâmbio já era altamente intenso. O Canadá ocupava o primeiro lugar e o México o terceiro, entre os parceiros comerciais dos E.E.U.U., aquele com volume de US$175 bilhões e este de US$59 bilhões, em 1980. Por outro lado, mais de 2/3 das importações do México provinham dos E.E.U.U. 3. ZONA DE LIVRE COMÉRCIO A caracterização do NAFTA como zona de livre comércio é enunciada logo no intróito do Tratado, com estas palavras: The Parties to this Agreement (...) hereby establish a free trade area. É verdade que se trata de zona de livre comércio sujeita à minuciosa regulamentação, versando o comércio de mercadorias, as barreiras comerciais, a atuação governamental, os investimentos, os serviços, a propriedade intelectual, as normas administrativas e institucionais. Além disso, compreende ainda o tratado em análise capítulos suplementares concernentes ao meio ambiente e ao trabalho. Quanto aos objetivos a serem alcançados, foram eles assim especificados: a) eliminação de barreiras e facilitação da circulação de bens e serviços nos territórios das partes contratantes; b) promoção de condições propícias à livre concorrência; c) aumento das possibilidades de investimentos; d) proteção da propriedade intelectual; e) criação de procedimentos aptos à execução do acordo e à solução de disputas; f) estabelecimento Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 160 DOUTRINA de estrutura incentivadora de cooperação não só em nível trilateral mas também regional e multilateral. 4. NAFTA E GATT Há contradição latente entre as diversas modalidades de blocos comerciais e o GATT, porque, enquanto aqueles visam ao favorecimento das partes que os compõem, baseia-se o último na cláusula de nação mais favorecida. Isso é o que se lê, aliás, logo em seu art. 1o - "... any advantage, favor, privilege or immunity granted by any contracting party to any product originating in or destined for any other country shalll be accorded immediately and unconditionally to the like product originating in or destined for the territories of all other contracting parties. ” Constituindo o NAFTA modalidade de bloco comercial, é óbvio o seu conflito latente com o GATT, o que gera, a seu turno, o risco de represálias por parte dos países não pertencentes à primeira organização. Considerando-se que três quartos do comércio dos E.E.U.U. se processam com países de fora da área do NAFTA, reação negativa por parte deles poderia afetar seriamente o volume das exportações americanas. Todavia, a hipótese aqui aventada é de remota concretização, porque o próprio GATT possui cláusulas de salvaguarda, admitindo excepcionalmente a formação de blocos comerciais, desde que satisfeitas as seguintes condições: eliminação de barreiras no que concerne a parte substancial do comércio entre os membros respectivos; exclusão da imposição de barreiras mais elevadas do que as vigentes antes da formação do bloco, relativamente a países não membros; estabelecimento de tratamentos discriminatórios apenas interinamente. 5. DISCIPLINA TRABALHISTA A parte do NAFTA dedicada à disciplina trabalhista é bastante extensa, sendo nela especificados os seguintes objetivos: a) o de melhorar as condições de trabalho e o nível de vida no território de cada uma das partes; b) o de promover a efetivação dos seguintes princípios: 1. liberdade de associação e proteção do direito de organização; 2. direito de negociar coletivamente; 3. direito de greve; 4. proibição de trabalho forçado; 5. proteção à criança e ao adolescente; 6. padrões mínimos de trabalho, inclusive salário mínimo; 7. eliminação de procedimentos discriminatórios; 8. salário igual para homens e mulheres; 9. prevenção de acidentes e doenças profissionais; 10. indenizações correspondentes; 11. proteção a trabalhadores migrantes; c) o de encorajar cooperação e promover a elevação de níveis de produção e qualidade; d) o de incentivar publicação e troca de informações, estudos conjuntos destinados a melhor compreensão das leis e instituições trabalhistas de cada uma das partes; e) o de cooperação no que respeita a outras atividades relacionadas com o trabalho; f) o de busca de eficácia e aplicação das leis trabalhistas de cada uma das partes; g) o de promoção de transparência na administração das normas trabalhistas. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 161 DOUTRINA Entre os institutos cuja prática se preconiza, merecem realce os seguintes: comissões de empresa, constituídas de forma paritária, para estabelecer regras de conduta no local de trabalho; implantação de serviços de mediação, conciliação e arbitragem; prática das convenções coletivas; agilização dos procedimentos trabalhistas; organizações incumbidas da solução das disputas trabalhistas de caráter imparcial e independente. Para a realização dos objetivos de natureza trabalhista, colimados pelo Tratado, prevê-se a existência de um Conselho de Ministros das Partes contratantes e de um Secretariado. 6. NAFTA E MERCOSUL Dada a inserção do Brasil no sistema do MERCOSUL e considerando-se, por outro lado, a previsão do NAFTA de que se possa este converter em tratado regional ou multilateral, força é compararem-se as disciplinas trabalhistas previstas em cada qual. Ao contrário do NAFTA, o Tratado de Assumpção não possui capítulo suplementar, cuidando de disciplina trabalhista. Todavia, os Ministros do Trabalho dos países membros, reunidos em Montevidéu, nos dias 8 e 9 de maio de 1991, resolveram criar o Subgrupo de Trabalho n° 11, para se ocupar de assuntos trabalhistas. Divulgou-se, então, a seguinte declaração: I - O Tratado de Assumpção abre as portas a notável progresso dos países signatários, o que indica a necessidade de se procurar resultado exitoso para as negociações pendentes; II - É preciso atentar para os aspectos trabalhistas e sociais do MERCOSUL e acompanhar as tarefas dos respectivos representantes, a fim de assegurar que o processo de integração se acompanhe de efetiva melhoria de condições de trabalho nos países subscritores do Tratado; III - Promover a criação de subgrupos de trabalho com o compromisso de desenvolverem o estudo das matérias a eles pertinentes; IV - Estudar a possibilidade de subscrição de documento no âmbito do Tratado de Assumpção, contemplando questões trabalhistas e sociais; V - Os países signatários dispor-se-ão a cooperar para o recíproco conhecimento dos regimes de cada qual relativos ao empregado, à seguridade social, à formação profissional e às relações individuais e coletivas de trabalho; VI - Promover o acompanhamento dos acordos alcançados mediante a realização de outras reuniões. Resolveu-se, em outra oportunidade, que o programa, acima delineado, viesse a ser desenvolvido por comissões de trabalho assim discriminadas: a) de relações individuais de trabalho; b) de relações coletivas de trabalho; c) de emprego; d) de formação profissional; e) de saúde e segurança no trabalho; f) de seguridade social; g) de setores específicos; h) de princípios. O passo seguinte foi a discriminação dos tópicos a serem desenvolvidos em cada comissão e a cronologia a observar-se na conclusão dos estudos respectivos. Assim, por exemplo, o campo de atuação da comissão 1 ficou delimitado pela forma abaixo: 1. Análise Comparativa dos Sistemas de Relações de Trabalho Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 162 DOUTRINA 2. Custo de Trabalho 3. Sistema de Garantia do Tempo de Serviço 4. Política Salarial 5. Locação de Mão-de-Obra 6. Fiscalização do Trabalho. E a cronologia a ser observada pela referida Comissão é a seguinte: Até dezembro de 1992, compromisso para uma análise comparativa dos diversos sistemas de relações de trabalho, com definição metodológica. Até março de 1993 - identificar as assimetrias, ou seja, as vantagens e desvantagens das diversas regulamentações, subsídios, impostos ou intervenção do Estado que afetem a competitividade de produtos ou setores, não se considerando assimestrias as diferenças de competitividade decorrentes da dotação de recursos ou capacidade adquiridas. Até setembro de 1993 a apresentação de proposta. Até dezembro de 1993, o encaminhamento das propostas ao GMC, para fins de consideração e instrumentalização, Na área do direito coletivo os tópicos discriminados foram estes: 1. Negociação Coletiva de Trabalho 2. Estrutura Sindical 3. Greve e lockout. E a cronologia a ser. seguida pela Comissão n° 2 é a indicada abaixo: Definição de metodologia, até dezembro de 1992; Identificação de assimetria, de março de 1993; Apresentação de proposta, até setembro de 1993; Encaminhamento das propostas GMC, até dezembro de 1993, para fins de consideração e instrumentalização. 7. QUADRO INSTITUCIONAL Desde 1960, a tecla da integração econômica tem sido reiteradamente batida na América Latina. Há de se assinalar, em primeiro lugar, a ALALC, composta da Argentina, Brasil, Chile, México, Paraguai, Peru e Uruguai, sucedida pela ALADI em 1980. Segue-se o Mercado Comum da América Central, composto de Costa Rica, El Salvador, Honduras, Guatemala e Nicarágua. Em 1969, surge o grupo andino, compreendendo Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela, a partir de 1973. Em 1991, cria-se o MERCOSUL integrado pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. A criação desses grupos, baseada na idéia de eliminação de barreiras, para possibilitar a expansão comercial e o desenvolvimento econômico, implicava conflito com as características do Estado Intervencionista, modelo adotado por grande número de países latino-americanos, a partir da década de 30, sob a influência de regimes Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 163 DOUTRINA corporativos bem sucedidos, na Itália, na Alemanha, na Áustria, na Espanha e em Portugal. Com a derrocada desses regimes, após o término da 2a Grande Guerra Mundial, desapareceu a fachada corporativa das estruturas políticas, vigentes na Europa e na América Latina, mas o intervencionismo teve continuidade. É que, após o término da 2a Grande Guerra, difundiu-se o temor da depressão e a crença de que o intervencionismo era a maneira de a debelar. Essa crença incrementava-se, ainda mais, pelo crescente prestígio da ideologia socialista. Tudo isso bem se ilustra com a eleição realizada na Inglaterra, tendo, de um lado, Wiston Churchil, herói da guerra recém-finda, e, de outro, Clement Attlee, que pregava a nacionalização das indústrias e dos serviços de saúde e que, por isso mesmo, sagrou-se vencedor. Sob a influência do corporativismo, vários programas de nacionalização já haviam sido encetados na América Latina. No Brasil, realça-se a nacionalização da siderurgia e dos portos. Mas o surto de nacionalizações do após guerra foi quiçá mais forte. No Brasil, estendeu-se às atividades petrolíferas, à petroquímica, à energia elétrica, à mineração, às ferrovias, às comunicações, à navegação, etc. Pari passu com a política de nacionalização, adotou-se, também, na América Latina, o programa de substituição de importações. A conjugação dos dois fatores, aqui apontados, era flagrantemente contrária ao incremento do comércio internacional, em qualquer de suas projeções, mundial ou regional. Na área trabalhista, as influências do corporativismo e do intervencionismo do pós-guerra traduziram-se em tutela estatal, geradora de legislação extremamente aparatosa, de que é exceção o caso do Uruguai. Diante do quadro institucional acima bosquejado, não havia campo propício ao florescimento das associações criadas para o fomento do comércio internacional. Como acentuam Hufbauer e Schott, “policies of import substitution and state capitalism implied that, in any regional trade arrangement, the partners would be buying from each other at far higher prices than they would pay for the same goods imported from the industrial nations. Customs tariffs that were once collected by the public treasury, and quota rents that were once appropriated by favored local firms, would now be captured by the new regional trading partners. Politically and economically, this was a significant drawback to regional integration, and it meant that each country wanted free trade with its costumers but not with its suppliers. Finally, chronic debtor countries with overvalued currencies were reluctant to liberalize at all, for fear of worsening already bad current account deficits.”1 1. Hufbauer, Gary Clayde e Schott, Jeffrey J., Western Hemisphere Economic Integration, Washington, Institute for International Economics, 1994, p. 65. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 164 DOUTRINA 8. NOVAS PERSPECTIVAS Depois da queda do Muro de Berlim (09.11.89) e do esfacelamento da União Soviética, novas perspectivas sociais e econômicas se entreabriram. A reunificação subseqüente da Alemanha, o reconhecimento do Japão como potência econômica e o fim da rivalidade estratégica entre o Oeste e o Leste levaram os observadores econômicos à conclusão de que as relações econômicas tomar-se-iam o eixo das relações internacionais. Em conformidade com tais expectativas, em 28 de janeiro de 1992, os seis Estados membros da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ANSEA) decidem estabelecer, entre eles, zona de livre comércio. Em 7 de fevereiro de 1992, pelo Tratado de Maastricht, institui-se a União Européia. Em 17 de dezembro, do mesmo ano, assina-se o NAFTA, gerador de zona de livre comércio entre os Estados Unidos, Canadá e México. Sucederam os aludidos tratados ao Tratado de Assumpção, de 26 de março de 1991, que dera origem ao MERCOSUL, a ser integrado pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. O novo elã, no sentido de se criarem associações destinadas ao incremento do comércio internacional, explica-se como resultado da crença de que, a partir da queda do muro de Berlim, o padrão de convivência entre as nações não seria mais o do alinhamento político e sim o da convergência de interesses econômicos. E se esse novo padrão de convivência, na área econômica, significa eliminação de barreiras desestimuladoras do comércio, na esfera social, exige harmonização de sistemas trabalhistas. 9. HARMONIZAÇÃO DE SISTEMAS TRABALHISTAS A harmonização de sistemas trabalhistas, entre países pertencentes a “trading blocks”, mostra-se necessária a fim de estimular o livre trânsito de pessoas e de serviços bem como para garantir a comunicabilidade dos respectivos regimes de seguridade social. Os caminhos conducentes à aludida harmonização são múltiplos, merecendo realce os seguintes: a) o da preservação dos sistemas nacionais, conjugada com a busca de eficácia e a promoção de transparência na aplicação das normas respectivas, como é o caso do NAFTA; b) o da manutenção dos sistemas nacionais, com eliminação apenas de suas divergências mais ostensivas, como parece ser o desideratum dos países membros do MERCOSUL; c) o da admissibilidade de que, sobre regras nacionais, possam prevalecer outras básicas, de caráter comunitário, como ocorre no âmbito da União Européia. O primeiro método de harmonização foi certamente adotado por razões políticas, para espancar a idéia de que a implantação do NAFTA, poderia implicar redução de direitos trabalhistas. O segundo método, em curso no âmbito do MERCOSUL, baseia-se na crença de que cada sistema nacional constitui fruto de decantação cultural, de caráter incomunicável, do que resulta espaço tão somente para eliminação de disparidades ostensivas. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 165 DOUTRINA O terceiro método, acolhido no âmbito da União Européia, resulta do entendimento de que determinadas matérias, pela sua relevância, precisam consubstanciar-se em regras supranacionais, como, por exemplo, a relativa à livre circulação de trabalhadores; as de tutela do ambiente de trabalho; a de coordenação da seguridade social dos trabalhadores migrantes; a de formação profissional; as asseguradoras da igualdade entre homens e mulheres. A prevalência desse método significa, por outro lado, abertura para revisão das normas nacionais colidentes com o ideal de expansão do comércio dos países componentes de cada grupo (vide art. 3.B do Tratado). A necessidade de tal revisão se vai, aliás, fazendo sentir cada vez com maior premência, nos país continentais, da comunidade européia, pela constatação de que o aparatoso sistema legislativo neles implantado, implica pesados encargos para suas empresas, mostrando-se, em conseqüência, desestimulante da atividade econômica e gerando desemprego.2 Em alguns países, a taxa de desemprego alcançou o nível de 25% da respectiva força de trabalho. Pelas razões apontadas, forte é hoje, na Europa, o movimento no sentido da flexibilização ou desregulamentação da legislação trabalhista, tendência que se vem refletindo, cada vez com maior intensidade, nos países da América Latina. 10. CONCLUSÕES Deriva daí a idéia de que, tanto no âmbito do MERCOSUL quanto no do NAFTA, a solução ideal seria a da desregulamentação dos sistemas trabalhistas vigorantes nos territórios dos países membros e a montagem, em cada grupo, de núcleo de regras básicas a respeito de princípios, inclusive o de livre circulação de trabalhadores; o de compatibilidade de regimes de seguridade social e o da eliminação de discriminação, relativamente a trabalhadores migrantes. Nesse estatuto nuclear, incluir-se-iam, ainda, regras sobre isonomia; sobre identificação e liberdade dos sujeitos trabalhistas (empregados e empregadores); identificação e liberdade de atuação dos parceiros sociais (entidades sindicais); regras destinadas a garantir a integridade psicossomática dos trabalhadores (normas sobre periculosidade, insalubridade e proteção ao trabalho das crianças e adolescentes). No mais, haveriam os países signatários, tanto do MERCOSUL quanto do NAFTA, de incentivar a prática dos procedimentos de autocomposição, notadamente da contratação coletiva. 2. “Il y a l'Europe à la mode socialiste: des institutions européennes renforcées entre les mains d'une bureaucratie dirigiste. Il y a l'Europe à la mode nationaliste: aucun abandon de souveraineté, chaque État maître chez lui, avec sa mannaie, ses impôts et ses lois.Mais la seule Europe capable d'apporter liberté et prospérite aux Européens et celle dont on ne parle pas: l'Europe à la mode libérale. Elle est pourtant dans le droit fil du traité de Rome et de l'Acte unique. Elle nous a déjà valu beaucoup de progrès et s'imposera complètement tôt ou tard.” (Faugère, Jean-Pierre, L'Europe Économique, Marchés et Politiques, s.l.p., Nathan, 1992, p. 22). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 166 O presente número da Revista do Tribunal Superior do Trabalho publica, a seguir, a monografia vencedora do concurso nacional realizado pelo TST destinado a bacharéis e estudantes de Direito. O tema proposto foi Não intervenção do Estado nas relações de trabalho - Cláusula social nos tratados internacionais, uma referência a discussão estimulada pela Organização Mundial do Comércio (OMC) visando ao estabelecimento de legislação que restrinja o comércio internacional de países que não ofereçam proteção mínima ao trabalhador. No próximo número da Revista serão publicadas as monografias contempladas com o segundo, o terceiro e o quarto lugares no concurso. NÃO INTERVENÇÃO DO ESTADO NAS RELAÇÕES DE TRABALHO - CLÁUSULA SOCIAL NOS TRATADOS INTERNACIONAIS Fernando Resende Guimarães Sumário: 1. Introdução: conflitos antigos em um novo cenário; 2. Contexto histórico atual: enfraquecimento do poder estatal. Progresso tecnológico, globalização e neoliberalismo. A internacionalização da questão trabalhista; 3. Desregulamentação dos direitos trabalhistas e cláusula social. Desvalorização do trabalho humano. Polêmicas em torno das cláusulas sociais; 4. A transição para um mercado de trabalho global; 5. Considerações finais; Bibliografia consultada. 1. INTRODUÇÃO: CONFLITOS ANTIGOS EM UM NOVO CENÁRIO “Se o Estado pode atuar para proteger as crianças e jovens, deve entretanto deixar aos adultos a livre disposição de seu trabalho. Os povos pobres não podem lutar contra os povos ricos, senão sob a condição de compensar sua inferioridade de capital, de força física e de educação, mediante uma prolongação da jornada de trabalho”.(Leroy-Bealieu)1 Em tempos de ataque à intervenção estatal nas relações de trabalho e de acalorados debates acerca da introdução de cláusulas sociais nos tratados internacionais, estas palavras soam bastante modernas. Elas expressam bem o atual discurso de países subdesenvolvidos que insistem em fazer das condições desumanas a que são submetidos seus trabalhadores em uma “vantagem” comparativa no comércio internacional. Isto, mais de um século depois que Leroy-Bealieu, economista liberal francês, tentava justificar a recusa da França em adequar-se a padrões mínimos trabalhistas, tal qual lhe propunha a Suíça e Alemanha, países precursores na concessão de direitos sociais. Como se pode perceber, a não intervenção do Estado nas relações de trabalho e a discussão em torno de padrões mínimos internacionais de proteção ao trabalhador não são questões propriamente novas. A associação entre idéias liberais de organização econômica da sociedade para as quais o trabalho é mera mercadoria - e relações comerciais internacionais entre países cujas populações gozam de diferentes patamares de condições sociais, respondem pela veiculação, não por acaso, em conjunto, destas questões. 1. apud BATISTA, Paulo Nogueira. Cláusula social e comércio internacional: uma antiga questão sob nova roupagem. Política Externa, São Paulo, v.3, n.2, p. 38, set./out/nov. 1994 Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 169 CONCURSO DE MONOGRAFIAS Assim, apesar de indicarem movimentos opostos, é possível identificar causas comuns para ambos os fenômenos, justificando-se, portanto, que se faça referência a uma contradição meramente aparente. O que mudou em relação ao final do século IXX é que, se antes o conflito se dava apenas no âmbito de nações européias, em razão do pioneirismo do processo de industrialização na Europa, agora, com a explosão do processo globalizante, o mundo inteiro está envolvido. A complexidade dos impasses atuais derivados do tema em questão têm, portanto, potencial para determinar substanciais modificações na própria estrutura do sistema produtivo-econômico mundial, engendrando, inclusive, a implementação de uma nova estrutura social. Mas ainda há um longo caminho a se percorrer, inexistindo consensos e muito menos um desfecho previsível para a questão. Isto se reflete na divergência de posicionamentos que existe dentro das próprias classes interessadas, sejam os governos, os empregadores ou mesmo os trabalhadores, uma vez que o “entrechoque de interesses tão variados, ao longo de linhas nacionais e internacionais, podem resultar alianças tácitas ou explícitas, entre as diversas categorias sociais em diferentes países, desenvolvidos e em desenvolvimento.”2 2. CONTEXTO HISTÓRICO ATUAL: ENFRAQUECIMENTO DO PODER ESTATAL 2.1. Progresso Tecnológico, Globalização e Neoliberalismo O fenômeno do enfraquecimento do poder estatal é subproduto direto da globalização e da hegemonia mundial do sistema capitalista, cuja faceta político-ideológica traduz-se no neoliberalismo. A derrocada do comunismo, com o conseqüente término da guerra fria, e o acelerado avanço do progresso científico-tecnológico nas últimas décadas, o qual possibilitou uma integração comercial jamais vista na história (conhecida) mundial, fazendo surgir uma rede de informações verdadeiramente global, foram os elementos catalisadores das transformações que assolam o mundo e da indisfarçável crise de paradigmas que deixa a todos - intelectuais, juristas, analistas financeiros - perplexos diante de um futuro que se descortina marcado pela imprevisibilidade. A queda do muro de Berlim em 1989 representou a pá de cal do regime comunista e do até então vigente sistema bipolar de forças mundiais. A extinta União Soviética, cujo fôlego econômico dava mostras dos primeiros sinais de debilidade já na década de 70, perdeu a condição de superpotência que compartilhava com os EUA. As repercussões políticas, econômicas e, principalmente, ideológicas foram enormes, sendo instaurada uma nova ordem mundial. 2. BATISTA, Paulo Nogueira. Op. Cit., p. 49 Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 170 CONCURSO DE MONOGRAFIAS A ascensão dos EUA como potência mundial hegemônica fez reproduzir o capitalismo por todo o globo, agora, sem o contraponto anteriormente representado pelo comunismo. É sintomático que, no próprio âmbito do sistema capitalista, o modelo de liberalismo clássico proposto pela “revolução conservadora” dos governos Thatcher e Reagan nos anos 80, na Inglaterra e nos EUA respectivamente - cujo mandamento principal é “quanto menos Estado melhor”, na crença de que as leis do mercado regulam superiormente o sistema - tenha coincidido com o declínio do “Welfare State” (Estado de Bem-Estar Social) adotado principalmente na Europa Ocidental. Daí a onda mundial de privatizações, cortes de gastos dos governos, redução dos direitos sociais e eliminação do déficit público, conforme preconiza o receituário neoliberal batizado de “Consenso de Washington”. O conflito Leste-Oeste (capitalismo x comunismo) foi deslocado para o conflito Norte-Sul (países desenvolvidos x países subdesenvolvidos, eufemisticamente chamados de países em desenvolvimento), onde o embate é travado pela conquista de mercados internacionais, com o objetivo maior de obtenção de superávit na balança comercial. As novas tecnologias permitiram uma aceleração da informação e o barateamento das indústrias de telecomunicações e de transportes, o que fez reduzir drasticamente a importância da localização geográfica. As grandes empresas passaram a maximizar em nível planetário o seu sistema produtivo. A concorrência passou a ser mundial. Como resultado, verifica-se uma acirrada competição no mercado internacional, tornando-se prioritária, neste contexto, a redução dos custos de produção e o aumento da produtividade. Arma-se, ainda, uma verdadeira queda-de-braço entre os Estados quanto às questões relativas às barreiras alfandegárias, os subsídios governamentais e as práticas comerciais de “dumping”. Surgem então no cenário mundial freqüentes rodadas de negociação sobre o comércio internacional, sendo instituído uma entidade internacional para coordenar tal processo, o GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio), sucedido em 1995 pela OMC (Organização Mundial de Comércio). Por outro lado, paralelamente ao movimento globalizante, deu-se início à criação de blocos econômicos - União Européia, Nafta (Acordo Norte-Americano de Livre Comércio), Apec (Cooperação Econômica Ásia-Pacífico) - que se por um lado determina limites regionais às quedas de barreiras comerciais, por outro, aumenta o volume de negócios de cada bloco no comércio internacional. A crescente interdependência entre países e mercados evidencia-se através de diversos indicadores, sendo exemplos destes:3 3.Globalização aprofunda o abismo entre ricos e pobres. In: Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, caderno especial Globalização, p. 12, 02 nov. 1997 (Fonte citada: “Programa das Nações Unidas para o desenvolvimento-1997"). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 jul/set 2000 171 CONCURSO DE MONOGRAFIAS - no início dos anos 80, o comércio mundial de bens e serviços girava cerca de 5 (cinco) trilhões de dólares ao ano; em 1997, aproximou-se dos 14 (quatorze) trilhões; - o volume de transações internacionais com ações entre 1980 e 1990 teve um crescimento de 28% (vinte e oito por cento) ao ano, em média; a queda da Bolsa de Valores de qualquer centro econômico, com destaque para a de Nova Iorque, afeta, em questão de segundos, as demais Bolsas de Valores mundiais; - em 1997, o número de ligações telefônicas entre os EUA e a Europa superou 700 (setecentos) milhões. Em 1960, elas foram apenas 2 (dois) milhões; Significativo também é o dado de que por volta de 50% (cinqüenta por cento) do comércio global atual refere-se a operações entre os grandes grupos internacionais. Com efeito, assumindo papéis outrora relegados aos Estados Nacionais, surgem, como atores principais do processo de globalização em marcha, as empresas transnacionais. Basta dizer que das 100 (cem) maiores economias do mundo, 50 (cinqüenta) são megaempresas. Em 1994, o faturamento da “GM-General Motors” foi superior ao PIB de países como Turquia, Dinamarca e África do Sul. A lógica de abertura comercial, ao mesmo tempo que propicia a expansão dos negócios dos grupos econômicos multinacionais, provoca limites no sistema de controles de decisões no âmbito dos próprios Estados Nacionais. Como as regras do jogo são cada vez mais condicionadas à tentativa (ou seria necessidade ?) dos Estados de atrair novos capitais e investimentos, as grandes empresas conseguem obter, mediante o alto poder de barganha que desfrutam, diversos benefícios governamentais. Matérias-primas subsidiadas, empréstimos a juros reduzidos, isenções/incentivos fiscais e até doações de terrenos e maquinários para instalação de fábricas são alguns dos atrativos oferecidos para o aporte de investimentos e capitais. O baixo nível de proteção social e direitos trabalhistas é visto como mais um destes fatores de atração. O Estado perde a condição de agente de riquezas, torna-se enxuto e passa a ter a atribuição de retirar os entraves à circulação de capitais e de criar as melhores condições possíveis para sua reprodução (lucratividade). 2.2 A Internacionalização da Questão Trabalhista O tema da cláusula social, objeto do presente estudo, oportuniza a identificação e análise do fenômeno da internacionalização da questão trabalhista. A própria auto-afirmação do Direito do Trabalho se deu no contexto do fim da Primeira Guerra Mundial e sob o impacto da Revolução Russa em 1917, com o Tratado de Versailles em 1919. Este não só consagrou os princípios fundamentais do Direito do Trabalho como também instituiu a Organização Internacional do Trabalho (OIT), com o objetivo de promover, através deste novo organismo internacional, a uniformização daqueles princípios. Nos países capitalistas em processo de industrialização, o temor de que a escassez de benefícios sociais pudesse criar instabilidade propícia à disseminação de idéias Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 172 CONCURSO DE MONOGRAFIAS marxistas fez com que os interesses reivindicados pelos trabalhadores fossem absorvidos pelos Estados capitalistas e contemplados em legislações trabalhistas de garantias mínimas - fenômeno conhecido como “constitucionalismo socia”.4 Os direitos trabalhistas acabaram contemplados muito mais pela via da legislação nacional, nos países de cultura jurídica romana, ou pela via das convenções coletivas de trabalho, caso dos anglo-saxões, do que exatamente pela atuação e/ou poder de coerção da OIT. A melhoria das condições laborais foi possível não só pelo aumento da consciência social e o repasse dos ganhos de produtividade obtidos no pós-guerras, mas também pela existência de uma disseminada política protecionista em favor das indústrias nacionais. As concessões de proteção ao trabalhador não importavam em perda de competitividade no comércio internacional pelo fato deste ser rígido e fechado. Acontece que, gradativamente, o protecionismo das indústrias nacionais, à época presente mundo afora, começou a ceder vez à liberalização comercial promovida pelos países desenvolvidos. Porém, o elevado estágio de industrialização destes países ainda lhes permitiam competir a nível mundial em posição confortável. Por um lado, as vantagens do progresso tecnológico, da fartura de capitais e da maior capacitação de seus trabalhadores, inviabilizavam a concorrência dos países subdesenvolvidos. Por outro, entre as próprias nações desenvolvidas, o valor do trabalho humano era mais ou menos equivalente, pois seus trabalhadores lograram alcançar graus semelhantes de proteção estatal. Todavia, no final da década de 70, entraram em cena os países semidesenvolvidos mas industrializados, que irromperam no mercado mundial de manufaturas com competitividade calcada em custos baixíssimos de mão-de-obra. A situação começou a mudar. Tanto mais com o progresso tecnológico e a intensificação da globalização dos mercados. A concorrência passou a existir em escala planetária, o que “acarretou em cada economia nacional uma mudança estrutural: crescem os ramos em que as exportações são competitivas e se atrofiam outros em que os custos são excessivos em relação aos de outras economias nacionais.”5 A necessidade de obter ganhos em produtividade e diminuição dos custos de produção fizeram com que os direitos trabalhistas (melhor dizendo, a ausência deles) se tornassem um fator importante, muitas vezes até determinante, na capacidade competitiva dos produtos nacionais no mercado internacional. Não há como olvidar que uma das causas do fantasma do desemprego que ronda a Europa Ocidental e a América do Norte reside no êxodo de várias multinacionais 4. SÜSSEKIND, Arnaldo, Direito Constitucional do Trabalho. 1 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 11. 5. SINGER, Paul. O dumping social, o Brasil e a Cúpula das Américas. In: Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, coluna Opinião Econômica, pág. 2-2, de 11/12/1994. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 173 CONCURSO DE MONOGRAFIAS para o Terceiro Mundo, onde constróem fábricas visando a exportação (Zonas Processadoras de Exportação - ZPEs). E assim, cada vez mais o sistema de benefícios e garantias trabalhistas de um país passou a interessar a todos os demais. Os trabalhadores dos países ricos percebendo a inter-relação, começaram a pressionar seus governos para que tomassem iniciativas contra o que passou a denominar-se “dumping social”. Como se sabe, “dumping” é a prática de cobrar preços iguais ou até inferiores ao preço de custo de um bem, como forma de açambarcar o mercado. O “dumping social“ se caracterizaria, portanto, pelo fato de os países em desenvolvimento pagarem salários muito inferiores aos do mundo industrializado, com o que seus produtos levam vantagem na competição global. Assim surgiram as primeiras menções às cláusulas sociais, cuja introdução nos tratados internacionais tornou-se aspecto bastante relevante, e igualmente controvertido, nos fóruns de debates mundiais. 3. DESREGULAMENTAÇÃO DOS DIREITOS TRABALHISTAS E CLÁUSULA SOCIAL 3.1 Desvalorização Do Trabalho Humano Apesar de já ter sido dado até como morto, o conflito capital x trabalho subsiste, verificando-se, inclusive, seu recrudescimento nos últimos anos. Conforme discorrido anteriormente, no contexto atual da globalização e do neoliberalismo, a desvalorização do trabalho humano contrasta com o incremento do desenvolvimento tecnológico e os sucessivos recordes de produtividade. O desemprego estrutural tornou-se um câncer mundial, cujo remédio ainda está por ser encontrado. Existem no mundo, aproximadamente 900 (novecentos) milhões de desempregados, que juntos constituem a segunda maior nação do planeta.6 O processo de automação e de aceleração nas técnicas de organização de trabalho que já eliminaram tantos empregos, não cessam em elevar os índices de produtividade e a reduzir os postos de trabalho nas empresas. Muitas vagas estão sendo fechadas para sempre e a realocação destas nos novos setores produtivos criados pelo avanço tecnológico está longe de ser compensatória e autocorretiva. A utilização intensa de máquinas e novas técnicas de engenharia genética (biotecnologia) também reduz acentuadamente o emprego no campo, onde o prognóstico é igualmente sombrio. Como se não bastasse, o fenômeno do desemprego é acompanhado pelo da precarização do emprego, com perdas sucessivas de direitos trabalhistas. 6. Fonte: OIT, “Anuário de Estadisticas del Trabajo-1997” Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 174 CONCURSO DE MONOGRAFIAS A redução das garantias trabalhistas se dá mediante a simples retirada do Estado de seu papel regulador das relações de trabalho no sistema capitalista. Como se sabe, as leis trabalhistas foram criadas para atender à necessidade social de um arcabouço jurídico de proteção ao trabalhador hipossuficiente, considerando a existência de uma relação econômica anterior que determina, exatamente, uma situação de desigualdade e hipossuficiência. Pertinentes aqui as sábias palavras de Lacordaire de que “entre o fraco e o forte, a liberdade oprime e é a lei que liberta". A situação se agrava quando vemos a marginalização e desmobilização dos sindicatos profissionais e o enfraquecimento do poder de barganha dos trabalhadores em geral, acuados pelo fantasma do desemprego e o vasto exército de reposição de mão- de-obra disponível. Ademais, a consciência proletária, tão importante nas reivindicações sociais de outrora, “vem se dispersando com a fragmentação da classe trabalhadora nas multidiversas redes isoladas do novo mundo do trabalho”7. Tanto é verdade que as ruidosas greves e enfrentamentos dos sindicatos na luta por melhores salários e condições de trabalho cederam lugar à mera tentativa de manutenção do emprego e reposição salarial de perdas inflacionárias. Perdem os trabalhadores dos países ricos e democráticos, que se encontram no difícil dilema de se verem privados das vantagens salariais e trabalhistas duramente conquistadas ao longo do século ou de verem sumir (serem exportados) seus empregos, e perdem também os trabalhadores dos países menos desenvolvidos, que continuam com pouca ou nenhuma perspectiva de melhoria das condições sociais. Se antes eram os trabalhadores dos países desenvolvidos que serviam de paradigma para as conquistas dos trabalhadores dos países recém-industrializados, a partir dos anos 80 a tendência se inverteu. Cada vez mais os trabalhadores das nações ricas estão mais desprotegidos e ganhando piores salários. A introdução das cláusulas sociais no âmbito de tratados comerciais internacionais significaria a adoção de padrões sociais e trabalhistas mínimos entre os signatários de acordos econômicos, sob pena de imposição de medidas de caráter multilateral, tais como sanções, direitos compensatórios e salvaguardas. Isto posto, o respeito a “padrões mínimos” seria condicionante da participação no comércio internacional, o que diminuiria a “vantagem” comparativa dos países mais pobres. Não é difícil perceber como o atual fenômeno da desvalorização do trabalho humano está por detrás da conduta aparentemente contraditória de diversos países, que, ao mesmo tempo em que cortam direitos sociais de seus trabalhadores nacionais, desregulamentando a legislação trabalhista, manifestam-se em favor de garantias mínimas de trabalhadores estrangeiros, reivindicando a adoção das cláusulas sociais. 7. GENRO, Tarso. Vanguarda de uma nova cidadania. In: Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, caderno Mais, 24 ago. 1997. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 175 CONCURSO DE MONOGRAFIAS A lógica vigente é a de que quanto menor for o valor do trabalho no âmbito interno, maior a vantagem comparativa no comércio internacional, ao passo que, no âmbito externo, quanto mais se puder evitar o baixo valor do trabalho nos países concorrentes, tanto melhor. 3.2 Polêmicas em Torno das Cláusulas Sociais Em posição de ataque à adoção das cláusulas, estão os países subdesenvolvidos, dentre os quais o Brasil, que temem perder aquela que consideram ser sua maior “vantagem” no mercado global. Segundo alegam, na prática, a imposição de padrões trabalhistas para regular o comércio internacional abriria caminho para um sem-número de medidas e práticas de caráter protecionista. A maioria dos países desenvolvidos já encampou a luta de seus sindicatos, muito mais bem organizados e aguerridos do que nos países subdesenvolvidos, com destaque para França, Noruega e EUA, que mostram-se sensíveis ao fenômeno da exportação de empregos. Aliás, os EUA são os maiores defensores das cláusulas sociais, tendo sido o primeiro país a adotar leis internas nas quais há exigência de respeito a padrões trabalhistas mínimos, tais como proibição de uso de trabalhos forçados ou infantil e aplicação de salário mínimo geral. Isto se deu em 1984, com a lei que renovou o sistema geral de preferências dos EUA. Em 1988, o Congresso dos EUA aprovou lei (“Ato de Comércio”) que classifica como “concorrência desleal não-razoável” a denegação sistemática por governos estrangeiros de direitos trabalhistas reconhecidos internacionalmente (art. 301). Pelo menos desde setembro de 1986, início da “Rodada Uruguai” do GATT (“Acordo Geral de Tarifas e Comércio”), que precedeu a OMC (Organização Mundial de Comércio), que o debate em torno da inclusão das cláusulas sociais está constantemente em pauta na agenda internacional. Desde então, a discussão em torno das cláusulas sociais se tornou um dos grandes obstáculos, senão o maior, das negociações dos acordos multilaterais de comércio. Recentemente, os EUA sinalizaram junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI) uma fórmula pela qual as concessões de recursos financeiros aos países em desenvolvimento passe pela observância de padrões trabalhistas e ambientais, nos termos do que é proposto em relação à introdução das cláusulas sociais nos tratados internacionais. Parte importante da controvérsia refere-se à definição de qual seria o fórum competente para seu debate e implementação, se a OMC ou a OIT. Os defensores das cláusulas sociais pretendem incluir a questão na OMC, por entenderem que suas regras e seu sistema de resolução de disputas constituem instrumentos muito mais fortes de pressão. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 176 CONCURSO DE MONOGRAFIAS O raciocínio em favor da OMC, segundo seus ativistas, é que as sanções comerciais num mundo globalizado têm apelo maior que a vergonha perante a opinião pública, único método de pressão da OIT. Assim, a cláusula social seria a garantia de que os trabalhadores contem não com a vaga simpatia, mas com pressões internacionais concretas por melhores condições de trabalho. Por outro lado, os países subdesenvolvidos, principais opositores das cláusulas, argumentam que a OMC foi criada para liberalizar o comércio e não para cuidar da agenda social, até porque já existe um organismo internacional próprio para tal questão, a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Até agora, tem prevalecido o entendimento de que os padrões trabalhistas mínimos são da alçada da OIT, mas os sindicatos e governos dos países desenvolvidos, junto com as ONG's (organizações não-governamentais) de direitos humanos, parecem dispostos a insistir na veiculação do tema junto à OMC. Quanto às espécies de cláusulas sociais que seriam adotadas, se não há exatamente um consenso a respeito, pode-se dizer, pelo menos, que trata-se de um dos menores focos de polêmica. Pelo que se pôde observar das reuniões, fóruns e conferências internacionais em que foi trazido à tona o assunto, as cláusulas sociais a serem adotadas diriam respeito aos seguintes aspectos, basicamente: - liberdade de associação e de expressão para os sindicatos; - afirmação do direito à negociação coletiva; - abolição do trabalho escravo; - abolição dos trabalho infantil; - não-discriminação no emprego (raça, sexo, etc.). Não seriam adotadas, pelo menos num primeiro momento, cláusula sociais que referentes à duração máxima da jornada de trabalho, concessão de repouso semanal remunerado, férias ou previdência social, e muito menos de uma cláusula social que estabeleça um salário mínimo mundial. Os governos dos países desenvolvidos sabem que ainda é bastante prematuro colocar o tema da remuneração em discussão, ainda que seus sindicatos deixem escapar que, mais dia menos dia, terá de ser levantada a bandeira do salário mínimo mundial. No mais, é interessante registrar que já existe na própria OMC uma espécie de cláusula social, que proíbe a comercialização de bens produzidos em presídios. 4. A TRANSIÇÃO PARA UM MERCADO DE TRABALHO GLOBAL Do ponto de vista global (e é este que conta num mundo cada vez mais sem fronteiras econômicas), a competição irrestrita entre economias diferenciadas tende a aproximar os níveis de salário direto e indireto (este dado pelo custo dos direitos trabalhistas) a uma média global ponderada. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 177 CONCURSO DE MONOGRAFIAS Por enquanto, o capital tem prevalecido sobre o trabalho, cujo valor está em declínio. A continuar assim, o mercado de trabalho na maioria dos países será globalizado e desregulamentado, gerando achatamento de salários, diminuição de garantias trabalhistas e grande concentração de renda. Cabe reproduzir aqui o discurso de posse de Albert Thomas, primeiro diretor geral da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que ao assumir a função, disse: “Os acordos internacionais sobre as normas de trabalho evitariam que a concorrência se fizesse em detrimento dos trabalhadores, por uma espécie de dumping desumano e constituiriam, entre empregadores e países, uma espécie de código de concorrência leal". Décadas depois, o panorama atual é exatamente este: a concorrência se faz em detrimento dos trabalhadores. Neste contexto, as cláusulas sociais representariam “os acordos internacionais sobre normas de trabalho” a que se referiu Albert Thomas, impedindo um nivelamento por baixo nas condições sociais dos trabalhadores mundiais. Logicamente, contudo, as cláusulas não podem servir de pretexto para práticas discriminatórias e protecionistas, na forma com que algumas nações industrializadas pretendem inseri-las nos tratados internacionais. Há que se atentar para os riscos de uma formulação multilateral vaga que possa ensejar práticas unilaterais discriminatórias e, o que é ainda pior, legítimas. Uma alternativa interessante e criativa para “relacionar positivamente comércio e proteção ao trabalho” é a sugerida pelo embaixador Paulo Batista Nogueira.8 O mecanismo consistiria em condicionar a “aplicação das medidas restritivas (no âmbito da OMC) a exportações de mercadorias produzidas em condições de violação de direitos trabalhistas fundamentais consagrados pela OIT, desde que da introdução dessas mercadorias comprovadamente resulte dano em termos de desemprego em setores específicos da economia do país importador”. Não se pode perder de vista que o próprio processo econômico engendra e requer modificações na estrutura do sistema produtivo, o que pode vir a acarretar um aperfeiçoamento nos níveis de distribuição de rendas. Sem a garantia de padrões sociais mínimos, com o ritmo atual de desvalorização do trabalho, corre-se o risco de haver uma produção de bens como jamais vista, haja vista o elevado nível de produtividade alcançado, sem que haja na sociedade capacidade de consumo para tanto. Isto geraria uma redução do nível de atividade econômica, o que, conseqüentemente, traria reflexos no nível de lucratividade das grandes empresas. Mister fixar que “salário é custo e preço ao mesmo tempo”.9 8. BATISTA, Paulo Nogueira. Op. Cit., p. 53 9. SAYAD, João. Não e não. In: Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, coluna Opinião Econômica, 07 jul. 1997. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 178 CONCURSO DE MONOGRAFIAS Demais disso, algumas grandes empresas começam a perceber que trabalhadores satisfeitos são muito mais eficientes e criativos, e, portanto, mais produtivos. Em contraposição à piora das condições de trabalho em curso, esboça-se uma verdadeira revolução na área de recursos humanos, a qual norteia-se pelo princípio da valorização dos funcionários dentro das empresas. Adquire-se a noção de sinergia dentro das relações de trabalho, e o empregado começa a ser encarado com parceiro do empregador. Tal movimento só vem a corroborar a tese de que o desenvolvimento social também fomenta o desenvolvimento econômico e não apenas o contrário. Outro aspecto a ser considerado na inevitabilidade da mudança de mentalidade a médio/longo prazo é o fato de os fundos de pensão constituírem “uma das principais fontes de capital para investimento no sistema atual”10. Como tais fundos só podem existir em função de vínculos empregatícios estáveis, a defesa do capital pela erradicação destes nas relações de trabalho seria como dar um tiro no próprio pé. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A necessidade de resgate da dignidade humana indica que a equação dos limites da formação de preços de bens e serviços na competitividade global, “com os lucros tendendo ao infinito e direitos sociais tendendo a zero”, precisa ser recomposta. 11 Uma política em prol de maior justiça social deve se pautar, neste momento de transição que a humanidade atravessa, por uma maior redistribuição de renda, sendo repassado aos trabalhadores os ganhos auferidos com o aumento da produtividade e da lucratividade obtida com o avanço tecnológico, que deveria ser, em última análise de toda humanidade. A redução da jornada de trabalho sem perda salarial é medida que se impõe, existindo cada vez mais vozes a se levantar por tal causa. A França é exemplo concreto do sucesso desta medida, tendo ocorrido considerável queda no nível de desemprego após a diminuição da jornada de trabalho semanal para 35 horas. Ficou patente a inconsistência dos argumentos empresariais de crítica da intervenção estatal em favor da redução da carga horária de trabalho. As cláusulas sociais, deixados de lado os interesses escusos discriminatórios e protecionistas, são instrumentos importantes a serem adotados nos tratados internacionais, a fim de evitar a utilização das baixas condições sociais e trabalhistas como “vantagem” competitiva. 10. Futuro reserva menos emprego, diz economista-Entrevista da 2ª. In: Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, p. 4,26 ago. 1997. 11. JAKOBSEN, Kjeld. Questão trabalhista, verdades e mentiras: Geração de desemprego. In: Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, caderno principal, p. 3, 31 jan. 1998. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 179 CONCURSO DE MONOGRAFIAS A competitividade que age como força motriz do progresso, deve ser aquela que advém do avanço tecno-científico e da capacitação dos trabalhadores e oportuna, em razão do incremento da produtividade, melhor e mais adequados salários. No cenário atual, apenas uma diminuta elite mundial está usufruindo do sofisticado progresso científico-tecnológico da humanidade, enquanto que a maioria dos seres humanos ainda está lidando com problemas sociais básicos (fome, saneamento básico, analfabetismo, doenças curáveis, etc.). As diferenças entre ricos e pobres não estão aumentando apenas dentro dos países, mas também dentro dos países. Se em 1960 os 20% mais ricos ganhavam 30 vezes mais do que os 20% pobres, em 1994 sua renda era 78 vezes superior. O patrimônio conjunto dos raros 447 bilionários que há no mundo eqüivalem à renda somada da metade mais pobre da população mundial, cerca de 2,8 bilhões de pessoas.12 A taxa absoluta de pobreza do mundo está aumentando de um total de 1,2 bilhão em 1987, para 1,5 bilhão em 1999. Se as atuais tendências de crescimento econômico persistirem, o número de pessoas que vivem com menos de US$ 1 (um dólar) por dia aumentará para 1,9 bilhão em 2015. Cabe indagar, portanto, qual a razão de ser de tanto desenvolvimento econômico? Pertenceria a economia à categoria dos fenômenos governados por leis imutáveis, como os do sistema planetário, além do controle humano, ou seria ela parte integrante da cultura dos homens como expressão de seus valores morais? A noção de dignidade da pessoa humana não está sendo perdida em função de um economicismo estéril e inconseqüente? Ora, existem crianças que trabalham quando deveriam estar na escola, enquanto há milhões de adultos que querem trabalhar e não conseguem. Tal situação, como diversas outras que também poderiam exemplificar absurdos da modernidade são, inquestionavelmente, resultados de escolhas humanas, e em última análise, tradução de valores que permeiam a sociedade. A desvalorização do trabalho humano que enseja a não intervenção do estado nas relações de trabalho e a exploração de mão-de-obra nos países subdesenvolvidos pode ser revertida desde que exista uma consciência da irracionalidade e, por que não dizer, da insensatez do atual sistema econômico. O fato é que a própria elite que se beneficia deste sistema econômico está cada vez mais acuada e amedrontada diante das manifestações de violência que eclodem da parte excluída destes ganhos. 12. apud O lado cruel da globalização. In: Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, caderno Economia, p. 11, 16 nov. 1999 (Fonte citada: “Relatório sobre o desenvolvimento mundial deste século-Banco Mundial”). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 180 CONCURSO DE MONOGRAFIAS Mais e mais são construídas prisões para os pobres e também para os ricos, que se vêm obrigados a cercar suas casas e condomínios, blindar seus carros e esconder seus pertences. Concluímos com a certeza de que a lição ainda a ser aprendida é a de que existe uma inquestionável correlação entre o fenômeno da banalização da vida e o da desvalorização do trabalho. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA Livros: ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo. In: Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático, Paz e Terra, Rio de Janeiro, 1995 BATISTA, Paulo Nogueira. Cláusula social e comércio internacional: uma antiga questão sob nova roupagem. Política Externa, São Paulo, v.3, n.2, p. 38, set./out/nov. 1994 BONFIM, Benedito Calheiros et al. Globalização, neoliberalismo e direitos sociais. Rio de Janeiro: Destaque, 1997 PASTORE, José, Flexibilização dos mercados de trabalho e contratação coletiva. 2 ed. São Paulo, LTr 1994 SÜSSEKIND, Arnaldo, Direito Constitucional do Trabalho. 1 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 11. Outros: BARROS Jr., Cássio de Mesquita. Flexibilização do Direito do Trabalho. ln: texto da aula prova de erudição no concurso de professor da faculdade de Direito da USP. CARRION, Valentin. Desregulamentação do Direito do Trabalho. In: conferência no Congresso internacional de Direito do Trabalho, Belém, 1995. CLINTON impediu o consenso, diz professor. In Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, caderno Dinheiro, p. 2-6, 19 dez. 1999. LEITE, Júlio Cesar do Prado. Globalização - conseqüências nas relações de trabalho. Revista de Direito do Trabalho, Curitiba, v.5, n.2, p. 6, fev. 1999. MULTINACIONAIS aprovam CLT. In: Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, caderno Economia, p. 11, 17 jan. 2000. O lado cruel da globalização. In: Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, caderno Economia, p. 11, 16 nov. 1999 POCHMANN, Márcio. O emprego e os mercadores de ilusões. In: Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, coluna “Opinião Econômica”, 22 out. 1997. ROSSI, Clóvis. O emprego e os dogmas. In: Jornal Folha de São Paulo, São Paulo, p. 2, 11 abr. 1999. Sobreviventes da globalização. In: Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 08 fev. 1998. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 181 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DA SUBSEÇÃO II ESPECIALIZADA EM DISSÍDIOS INDIVIDUAIS* 01. AÇÃO RESCISÓRIA. AÇÃO CAUTELAR INCIDENTAL. PLANOS ECONÔMICOS. Procede o pedido de cautelar incidental somente se o autor da ação rescisória, fundada no art. 485, inc. V, do CPC, invocar na respectiva petição inicial afronta ao art. 5o, inciso XXXVI, da Constituição Federal de 1988. . AC 535378/99 Min. Ronaldo Leal DJ 23.06.00 Decisão unânime . ARXOFROAC 523827/98 Min. Barros Levenhagen DJ 16.06.00 Decisão unânime . AGAC 619295/99 Min. Luciano Castilho DJ 09.06.00 Decisão unânime . ROAC 422674/98 Min. Moura França DJ 23.10.98 Decisão unânime . ROAC 414425/97 Min. Luciano Castilho DJ 23.10.98 Decisão unânime . AC 436072/98 Min. Carlos Alberto DJ 25.09.98 Decisão unânime 02. AÇÃO RESCISÓRIA. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO. SALÁRIO MÍNIMO. CABÍVEL. Viola o art. 192 da CLT decisão que acolhe pedido de adicional de insalubridade com base na remuneração do empregado. . ROAR 395358/97 Min. Luciano Castilho DJ 17.03.00 Decisão unânime . ROAR 333646/96 Min. Moura França DJ 10.09.99 Decisão por maioria . ROAR 274975/96 Min. Moura França DJ 13.08.99 Decisão unânime 03. AÇÃO RESCISÓRIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DE MÉRITO REQUERIDA EM FASE RECURSAL. RECEBIMENTO COMO MEDIDA ACAUTELATÓRIA. MP 1906 E REEDIÇÕES. Em face do que dispõe a MP 1906 e reedições, é recebido como medida acautelatória em ação rescisória o pedido de antecipação de tutela formulado por entidade * Os acórdãos precedentes dos temas estão disponíveis na home page do Tribunal Superior do Trabalho: www.tst.gov.br Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 jul/set 2000 185 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL pública em recurso ordinário, visando a suspender a execução até o trânsito em julgado da decisão proferida na ação principal. . RXOFROAR 354123/97 Min. Ronaldo Leal DJ 19.11.99 Decisão unânime . RXOFROAR 336923/97 Min. Moura França DJ 08.10.99 Decisão unânime . RXOFROAR 336916/97 Min. Francisco Fausto DJ 08.10.99 Decisão unânime 04. AÇÃO RESCISÓRIA. BANCO DO BRASIL. ADICIONAL DE CARÁTER PESSOAL. ACP. Procede, por ofensa ao art. 5°, inc. XXXVI, da CF/88, o pedido de rescisão de julgado que acolheu adicional de caráter pessoal em favor de empregado do Banco do Brasil S.A. . ROAR 396165/97 Julgado em 13.06.00 .ROAR 396902/97 DJ 30.06.00 .ROAR 416459/98 DJ 12.05.00 .AR 261195/96 DJ 22.05.98 . ROAR 244920/96, Ac. 5294/97 DJ 24.04.98 . ROAR 192022/95, Ac. 2957/97 DJ 26.09.97 Min. Luciano Castilho Decisão unânime Min. Barros Levenhagen Decisão unânime Min. Ronaldo Leal Decisão unânime Min. Francisco Fausto Decisão por maioria Min. Manoel Mendes Decisão por maioria Red. Min. Manoel Mendes Decisão por maioria 05. AÇAO RESCISÓRIA. BANCO DO BRASIL. AP E ADI. HORAS EXTRAS. SÚMULA 83 DO TST. APLICÁVEL. Não se acolhe pedido de rescisão de julgado que deferiu a empregado do Banco do Brasil S.A. horas extras após a sexta, não obstante o pagamento dos adicionais AP e ADI, ou AFR quando a decisão rescindenda for anterior à Orientação Jurisprudencial n° 17, da Seção de Dissídios Individuais do TST (07.11.94). Incidência das Súmulas 83 do TST e 343 do STF. . ROAR 391345/97 (despacho) DJ 22.05.00 . AR 486205/98 DJ 25.02.00 .ROAR 339965/97 DJ 08.10.99 . ROAR 394589/97 DJ 11.12.98 . AR 394096/97 Min. Barros Levenhagen Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Moura França Decisão unânime Min. Moura França Decisão unânime Min. Valdir Righetto Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 186 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 20.11.98 Decisão unânime . AR 294027/96, Ac. 4421/97 Min. Luciano Castilho DJ 21.11.97 Decisão unânime 06. AÇÃO RESCISÓRIA. CIPEIRO-SUPLENTE. ESTABILIDADE. ADCT, ART. 10, II. SÚMULA 83 DO TST. INAPLICÁVEL. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. Rescinde-se o julgado que nega estabilidade a membro suplente de CIPA, representante de empregado, ainda que se cuide de decisão anterior à Súmula 339 do TST. Ofensa ao art. 10, II, " a”, do ADCT da CF/88. . ROAR 298504/96 Min. Francisco Fausto DJ 17.09.99 Decisão unânime . ROAR 302931/96 Min. João O. Dalazen DJ 14.05.99 Decisão unânime . ROAR 295373/96 Min. João O, Dalazen DJ 07.05.99 Decisão unânime . AR 343857/97 Min. Valdir Righetto DJ 05.02.99 Decisão unânime 07. AÇÃO RESCISÓRIA. COMPETÊNCIA. CRIAÇÃO DE TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO. NA OMISSÃO DA LEI, É FIXADA PELO ART. 678, INC. I, C, ITEM 2, DA CLT. A Lei 7872/89 que criou o Tribunal Regional do Trabalho da 17a Região não fixou a sua competência para apreciar as ações rescisórias de decisões oriundas da 1a Região. . ROAR 341313/97 Red. Min. João O. Dalazen DJ 18.06.99 Decisão por maioria . CC 298320/96, Ac. 741/97 Min. Ângelo Mário DJ 02.05.97 Decisão unânime . CC 50736/92, Ac. 2818/94 Min. José L. Vasconcellos DJ 07.10.94 Decisão unânime 08. AÇÃO RESCISÓRIA. COMPLEMENTAÇAO DE APOSENTADORIA. BANESPA. Não se rescinde julgado que acolheu pedido de complementação de aposentadoria integral em favor de empregado do BANESPA, antes da Súmula 313 do TST, em virtude da notória controvérsia jurisprudencial então reinante. Incidência da Súmula 83 do TST. . ROAR 478171/98 Min. Luciano Castilho DJ 30.06.00 Decisão unânime . AR 343847/97 Min. João O. Dalazen DJ 30.04.98 Decisão unânime . AR 215741/95, Ac. 4975/97 Min. Francisco Fausto DJ 13.02.98 Decisão unânime Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 187 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL . ROAR 153684/94, Ac.SDI-Plena 802/96 DJ 17.12.96 Min. Luciano Castilho Decisão unânime 09. AÇÃO RESCISÓRIA. CONAB. AVISO DIREH 02/84. SÚMULA 83 DO TST. APLICÁVEL. Não se rescinde julgado que reconheceu garantia de emprego com base no Aviso DIREH 02/84 da CONAB, antes da Súmula 355 do TST, em virtude da notória controvérsia jurisprudencial então reinante. Incidência da Súmula 83 do TST. . ROAR 528630/99 DJ 23.06.00 .ROAR 501310/98 DJ 23.06.00 . ROAR 532259/99 DJ 23.06.00 . ROAR 413102/97 (despacho) DJ 06.04.00 .ROAR 437573/98 DJ 03.03.00 . AR 337387/96, Ac. 5173/97 DJ 06.02.98 Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Ives Gandra Decisão unânime Min. Ives Gandra Decisão unânime Min. Barros Levenhagen Min. Luciano Castilho Decisão unânime Min. Manoel Mendes Decisão unânime 10. AÇÃO RESCISÓRIA. CONTRATO NULO. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. EFEITOS. ART. 37, II E § 2°, DA CF/88. Somente por ofensa ao art. 37, II e § 2°, da CF/88, procede o pedido de rescisão de julgado para considerar nula a contratação, sem concurso público, de servidor, após a CF/88. .RXOFROAR 488233/98 DJ 01.09.00 .RXOFROAR 627293/00 DJ 30.06.00 . RXOFROAR 523813/98 DJ 30.06.00 .RXOFROAR 528616/99 DJ 09.06.00 Red. Min. Barros Levenhagen Decisão por maioria Juiz Conv. Márcio R. do Valle Decisão unânime Min. Francisco Fausto Decisão unânime Min. Ronaldo Leal Decisão unânime 11. AÇÃO RESCISÓRIA. CORREÇÃO MONETÁRIA. LEI 7.596/87. UNIVERSIDADES FEDERAIS. IMPLANTAÇÃO TARDIA DO PLANO DE CLASSIFICAÇÃO DE CARGOS. VIOLAÇÃO DE LEI. SÚMULA 83 DO TST. APLICÁVEL. Não se rescinde julgado que acolhe pedido de correção monetária decorrente da implantação tardia do Plano de Classificação de Cargos de Universidade Federal previsto na Lei 7596/87, à época em que era controvertida tal matéria na jurisprudência. Incidência da Súmula 83 do TST. . RXOFROAR 341954/97 Min. Luciano Castilho Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 188 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 01.10.99 . AR 220904/95, Ac. 5283/97 DJ 20.02.98 . ROAR 213030/95, Ac.4487/97 DJ 28.11.97 . ROAR 167072/95, Ac. 1296/96 DJ 06.12.96 Decisão unânime Min. Leonaldo Silva Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Vantuil Abdala Decisão unânime 12. AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA. CONSUMAÇÃO ANTERIOR À EDIÇÃO DA MP 1.577/97. A regra ampliativa do prazo decadencial para a propositura de ação rescisória, em favor de pessoa jurídica de direito público, não se aplica se, ao tempo em que sobreveio a MP 1577/97, já se exaurira o biênio do art. 495 do CPC. Preservação do direito adquirido da parte à decadência já consumada sob a égide da lei velha. .ROAR 573124/99 DJ 30.06.00 . ROAG 488258/98 DJ 16.06.00 . RXOFROAR 613115/99 (despacho) DJ 11.05.00 . RXOFAR 510341/98 DJ 05.05.00 . ROAG 488246/98 (despacho) DJ 06.04.00 . RXOFROAG 468142/98 DJ 03.03.00 . RXOFROAR 488361/98 DJ 18.02.00 .RXOFROAR 478182/98 DJ 03.12.99 Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Ives Gandra Decisão unânime Min. Barros Levenhagen Min. Ronaldo Leal Decisão unânime Min. Barros Levenhagen Min. Francisco Fausto Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Moura França Decisão unânime 13. AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA. DIES AD QUEM. ART. 775 DA CLT. APLICÁVEL. Prorroga-se até o primeiro dia útil imediatamente subseqüente o prazo decadencial para ajuizamento de ação rescisória quando expira em férias forenses, feriados, finais de semana ou em dia em que não houver expediente forense. Aplicação do art. 775 da CLT. . ROAR 575062/99 Min. Ives Gandra DJ 18.08.00 Decisão unânime . RXOFROAR 338431/97 Min. Ronaldo Leal DJ 05.11.99 Decisão unânime . ROAR 218796/95, Ac. 4493/97 Min. João O. Dalazen DJ 15.05.98 Decisão unânime Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 189 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL . AR 95461/93, Ac. 1150/97 DJ 12.09.97 . ROAR 195400/95, Ac. 072/97 DJ 04.04.97 . ROAR 126875/94, Ac. 1042/96 DJ 22.11.96 . REesp 51968-3 STJ DJ 10.10.94 .MS 20171-Pleno STF DJ 30.03.79 Min. José Z. Calasãs Decisão unânime Min. José Z. Calasãs Decisão unânime Min. Francisco Fausto Decisão unânime Min. Cesar Asfor Decisão unânime Min. Rafael Mayer Decisão unânime 14. AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA. DIES A QUO. RECURSO INTEMPESTIVO. Havendo recurso, o termo inicial do prazo decadencial para a ação rescisória conta-se do trânsito em julgado da última decisão proferida, seja de mérito, ou não, ressalvada a hipótese de recurso manifestamente intempestivo, em que flui do exaurimento do prazo em que deveria ter sido interposto, quando se tem por transitada em julgado a decisão rescindenda. Havendo razoável controvérsia acerca da intempestividade do recurso, segue-se a diretriz geral da Súmula 100 do TST. . ROAR 436016/98 DJ 30.06.00 .ROAR 573138/99 DJ 23.06.00 .ROAG 416355/98 DJ 26.05.00 .ROAR 436012/98 DJ 19.05.00 . ROAG 421628/98 (despacho) DJ 02.05.00 . ROAR 320940/96 DJ 04.06.99 Min. Ives Gandra Decisão unânime Min. Ronaldo Leal Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Ives Gandra Decisão unânime Min. Barros Levenhagen Red. Min. Moura França Decisão por maioria 15. AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA. DUAS DECISÕES RESCINDENDAS. Havendo recurso parcial no processo principal, o trânsito em julgado dá-se em momentos e em tribunais diferentes, contando-se o prazo decadencial para a rescisória do trânsito em julgado de cada condenação, salvo se o recurso ventilar questão preliminar ou questão prejudicial cujo acolhimento, em tese, possa tornar insubsistente a condenação, caso em que flui a decadência somente após o trânsito em julgado da decisão que julgar o recurso parcial. Inteligência da Súmula 100 do TST. . ROAR 575047/99 Min. João O. Dalazen DJ 30.06.00 Decisão unânime . RXOFROAR 579976/99 Min. Ives Gandra Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 190 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 23.06.00 Decisão unânime . RXOFROAR 465763/98 Min. Ronaldo Leal DJ 14.04.00 Decisão unânime . ROAR 410038/97 Min. Francisco Fausto DJ 31.03.00 Decisão unânime . RXOFROAR 426546/98 Min. Moura França DJ 03.12.99 Decisão por maioria 16. AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA. EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. A exceção de incompetência, ainda que oposta no prazo recursal, sem ter sido aviado o recurso próprio, não tem o condão de afastar a consumação da coisa julgada e, assim, postergar o termo inicial do prazo decadencial para a ação rescisória. .ROAR 501346/98 Min. Ives Gandra DJ 09.06.00 Decisão unânime . RXOFROAR 435995/98 Min. Francisco Fausto DJ 08.10.99 Decisão unânime . AR 399649/97 Min. João O. Dalazen DJ 18.06.99 Decisão unânime 17. AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA. NÃO-CONSUMAÇÃO ANTES DA EDIÇÃO DA MP 1577/97. AMPLIAÇÃO DO PRAZO. A vigência da MP 1577/97 e de suas reedições implicou o elastecimento do prazo decadencial para o ajuizamento da ação rescisória a favor dos entes de direito público, autarquias e fundações públicas. Se o biênio decadencial do art. 495 do CPC findou após a entrada em vigor da referida medida provisória e até sua suspensão pelo STF em sede liminar de ação direta de inconstitucionalidade (ADin 1753-2), tem-se como aplicável o prazo decadencial elastecido à rescisória. . RXOFAR 570757/99 Min. Ives Gandra Julgado em 09.05.00 Decisão por maioria .RXOFROAG 598581/99 Min. Ives Gandra Julgado em 09.05.00 Decisão por maioria . RXOFROAR 557555/99 Min. Luciano Castilho DJ 01.09.00 Decisão por maioria . RXOFROAR 538437/99 Min. Ives Gandra DJ 23.06.00 Decisão por maioria . RXOFROAR 531296/99 Min. Ronaldo Leal DJ 09.06.00 Decisão por maioria 18. AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA. UNIÃO. LEI COMPLEMENTAR N° 73/93, ART. 67. LEI 8.682/93, ART. 6o. O art. 67 da Lei Complementar n° 73/93 interrompeu todos os prazos, inclusive o de decadência, em favor da União no período compreendido entre 14.02.93 e 14.08.93. . ROAR 314065/96 Red. Min. Francisco Fausto Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 191 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 03.09.99 Decisão por maioria . RXOFROAR 328657/96 Min. Moura França DJ 23.10.98 Decisão unânime . ROAG 232132/95, Ac. 971/97 Min. Valdir Righetto DJ 09.10.98 Decisão unânime . ROAR 255940/96, Ac. 4209/97 Min. Luciano Castilho DJ 07.11.97 Decisão unânime 19. AÇÃO RESCISÓRIA. DESLIGAMENTO INCENTIVADO. IMPOSTO DE RENDA. ABONO PECUNIÁRIO. VIOLAÇÃO DE LEI. SÚMULA 83 DO TST. APLICÁVEL. Havendo notória controvérsia jurisprudencial acerca da incidência de imposto de renda sobre parcela paga pelo empregador (“abono pecuniário ”) a titulo de “desligamento incentivado ”, improcede pedido de rescisão do julgado. Incidência da Súmula 83 do TST. . ROAR 283251/96 Min. Cnéa Moreira DJ 11.12.98 Decisão unânime . ROAR 284249/96 Min. João O. Dalazen DJ 27.11.98 Decisão unânime . ROAR 283257/96 Min. Moura França DJ 27.11.98 Decisão unânime 20. AÇÃO RESCISÓRIA. DOCUMENTO NOVO. DISSÍDIO COLETIVO. SENTENÇA NORMATIVA. Documento novo é o cronologicamente velho, já existente ao tempo da decisão rescindenda, mas ignorado pelo interessado ou de impossível utilização à época no processo. Não é documento novo apto a viabilizar a desconstituição de julgado. a) a sentença normativa proferida ou transitada em julgada posteriormente à sentença rescindenda. . AR 38066/91, Ac. 2898/92 Min. Ermes P. Pedrassani DJ 05.02.93 Decisão unânime . AR 1063-PR STF Min. Néri da Silveira DJ 25.08.95 Decisão por maioria b) a sentença normativa preexistente à sentença rescindenda, mas não exibida no processo principal, em virtude de negligência da parte, quando podia e deveria louvar-se de documento já existente e não ignorado quando emitida a decisão rescindenda. . ROAR 570361/99 Min. Luciano Castilho DJ 09.06.00 Decisão unânime . ROAR 256172/96 Red. Min. João O. Dalazen DJ 28.05.99 Decisão por maioria . AR 1313-1-PI, Pleno STF Min. Marco Aurélio DJ 14.02.92 Decisão unânime Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 192 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL . AR 1320-PI STF Min. Octávio Gallotti DJ 10.08.90 Decisão unânime 21. AÇÃO RESCISÓRIA. DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO. TRANSITO EM JULGADO. INOBSERVÂNCIA. DL 779/69, ART. 1o, V. INCABÍVEL. Incabível ação rescisória para a desconstituição de sentença não transitada em julgado porque ainda não submetida ao necessário duplo grau de jurisdição, na forma do Decreto-lei n ° 779/69. Determina-se que se oficie ao Presidente do TRT para que proceda à avocatória do processo principal para o reexame da sentença rescindenda. . ROAG 289701/96, Ac. 3982/97 Min. José Z. Calasãs DJ 07.11.97 Decisão unânime . ROAR 300032/96, Ac. 3387/97 Min, Regina Rezende DJ 19.09.97 Decisão unânime . ROAR 144148/94, Ac. 1061/97 Min. Regina Rezende DJ 01.08.97 Decisão unânime . AIRO 47074/92, Ac. 1608/92 Min. Ermes P. Pedrassani DJ 28.08.92 Decisão unânime 22. AÇÃO RESCISÓRIA. ESTABILIDADE. ART. 41, CF/88. CELETISTA. ADMINISTRAÇÃO DIRETA, AUTÁRQUICA OU FUNDACIONAL. APLICABILIDADE. O servidor público celetista da administração direta, autárquica ou fundacional é beneficiário da estabilidade prevista no art. 41 da Constituição Federal. . ROAR 420755/98 Min. João O. Dalazen Julgado em 22.08.00 Decisão por maioria . ROAR 387511/97 Min. Luciano Castilho Julgado em 22.08.00 Decisão por maioria . RE 187229-2, PA-2aT Min. Marco Aurélio DJ 14.05.99 Decisão unânime 23. AÇÃO RESCISÓRIA. ESTABILIDADE. PERÍODO PRÉ-ELEITORAL. VIOLAÇÃO DE LEI. SÚMULA 83 DO TST. APLICÁVEL. Não procede pedido de rescisão de sentença de mérito que assegura ou nega estabilidade pré-eleitoral, quando a decisão rescindenda for anterior à Orientação Jurisprudencial n° 51, da Seção de Dissídios Individuais do TST (25.11.96). Incidência da Súmula 83 do TST. . AR 421453/98 Min. Valdir Righetto DJ 18.06.99 Decisão unânime . ROAR 293318/96 Min. Cnéa Moreira DJ 12.03.99 Decisão unânime . ROAR 468045/98 ed. Min. Moura França DJ 12.03.99 Decisão por maioria . AR 259110/96, Ac. 4395/97 Min. João O. Dalazen Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 193 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 05.12.97 Decisão unânime 24. AÇÃO RESCISÓRIA. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. REINTEGRAÇÃO EM PERÍODO POSTERIOR. DIREITO LIMITADO AOS SALÁRIOS E CONSECTÁRIOS DO PERÍODO DA ESTABILIDADE. Rescinde-se o julgado que reconhece estabilidade provisória e determina a reintegração de empregado, quando já exaurido o respectivo período de estabilidade. Em juízo rescisório, restringe-se a condenação quanto aos salários e consectários até o termo final da estabilidade. . AR 210412/95, Ac. 1640/96 Min. Vantuil Abdala DJ 21.02.97 Decisão por maioria . ROAR 182237/95, Ac. 646/96 Min. Luciano Castilho DJ 06.12.96 Decisão unânime . AR 142993/94, Ac. 4644/95 Min. Afonso Celso DJ 15.12.95 Decisão unânime 25. AÇÃO RESCISÓRIA. EXPRESSÃO “LEI” DO ART. 485, V, DO CPC. NÃO INCLUSÃO DO ACT, CCT, PORTARIA E REGULAMENTO. Não procede pedido de rescisão fundado no art. 485, inc. V, do CPC, quando se aponta violação a norma de convenção coletiva de trabalho, acordo coletivo de trabalho, portaria do Poder Executivo e regulamento de empresa. . ROAR 536879/99 (despacho) Min. Barros Levenhagen DJ 08.05.00 . ROAR 401736/97 Min. Ives Gandra DJ 09.06.00 Decisão unânime . ROAR 237461/95, Ac. 3434/97 Min. Luciano Castilho DJ 19.09.97 Decisão unânime . ROAR 109086/94, Ac. 1677/96 Min. José L. Vasconcellos DJ 07.02.97 Decisão unânime . ROAR 27460/91, Ac. 2909/92 Min. Francisco Fausto DJ 26.02.93 Decisão unânime . ROAR 330/79, Ac. TP 1218/80 Min. Coqueijo Costa DJ 27.06.80 Decisão unânime 26. AÇÃO RESCISÓRIA. GRATIFICAÇÃO DE NÍVEL SUPERIOR. SUFRAMA. A extensão da gratificação instituída pela SUFRAMA aos servidores celetistas exercentes de atividade de nível superior não ofende as disposições contidas nos arts. 37, XIII, e 39, § 1a, da CF/88. . RXOFROAR 358690/97 Min. Ronaldo Leal DJ 23.06.00 Decisão unânime . RXOFROAR 358698/97 Min. Ives Gandra DJ 07.04.00 Decisão unânime Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 194 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL . RXOFROAR 389745/97 DJ 17.03.00 . RXOFROAR 345705/97 DJ 05.11.99 . RXOFROAR 347256/97 DJ 10.09.99 Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Ronaldo Leal Decisão unânime 27. AÇÃO RESCISÓRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Incabível condenação em honorários advocatícios em ação rescisória no processo trabalhista, salvo preenchidos os requisitos da Lei 5584/70. .ROAR 411384/97 DJ 23.06.00 .ROAR 440028/98 DJ 19.05.00 . RXOFROAR 566898/99 (despacho) DJ 18.04.00 .ROAR 396519/97 DJ 07.04.00 .ROAR 367459/97 DJ 31.03.00 .ROAR 360858/97 DJ 26.11.99 . AR 199961/95, Ac. 1308/97 DJ 22.08.97 Min. Luciano Castilho Decisão unânime Min. Ives Gandra Decisão unânime Min. Barros Levenhagen Min, João O. Dalazen Decisão unânime Min. Francisco Fausto Decisão unânime Min. Ronaldo Leal Decisão unânime Min. Vantuil Abdala Decisão unânime 28. AÇÃO RESCISÓRIA. JUÍZO RESCISÓRIO. RESTITUIÇÃO DA PARCELA JÁ RECEBIDA. DEVE A PARTE PROPOR AÇÃO PRÓPRIA. Inviável em sede de ação rescisória pleitear condenação relativa à devolução dos valores pagos aos empregados quando ultimada a execução da decisão rescindenda, devendo a empresa buscar por meio de procedimento próprio essa devolução. . ROAR 527657/99 DJ 04.08.00 .AR 298319/96, Ac. 4429/97 DJ 13.03.98 .AR 215752/95, Ac. 1505/97 DJ 29.08.97 . AR 196966/95, Ac. 1089/97 DJ 20.06.97 . ROAR 187615/95, Ac. 1748/96 DJ 28.02.97 Min. Francisco Fausto Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão por maioria Min. Ronaldo Leal Decisão unânime Min. Manoel Mendes Decisão por maioria Min. Vantuil Abdala Decisão unânime Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 195 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL 29. AÇÃO RESCISÓRIA. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. SÚMULA 83 DO TST E SÚMULA 343 DO STF. INAPLICÁVEIS. No julgamento de ação rescisória fundada no art. 485, inc. V, do CPC, não se aplica o óbice das súmulas 83 do TST e 343 do STF, quando se tratar de matéria constitucional. .ROAR 412335/97 DJ 23.06.00 . RXOFROAR 336916/97 DJ 08.10.99 . ROAR 213034/95, Ac. 1959/97 DJ 01.08.97 . ROAR 60959/92, Ac. 416/95 DJ 05.05.95 . EAR 17/82, Ac. TP 1554/88 DJ 16.12.88 . RE 105205-SP, 1aT STF Julgado em 04.09.87 . RE 101114-SP, 1ªT STF Julgado em 12.12.83 Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Francisco Fausto Decisão unânime Min. Manoel Mendes Decisão por maioria Red. Min. Ney Doyle Decisão por maioria Red. Min. Marco Aurélio Decisão por maioria Min, Sydney Sanches Decisão unânime Min. Rafael Mayer Decisão unânime 30. AÇÃO RESCISÓRIA. MULTA. ART. 920 DO CÓDIGO CIVIL. SÚMULA 83 DO TST. APLICÁVEL. Não se acolhe, por violação do art. 920 do Código Civil, pedido de rescisão de julgado que impôs condenação ao pagamento de multa, quando a decisão rescindenda for anterior à Orientação Jurisprudencial n° 54, da Seção de Dissídios Individuais do TST (30.05.94). Incidência da Súmula 83/TST. . ROAR 505212/98 Min. Ronaldo Leal DJ 09.06.00 Decisão unânime . AC 490768/98 Min. Moura França DJ 24.09.99 Decisão unânime . ROAR 165308/95, Ac. 3533/97 Min. Ronaldo Leal DJ 03.10.97 Decisão unânime . ROAR 239868/96, Ac. 1651/96 Min. Ronaldo Leal DJ 21.02.97 Decisão unânime 31. AÇÃO RESCISÓRIA. MULTA. VIOLAÇÃO DO ART. 920 DO CÓDIGO CIVIL. DECISÃO RESCINDENDA EM EXECUÇÃO. Não se acolhe, por violação do art. 920 do Código Civil, pedido de rescisão de julgado que, em execução, rejeita limitação da condenação ao pagamento de multa. Inexistência de violação literal. . ROAR 201002/95, Ac. 1896/97 Min. Luciano Castilho DJ 19.09.97 Decisão unânime . ROAR 139856/94, Ac. 1020/96 Min. Manoel Mendes Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 196 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 25.10.96 . ROAR 90532/93, Ac. 4213/95 DJ 10.11.95 Decisão unânime Juiz Conv. Euclides Rocha Decisão unânime 32. AÇÃO RESCISÓRIA. PETIÇÃO INICIAL. CAUSA DE PEDIR. AUSÊNCIA DE CAPITULAÇÃO, OU CAPITULAÇÃO ERRÔNEA NO ART. 485 DO CPC. PRINCÍPIO IURA NOVIT CURIA. Não padece de inépcia a petição inicial de ação rescisória apenas porque omite a subsunção do fundamento de rescindibilidade no art. 485 do CPC, ou o capitula erroneamente. Contanto que não se afaste dos fatos e fundamentos invocados como causa de pedir, ao Tribunal é licito emprestar-lhes a adequada qualificação jurídica (“iura novit curia”). .ROAR 316368/96 DJ 14.05.99 . ROAR 187626/95, Ac. 555/96 DJ 11.10.96 . ROAR 216888/95, Ac. 4490/97 DJ 28.11.97 . REsp. 7958-0,4aT STJ DJ 15.02.93 . REsp. 7154, 2ªT STJ DJ 03.06.91 Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Cnéa Moreira Decisão unânime Min. Manoel Mendes Decisão unânime Min. Sálvio de Figueiredo Decisão unânime Min. Ilmar Galvão Decisão unânime 33. AÇÃO RESCISÓRIA. PETIÇÃO INICIAL. VIOLAÇÃO LITERAL DE LEI. PRINCÍPIO IURA NOVIT CURIA. Fundando-se a ação rescisória no art. 485, inc. V, do CPC, é indispensável expressa indicação na petição inicial da ação rescisória do dispositivo legal violado, não se aplicando, no caso, o princípio “iura novit curia". .ROAR 404968/97 DJ 25.08.00 . ED-ROAR 468135/98 DJ 16.06.00 .RXOFROAR 576311/99 DJ 09.06.00 . RXOFAR 539179/99 DJ 02.06.00 . ROAR 615959/99 (despacho) DJ 03.05.00 .ROAR 400376/97 DJ 03.03.00 .ROAR 389794/97 DJ 26.11.99 .ROAR 295972/96 Red. Min. Francisco Fausto Decisão por maioria Min. Moura França Decisão unânime Min. Ives Gandra Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Barros Levenhagen Min. Ronaldo Leal Decisão unânime Red. Min. Luciano Castilho Decisão por maioria Min. Ronaldo Leal Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 197 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 04.12.98 . ROAR 239878/96, Ac. 3893/97 DJ 28.11.97 Decisão unânime Min. Vantuil Abdala Decisão unânime 34. AÇÃO RESCISÓRIA. PLANOS ECONÔMICOS. O acolhimento de pedido em ação rescisória de Plano Econômico, fundada no art. 485, inc. V, do CPC, pressupõe, necessariamente, expressa invocação na petição inicial de afronta ao art. 5°, inciso XXXVI, da Constituição Federal de 1988. A indicação de ofensa literal a preceito de lei ordinária atrai a incidência da Súmula 83 do TST e Súmula 343 do STF. . ROAR 541678/99 DJ 26.05.00 . RXOFROAR 581564/99 DJ 14.04.00 .ROAR 411359/97 DJ 14.04.00 . ROAG 424793/98 (despacho) DJ 13.04.00 . RXOFROAR 307829/96 DJ 30.10.98 . RXOFROAR 329124/96 DJ 23.10.98 Min. Ives Gandra Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Francisco Fausto Decisão unânime Min. Barros Levenhagen Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Moura França Decisão unânime 2. Se a decisão rescindenda é posterior à Súmula 315 do TST (Res. 07, DJ22.09.93), inaplicável a Súmula 83 do TST. . ROAR 410063/97 Min. Luciano Castilho DJ 05.02.99 Decisão unânime 35. AÇÃO RESCISÓRIA. PLANOS ECONÔMICOS. COISA JULGADA. LIMITAÇÃO À DATA BASE NA FASE DE EXECUÇÃO. Não ofende a coisa julgada a limitação à data base da categoria, na fase executória, da condenação ao pagamento de diferenças salariais decorrentes de planos econômicos, quando a decisão exeqüenda silenciar sobre a limitação, uma vez que a limitação decorre de norma cogente. Apenas quando a sentença exeqüenda houver expressamente afastado a limitação à data base é que poderá ocorrer ofensa à coisa julgada. . ROAR 607329/99 Julgado em 22.08.00 .ROAR 355049/97 DJ 10.12.99 . E-RR 195818/95, Ac. 2367/97 DJ 06.06.97 . E-RR 88034/93, Ac. 2308/96 DJ 14.11.96 Min. Ives Gandra Decisão unânime Red. Min. Ives Gandra Decisão por maioria Min. Vantuil Abdala Decisão unânime Min. Manoel Mendes Decisão unânime Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 198 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL 36. AÇÃO RESCISÓRIA. PREQUESTIONAMENTO. VIOLAÇÃO OCORRIDA NA PRÓPRIA DECISÃO RESCINDENDA. Não é absoluta a exigência de prequestionamento na ação rescisória: ainda que a ação rescisória tenha por fundamento violação de dispositivo legal, é prescindível o prequestionamento quando o vicio nasce no próprio julgamento, como se dá com a sentença “extra, citra e ultra-petita”. . AR 486245/98 Min. João O. Dalazen DJ 12.11.99 Decisão por maioria . AR 417543/98 Min. João O. Dalazen DJ 09.04.99 Decisão unânime . ROAR 56633/92, Ac. 1793/96 Min. Francisco Fausto DJ 07.03.97 Decisão unânime 37. AÇÃO RESCISÓRIA. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. SÚMULA 83 DO TST E SÚMULA 343 DO STF. INAPLICÁVEIS. No julgamento de ação rescisória fundada no art. 485, inc. V, do CPC, não se aplica o óbice das súmulas 83 do TST e 343 do STF quando se tratar de prazo prescricional com assento constitucional. . ROAR 472589/98 Min. Ronaldo Leal DJ 23.04.99 Decisão unânime . ROAR 239815/96,Ac.3571/97 Min. João O. Dalazen DJ 10.10.97 Decisão unânime . ROAR 60959/92, Ac.0416/95 Red. Min. Ney Doyle DJ 05.05.95 Decisão por maioria . ROAR 55094/92, Ac.0155/95 Min. Vantuil Abdala DJ 30.06.95 Decisão por maioria . ROAR 68380/93, Ac. 267/94 Red. Min. Guimarães Falcão DJ 06.05.94 Decisão por maioria 38. AÇÃO RESCISÓRIA. PROFESSOR-ADJUNTO. INGRESSO NO CARGO DE PROFESSOR-TITULAR. EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO. (LEI 7.596/87, DECRETO 94.664/87 E ART. 206, V, CF/88). A assunção do professor adjunto ao cargo de professor titular de universidade pública, sem prévia aprovação em concurso público, viola o art. 206, inc. V, da Constituição Federal. Procedência do pedido de rescisão do julgado. . ROAR 58620/92, Ac. 0836/97 Red. Min. José L. Vasconcellos DJ 09.05.97 Decisão por maioria . ROAR 144183/94, Ac. 1377/96 Min. Manoel Mendes DJ 13.12.96 Decisão unânime . ROAR 58621/92, Ac. 1922/95 Min. Vantuil Abdala DJ 04.08.95 Decisão unânime . ROAR 76038/93, Ac. 4442/94 Min. Ney Doyle Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 199 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 09.12.94 Decisão unânime 39. AÇÃO RESCISÓRIA. REAJUSTES BIMESTRAIS E QUADRIMESTRAIS. LEI 8.222/91. SÚMULA 83 DO TST. APLICÁVEL. Havendo controvérsia jurisprudencial à época, não se rescinde decisão que aprecia a possibilidade de cumulação das antecipações bimestrais e reajustes quadrimestrais de salário previstos na Lei 8222/91. Incidência da Súmula 83 do TST. . ROAR 284860/96 DJ 14.08.98 . ROAR 258356/96, Ac. 4390/97 DJ 30.04.98 . ROAR 337505/97, Ac. 4817/97 DJ 28.11.97 . ROAR 253380/96, Ac. 4208/97 DJ 17.10.97 . ROAR 153694/94, Ac. 0016/97 DJ 14.03.97 Min. Luciano Castilho Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Manoel Mendes Decisão unânime Min. Luciano Castilho Decisão unânime Min. Manoel Mendes Decisão unânime 40. AÇÃO RESCISÓRIA. REAJUSTES SALARIAIS PREVISTOS EM NORMA COLETIVA. PREVALÊNCIA DA LEGISLAÇÃO DE POLÍTICA SALARIAL QUANDO A NORMA COLETIVA É ANTERIOR À LEI. Os reajustes salariais previstos em norma coletiva de trabalho não prevalecem frente à legislação superveniente de política salarial. . ROAR 555970/99 DJ 26.05.00 . ROAR 390765/97 DJ 17.03.00 . ROAR 218777/95 DJ 15.05.98 . ROAR 201018/95, Ac. 3937/97 DJ 10.10.97 . AR 196931/95, Ac. 1303/97 DJ 13.06.97 . AR 284283/96, Ac. 1139/97 DJ 16.05.97 . AGAI 164688-9-RS, 2aT STF DJ 30.08.96 Min. Ronaldo Leal Decisão unânime Min, João O. Dalazen Decisão unânime Min, João O. Dalazen Decisão unânime Min. Luciano Castilho Decisão por maioria Min. Vantuil Abdala Decisão unânime Min. Moura França Decisão unânime Min. Maurício Corrêa Decisão unânime 41. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA CITRA PETITA. CABIMENTO. Revelando-se a sentença “citra petita”, o vicio processual vulnera os arts. 128 e 460 do CPC, tornando-a passível de desconstituição, ainda que não opostos Embargos Declaratórios. . ROAR 364785/97 Juiz Conv. Mauro César M. de Souza Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 200 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 17.12.99 Decisão unânime . AR 486245/98 Min. João O. Dalazen DJ 12.11.99 Decisão por maioria . ROAR 318094/96 Min. João O. Dalazen DJ 14.05.99 Decisão unânime 42. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE MÉRITO. COMPETÊNCIA DO TST. ACÓRDÃO RESCINDENDO DO TST. NÃO CONHECIMENTO DE RECURSO. ENUNCIADO 192. NÃO APLICAÇÃO. Acórdão rescindendo do TST que não conhece de recurso de Embargos ou de Revista, seja examinando a argüição de violação de dispositivo de lei, seja decidindo de acordo com Súmula de direito material ou em consonância com iterativa, notória e atual jurisprudência de direito material da SDI (Súmula 333) examina o mérito da causa, comportando ação rescisória da competência do Tribunal Superior do Trabalho. . AR 269369/96, Ac. 4047/97 Red. Min. Luciano Castilho DJ 24.10.97 Decisão por maioria . AR 215752/95, Ac. 1505/97 Min. Ronaldo Leal DJ 29.08.97 Decisão unânime . AR 142914/94, Ac. 1218/96 Min. Vantuil Abdala DJ 21.02.97 Decisão unânime . AR 99991/93, Ac. 4324/95 Red. Min. Francisco Fausto DJ 16.02.96 Decisão por maioria . AR 1313-1 -PI, Pleno STF Min. Marco Aurélio DJ 14.02.92 Decisão unânime 43. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE MÉRITO. DECISÃO DE TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO EM AGRAVO REGIMENTAL CONFIRMANDO DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR QUE, APLICANDO A SÚMULA 83 DO TST, INDEFERIU A PETIÇÃO INICIAL DA AÇÃO RESCISÓRIA. CABIMENTO. Se a decisão recorrida, em agravo regimental, aprecia a matéria na fundamentação, sob o enfoque das Súmulas 83 do TST e 343 do STF, constitui sentença de mérito ainda que haja resultado no indeferimento da petição inicial e na extinção do processo, " sem julgamento do mérito Sujeita-se, assim, à reforma pelo TST a decisão do Tribunal que, invocando controvérsia na interpretação da lei, indefere a petição inicial de ação rescisória. . ROAG 293320/96 Min. Regina Rezende DJ 09.10.98 Decisão unânime . ROAG 176910/95, Ac. 1414/96 Min. Manoel Mendes DJ 13.12.96 Decisão unânime . ROAG 180727/95, Ac. 1317/96 Min. Vantuil Abdala DJ 29.11.96 Decisão unânime Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 201 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL 44. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE MÉRITO. DECISÃO HOMOLOGATÓRIA DE ADJUDICAÇÃO. INCABÍVEL. Incabível ação rescisória para impugnar decisão homologatória de adjudicação. . ROAR 256058/96, Ac. 4386/97 DJ 28.11.97 . ROAR 905/89, Ac. 0366/91 DJ 10.05.91 . ROAR 147/89, Ac. 3619/89 DJ 02.02.90 . RE 95513-MS, 1aT STF DJ 12.04.85 Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. Almir Pazzianotto Decisão unânime Min. Barata Silva Decisão unânime Min. Sydney Sanches Decisão unânime 45. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE MÉRITO. DECISÃO HOMOLOGATÓRIA DE ARREMATAÇÃO. INCABÍVEL. Incabível ação rescisória para impugnar decisão homologatória de arrematação. . ROAR 70553/93, Ac. 3548/96 DJ 09.08.96 . ROAR 13342/90, Ac. 0231/92 DJ 08.05.92 . ROAR 0320/89, Ac. 0199/90 DJ 06.07.90 . ROAR 0789/86, Ac. 4988/89 DJ 22.06.90 . RE 87651-RS,1a T STF DJ 01.06.84 Min. José L. Vasconcellos Decisão por maioria Min. Hélio Regato Decisão unânime Min. Barata Silva Decisão unânime Min. Norberto S. de Souza Decisão unânime Min. Néri da Silveira Decisão unânime 46. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE MÉRITO. QUESTÃO PROCESSUAL. Pode uma questão processual ser objeto de rescisão desde que consista em pressuposto de validade de uma sentença de mérito. . AR 240396/96, Ac. 1332/97 DJ 01.08.97 . ROAR 74395/93, Ac. 4456/94 DJ 03.02.95 .AR 1315-8, Pleno STF DJ 05.10.90 . AR 551-SP, 2ª Seção STJ DJ 07.02.85 Min. Vantuil Abdala Decisão unânime Min. Ney Doyle Decisão unânime Min. Octávio Gallotti Decisão unânime Min. Pedro Acioli Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 202 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL 47. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE MÉRITO. VIOLAÇÃO DO ART. 896, A, DA CLT. Incabível ação rescisória, por violação do art. 896, " a ”, da CLT, contra decisão que não conhece de recurso de revista, com base em divergência jurisprudencial, pois não se cuida de sentença de mérito (art. 485 do CPC). . EAR 09/88, Ac. 4811/94 Red. Min. Francisco Fausto DJ 16.12.94 Decisão por maioria . AR 64765/92, Ac. 2280/94 Min. Vantuil Abdala DJ 19.08.94 Decisão unânime . AR 24/84, Ac. TP 2657/86 Min. Coqueijo Costa DJ 19.12.86 Decisão por maioria . AR 18/82, Ac. 1501/84 Red. Min. Marco Aurélio DJ 31.10.84 Decisão por maioria 48. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA E ACÓRDÃO. SUBSTITUIÇÃO. Em face do disposto no art. 512 do CPC, é juridicamente impossível o pedido explícito de desconstituição de sentença quando substituída por acórdão regional. RXOFROAR 545306/99 Min. Francisco Fausto DJ 04.08.00 Decisão unânime ROAR 542810/99 Min. Luciano Castilho DJ 23.06.00 Decisão unânime ROAR 486103/98 Min. João O. Dalazen DJ 23.06.00 Decisão unânime ROAR 564596/99 Min. Ives Gandra DJ 16.06.00 Decisão unânime ROAR 559613/99 Min. Ronaldo Leal DJ 05.05.00 Decisão unânime ROAG 450410/98 (despacho) Min. Barros Levenhagen DJ 18.04.00 RXOFROAR 356399/97 Min. Francisco Fausto DJ 17.12.99 Decisão unânime ROAR 346967/97 Min. João O. Dalazen DJ 09.04.99 Decisão por maioria 49. MANDADO DE SEGURANÇA. AÇÃO DE CUMPRIMENTO FUNDADA EM DECISÃO NORMATIVA QUE SOFREU POSTERIOR REFORMA, QUANDO JÁ TRANSITADA EM JULGADO A SENTENÇA CONDENATÓRIA PROFERIDA NA AÇÃO DE CUMPRIMENTO. É cabível o mandado de segurança para extinguir a execução fundada em sentença proferida em ação de cumprimento, quando excluída da sentença normativa a cláusula que lhe serviu de sustentáculo. . ROMS 184658/95, Ac. 1167/97 Red. Min. Ronaldo Leal DJ 14.11.97 Decisão por maioria Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 203 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL . ROMS 182198/95, Ac. 541/96 DJ 11.10.96 . ROMS 147402/94, Ac. 4849/95 DJ 15.12.95 Min. Cnéa Moreira Decisão unânime Juiz Conv. Euclides Rocha Decisão por maioria 50. MANDADO DE SEGURANÇA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. CABIMENTO. A tutela antecipada concedida antes da prolação da sentença é impugnável mediante mandado de segurança, por não comportar recurso próprio. . ROMS 581592/99 DJ 26.05.00 . ROMS 527668/99 (despacho) DJ 11.05.00 . ROAG 365178/97 DJ 03.03.00 . ROMS 312172/96 DJ 18.12.98 . ROMS 329121/96 DJ 23.10.98 . ROMS 268677/96, Ac. 4121/97 DJ 05.12.97 Min. Barros Levenhagen Decisão unânime Min. Barros Levenhagen Min. Luciano Castilho Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão por maioria Min. Luciano Castilho Decisão unânime Red. Min. Luciano Castilho Decisão por maioria 51. MANDADO DE SEGURANÇA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA EM SENTENÇA. REINTEGRAÇÃO. NÃO CABIMENTO. A antecipação da tutela conferida na sentença não comporta impugnação pela via do mandado de segurança, por ser impugnável mediante recurso ordinário. A ação cautelar é o meio próprio para se obter efeito suspensivo a recurso. . ROAG 525170/98 DJ 19.05.00 . ROMS 413606/97 DJ 12.05.00 .ROMS 416417/98 DJ 28.04.00 . ROMS 456910/98 DJ 31.03.00 . ROMS 432339/98 DJ 28.05.99 . ROMS 357739/97 DJ 14.05.99 . ROMS 347262/97 DJ 05.03.99 Min. Luciano Castilho Decisão unânime Min. Francisco Fausto Decisão unânime Min. Francisco Fausto Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão por maioria Red. Min. João O. Dalazen Decisão por maioria Min. Moura França Decisão unânime Min. Luciano Castilho Decisão unânime Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 204 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL 52. MANDADO DE SEGURANÇA. ART. 284, CPC. APLICABILIDADE. Exigindo o mandado de segurança prova documental pré-constituída, inaplicável se torna o art. 284 do CPC quando verificada na petição inicial do " mandamus” a ausência de documento indispensável ou sua autenticação. . ROAG 287699/96, Ac. 4539/97 Min. Lourenço Prado DJ 15.05.98 Decisão unânime . ROMS 144213/94, Ac. 1362/97 Min. Francisco Fausto DJ 28.11.97 Decisão unânime . ROMS 144237/94, Ac. 1589/96 Min. Francisco Fausto DJ 07.03.97 Decisão unânime 53. MANDADO DE SEGURANÇA. COOPERATIVA EM LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL. LEI 5.764/71, ART. 76. INAPLICÁVEL. NÃO SUSPENDE A EXECUÇÃO. A liquidação extrajudicial de sociedade cooperativa não suspende a execução dos créditos trabalhistas existentes contra ela. . ROMS 215137/95, Ac. 1008/97 Min. João O. Dalazen DJ 09.05.97 Decisão unânime . ROMS 201885/95, Ac. 1758/96 Min. Vantuil Abdala DJ 14.03.97 Decisão por maioria . ROMS 201886/95, Ac. 665/96 Min. Luciano Castilho DJ 08.11.96 Decisão unânime . ROMS 199356/95, Ac. 135/96 Min. Luciano Castilho DJ 13.09.96 Decisão unânime 54. MANDADO DE SEGURANÇA. EMBARGOS DE TERCEIROS. CUMULAÇÃO. INVIABILIDADE. Ajuizados embargos de terceiros (art. 1046 do CPC) para pleitear a desconstituição da penhora, inviável a interposição de mandado de segurança com a mesma finalidade. . ROMS 359855/97 Min. Moura França DJ 26.11.99 Decisão unânime . ROMS 355737/97 Min. Moura França DJ 13.11.98 Decisão unânime 55. MANDADO DE SEGURANÇA. EXECUÇÃO. LEI 8.432/92. ART. 897, § 1º, DA CLT. CABIMENTO. Devendo o agravo de petição delimitar justificadamente a matéria e os valores objeto de discordância, não fere direito liquido e certo o prosseguimento da execução quanto aos tópicos e valores não especificados no agravo. . ROMS 382059/97 Min. Moura França DJ 13.11.98 Decisão unânime . ROMS 263724/96, Ac. 3484/97 Min. João O. Dalazen Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 205 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 17.10.97 Decisão unânime . ROMS 141001/94, Ac. 4149/95 Min. Indalécio Gomes DJ 17.11.95 Decisão unânime . ROMS 110063/94, Ac. 4212/95 Juiz Conv. Euclides Rocha DJ 10.11.95 Decisão unânime 56. MANDADO DE SEGURANÇA. EXECUÇÃO. PENDÊNCIA DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Não há direito líquido e certo à execução definitiva na pendência de recurso extraordinário, ou de agravo de instrumento visando a destrancá-lo. . ROMS 180738/95, Ac. 3996/97 Min. João O. Dalazen DJ 03.04.98 Decisão unânime . RXOF 153655/94, Ac. 837/96 Min. Manoel Mendes DJ 18.10.96 Decisão unânime . ROMS 18527/90, Ac. 1420/92 Red. Min. Orlando T. Costa DJ 26.06.92 Decisão por maioria 57. MANDADO DE SEGURANÇA. INSS. TEMPO DE SERVIÇO. AVERBAÇÃO E/OU RECONHECIMENTO. Conceder-se-á Mandado de Segurança para impugnar ato que determina ao INSS o reconhecimento e/ou averbação de tempo de serviço. . RXOFROMS 566914/99 Juiz Conv. Márcio R. do Valle Julgado em 22.08.00 Decisão unânime . RXOFROMS 556922/99 Min. Ives Gandra DJ 25.08.00 Decisão unânime . RXOFROMS 576894/99 Min. Barros Levenhagen DJ 17.03.00 Decisão unânime 58. MANDADO DE SEGURANÇA PARA CASSAR LIMINAR CONCEDIDA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CABÍVEL. É cabível o mandado de segurança visando a cassar liminar concedida em ação civil pública. . ROMS 589373/99 Min. Barros Levenhagen DJ 12.05.00 Decisão por maioria . ROMS 437516/98 Min. Moura França DJ 27.11.98 Decisão unânime . ROMS 298607/96 Min. Luciano Castilho DJ 14.08.98 Decisão unânime . ROMS 104973/94 Min. José L. Vasconcellos DJ 17.11.95 Decisão unânime Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 206 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL 59. MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA. CARTA DE FIANÇA BANCÁRIA. A carta de fiança bancária equivale a dinheiro para efeito da gradação dos bens penhoráveis, estabelecida no art. 655 do CPC. . ROMS 471744/98 (despacho) Min. Barros Levenhagen DJ 05.06.00 . ROMS 584245/99 (despacho) Min. Barros Levenhagen DJ 15.05.00 . RXOF 110325/94, Ac. 952/96 Min. Regina Rezende DJ 03.05.96 Decisão unânime . RXOF 16713 6/95, Ac. 845/96 Min. Leonaldo Silva DJ 18.10.96 Decisão unânime . RXOF 43937/92, Ac. 2295/94 Min. Geraldo Vianna DJ 16.09.94 Decisão unânime 60. MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA EM DINHEIRO. BANCO. Não fere direito liquido e certo do impetrante o ato judicial que determina penhora em dinheiro de banco, em execução definitiva, para garantir crédito exeqüendo, uma vez que obedece à gradação prevista no art. 655 do CPC. . ROAG 574989/99 Min. João O. Dalazen DJ 09.06.00 Decisão unânime . ROMS 478158/98 Min. Ives Gandra DJ 09.06.00 Decisão unânime .ROMS 471779/98 Min. João O. Dalazen DJ 14.04.00 Decisão unânime . ROMS 317032/96 Min. Luciano Castilho DJ 14.08.98 Decisão unânime 61. MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA EM DINHEIRO. EXECUÇÃO DEFINITIVA. DEPÓSITO EM BANCO OFICIAL NO ESTADO. ARTIGOS 612 E 666 DO CPC. Havendo discordância do credor, em execução definitiva, não tem o executado direito líquido e certo a que os valores penhorados em dinheiro fiquem depositados no próprio banco, ainda que atenda aos requisitos do art. 666,I, do CPC. . ROMS 478020/98 Min. Barros Levenhagen DJ 23.06.00 Decisão unânime . RXOFROMS 348209/97 Red. Min. Ronaldo Leal DJ 03.09.99 Decisão por maioria . ROMS 359852/97 Min. Moura França DJ 13.08.99 Decisão unânime . ROMS 329139/96 Min. João O. Dalazen DJ 28.05.99 Decisão unânime . ROMS 74864/93 Min. José L. Vasconcellos Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 207 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 03.11.95 Decisão por maioria 62. MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA EM DINHEIRO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. Em se tratando de execução provisória, fere direito líquido e certo do impetrante a determinação de penhora em dinheiro, quando nomeados outros bens à penhora, pois o executado tem direito a que a execução se processe da forma que lhe seja menos gravosa, nos termos do art. 620 do CPC. . ROMS 648899/00 Julgado em 08.08.00 . ROMS 431362/98 DJ 16.06.00 . ROMS 614680/99 (despacho) DJ 25.05.00 . ROMS 399042/97 DJ 10.12.99 . ROMS 328694/96 DJ 03.09.99 . ROMS 105612/94, Ac. 4652/95 DJ 07.12.95 Juiz Conv. Márcio R. do Valle Decisão unânime Red. Min. João O. Dalazen Decisão por maioria Min. Barros Levenhagen Juiz Conv. Márcio Rabelo Decisão unânime Red. Min. João O. Dalazen Decisão por maioria Min. Vantuil Abdala Decisão por maioria 63. MANDADO DE SEGURANÇA. REINTEGRAÇÃO. AÇÃO CAUTELAR. Comporta a impetração de mandado de segurança o deferimento de reintegração no emprego em ação cautelar. . ROMS 344248/97 DJ 12.02.99 . ROMS 298642/96 DJ 15.05.98 . ROMS 266712/96 DJ 27.03.98 . ROMS 204696/95 DJ 05.09.97 Red. Min. Regina Rezende Decisão por maioria Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão unânime Min. João O. Dalazen Decisão por maioria 64. MANDADO DE SEGURANÇA. REINTEGRAÇÃO LIMINARMENTE CONCEDIDA. Não fere direito líquido e certo a concessão de tutela antecipada para reintegração de empregado protegido por estabilidade provisória decorrente de lei ou norma coletiva. . ROMS 421536/98 Min. João O. Dalazen DJ 07.04.00 Decisão unânime . ROMS 458240/98 Min. João O. Dalazen DJ 07.04.00 Decisão unânime . ROMS 387579/97 Min. João O. Dalazen Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 208 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 28.05.99 Decisão unânime . ROMS 390696/97 Min. Moura França DJ 20.11.98 Decisão unânime 65. MANDADO DE SEGURANÇA. REINTEGRAÇÃO LIMINARMENTE CONCEDIDA. DIRIGENTE SINDICAL. Ressalvada a hipótese do art. 494 da CLT, não fere direito liquido e certo a determinação liminar de reintegração no emprego de dirigente sindical, em face da previsão do inciso X do art. 659 da CLT. ROMS 544165/99 (despacho) Min. Barros Levenhagen DJ 28.06.00 ROMS 413515/97 Min. Francisco Fausto DJ 12.05.00 Decisão unânime ROMS 365589/97 Min. Luciano Castilho DJ 23.04.99 Decisão unânime ROMS 414613/97 Min. João O. Dalazen DJ 31.03.00 Decisão unânime ROMS 302950/96, Ac. 5154/97 Min. Manoel Mendes DJ 06.02.98 Decisão unânime ROMS 180737/95, Ac. 3537/97 Min. Ronaldo Leal DJ 31.10.97 Decisão unânime ROMS 172525/95, Ac. 1070/97 Min. Francisco Fausto DJ 23.05.97 Decisão unânime 66. MANDADO DE SEGURANÇA. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ADJUDICAÇÃO. INCABÍVEL. É incabível o mandado de segurança contra sentença homologatória de adjudicação, uma vez que existe meio próprio para impugnar o ato judicial, consistente nos embargos à adjudicação (CPC, art. 746). . ROMS 986/89, Ac. 1426/90 Min. Ursulino Santos DJ 12.04.91 Decisão unânime . ROMS 198/87, Ac. TP 0912/89 Min. José Ajuricaba DJ 04.08.89 Decisão unânime . ROMS 426/81, Ac. TP 2759/81 Juiz Conv. Reginaldo Medeiros DJ 05.02.82 Decisão unânime 67. MANDADO DE SEGURANÇA. TRANSFERÊNCIA. ART. 659, IX, DA CLT. Não fere direito liquido e certo a concessão de liminar obstativa de transferência de empregado, em face da previsão do inciso IX do art. 659 da CLT. . ROMS 390692/97 Min. Moura França DJ 24.09.99 Decisão unânime . ROMC 298608/96, Ac. 1442/96 Min. Manoel Mendes Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 209 ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DJ 22.11.96 Decisão unânime . ROMS 111054/94, Ac. 939/95 Min. Guimarães Falcão DJ 09.06.95 Decisão unânime 68. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. COMPETÊNCIA. Na Junta de Conciliação e Julgamento, a tutela antecipatória de mérito postulada, inclusive nas hipóteses previstas nos incisos IX e X do art. 659 da CLT, deve ser prontamente submetida e decidida pelo Juiz Presidente. Nos Tribunais, compete ao Relator decidir sobre o pedido de antecipação de tutela, submetendo sua decisão ao Colegiado respectivo, independentemente de pauta, na sessão imediatamente subseqüente. . ROAG 421537/98 Min. Ives Gandra DJ 04.08.00 Decisão unânime . ROMS 417142/98 Min. Moura França DJ 19.03.99 Decisão unânime 69. FUNGIBILIDADE RECURSAL. INDEFERIMENTO LIMINAR DE AÇÃO RESCISÓRIA OU MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO PARA O TST. RECEBIMENTO COMO AGRAVO REGIMENTAL E DEVOLUÇÃO DOS AUTOS AO TRT. Recurso ordinário interposto contra despacho monocrático indeferitório da petição inicial de ação rescisória ou de mandado de segurança pode, pelo principio de fungibilidade recursal, ser recebido como agravo regimental. Hipótese de não conhecimento do recurso pelo TST e devolução dos autos ao TRT, para que aprecie o apelo como agravo regimental. . ROMS 596678/99 Juiz Conv. Márcio R. do Valle Julgado em 15.08.00 Decisão unânime . RO AR 349721/97 Min. Francisco Fausto DJ 01.09.00 Decisão unânime . ROAR 393612/97 Min. Ives Gandra DJ 04.08.00 Decisão unânime . AIRO 479642/98 Min. Ives Gandra DJ 16.06.00 Decisão unânime . RO AC 564618/99 (despacho) Min. Barros Levenhagen DJ 01.06.00 . RXOFROAR 445149/98 Min. Barros Levenhagen DJ 18.02.00 Decisão unânime . ROAR 325457/96 Min. Moura França DJ 13.08.99 Decisão unânime Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 210 POSSE DA NOVA ADMINISTRAÇÃO Realizou-se no dia 1° de agosto de 2000 a posse da nova Administração do Tribunal Superior do Trabalho para o biênio 2000-2002. A sessão solene, realizada no saguão do edifício sede do Tribunal devido ao grande número de convidados, foi aberta pelo Excelentíssimo Senhor Ministro Wagner Pimenta, que deu posse ao Excelentíssimo Senhor Ministro Almir Pazzianotto e passou-lhe a presidência da sessão. Tomaram posse também o Excelentíssimo Senhor Ministro Ursulino Santos Filho, no cargo de Vice-Presidente, e o Excelentíssimo Senhor Ministro José Luiz Vasconcellos, no cargo de Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho. A cerimônia de posse contou com a presença de insignes autoridades representantes do três Poderes da República, advogados, líderes sindicais, empresários e outras personalidades. O novo presidente do TST, ministro Almir Pazzianotto, foi saudado, em nome dos trabalhadores, pelo presidente da Força Sindical e do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, Sr. Paulo Pereira da Silva, e, em nome dos empregadores, pelo presidente da Confederação Nacional da Indústria, deputado Carlos Eduardo Moreira Ferreira; a advogada Maria Cristina Irigoyen Peduzzi falou pela Ordem dos Advogados do Brasil; falou pelo Ministério Público do Trabalho o procurador-geral Guilherme Mastrichi Basso; o ministro Wagner Pimenta fez breve relato sobre a sua administração no biênio 1998-2000; o ministro João Oreste Dalazen falou em nome dos ministros do TST; por último discursou o ministro Almir Pazzianotto. DISCURSO DO EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO WAGNER PIMENTA Dois termos de sentidos antagônicos - luta e paz -, caracterizaram nosso período na Presidência do TST. No discurso de posse, dissemos: “Maior do que as crises são nossas esperanças e o entusiasmo para a luta”. Era a antevisão do que depois aconteceria. E assinalamos: “É, também, o momento de reforçar a coesão de todos os órgãos que compõem a Justiça do Trabalho”. A luta. Logo depois, começou uma campanha contra o Judiciário Trabalhista, até com propostas de sua extinção ou fusão à Justiça Federal. Partimos para ampla campanha de esclarecimentos. Nada ficou sem resposta ou adoção de providências. Lutamos no campo das idéias. Modificamos concepções que considerávamos impróprias pela argumentação oportuna e fundamentada, sem atacar ou ferir pessoas. Não entramos em escaramuças sem significado nem grandeza para quem pensa no Brasil. Assim se faz na democracia. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 213 NOTAS E COMENTÁRIOS No auge da crise, em sessão pública neste Tribunal, afirmamos que queríamos respeito e cooperação, que necessitávamos de boas leis, e pedimos que os ataques fossem substituídos pela cooperação patriótica. O protesto foi ouvido em todos os rincões do País. Convidados pela Câmara dos Deputados, ali fizemos exposição sobre o que era a Justiça do Trabalho, suas atribuições e importância para o povo, as necessidades de reformas e sugerimos como poderiam ser feitas. Elaboramos informações aos congressistas, em forma sucinta, às vezes levadas de porta a porta, com rápidas conversas. Da mesma forma agimos quanto à mídia. Palestras foram feitas - e muitas! -, em numerosas cidades brasileiras. O quadro, a princípio desfavorável, foi-se modificando. Na Comissão de Reforma do Judiciário, a maioria de nossas propostas foi aceita, e decidiram aumentar as atribuições da Justiça do Trabalho. Com a Emenda Constitucional 24, o número de Ministros desta Corte fora reduzido a 17. Nossa reivindicação de que voltasse a 27 foi aprovada pela Câmara dos Deputados. O resultado da votação traduziu-se em esplêndida vitória: 401 votantes e 398 votos favoráveis ao TST. Duas leis importantes - a do Rito Sumaríssimo e a das Comissões de Conciliação Prévia -, cujos anteprojetos aqui nasceram, foram sancionadas pelo Excelentíssimo Senhor Presidente da República, que nos convidou a fazer pronunciamento na respectiva solenidade, prestigiando este Tribunal. Considerando as atribuições hoje desempenhadas por esta Justiça e as outras que virão e o grande número de processos a julgar, ela necessita desesperadamente de reforço. Por isso remetemos ao Congresso Nacional o Plano Nacional de Criação de Varas do Trabalho, criterioso, econômico e tecnicamente fundamentado, buscando estender sobre maior parte da população o manto da Justiça, cumprindo mandamento constitucional. Pelo mesmo motivo, providenciamos a recuperação do número de juízes dos Tribunais Regionais, também diminuído pela Emenda Constitucional 24, seguindo-se o critério de necessidade e na forma determinada pela Constituição Federal. Buscamos destruir o mito da “Justiça lenta”. Por acaso é lento o TST, que julgou 112 mil processos em 1998 e mais de 121 mil em 1999, batendo recordes sucessivos? Esta Justiça trabalha com rapidez e denodo, constantemente com sacrifício. Se alguns processos - e talvez seja a exceção que leva ao mito -, demoram a chegar à decisão final e irrecorrível, é em conseqüência do amaranhado processual, e não da lentidão do trabalho. É preciso que a legislação processual seja aprimorada, e isso ainda nem se começou a fazer. Outro aspecto é imperioso esclarecer. Por engano, cobram do TST providências que a lei não lhe atribui e, por isso, ele não pode tomar. O fato ocorre, por exemplo, com relação ao rumoroso caso da construção do prédio do TRT de São Paulo. Se anomalias ocorreram, o TST não é por elas responsável ou co-responsável. Nem é fiscal de Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 214 NOTAS E COMENTÁRIOS obras. Os Tribunais Regionais têm independência administrativa e financeira consagrada na Constituição (art. 99). Respeitamos a palavra dada, cumprimos as promessas da posse e não aderimos à facção dos que perdem a guerra sem ao menos mostrarem a cara na primeira batalha. O Tempo se transformou em História. A paz. A paz pode depender da luta. A paz que hoje temos não é a dos campos cinzentos depois de cessar a refrega. Temos a paz do sucesso obtido e da dignidade mantida, a paz iluminada e florida de esperanças. A paz de tribunais coesos, falando no mesmo tom de brasilidade, irmanados em propósitos, crentes na grandeza do destino, porque a utopia é uma realidade em potencial. A paz de servidores eficientes e tranqüilamente ajustados a suas funções, pelo respeito e gratidão que receberam. Temos, em paz, uma Justiça vitoriosa. Que tudo assim continue é o que desejamos! Aos nossos sucessores, magistrados de competência, coragem e espírito de humanidade e justiça, os votos de que a força e a presença inspiradora de Deus, que jamais nos faltaram, com eles sempre esteja. De tudo podemos fazer um resumo. O único orador eficiente é o sucesso. Se fomos bem sucedidos, nada a dizer. Se fracassamos, só nos resta pedir perdão. Obrigado. DISCURSO DO EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO JOÃO ORESTE DALAZEN Exmo. Senhor Ministro ALMIR PAZZIANOTTO PINTO, DD. Presidente do egrégio Tribunal Superior do Trabalho; Exmo. Senhor Vice-Presidente da República, Doutor MARCO MACIEL, na pessoa de quem saudamos e homenageamos as demais autoridades presentes e já nominadas; Senhores juízes, advogados, parlamentares e membros do Ministério Público Senhores Ministros deste egrégio Tribunal; Senhoras e Senhores, O Tribunal Superior do Trabalho, nesta sessão solene, ao renovar e empossar sua cúpula diretiva para o próximo biênio, dá cumprimento à disposição constitucional que lhe assegura independência e autogoverno. É um momento grandioso do Tribunal porque, uma vez mais, em acatamento à lei, há alternância no exercício do poder e, além disso, observa-se a praxe consagrada de convocar os membros mais antigos da Corte para o exercício de cargos de direção. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 215 NOTAS E COMENTÁRIOS Praxe, aliás, benfazeja, que sempre se há de exaltar, porquanto inequivocamente concorre para que se estreitem e solidifiquem-se os laços de afeto e de solidariedade que unem os componentes do Tribunal. A generosidade de meus pares reservou-me a ventura e a honra de dirigir-lhes a palavra, nesta ocasião. Por imperativo de justiça e porque, como já se disse, “a gratidão é a memória do coração” (MASSIEU), saúdo inicialmente o eminente Ministro WAGNER ANTÔNIO PIMENTA, que vem de transmitir o cargo para cujo enobrecimento contribuiu sobremaneira. Todos neste Tribunal sempre admiramos em WAGNER PIMENTA o homem de afabilidade e lhaneza, de cortesia natural e espontânea, o protótipo do mito brasileiro do homem cordial de que nos fala SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA, Ignorávamos, todavia, que essa cordialidade era complementada por inabalável firmeza e perseverança incansável na defesa da Justiça do Trabalho. Escreveu HONORÉ DE BALZAC que não existem “grandes talentos sem uma grande vontade. Estas duas forças gêmeas são necessárias para a construção do edifício imenso de uma glória”. O Senhor Ministro WAGNER PIMENTA soube aliar talento, humildade e habilidade a uma vontade férrea em favor da Instituição, enfrentando, com denodo e galhardia, os maiores desafios da história da Justiça do Trabalho. Quando, em tempos recentes, na ofensiva descomunal desferida contra a Justiça do Trabalho, muitos ameaçavam capitular antes mesmo de haver a luta começado, WAGNER PIMENTA, confiante e arrojado, soube expor mansa e claramente a verdade sobre a Instituição, até porque, na lição de CHARLES DICKENS, “não há nada tão forte nem tão seguro numa emergência como a simples verdade”. E a verdade sobre a Justiça do Trabalho aflorou mercê da capacidade de persuasão e da determinação sem desfalecimentos de WAGNER PIMENTA. Sua Excelência demonstrou a todos, então, com precisão, rapidez e apuro, o transcendental papel político e social da Justiça do Trabalho, único segmento do Poder Judiciário que conseguiu levar o direito às classes populares. Mais ainda: não se colocou como um deus olímpico a ditar o rumo e a salvação. Ao revés, mobilizou toda a Instituição e expressivos segmentos da sociedade para desfraldar essa bandeira. Igualmente na dramática e histórica luta pela extinção da representação classista, Sua Excelência não se atemorizou nem esmoreceu diante do desafio ao mesmo tempo delicado e gigantesco. Ao contrário, embora arrostando os transes da hercúlea tarefa, também nesse episódio revelou a serena bravura dos fortes: liderou a Justiça do Trabalho e galvanizou a opinião pública para a boa causa. Enfim, uma vez mais, agiu como o maestro da orquestra, que com sua firme batuta conduz os intérpretes à execução dos elementos fundamentais da música: o ritmo, a melodia, o timbre e a harmonia. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 216 NOTAS E COMENTÁRIOS Mas o Ministro WAGNER PIMENTA não foi apenas um lutador: foi capaz também de “sonhar sem fazer do sonho seu senhor”, no dizer do poeta. A um tempo em que ninguém vislumbrava a viabilidade política de restabelecer-se a composição de 27 Ministros para o Tribunal Superior do Trabalho, eis que Sua Excelência logra convencer expressiva maioria da Câmara dos Deputados a empalmar essa medida, de resto inafastável. Por isso e muito mais que relatórios e estatísticas evidenciam, o Ministro WAGNER ANTÔNIO PIMENTA realizou fecunda administração, despida da glória pessoal e marcada por inexcedível desprendimento. Lega-nos, sobretudo, exemplo dignificante de sacrifício, de grandeza, de desvelada dedicação e obstinado empenho e, por que não dizer, de amor à Instituição. Parafraseando CAMÕES, pode-se afirmar, com segurança, que serviu com tanto amor a esta Justiça que “mais servira, se não fora para tão longo amor tão curto o mandato!” Assim, ao transmitir a Presidência da Corte, Sua Excelência não deixa apenas rastros imperceptíveis nas areias do tempo, mas as marcas indeléveis dos que mais honraram e dignificaram este Tribunal. Volve o Ministro WAGNER PIMENTA à bancada de julgamento, podendo saborear agora a reconfortante convicção do dever cumprido, em ritmo menos frenético. Afinal, a vida apresenta os mesmos matizes que a música: há o “crescendo” e o “fortíssimo”, mas também o “diminuendo”, que pode ser muito belo! Receba, pois, o eminente Ministro WAGNER ANTÔNIO PIMENTA o imorredouro preito de gratidão e de reconhecimento de toda a Justiça do Trabalho! Ascende à Presidência o preclaro Ministro ALMIR PAZZIANOTTO PINTO. Quem bem o conhece pode afirmar, sem erro possível no vatícinio, que, à semelhança de seu antecessor, conduzirá com equilíbrio, sabedoria e altivez os destinos da Justiça do Trabalho. Guindado à Presidência do TST aos 63 anos de uma vida rica e combativa, o Ministro ALMIR PAZZIANOTTO é paulista de Capivari. Ali cultivou as primeiras letras e estudou até a adolescência. De Capivari, seu berço e sua juventude, aberta e livre, ele se abandona durante um tempo para sair ao mundo, bacharelando-se em Ciências Jurídicas pela Universidade Católica de Campinas, em 1960. Após, torna-se advogado de inúmeras entidades sindicais por mais de duas décadas, acumulando a valiosíssima experiência de achar-se no epicentro das tempestuosas lutas sindicais travadas no ABC paulista, na década de setenta. Contudo, nunca olvidou a humildade de suas origens e até hoje mantém laços estreitos e profundos com a terra natal. A sua Capivari é o território carinhoso e o oásis espiritual de sua vida, corroborando o acerto de RUBEM BRAGA ao pontuar: “A terra onde se nasce e que nos viu crescer, exerce sobre nós uma permanente força de gravidade sentimental”. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 217 NOTAS E COMENTÁRIOS O novo Presidente do TST é um homem simples em tudo: em seu trato, em sua maneira de viver e até em sua despretensiosa diversão em sítio de lazer. Nele gosta de ver o nascer do sol e o brilhar da lua, o mugir do gado e a amizade dos cães e dos animais em geral, por quem cultiva um franciscano sentimento de amor, que só rivaliza em intensidade com a paixão pelo bom futebol. Também é um homem solidário, com quem se pode contar nas horas mais difíceis. Cometerei aqui a indiscrição de revelar publicamente um episódio que bem retrata esse traço da personalidade do nosso Presidente. Há algum tempo, ainda em meu noviciado de Ministro nesta Casa, encontrava-me em situação financeira aflitiva. Eis que, anonimamente, recebo a visita em meu Gabinete do Ministro ALMIR PAZZIANOTTO, prontificando-se em ajudar financeiramente no que precisasse. Registro esse fato não apenas para confessar que tenho uma conta corrente afetiva em que devo gratidão e amizade ao Ministro ALMIR PAZZIANOTTO, mas, sobretudo, para realçar também a grande figura humana que se oculta sob a sua fisionomia. A tais atributos, some-se o de ávido leitor, que sabe da Literatura, da História e do sindicalismo o bastante para bem entender o Homem e os conflitos sociais em que se vê a braços. Sobrepaira, contudo, na personalidade do novo Presidente do TST, a dimensão política. Sua Excelência gosta de Política com “p” grande: é um Homem político, político na acepção grega do vocábulo, isto é, da Política cuja finalidade “é o bem humano”, no dizer de SÃO TOMAZ DE AQUINO. Eleito para três sucessivos mandatos de deputado estadual em São Paulo, no terceiro, em 1983, licenciou-se para desempenhar o cargo de Secretário das Relações do Trabalho. Já ali enfrentou com serenidade as crises mais agudas pelas quais passou o governo Montoro, a começar pela miniinsurreição que chegou a derrubar as grades do Palácio dos Bandeirantes, apenas três semanas depois da posse. Em maio de 1984, solucionou sem traumas o que se poderia transformar numa sangrenta rebelião de trabalhadores dos canaviais da região de Ribeirão Preto. A habilidade de negociador, entre outros méritos, levou ALMIR PAZZIANOTTO a ser o primeiro dos ministros escolhidos pelo saudoso Presidente TANCREDO NEVES para prestar o concurso de sua inteligência e diplomacia à administração federal. Assim, na jovialidade de seus 48 anos, era alçado à chefia do Ministério do Trabalho, um dos postos-chave de um governo de transição, constantemente às voltas com convulsões sociais. À testa do Ministério do Trabalho, em poucos meses ALMIR PAZZIANOTTO alteraria, de maneira substancial, o tratamento que até então se dispensava ao sindicalismo e aos sindicalistas brasileiros. Notório também que a visão aberta, humanista e sensível do MINISTRO ALMIR PAZZIANOTTO e a sua infatigável busca da conciliação concorreram decisivamente para a solução de incontáveis conflitos coletivos de trabalho, quer ao tempo em Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3. jul/set 2000 218 NOTAS E COMENTÁRIOS que comandava o Ministério do Trabalho, quer neste Tribunal, em que ingressou em 1988, em vaga destinada a advogado. Ao longo de tantos anos, o MINISTRO ALMIR PAZZIANOTTO consolidou sua imagem de indefectível conciliador. Se, como frisou SHAKESPEARE, na boca de HENRIQUE VI, “são benditos os que trabalham para a paz na terra”, dentre eles, sem dúvida, figura Sua Excelência. Senhoras e Senhores Tão elevados predicados de homem público sempre voltado a servir à Nação dão-nos a plena certeza de que o MINISTRO ALMIR PAZZIANOTTO trabalhará incessantemente, e como verdadeiro dínamo, pelo fortalecimento, unidade e recuperação do prestígio da Justiça do Trabalho, nesta quadra espinhosa por que passa todo o Poder Judiciário. Ninguém ignora a existência, de uns tempos a esta parte, de deliberada e injustificável hostilidade contra o Poder Judiciário. Impressionam a injustiça, leviandade e precipitação que presidem, muitas vezes, as apreciações sobre os juízes e tribunais, neste País! É forçoso convir que essa agressão reiterada e quase trivial à Justiça na atualidade alcançou dimensão muito grave e preocupante. Está claro que a liberdade de pensamento e de expressão constitui direito inviolável da pessoa humana e que é bem-vinda a crítica construtiva e séria ao Poder Judiciário. Está claro que compreendemos, respeitamos e até aplaudimos o jornalismo investigativo, prerrogativa basilar da cidadania. Intolerável, todavia, é a divulgação de notícias distorcidas e truncadas, próprias de quem desconhece o Poder Judiciário e seus membros! Intolerável é disseminar notícia tendenciosa sobre o Poder Judiciário, em campanha que às vezes parece concertada para desmoralizá-lo, forjando uma opinião pública contra a Justiça. Inaceitável particularmente é o vezo reprochável da crítica generalizada à Justiça, a que se lançam alguns, especialmente na mídia, estendendo a toda uma classe, em sua esmagadora maioria ciosa da transparência e da honorabilidade, os desvios éticos isolados de algum de seus membros, encontráveis e inevitáveis em qualquer área da atividade humana, tudo como se um homem fosse a Instituição. Mas, ai de nós, juízes e ministros, no calvário em que se transformou o exercício da magistratura neste País! Além de aturdidos pela pletora de processos e as naturais cobranças das partes a suplicar-nos um desfecho rápido, além de padecermos o drama dos vencimentos defasados na angustiante espera por um teto que somente nos expôs a insuportáveis desgastes, vivemos acossados e patrulhados pela cobertura ácida e infeliz da mídia, que às vezes causa danos imerecidos à imagem da magistratura e de exemplares serventuários. É, portanto, chegado o momento de exortar todos a que preservemos a imagem do Poder Judiciário e a que resgatemos a confiança do povo na Justiça, porquanto um povo que nela descreia terá atingido o limiar do caos. Afinal, sem Justiça não há ordem Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 219 NOTAS E COMENTÁRIOS jurídica e sem ordem jurídica assistiríamos ao descalabro social e à anarquia. A Justiça é o fundamento do Estado Democrático de Direito. Irretocável e oportuna a advertência de BALZAC, a propósito: “Desconfiar da magistratura é um princípio de dissolução social. Reconstruí a instituição noutras bases, pedi-lhes imensas garantias... mas confiai nela”. Sim, precisamos com urgência reconstruir o Poder Judiciário, não apenas mais respeitado, forte e altivo: também mais eficiente. Entretanto, lastimavelmente ilusório supor que a tão aguardada, propalada e inadiável reforma do Poder Judiciário, recém-aprovada na Câmara dos Deputados, atenderá à aspiração essencial da sociedade: uma Justiça rápida. Em particular, delineia-se frustrante a reforma para obstaculizar o congestionamento de recursos com que se defrontam os Tribunais Superiores. Estamos convencidos de que somente a súmula vinculante, tal como prevista no projeto apenas para o Supremo Tribunal Federal, pode solucionar a caótica situação atual do Tribunal Superior do Trabalho, que hoje represa uma avalanche de mais de cento e trinta e oito mil recursos para distribuição. Sabidamente, um quadro irracional prevalece hoje nos Tribunais Superiores, chamados a rejulgar milhares de vezes a mesma tese jurídica já pacificada na Corte, em prejuízo da economia e celeridade processuais. Frente ao fenômeno das demandas repetitivas, não faz sentido movimentar-se desnecessariamente a máquina estatal para, ao fim, alcançar-se um desfecho previsível. De resto, decisões discrepantes da Justiça depõem mal contra o Poder Judiciário e desestimulam o investimento no País. Saudamos, todavia, como animadora e auspiciosa a instituição do Conselho Superior da Justiça do Trabalho e da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho. O Conselho exercerá a supervisão administrativa, orçamentária, financeira e patrimonial da Justiça do Trabalho de primeiro e segundo graus. É órgão sobremodo importante, de criação já tardia, que finalmente dará ao Tribunal Superior do Trabalho o instrumental jurídico, de que hoje ainda se ressente, para coibir pontuais desmandos administrativos e para preservar a austeridade no gasto público. Houvesse tal Conselho e, por certo, a Justiça do Trabalho não teria sido enxovalhada aqui e acolá. Por sua vez, a implantação da Escola Nacional da Magistratura do Trabalho inscreve-se também entre as medidas mais urgentes e indispensáveis. “A qualidade da Justiça - acentuou BERNARD SCHWARTZ - depende mais da qualidade dos homens que aplicam a lei do que do conteúdo da lei aplicada”. Manifesto, desse modo, que não adianta mudar apenas a lei. Constitui igualmente providência impostergável propiciar não só a reciclagem técnico-profissional do juiz, hoje esquecido, como também velar pelo aprimoramento de sua formação como homem, inclusive para que ele não seja somente jurista. Conforme assinalou RADBRUCH, coberto de razão, “os juristas não devem limitar seus estudos à acumulação de simples Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 220 NOTAS E COMENTÁRIOS conhecimentos jurídicos (...) já que a atividade jurídica não se esgota essencialmente na aplicação do Direito.” Tarefa igualmente imperiosa é sensibilizar o Congresso Nacional para implementar mudanças modernizadoras na legislação trabalhista, da década de 30 e 40, notoriamente ultrapassada, em particular a nossa arcaica legislação sindical que, não se sabe por que, vem governo e sai governo e permanece intocada. A Consolidação das Leis do Trabalho, velha de quase sessenta anos, não atende às transformações radicais ocorridas no mundo desde então. Além disso, não é suficientemente flexível para acompanhar tais mudanças no ritmo mais veloz ditado pelo processo de globalização da economia e de trepidantes conquistas tecnológicas. Na perspectiva inarredável de que deve haver sintonia entre a Justiça do Trabalho e as transformações por que passa a sociedade, no mundo e no Brasil, impõe-se ao Tribunal Superior do Trabalho liderar as propostas de aperfeiçoamento da legislação trabalhista, tendo sempre presente que a recorrente idéia de flexibilização de direitos sociais não pode ser apenas um eufemismo para a sua supressão, pura e simples. Senhor Ministro ALMIR PAZZIANOTTO Se é certo que a Vida contemplou Vossa Excelência com os cargos e postos na exata dimensão de seu talento, não menos certo que também lhe conferiu, em igual proporção, elevadas missões e responsabilidades, como a que vem de assumir neste momento. Afiançamos-lhe, contudo, que o pesado fardo de Vossa Excelência será suavizado pela colaboração e aconselhamento de seus pares, com quem poderá contar em todas as horas, permitindo-lhe empreender uma administração compartilhada da Corte. Sobretudo, Vossa Excelência será coadjuvado pela proficiência dos Ministros URSULINO SANTOS FILHO e JOSÉ LUIZ VASCONCELLOS, ora empossados respectivamente na Vice-Presidência e na Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho. O Ministro Corregedor JOSÉ LUIZ VASCONCELLOS, professor universitário e processualista emérito, alia inteligência privilegiada a uma soberba cultura humanística. Experiente, tem uma extensa folha de relevantíssimos serviços prestados à Justiça do Trabalho, desde 1961. Seguramente será um baluarte da nova direção do Tribunal. O novo Vice-Presidente, Ministro URSULINO SANTOS, personalidade das mais cativantes e envolventes, é homem intrépido e aguerrido, na defesa de seus princípios e ideais de Justiça. Lamentavelmente para todos nós, Sua Excelência, ainda neste mês, alcançará a aposentadoria compulsória, quando, então, como no poema de FERNANDO PESSOA, “Outros haverão de ter / O que nós houvermos de perder.” O consolo para tão dura perda consiste em saber que, regimentalmente, será alçado à Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho o preclaro Ministro FRANCISCO FAUSTO DE PAULA MEDEIROS, potiguar fidalgo que cultiva a simplicidade dos sábios e a amenidade dos santos. Juiz paradigmático e habilidoso articulador, dele se Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 221 NOTAS E COMENTÁRIOS pode afirmar, com segurança: “um operário construtor de catedrais"! Dará grande contributo à administração do Tribunal nos próximos anos. Senhor Presidente Quiseram os fados do destino que Vossa Excelência assumisse a Presidência do Tribunal Superior do Trabalho na efervescência do crepúsculo de um século estonteante para a Humanidade. “Um século que decretou a morte de Deus, a morte da história, a morte do Homem. Em que se pisou na Lua e se morreu de fome”, nas palavras eloqüentes do poema de AFONSO ROMANO DE SANT'ANNA. Um século, enfim, em que o mundo passou e passa por grandes transformações, mormente devido à globalização da economia e à revolução das tecnologias da informação e da comunicação. Abrem-se, por conseguinte, alvissareiras perspectivas de progresso à Humanidade. Paradoxal e desafortunadamente, todavia, constata-se que o avanço tecnológico até aqui não se fez acompanhar da paralela evolução da qualidade de vida do Homem. Ingressamos na Revolução da Informática sem superar os problemas da Revolução Industrial e, pior ainda, com receio de aprofundamento das desigualdades, como temem os manifestantes de Seatle, Davos e Washington. É doloroso, mas no limiar de século XXI ainda não soubemos aproveitar as imensas transformações do mundo para edificar uma sociedade mais justa, equitativa e solidária. Vivemos particularmente num País em que esse quadro assume feições ainda mais inquietantes, pois aqui é tradicional e grave a exclusão social. Aqui, sabemos todos, cinturões de desenvolvimento apertam bolsões de miséria, quando não o contrário. Natural que avulta a responsabilidade da Justiça do Trabalho em País assim, não apenas contraditório e largamente dividido, como também tenso e de notória expansão da conflituosidade trabalhista. Sentimo-nos, porém, confiantes e esperançosos, Senhor Presidente! Estamos convictos de que não haverão de faltar a Vossa Excelência engenho e arte, espírito de luta e capacidade de ação criadora para reafirmar a Justiça do Trabalho como instituição que somente existe e faz sentido se for em prol do Homem: para o Homem e pelo Homem. Auguramos-lhe, Senhor Presidente, uma gestão fértil e coroada de êxito. E que Deus o inspire e estimule nesta nova jornada, agora como grande timoneiro da Justiça do Trabalho brasileira. Afinal, no verso da poetisa paranaense HELENA KOLODY, “Para quem viaja ao encontro do sol, é sempre madrugada!” Muito obrigado! Rev. TST, Brasília, vol 66, nº 3, jul/set 2000 222 NOTAS E COMENTÁRIOS DISCURSO DO EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO ALMIR PAZZIANOTTO PINTO Senhoras e Senhores, Serei breve. Agradeço sensibilizado a presença de todos, prestigiando esta singela cerimônia. Dos altos representantes dos Três Poderes, aos prestativos servidores da Corte, aqueles que até aqui vieram conferem especial significado a este final de tarde, quando são empossados os novos dirigentes do Tribunal Superior do Trabalho. Consigno reconhecimento especial à Neyde, minha mulher, aos filhos, Ricardo e Paulo, à afilhada Célia e ao Cláudio, diletos companheiros, fiéis amigos e prudentes conselheiros, nos bons e maus momentos, dos quais sinto inexcedível orgulho; Ao saudoso pai, Ulysses, à minha querida mãe, Maria, para quem continuo sendo um menino, alvo de preocupações e cuidados; Às irmãs, Zulma, Zilce e Zaire, aos cunhados, sobrinhos, tios, primos; Ao Presidente a quem sucedo, Ministro Wagner Pimenta, ao meu Vice-Presidente, Ursulino Santos, ao Corregedor-Geral, José Luiz Vasconcelos, a todos os senhores Ministros, no exercício ou aposentados; Aos Juízes de Tribunais e de primeiro grau; Ao Exmo. Procurador-Geral e demais integrantes do combativo Ministério Público do Trabalho; Aos servidores da Corte, funcionários do Gabinete, a todos que estão ou estiveram comigo, desde Capivari, onde nasci e me iniciei como advogado, sincero, comovido e imorredouro agradecimento. Senhoras e Senhores informações da Organização Internacional do Trabalho advertem sobre a existência de 200 milhões de desempregados e 1 bilhão de subempregados no mundo, acusando, ainda, a presença de 1,2 bilhão de pessoas dispondo de um dólar por dia para subsistência. O Relatório de 1995, do Banco Mundial, sobre o Desenvolvimento, prevê que, no máximo em 30 anos, teremos 1 bilhão de trabalhadores a mais, disputando lugar no mercado de mão-de-obra, 90% provenientes de países de renda baixa ou média. Aponta, ademais, o perigo de se aprofundarem as contradições entre países ricos e pobres, salvo se os ricos puserem em prática políticas externas e internas corretas, sobretudo no plano da distribuição da riqueza. A este propósito, o citado Relatório assinala que a renda média per capita dos países desenvolvidos fora, em 1870, 11 vezes superior à dos pobres, desigualdade que se elevara, em 1960, a 38 e, em 1985, a 52. Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 223 NOTAS E COMENTÁRIOS A morte de 58 asiáticos, asfixiados quando penetravam clandestinamente na Inglaterra, ocultos em caminhão conduzido em barcaça através do Canal da Mancha, expõe ao mundo os riscos a que se submetem aqueles que fogem da miséria, tentando melhorar de vida em país industrializado. Perigos semelhantes padecem os brasileiros que, violando as barreiras erguidas na fronteira com o México, penetram nos Estados Unidos da América, desafiando a polícia e fazendeiros dispostos a corrê-los a bala, como revelou a revista Time, reproduzida pela “Folha de São Paulo”. Noticia “O Estado”, também de São Paulo, que em junho três perderam a vida em regiões desérticas, no curso de frustrada tentativa (ed. de 1 de julho). Matéria semelhante publicada pelo citado jornal (ed. de 22 de junho) informa que estão na ilegalidade, no Estado de Nova Iorque, entre 150 a 300 mil brasileiros, obrigando o governo local a criar organismo para tratar desse assunto. No Japão, 250 mil “dekasseguis”, paulistas, mineiros, paranaenses, “vivem quase num gueto”, declara o Padre Evaristo Higa, citado em notícia da “Folha de São Paulo” (ed. de 25 de junho), desamparados de garantias ou benefícios sociais, entregues ao trabalho, preocupados em conseguir algumas horas extras. Para o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas - IPEA, o Brasil apresentava, no início dos anos 90, “um dos maiores graus de desigualdade do mundo”, com 10% de ricos obtendo rendimento médio quase 30 vezes superior ao dos 40% mais pobres. O mesmo estudo revela que esse problema sofre variações de região para região e em função da raça, com os membros da comunidade negra e parda ganhando em geral cerca de 30% abaixo do que recebem trabalhadores brancos. Estatísticas recentes, sobre o problema do desemprego, indicam que nos primeiros cinco meses deste ano, em algumas áreas metropolitanas, a desocupação chegou perto de 18%, permanecendo a média nacional ao redor de 8%, “recorde da série histórica iniciada em 1982”, segundo observação da “Folha” (ed. de 22 de junho). Referindo-se a dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Gilberto Dimenstein, no mesmo jornal, declara que na Grande São Paulo o desemprego de jovens de 19 a 24 anos cresceu, entre 1979 e 1998, 543%. Em 98 a desocupação, nessa faixa etária, era de 27%, impondo a um em cada três moços a condição de ociosidade. Segundo a mesma fonte, os desempregados, de 15 a 24 anos, triplicaram, saltando de 1 para 3,3 milhões (ed. de 25 de junho, 2000). Com experiência acumulada na periferia de São Paulo, o Delegado de Polícia André Drames, do Centro de Análise Criminal, informa que unicamente nos bairros do Grajaú e Parelheiros 10 mil crianças estão sem escola e 50% de jovens e moços, com idade de até 25 anos, não encontram trabalho (“O Estado de São Paulo”, 4 de julho, 2000). O título da principal matéria do jornal “O Estado de São Paulo”, em 9 de julho, dizia “Crises econômicas levaram mais jovens ao crime”. Por outro lado, “cerca de 7,7 milhões de crianças e adolescentes, entre 5 e 17 anos, continuam atuando em lavouras, carvoarias, olarias, mercado informal e ambiente doméstico”(“O Estado, ed. de 10 de julho). Na mesma semana a revista “Veja” trazia, como reportagem de capa, estatística Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 224 NOTAS E COMENTÁRIOS dos brasileiros mais ricos, seu pensamento acerca do país, dos pobres e deles mesmos, e nomes de lojas “onde as roupas chegam a ter o preço de um apartamento”. Na voragem desse quadro aflitivo e preocupante, a Justiça do Trabalho se debate para corresponder às expectativas de patrões e trabalhadores jurisdicionados. Na década de 1960, ao surgirem os comentários iniciais acerca do envelhecimento da CLT, já era visível o crescimento do número de processos, fenômeno apontado por analistas como manifestação positiva de cidadania dos trabalhadores. Multiplicavam-se, paralelamente, os dissídios coletivos, traduzindo com clareza as dificuldades enfrentadas pelo sindicalismo patronal e profissional no terreno da livre negociação. Examinando as estatísticas, verificamos que o volume de ações, no primeiro grau de jurisdição, praticamente dobrava a cada dez anos. Nos anos de 1960, foram da ordem de 2,8 milhões; nos de 70, 4,1 milhões; na década de 80, 7,3 milhões e, na de 90, mais de 16 milhões. Acompanhando a quantidade de feitos, ampliava-se o número de Juntas de Conciliação e Julgamento, como então eram denominadas as atuais Varas do Trabalho, conquanto mais vagarosamente. Nas capitais e maiores cidades permaneceram agrupadas na região central, ignorando a política descentralizadora, praticada com excelentes resultados pela Justiça Comum. Com 60 anos de vida, o Judiciário Trabalhista possui 1.109 Varas do Trabalho, instaladas em 536 dos atuais 5.548 municípios, cuja jurisdição se estende a 4.195, remanescendo outros 817 nos quais os processos continuam sob a alçada do Juiz de Direito. Alojadas em prédios próprios temos 624 Varas, 339 em alugados e 146 em casas cedidas em comodato por prefeituras municipais, que ainda contribuem com partes dos funcionários. Em 1999 deram entrada mais de 1,8 milhão de feitos, ajuizados de forma desproporcionada. Há Varas, como a de Pouso Alegre, Minas Gerais, onde o número de ações aforadas excedeu a quatro mil, e outras que receberam poucas dezenas, como é o caso da situada em Feijó, às margens do Rio Embira, Estado de Rondônia, com menos de 50. O resíduo deixado pelas não solucionadas superou, no mês de dezembro, a 900 mil, e o número de execuções ultrapassa a 1 milhão. Vários fatores se consorciam, gerando processos que assoberbam Varas do Trabalho, os grandes Regionais e o Tribunal Superior, dando ensejo a incessantes acusações de ineficiência e morosidade. Entre eles ressalto o desemprego, a dificuldade de se obter nova colocação, os baixos salários, a deficiente fiscalização, o crescimento do mercado informal e especialmente a ausência de medidas que imprimam atualidade à legislação laboral. Admitindo a procedência das críticas, projetam-se soluções, sobressaindo-se a do crescimento estrutural e numérico deste ramo do Judiciário. Deste raciocínio emergiu o art. 112 da Constituição de 1988, exigindo pelo menos um Tribunal Regional do Trabalho em cada Estado, dotado de autonomia administrativa e financeira, submetido Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 225 NOTAS E COMENTÁRIOS à fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União (C.R., arts. 70 e 71). Obedecendo ao imperativo constitucional, entre 1989 e 1992 foram criados, por lei, oito Tribunais Regionais. Essa iniciativa, porém, logo encontraria óbices financeiros, esmorecendo ao chegar a vez do Acre, permanecendo à espera do seu Tribunal, além dele, Tocantins, Amapá e Roraima. Nesta mesma ordem de idéias se coloca o projeto da criação de 260 Varas do Trabalho, remetido ao Congresso Nacional pelo Presidente Wagner Pimenta, nos derradeiros dias da sua administração, e o preenchimento, por magistrados de carreira, dos vazios deixados nos Tribunais Regionais ao se extinguir a representação classista. Outra corrente defende a simplificação do processo e a imposição de obstáculos à utilização de recursos. A exigência dos depósitos recursais, a submissão do conhecimento de recursos, como o de revista, à relevância ou transcendência das matérias recorridas e a recente lei do rito sumaríssimo, encaixam-se neste modelo de pensamento. Uma terceira via é sugerida por aqueles que desejam ir logo às causas, argumentando com a inadiável modernização das relações de trabalho, simplificando-se a legislação para livrá-la de muita carga dispendiosa e inútil, privilegiando-se as negociações diretas, a flexibilidade dos contratos e a firmeza dos distratos, como instrumentos adequados à prevenção e solução de divergências. Não é correto assistirmos inermes à proliferação de ações individuais e coletivas, corroendo as entranhas da economia, trazendo-lhe pesado clima de desconfiança, acumulando incalculável passivo trabalhista e incentivando inversões em equipamentos destinados a suprimir mão-de-obra. Destacou há pouco tempo o Banco Mundial, no Relatório sobre o Trabalhador e o Processo de Integração Mundial, estarmos em meio a uma revolução econômica provocando, tanto em países abastados como entre os pobres, “crescente insegurança, na medida em que a mudança tecnológica, a expansão das interações internacionais e o declínio das estruturas comunitárias tradicionais parecem estar ameaçando os empregos, os salários e a assistência aos idosos”(pág. 2). Mais categórico é Jeremy Rifkin, autor de “O Fim dos Empregos”, para quem “A Era da Informação chegou. Nos próximos anos, novas e mais sofisticadas tecnologias de software aproximarão a civilização de um mundo praticamente sem trabalhadores”, pois “as máquinas estão rapidamente substituindo o trabalho humano e prometem uma economia de produção quase totalmente automatizada, nas primeiras décadas do século XXI” (pág. XVII). Na antevisão de William Bridges, especialista em transição, o emprego, como é praticado há dois séculos, deverá desaparecer, cedendo a vez a outras modalidades de trabalho, como o temporário, a tempo não integral ou segundo o sistema “modularizado” ou de “terceirização” (“Um Mundo Sem Empregos”). O italiano Domenico De Masi confere a um dos seus livros o sintomático título “Desenvolvimento Sem Trabalho” e a francesa Viviane Forrester alerta que somos vítimas de magistral engodo, quando teimamos em preservar do extinção o mais sagrado dos nossos tabus: o trabalho (“O Horror Econômico”). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 226 NOTAS E COMENTÁRIOS Felicito o Exmo. Sr. Ministro do Trabalho, Francisco Dorneles, pela auspiciosa informação, publicada no mês de julho (“O Estado de São Paulo”, 1° de julho), de que o governo deverá criar 10 milhões de postos de trabalho até 2003. O êxito desse programa condiciona-se, obviamente, à firme expansão da economia, e isto me leva a refletir que nos regimes baseados na livre iniciativa não há como obrigar os donos do dinheiro a investirem em atividades produtivas. É forçoso, sim, persuadi-los a acreditar na superioridade da mão-de-obra, para que exerçam opção pelo trabalho assalariado, deixando de recorrer pesadamente à tecnologia de ponta e à informática. A Justiça do Trabalho não tem motivos nem como se opor à introdução de novos métodos de produção, à privatização de estatais ineficientes, à preocupação com custos, à estabilidade da moeda, embora espere que tudo se faça no sentido de nos libertar da pobreza e do subdesenvolvimento, proporcionando-nos a desejada condição de país evoluído, ágil, dinâmico, comercialmente competitivo. Somente nação imatura, perdulária e inconseqüente permaneceria apática diante da crise que assola as relações de trabalho, colocando patrões e empregados sob um dilúvio de ações judiciais, que trazem consigo insuportáveis custos sociais, políticos e econômicos. Não ignoro a existência de maus empregadores, cevados na constante violação às obrigações legais. Já pudemos perceber, todavia, não ser a ação trabalhista a melhor arma para reprimi-los, sobretudo porque, graças ao acúmulo de processos, os mais relapsos se vêm favorecidos com a demora na decisão e as peripécias da execução. Nutrimos pela Consolidação das Leis do Trabalho o respeito conquistado como obra-prima do pensamento jurídico e vitorioso projeto de engenharia política. Não podemos desconhecer, todavia, que foi redigida sob outras circunstâncias, quando o desenvolvimento de alguma localidade era avaliado pelo número de chaminés fumegantes, e a classe trabalhadora, as atividades industriais e todo o PIB nacional não correspondiam a uma parcela do que hoje se conhece, por exemplo, da Grande São Paulo. Se pretendemos dar novos rumos às relações de trabalho, não bastará nos limitarmos à recompilação de textos conhecidos. Será indispensável revermos questões como da hipossuficiência, unicidade sindical, preparação profissional dos jovens, modalidades inéditas de prestação de serviços, tratamento diferencial ao micro e pequeno empregador, revalorização da eficácia do distrato, globalização e reflexos na economia. Como lembrou Joseph Brodsky, para se construir uma sociedade genuinamente nova “não se começa pelas fundações ou pelo teto: mas fabricando tijolos novos”. Entre as lacunas do Código Civil e a rigidez da CLT, é preciso desenvolver sistema legal flexível e avançado, apto a responder às necessidades nacionais e que, ao mesmo tempo, respeite os compromissos de proteção àqueles que trabalham. Dirijo-me, agora, aos servidores da Justiça do Trabalho, Magistrados de primeiro e segundo graus e Ministros deste Tribunal. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 221 NOTAS E COMENTÁRIOS Aos primeiros expresso o reconhecimento desta Corte pelo desvelo, correção e fidelidade no desempenho das suas tarefas. Mesmo não dispondo de instalações e equipamentos à altura das necessidades, os nossos funcionários estão sempre se superando em dedicação e contribuindo de forma decisiva para o melhor rendimento dos órgãos aos quais pertencem. A todos os servidores que colaboram conosco, da mais remota Vara do Trabalho, passando pelo SAM, chegando à sede do Tribunal Superior, minha gratidão e a mais sincera homenagem. Aos juízes de primeiro e segundo graus pondero que, ao decidirem as ações que lhes são submetidas, estarão entregando às partes, paralelamente à prestação jurisdicional, elementos de que se valerão para desenhar o perfil da nossa instituição. Como já se observou, presidir, comandar, dirigir, é sobretudo exercício sereno da autoridade. Rui Barbosa, paradigma de jurista, campeão do Estado de Direito, porta-voz das liberdades democráticas, citando Lachaud, nos ensinou que “a lei é calma; não tem sequer os arrebatamentos da generosidade”(“República: Teoria e Prática”, pág. 68). Jamais voltem as costas aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, na administração da Justiça, para não revivermos malfadados episódios. Ao decidirem, não ignorem que foram incumbidos de resolver conflitos entre empregados e empregadores, evitando que as sentenças se convertam em focos de novos problemas, e de tal sorte que, como ordena o art. 8° da CLT, “nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público”. Nas complexas questões coletivas, terreno no qual os limites normativos se acham precariamente esboçados, não se deixem seduzir pelo desejo de legislar, se antecipando ao Congresso Nacional, tampouco se esqueçam de que em economia as contas devem permanecer equilibradas, para que acréscimos de custos não se transfiram aos consumidores, revertendo sobre todos como inflação e aumento de preços. VV. Exas. compõem conjunto de elite, que se distingue pela cultura jurídica e destacada formação humanística. Creio-me, portanto, autorizado a dizer que, por atarefada que encontre a Vara do Trabalho e sobrecarregado o Regional, escapa à compreensão dos jurisdicionados que se consumam meses na lavratura de sentença ou para que o acórdão seja publicado. A melhor decisão não é a mais demorada, rebuscada ou erudita, senão aquela que, pela objetividade e clareza, coloca fim à pendência, elucida e convence os demandantes. Aos Ministros desta Corte, lembro que o Presidente, segundo a fórmula Vaticana, não passa de um primus inter pares, competindo-lhe, na forma da lei e do regimento interno, administrar o Tribunal, coordenar e supervisionar a Justiça do Trabalho. Dizia Prates de Macedo, citando o Padre Vieira, não haver mando mais sofrido, nem mais mal compreendido, do que aquele que se exerce entre iguais. Cumprirei o biênio democraticamente, de forma participativa, com ajuda e aconselhamento de todos. É meta desta presidência passar o bastão ao sucessor, no último dia de junho do ano 2.002, sem processos à espera de julgamento. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 228 NOTAS E COMENTÁRIOS Dentro deste desiderato, estou ordenando que se proceda à distribuição das revistas, agravos e dissídios coletivos, que estão aguardando esta providência, recomendando aos Srs. Presidentes dos EE. Regionais que procedam da mesma forma. Ao lado do absoluto rigor na administração financeira, creio ser esta uma das medidas que a coletividade aguarda da nova administração, pois não é salutar ao prestígio do Tribunal que os autos permaneçam meses imobilizados, na dependência desta essencial formalidade. Concluo com observações acerca da instabilidade reinante no plano jurídico, rotulada por respeitável órgão da imprensa como “baderna legal”, produzida por cerca de um milhão de normas em vigor (“VEJA”, ed. 1.659,26. VII). Promulgada em 5 de outubro de 1988, nossa sétima Constituição ficou intocada durante os cinco primeiros anos. A partir, porém, da Emenda n° 1, de 1992, recebeu 28 emendas, havendo em curso 142 outras no Senado e 581 na Câmara dos Deputados, entre as quais a da reforma do Judiciário. Quanto à legislação infraconstitucional, superado o império dos decretos-leis, passamos à fase das medidas provisórias, cuja utilização estaria reservada a casos típicos de relevância e urgência. Pontes de Miranda já havia lecionado não ser prudente, nem adequado, que se legisle de maneira excessiva, pois as medidas verdadeiramente inovadoras “cabem em poucas páginas ou linhas”. A versatilidade das medidas provisórias, aliada à possibilidade das reedições e à ligeireza das alterações, comprometem a integridade do sistema jurídico, prejudicam a atuação do Poder Judiciário, cooperam para a instabilidade econômica, e desencorajam empreendimentos de longa maturação onde se exijam segurança e confiabilidade. Em recente artigo, o Ex-Presidente e Senador José Sarney, tratando da imagem externa do País, anotou que não conseguimos atingir “um nível de segurança, com perspectiva de crescimento e bom desempenho futuro”, pois “permanece a visão de uma área instável, onde se exerce uma especulação da ganância, lugar ideal para esse capital de curto prazo marcadamente aventureiro”. A vulnerabilidade da base jurídica colabora para essa avaliação negativa, que temos a obrigação de reparar, estabilizando a Constituição e toda legislação infraconstitucional, banindo todas as formas de corrupção, fortalecendo as instituições, defendendo a independência do Judiciário. Creio que estou me excedendo. Ao encerrar, reafirmo as palavras iniciais de gratidão e elevo respeitosamente o pensamento a Deus, o Justo Juiz. A Ele rogo que me proteja, ilumine o meu caminho, cubra-me de humildade, e me proporcione serenidade e coragem em todas as tarefas que terei pela frente, permitindo-me contribuir para que a Justiça do Trabalho em particular, o Poder Judiciário em geral e o Brasil como um todo, superem vitoriosamente este momento de incertezas e dificuldades. Encerro recordando palavras do inesquecível Presidente Tancredo Neves: se todos quisermos, como dizia há quase duzentos anos Tiradentes, herói enlouquecido de esperança, poderemos fazer deste País uma grande Nação. Brasília, 1o de agosto de 2000. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 229 NOTAS E COMENTÁRIOS DISCURSO DO DR. GUILHERME MASTRICHI BASSO, PROCURADORGERAL DO TRABALHO (Trechos) Há alguns anos, neste mesmo Pretório, em momento como este, de transição administrativa, o Procurador-Geral do Trabalho de então incluiu, em seu discurso, uma frase que memorizei, e que me permitirei repetir. Dizia Sua Excelência: “No infindável transcorrer dos tempos, o futuro logo se transforma em passado, e os que são chamados a substituir os que partem são felizes quando encontram o facho luminoso de caminhos seguros a percorrer”. Não é isso exatamente o que se passa nesta transição que vivenciamos? Por término de mandato, o Ministro Wagner Antônio Pimenta transfere a Presidência do TST ao Ministro Almir Pazzianotto Pinto, que passa o cargo de Vice-Presidente do TST ao Ministro Ursulino Santos Filho, o qual, por sua vez, transfere ao Ministro José Luiz Vasconcellos o encargo de Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho. Como todos integraram equipe harmônica, praticamente não terão muito a redescobrir, talvez, apenas, reinterpretar ações. No caso do Ministro Wagner Pimenta, reconhece-se ser um homem que se distingue pela temperança, pela coragem de tomar atitudes, e pelo combate a convenções injustas. Sua gestão sofreu, mais que outras, os efeitos da desregulamentação trabalhista, e, ao enfrentá-los, não se colocou na comodidade de posições indefinidas, marcou posições com destemor, em prol da dignidade da Justiça, inclusive perante os que questionavam a existência da Instituição. Mas já vivemos, agora, um novo ponto do futuro. As renovações, todos sabemos, representam o prelúdio de um novo período de atividades construtivas. Os ilustres Ministros que assumem representam, assim, a esperança do porvir. Enfrentarão conjuntura social-trabalhista nada tranqüilizadora, pelas dificuldades que hoje, no Brasil, os homens encontram para obter os meios materiais necessários à própria dignidade, empurrados para o desemprego por políticas sociais que poucas salvaguardas deixam ao dispor dos trabalhadores, impondo-lhes, assim, que se voltem para este templo de Justiça na defesa de seus direitos. E esse amparo certamente encontrarão os trabalhadores. Os Ministros Almir Pazzianotto Pinto e Ursulino Santos Filho, homens de larga experiência, haurida nas diversificadas áreas onde primaram com o talento que os distingue, galgam as suas novas funções com o descortino do administrador e a sensibilidade do Juiz, virtudes comprovadas. Chegam plasmados para o que irão realizar, e a sociedade será a recipiendária dos benefícios certos que antevejo da administração que se inicia. E terão, na companhia do Ministro José Luiz Vasconcellos, o apoio em prol do interesse. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 230 NOTAS E COMENTÁRIOS DISCURSO DO SR. PAULO PEREIRA DA SILVA, PRESIDENTE DA FORÇA SINDICAL (Trechos) Esta é a casa da Justiça. Nenhuma afronta à Justiça pode ser maior do que a do desemprego. Por isto, me sinto a vontade para falar sobre a Justiça. O Centro de Solidariedade ao Trabalhador da Força Sindical, entidade por mim presidida, recebe diariamente milhares e milhares de desempregados que buscam o direito de trabalhar. Por essa razão, homens com o ministro Wagner Pimenta e o Ministro Almir Pazzianotto têm papel fundamental a cumprir. O Ministro Pazzianotto, inclusive, tem suas origens no movimento sindical, e por isto mesmo sabe melhor que ninguém o que nós trabalhadores esperamos desta casa: compromisso com o sindicalismo moderno e responsável que necessita de mudanças, precedidas de ampla discussão com a sociedade brasileira. Nesta Justiça depositamos a mesma confiança que os trabalhadores já externaram em várias pesquisas de opinião pública, colocando-a como uma das instituições mais confiáveis do País. A sua manutenção é para a classe trabalhadora indispensável e uma questão de honra. E isto foi o que motivou a linha de raciocínio que nos levou à liderança de movimentos para sua defesa na época em que alguns setores da sociedade empreenderam campanha para sua extinção. A responsabilidade desta Corte e de todos os Tribunais e Varas do judiciário trabalhista não se limita ao exercício formal de julgamento de processos, mas equivale àquelas responsabilidades que os sindicalistas defendem da melhor maneira, procurando colaborar para que esses objetivos sejam alcançados. E que nesta oportunidade estamos renovando e reivindicando para melhor equilíbrio social da relação entre capital e trabalho. Os Senhores Ministros têm em conta o trabalho desenvolvido na luta pela democratização do sindicalismo moderno e do diálogo no conflito de interesse das classes. Evidencia desta forma que o Poder Normativo, diferencial flagrante frente a outros segmentos do sistema judiciário, tem importância vital para respaldar este trabalho, que deve ser dividido entre os sindicalistas e os membros deste Tribunal. Os momentos de turbulência na nossa sociedade, originários na prática, por pessoas de má índole, de atos de corrupção, acredito serão devidamente apurados e seus autores punidos independentemente de cargo ou posição. Excelentíssimo Senhor Ministro Almir Pazzianotto, confio na sua capacidade para exercer um dos cargos mais relevantes e importantes no nosso País, e os trabalhadores acreditam fielmente que sua experiência vivida no sindicalismo possa contribuir para o engrandecimento da Justiça. DISCURSO DO DEPUTADO CARLOS EDUARDO MOREIRA FERREIRA, PRESIDENTE DA CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA (Trechos) Autoridades já mencionadas por S. Ex.a o Sr. Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, minhas senhoras e meus senhores. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 NOTAS E COMENTÁRIOS É com muita honra que participo desta solenidade que marca a posse dos magistrados que assumem os destinos da mais alta Corte da Justiça do Trabalho no Brasil. Cumprimento o ilustre Ministro Almir Pazzianotto, pela iniciativa de conceder a palavra aos representantes dos empregados e dos empregadores, num gesto que reforça a sua obstinada cruzada em favor da harmonia entre o capital e o trabalho. Este é mais um dos sinais dos novos tempos. Dos tempos de mais entendimento, pois começa a se formar no Brasil a cultura do consenso, comprovada pelo aumento de 70% no número de acordos e convenções coletivas verificado no período de 1997 a 1999. Muitos dirão que isso foi fruto da recessão e do desemprego. Penso que foi resultado do amadurecimento dos negociadores. Passamos décadas ouvindo que empregados e empregadores não sabiam negociar e que, por isso, a indexação salarial era inevitável. Junto com o Plano Real veio a desindexação. As partes tiveram de negociar. E negociaram muito bem. Logo nos primeiros anos, empregados e empregadores acertaram ganhos reais de salários jamais alcançados na época do ilusionismo das políticas salariais baseadas na indexação. Eles provaram saber negociar. De lá para cá, as dificuldades aumentaram, mas, mesmo assim, foram acertadas por negociação, quebrando vários tabus. É o caso dos milhares de acordos coletivos sobre participação nos lucros ou resultados; banco de horas; benefícios sociais; flexibilização da jornada e salário; e até mesmo a negociação dos critérios de dispensa - assunto detestável para empregados e, sobretudo, para empregadores. Sim, porque a vocação dos empresários é produzir e criar postos de trabalho. É isso que nos dá satisfação. É isso que voltamos a fazer como resposta a um câmbio realista e juros mais baixos. A boa notícia que trago a esta egrégia Casa é que o emprego industrial crescerá 2% neste ano. E o do comércio e os serviços, mais do que isso. No Brasil atual, nada é mais urgente do que criar oportunidades de trabalho, gerando renda para quem trabalha, e trazendo tranqüilidade para uma sociedade que, durante séculos, desconheceu a perversidade da violência atual. Nada mais importante do que reduzir a informalidade que atinge a quase 60% da nossa força de trabalho. No campo do emprego, estamos apenas no início do que precisamos fazer. Na verdade, podemos criar muito mais postos de trabalho além dos 2% previstos para este ano. Para tanto, é fundamental avançarmos nas reformas agendadas, inclusive a trabalhista. O trabalho tornou-se o grande divisor de águas entre ganhadores e perdedores no mundo de hoje. Ninguém consegue vencer sem trabalho - e de boa qualidade. As novas tecnologias se disseminam velozmente. Isso atinge a todas as nações. O que faz diferença é o uso dessas tecnologias; é a forma de trabalhar; a competência do trabalhador e do empresário; o amor pelo trabalho a ser feito; o zelo; o comprometimento; a produtividade. As tecnologias de fronteira e os métodos modernos de produzir e vender estão demandando novas formas de trabalhar. As empresas passam por enormes transformações. Muitas profissões definham e perdem função. Outras nascem e promovem os profissionais. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 232 NOTAS E COMENTÁRIOS As relações do trabalho também se modificam. As formas de contratar se diversificam. O emprego fixo e contínuo se mescla com o trabalho em tempo parcial, com a atividade por projetos, com o trabalho realizado a distância. A negociação do salário fixo é acompanhada pela negociação da remuneração variável, dos benefícios sociais, dos prêmios de produção e produtividade. As relações do trabalho sofrem uma colossal remodelação. Nas novas condições, a negociação maleável passa a fazer os ajustes que a legislação inflexível não consegue realizar. A negociação se descentraliza; caminha na direção das empresas; equaciona problemas específicos em cada empresa e para cada grupo de trabalhadores, pois que, afinal, não são os países que competem neste mundo globalizado. São as empresas e os seus colaboradores que têm de vencer os seus respectivos concorrentes. É do seu sucesso que depende a sobrevivência da empresa, dos postos de trabalho e da economia. Prezado Presidente Almir Pazzianotto Pinto: estamos em um mundo que pede novas instituições trabalhistas. Instituições que estimulem as partes a substituir confrontação por cooperação e que garantam mais negociação e menos legislação. Essa é a chave para o êxito dos dias atuais. A competição galopante na economia internacionalizada tem pouca tolerância ao conflito. Para empregados e empregadores, é impossível vencer a guerra da concorrência externa, se não acabarem com suas batalhas internas. Felizmente, o Brasil começa a entender as necessidades de se reformular as instituições do trabalho. Esta é uma excelente ocasião para se reconhecer o que tem sido feito pelo Tribunal Superior do Trabalho nesse campo. Há anos esta Corte sinaliza que todo conflito coletivo mal negociado - ou simplesmente não negociado - corre o risco de ser arquivado. Isto tem desempenhado um importante papel pedagógico para as partes. Com isso, elas passaram a ser estimuladas a realizar negociações mais realistas e menos teatrais. Mas, a ação do TST foi além do conflito coletivo. Todos sabem que nasceu aqui a idéia das Comissões de Conciliação Prévia para resolver conflitos de natureza individual. Foi um avanço importante, e recebido com entusiasmo pelos empresários brasileiros e, em particular, pelos industriais que viram esgotar-se em três dias os cinco mil exemplares de uma Cartilha publicada pela CNI, tratando daquelas Comissões. Os primeiros resultados são animadores. Dados preliminares indicam que as Comissões instaladas estão conseguindo conciliar mais de 75% dos conflitos. É uma prova de que, quando as partes desejam, o negociado tem claras vantagens sobre o legislado. É mais expedito, menos oneroso e mais harmonioso. Essa é uma tendência mundial. Até mesmo na Europa, os mais complicados temas têm sido acertados por negociação direta entre as partes. A jornada de trabalho é encurtada ou ampliada por meio de acordos que levam em conta as necessidades dos trabalhadores, das empresas, das condições de mercado, da conjuntura econômica e inúmeros outros fatores importantes que jamais seriam captados e equacionados pela frieza da lei. Mas não é só para Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 233 NOTAS E COMENTÁRIOS a jornada de trabalho - e também não é só na Europa - que a negociação provou ser capaz de promover o acerto de divergências. No mundo inteiro, elevar a competitividade das empresas e ampliar as oportunidades de trabalho para os seres humanos passaram a ser assuntos da mais alta prioridade. Nos Estados Unidos, onde há apenas 4% de desempregados, a flexibilidade de contratação é ampla, e quase tudo é acertado pela via negocial. No Japão, nos Tigres Asiáticos, na Nova Zelândia e na Austrália, dá-se o mesmo. Quando se fala em competitividade e emprego, é inevitável salientar a necessidade de se investir pesadamente na qualificação dos empresários e dos trabalhadores. Esse tripé passou a ser absolutamente essencial para competir e vencer nos dias atuais: tecnologia, educação e entendimento. Sr. Presidente, Srs. Ministros. Do lado empresarial, estamos prontos para trilhar este caminho. Estamos fazendo o máximo no campo da modernização tecnológica. Estamos ampliando cada vez mais os investimentos em educação e formação profissional. Estamos profundamente empenhados na busca do entendimento através da negociação. Neste momento, que se revela histórico, reafirmo o compromisso dos empresários brasileiros de tudo fazer para reduzir o número de conflitos, aumentar o entendimento com os seus colaboradores, e aliviar o trabalho repetitivo dos nossos tribunais de justiça. Aproveito para cumprimentar o ilustre Ministro Wagner Pimenta pelos avanços introduzidos nos mecanismos de resolução de conflitos, durante a sua gestão, alguns dos quais foram rapidamente mencionados. Mas, para fazer justiça ao trabalho do Ministro Wagner Pimenta, teria eu de comentar aqui uma lista muito longa de aperfeiçoamentos e inovações nesse campo. Desejo reiterar, ainda, a confiança e o apreço que depositamos na inteligência e nas brilhantes carreiras dos nobres Ministros Ursulino Santos Filho e José Luiz Vasconcellos, que ora assumem a Vice-Presidência e a Corregedoria-Geral desta Corte. Sr. Presidente Almir Pazzianotto: Tenho certeza de que a gestão que ora se inicia será marcante na história da Justiça do Trabalho no Brasil. O Tribunal Superior do Trabalho tem à sua frente um profissional vitorioso. Detentor de sólidos conhecimentos na área jurídica, com uma vida inteiramente dedicada às causas do trabalho. Possuidor de enorme experiência prática e profundo conhecedor da dimensão administrativa dos problemas trabalhistas em nosso País. Por tudo isso, caro Presidente, os brasileiros depositam uma enorme confiança na ação de V. Ex.a. O Brasil está diante de uma rara oportunidade para avançar ainda mais no campo da modernização das instituições do trabalho. V. Ex.a enriquecerá a história desta Casa na medida em que, daqui a dois anos, registrarmos em todo o País um substancial declínio das desavenças trabalhistas. Nós empresários renovamos a confiança e o respeito que sempre depositamos em V. Ex.a. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 234 NOTAS E COMENTÁRIOS DISCURSO DA DRA. MARIA CRISTINA IRIGOYEN PEDUZZI EM NOME DO CONSELHO FEDERAL DA OAB (Trechos) Filho de fotógrafo, neto de fotógrafo, Almir Pazzianotto foi, também, fotógrafo, na juventude. Mas a vida lhe reservava ser fotografado, conseqüência da atração pela vida pública. O campo da sua atuação foi o Direito do Trabalho, mesclando, ao exercício da advocacia, a defesa dos direitos do trabalhador e da restauração das liberdades cívicas. Vivemos uma era de transição no Direito do Trabalho e no Poder Judiciário. A justiça, hoje, não se restringe mais ao simples respeito à lei e à ordem divina. A utopia da igualdade e da democracia exorbita o campo jurídico e onera principalmente o homem público. E dessas duas esferas, a jurídica e a política, participou ativamente o Ministro Almir Pazzianotto. Como advogado, testemunhou o enfraquecimento do poder sindical. Reeleito duas vezes para a Assembléia Legislativa de São Paulo, não completou o terceiro mandato, assumindo, em 1983, a Secretaria de Relações de Trabalho do Estado. Nessa época, o movimento sindical ressurgia, como resposta ao agravamento da crise econômica do país. As greves proliferavam na região do ABC. O Ministro Almir Pazzianotto participou dessa fase decisiva de renovação e democratização das relações trabalhistas no país. A ascensão ao posto de Ministro de Estado do Trabalho permitiu-lhe dar continuidade à política de valorização dos sindicatos e da via negocial na composição de conflitos. Nomeado Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, em 1988, destacou-se como juiz, íntegro, culto, conciliador e lúcido, para ajustar o exercício da competência normativa da Justiça do Trabalho às contingências dos novos tempos, estimulando e incrementando a negociação coletiva e a solução autônoma ou mediada dos conflitos. O exercício da Presidência do Tribunal Superior do Trabalho representa um novo desafio. Também agora as relações de trabalho assumem novas feições. Os dilemas da flexibilização afiguram-se tão graves quanto os da redemocratização. Não que ao Judiciário seja cometido o dever de minorar as discrepâncias sociais. Cabe-lhe, todavia, o dever da responsabilidade, e de atuar em defesa do equilíbrio nas relações entre trabalhadores e empregadores, incumbência que justifica a existência e o papel social da Justiça do Trabalho. A trajetória pessoal do Ministro Almir Pazzianotto o municia com a experiência, lucidez, discernimento e preparo necessários ao exercício da Presidência desta Corte, neste momento crítico em que estão sendo repensadas as relações laborais e a própria atuação do Poder Judiciário Trabalhista. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 235 APOSENTADORIA DO MINISTRO URSULINO SANTOS FILHO Em 26 de agosto de 2000, o Exm° Sr. Ministro Vice-Presidente, Ursulino Santos Filho, despediu-se do Tribunal Superior do Trabalho, aposentando-se em virtude do limite constitucional de idade. Durante a sessão do dia 24, o Exm° Sr. Ministro Presidente do Tribunal, Almir Pazzianotto Pinto, e os demais Exm°s Srs. Ministros desta egrégia Corte trabalhista prestaram homenagem ao ilustre magistrado. Também prestou insigne homenagem, transcrita abaixo, a Drª Ivana Auxiliadora Mendonça Santos, Procuradora Regional do Trabalho. Senhor Presidente, Srs. Ministros, Srª Representante do Ministério Público, Srs. Advogados, Srs. Servidores, Ministro Ursulino Santos - meu pai, Peço desculpas a este Órgão Especial por me referir ao Ministro Ursulino como meu pai, mas creio que o momento atenua o protocolo que sempre deve ser mantido. O Livro de Gênesis, capítulo 12, versículos 1-3, relata a chamada de Abraão. Diz: “Ora, o Senhor disse a Abraão: Sai-te da tua terra, e da tua parentela, e da casa de teu pai, para a terra que Eu te mostrarei. E far-te-ei uma grande nação e abençoar-te-ei, e engrandecerei o teu nome, e tu serás uma bênção. E abençoarei os que te abençoarem”. Assim como fez com Abraão, o Senhor Deus fez com você. Você saiu do interior do Amazonas, largando a sua terra, seus pais Ursulino e Antonieta, tia Belica, seu irmão Albertino, suas irmãs Maria Emília e Maria Antonieta. E como Abraão, foi para a terra que o Senhor o enviou. Rio de Janeiro, Goiânia e por fim Brasília. E como todos que vieram no início de Brasília, aqui foi estrangeiro. Casou-se com Elzy, minha mãe, e fez descendência - Rosana, Ivana e Fernando - que está sendo multiplicada por meio de suas netas Mariana e Maria Eduarda. A sua nação estava iniciando com a sua descendência, mas o Senhor tinha uma promessa na sua vida e lhe deu uma outra nação. Nação de pessoas que precisavam da Justiça. E o senhor se fez advogado e o Senhor engrandeceu o seu nome fazendo-o magistrado, para que você fosse uma bênção na vida daqueles que buscam por Justiça. Mas existe um tempo determinado para todas as coisas. Tempo de começar e tempo de terminar. Hoje o menino que tomava banho nu no rio Tefé e o homem que o Senhor Deus abençoou está se aposentando como magistrado e concluindo um ciclo na sua vida. Dia 26 de agosto começa um novo tempo, que tenho certeza será de grandes realizações pessoais e profissionais. Agradeço a Deus pela nação que ele lhe deu e a você, meu pai, pelo exemplo de honradez e virtude com que nos criou. Muito obrigada a este Colendo Tribunal, que em um ato de generosidade me concedeu a palavra, não como membro do Ministério Público, mas como admiradora deste Tribunal e de todos os magistrados que compõem esta alta Corte Trabalhista. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 236 TST NA 88a CONFERÊNCIA DA OIT No mês de junho de 2000, realizou-se em Genebra a 88a Conferência da Organização Internacional do Trabalho. Na qualidade de observadores, integraram a delegação brasileira os Excelentíssimos Senhores Ministros João Oreste Dalazen e Gelson de Azevedo, que apresentaram ao Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho os relatórios abaixo transcritos. Relatório do Excelentíssimo Senhor Ministro João Oreste Dalazen RELATÓRIO DE PARTICIPAÇÃO NA 88a REUNIÃO DA CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DO TRABALHO - GENEBRA - 2000 1. INTRODUÇÃO Na qualidade de observador e em cumprimento à honrosa indicação do Tribunal Superior do Trabalho, integrei a Delegação do Brasil que compareceu à 88a Reunião da Conferência Internacional do Trabalho, em Genebra, de 30 de maio a 15 de junho de 2000, prestigiada por cerca de 3.000 participantes. A ordem do dia esteve centrada nos seguintes temas: a) revisão da Convenção sobre Proteção à Maternidade n° 103, e da Recomendação sobre Proteção à Maternidade n° 95, ambas de 1952; b) discussão do informe global sobre liberdade de associação, liberdade sindical e reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva; c) apresentação e discussão da Memória do Sr. Diretor Geral da Repartição Internacional do Trabalho, examinando o grau de cumprimento do programa e das atividades da OIT durante o período de 98/99. Paralelamente desenvolveu-se o trabalho das diversas Comissões, sobressaindo a Comissão de Aplicação de Normas, em que, por exemplo, o Brasil respondeu à queixa de violação da Convenção n° 111, sobre discriminação no emprego (por motivo de sexo, raça, cor e origem étnica)¹ e a Ucrânia respondeu à denúncia de atraso no pagamento de salário a milhões de trabalhadores. Como fato bastante auspicioso, o Embaixador do Brasil em Genebra, Sr. CELSO AMORIM, foi eleito Presidente do Conselho de Administração da OIT pelo período de um ano. 1. A Comissão concluiu que houve progressos nessa área, mas solicitou ao Governo brasileiro explicações mais detalhadas sobre as acusações, bem como o prosseguimento de políticas anti-discriminatórias. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 237 NOTAS E COMENTÁRIOS 2. PRESIDÊNCIA DA CONFERÊNCIA Elegeu-se Presidente da 88a Reunião da Conferência da OIT, de forma consensual e por aclamação, o Ministro do Trabalho da República da Argentina, Sr. ALBERTO FLAMARIQUE, que proferiu importante discurso de saudação aos delegados. Dele merecem destaque os seguintes tópicos: “Estamos ingressando no século XXI com profundas contradições. O desenvolvimento tecnológico e os crescentes fluxos de comércio abrem inéditas perspectivas de progresso à Humanidade. Porém, ao mesmo tempo, o largo e doloroso ajuste à nova economia mundial cria incerteza e, em muitos casos, aumenta a desigualdade. O desemprego, a pobreza e a exclusão continuam sendo seu resultado. Reverter esta situação e recuperar o caminho do progresso social ou (...) prover um trabalho decente e segurança social para todos é o desafio de nossa geração. (...) As desigualdades podem ser aprofundadas, como temem os manifestantes de Seattle, Davos e Washington. Entretanto, também se podem aproveitar as transformações para construir uma sociedade mais justa, equitativa e solidária. A sociedade econômica do século XXI tem uma potencialidade muito maior que a sociedade industrial do século XX para generalizar o bem-estar, entre outras razões porque a base tecnológica para aumentar a produtividade - e, portanto, criar emprego de boa qualidade - é cada vez mais barata. (...) A demanda de eqüidade tem um fundamento ético e, pois, político: um sistema de exclusão é incompatível com o contrato social democrático. Porém também é certo que essa demanda não pode dissociar-se da busca de competitividade e esta não pode alcançar-se isolando-se do mundo. Para atingir os objetivos propostos, a OIT é o instrumento adequado. E isso por três razões, quando menos: 1) é o âmbito por excelência do acordo social tripartite; 2) é o mais importante laboratório mundial de investigação e difusão de nova idéias no mundo do trabalho; 3) é o órgão de fiscalização e cumprimento das convenções que emanam de sua atividade”. 3. PALESTRA DE CONVIDADO DE HONRA Convidado de honra, coube ao Sr. JORGE FERNANDO BRANCO DE SAMPAIO, Presidente da República de Portugal, proferir memorável palestra durante o evento, da qual me parecem dignos de realce, por sua atualidade e extraordinária relevância, os seguintes pontos: “O mundo em que vivemos é muito distinto do mundo que nos viu nascer. Os sistemas de valores e aspirações sociais, as relações entre os cidadãos e os Estados-nação e as relações entre distintos países e espaços regionais estão hoje sujeitos a condições que não existiam à época em que nasceu e desenvolveu-se esta Organização. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 238 NOTAS E COMENTÁRIOS Sem olvidar outros fatores condicionantes, gostaria de por em destaque três dimensões: a mundialização dos fluxos financeiros; a transnacionalização das atividades empresariais e o desenvolvimento das tecnologias da informação e das comunicações. Estou convencido de que tais fatores modificaram as premissas de desenvolvimento econômico em todo o mundo e até da própria solidariedade social, da governabilidade das sociedades contemporâneas e (...), o que é mais importante, as relações de poder no mundo de hoje”. Negando enfaticamente o determinismo econômico como fator de exclusão social, pontificou ainda o Sr. JORGE SAMPAIO: “É certo que a globalização dos mercados financeiros, o incremento de poder das empresas transnacionais e a revolução das tecnologias da informação e da comunicação criaram ao mesmo tempo oportunidades de desenvolvimento sem precedentes, mas também agravaram a situação de desigualdade a que estão submetidas imensas regiões do mundo e populações inteiras, que se encontram mais do que nunca fora do jogo da competição mundial e dos benefícios das mudanças em curso. Em minha opinião, nos encontramos frente a novos riscos e sérias ameaças às regras, sistemas e organizações aos quais a história reconhece um papel decisivo na promoção da defesa dos valores da dignidade e da solidariedade social. Reafirmo mais uma vez: não considero que os imperativos da competição empresarial nos condenem a eleger entre eficiência econômica e justiça social, opções que se excluiriam mutuamente. Recuso a tese segundo a qual a intervenção dos poderes públicos nacionais e das organizações internacionais se limitariam, dia a dia, a um espaço tão exíguo que, em muitos casos, seria incapaz de assegurar a efetividade dos direitos civis e políticos e que ao mesmo tempo transformaria os direitos sociais em um luxo que tão-somente seria possível nas regiões e épocas de maior prosperidade. Como todos sabemos, no seio da comunidade científica, dos sindicatos, das associações, das organizações empresariais e das próprias instituições políticas, cada vez são maiores as vozes e os argumentos que se alçam contra a inevitabilidade dos supostos determinismos econômicos e tecnológicos. Cada vez está mais claro que o mundo em que vivemos e o futuro que podemos construir não estão condenados a ser um espaço e um tempo em que os maiores e os mais poderosos vencem sempre aos menores e vulneráveis e em que a ética social se sacrifica sempre à competitividade empresarial ou, inclusive, às lógicas especulativas dos mercados financeiros.” Arrematou o ilustre conferencista propondo campanha mundial pela dignificação do trabalho. Sugeriu que a OIT lance mão das tecnologias da informação para que a opinião pública do mundo inteiro “conheça melhor e mais rápido os problemas do mundo do trabalho”. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 239 NOTAS E COMENTÁRIOS 4. INFORME SOBRE LIBERDADE SINDICAL Sem dúvida, um dos pontos altos da 88a Reunião da Conferência da OIT foi a divulgação e discussão do Informe Global sobre liberdade de associação, liberdade sindical e reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva, apresentado em cumprimento à Declaração da OIT relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho. Como se recorda, em 1998, como resposta aos desafios postos pela globalização da economia e objetivando “proteger e fomentar o respeito aos direitos básicos dos trabalhadores”, a OIT aprovou a referida Declaração, enunciando quatro princípios e direitos fundamentais no trabalho, consagrados em oito Convenções2: a) liberdade de associação, liberdade sindical e reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva; b) eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório; c) abolição efetiva do trabalho infantil; d) eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação. Portanto, mediante tal Declaração, a OIT encampou uma “verdadeira plataforma social mínima de âmbito mundial”. Mais ainda, comprometeu-se a OIT a preparar sucessivamente a cada ano um Informe Global sobre cada um desses princípios e direitos fundamentais no trabalho, destinado a avaliar os progressos obtidos nesses quatro pilares que constituem os direitos fundamentais no trabalho, no quadriênio anterior. Daí que em 2000 veio a lume para debate na Conferência o primeiro de uma série de informes globais anuais: sob o título “Sua Voz no Trabalho”, destaca a importância da liberdade de associação, liberdade sindical e reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva, indispensáveis para se alcançar o objetivo de um trabalho decente em uma economia globalizada. Trata-se, como se sabe, dos direitos fundamentais que determinam todos os demais direitos no mundo do trabalho. Precisamente porque são a peça chave, constituíram a temática desse primeiro informe global. O documento em apreço busca essencialmente traçar um panorama mundial e dinâmico dessa categoria básica de direito do trabalhador, quer dos países que hajam ratificado as Convenções fundamentais a respeito (n° 87 e 98), quer dos que não o tenham feito. “Sua Voz no Trabalho” ressalta que a sindicalização diminuiu globalmente nos últimos decênios e que, “apesar de sua universalidade e de sua qualificação como 2. A saber: Convenção n° 29, contra o trabalho forçado, de 1930, ratificada em 1957; Convenção n° 98, sobre direito à sindicalização e negociação coletiva, de 1949, ratificada em 1952; Convenção n° 100, sobre igualdade de remuneração, de 1951, ratificada em 1957; Convenção n° 105, sobre abolição do trabalho forçado, de 1957, ratificada em 1963; Convenção n° 111, sobre discriminação (emprego e ocupação), de 1958, ratificada em 1965; Convenção n° 87, sobre liberdade sindical e proteção ao direito de sindicalização, de 1948, única das oito básicas ainda não ratificada, porque depende de alteração constitucional. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 240 NOTAS E COMENTÁRIOS direito civil fundamental, falta muito na prática para se conseguir uma aceitação da liberdade sindical” entre os 175 Estados membros da OIT. Assinala que subsistem grandes disparidades no exercício da liberdade sindical e de associação, ao ponto de, em muitos países, ainda hoje se negar aos trabalhadores o direito de constituírem um sindicato ou de associarem-se a ele. Descreve o Informe o que reputa uma situação “freqüente e inquientante”: “A intimidação, as ameaças e, às vezes, assassinatos3 seguem sendo a sina possível de muitos trabalhadores que buscam organizar-se em certos países do mundo. (...) Preocupa também o número de trabalhadores excluídos do exercício da liberdade sindical e de associação e privados do direito de representação coletiva em muitos países. Em grande parte do mundo, está vedado o exercício desses direitos fundamentais aos trabalhadores rurais, aos empregados domésticos e aos imigrantes”. Anota ainda “Sua Voz no Trabalho” a situação particularmente mais difícil da mulher: “Encontramos mais mulheres do que homens em atividades não sindicalizadas, executando trabalhos sem nenhum tipo de segurança nem proteção”. Em especial evoca o Informe da OIT o caso dos trabalhadores domésticos, em sua maioria mulheres, criticando países como o Brasil, Canadá, Jordânia e Kuwait, cuja legislação não garantiria o direito de organização sindical, deixando-os freqüentemente “vulneráveis”. Afirma que “é preciso eliminar os obstáculos legais e rechaçar a idéia de que, devido à índole do seu trabalho e às suas relações com seu empregador, em cuja casa vivem provavelmente, é inadequado que busquem o apoio de uma organização”. 5. CONVENÇÃO SOBRE PROTEÇÃO À MATERNIDADE N° 183 Como é sabido, após intensos debates, a 88a Conferência aprovou a CONVENÇÃO SOBRE PROTEÇÃO À MATERNIDADE n° 183 (íntegra em anexo), revisando a Convenção anterior de 1952. A proposta de revisão suscitou preocupações bastante fundadas de que o resultado fosse normatização inferior à vigente há meio século4. Contudo, em essência, no plano do direito internacional, a nova Convenção 183 trouxe patentes avanços em cotejo com a anterior: a) a duração mínima obrigatória da licença maternidade passou de 12 para 14 semanas, preconizando a nova Recomendação que os países membros da 3. O documento ressalta que, nos últimos dez anos, o Comitê de Liberdade Sindical da OIT examinou denúncias de assassinatos e de desaparecimento de sindicalistas na Colômbia, Equador, Guatemala, República Dominicana e Indonésia. 4. Ginecologistas franceses chegaram a denunciar pressões de multinacionais para a OIT reduzir o grau de proteção à maternidade. El País de 04.06.2000, p. 36. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 241 NOTAS E COMENTÁRIOS OIT deveriam procurar estendê-la até 18 (dezoito) semanas, “ao menos”; b) direito de a empregada retornar ao mesmo cargo ou equivalente, depois da gravidez; c) proibição, pela primeira vez, de que se exija teste de gravidez da mulher que se candidate a um emprego, salvo quando previsto na legislação nacional, em certos casos; d) houve também maior abrangência subjetiva do benefício, de modo a compreender não apenas a mulher empregada, mas também a que desempenha forma atípica de trabalho dependente; e) garantiu-se pausa para o aleitamento do filho durante a jornada de labor, segundo a duração diária fixada pela legislação nacional. Em dois pontos ao menos, todavia, afigura-se não ter havido evolução da proteção: a) ao contrário da redação anterior, que reputava a despedida “ilegal”, pura e simplesmente, durante a licença maternidade, a Convenção 183 flexibilizou a garantia de emprego (art. 8°), ensejando-a durante a gravidez ou da licença maternidade, desde que não relacionada com a gestação e provado pelo empregador um outro motivo determinante da despedida; b) também é flexibilizado o período compulsório de seis semanas de licença após o parto: acordo entre entidades sindicais representativas de patrões e empregados pode ampliar ou reduzir esse período. Para o Governo brasileiro, em face da nova Convenção 183, abrem-se as seguintes perspectivas: 1a) ratificar a nova Convenção e denunciar a antiga Convenção 103, automaticamente; 2a) denunciar a antiga Convenção 103 e não ratificar a nova Convenção; 3a) não aprovar a nova Convenção e, assim, manter a ratificação da redação anterior. Parece-me improvável a ratificação pelo governo brasileiro. Claro está que o nível de proteção à maternidade da legislação nacional - uma das mais avançadas do mundo, no particular - é substancialmente superior ao introduzido pela nova Convenção 183, razão por que prevalece, à luz do art. 19, § 8°, da Constituição da OIT. Prevalece aqui o entendimento de que as Convenções da OIT constituem “normas mínimas de caráter internacional”. Penso, assim, que a virtual ratificação brasileira da Convenção 183 da OIT, não importa alteração para pior das normas legais mais benéficas à gestante. 6. OBSERVAÇÃO DERRADEIRA Embora já houvesse sido até laureada com um Prêmio Nobel da Paz (1969) e seja inegável sua importância histórica, de uns tempos a esta parte a OIT vinha perdendo prestígio internacional, entre outros motivos por conta da relativa falta de executoriedade de suas normas. A globalização da economia inequivocamente trouxe um novo alento à entidade. A meu juízo, entretanto, a OIT somente ganhará maior expressão internacional na medida em que os padrões mínimos de proteção ao trabalho que aprovar estiverem atrelados em pactos de comércio global. Idealmente, é indispensável que a OIT e a Organização Mundial do Comércio (OMC) dêem-se as mãos de modo a que no comércio Rev. TST, Brasília, vol. 66, n° 3, jul/set 2000 242 NOTAS E COMENTÁRIOS internacional haja exigência efetiva de aplicação das normas mínimas universais de proteção do trabalho. Recordemos que economia e trabalho são indisssociáveis, bem assim que inexiste determinismo inexorável na situação, que se registra em inúmeros Países, de espoliação de mão de obra e de violação do direito humano básico a um trabalho decente, em nome da competitividade empresarial. Como assinala FÁBIO KONDER COMPA- RATO, “as grandes misérias econômicas deste final de século - fome endêmica, (...), desemprego em massa - não são fatalidades históricas ou erros de cálculo, mas injustiças flagrantes e explorações intencionais”5. Lembremo-nos de que a Economia é sempre política. Brasília, agosto de 2000. JOÃO ORESTE DALAZEN Ministro do TST TEXTO DEL CONVENIO RELATIVO A LA REVISION DEL CONVENIO SOBRE LA PROTECCION DE LA MATERNIDAD (REVISADO), 1952 La Conferencia General de la Organización Internacional del Trabajo: Convocada en Ginebra por el Consejo de Administración de la Oficina Internacional del Trabajo, y congregada en dicha ciudad el 30 de mayo de 2000 en su octogésima octava reunión; Tomando nota de la necesidad de revisar el Convenio sobre la protección de la maternidad (revisado), 1952, y de la Recomendación sobre la protección de la maternidad, 1952, a fin de seguir promoviendo, cada vez más, la igualdad de todas las mujeres integrantes de la fuerza de trabajo y la salud y la seguridad de la madre y el niño y, a fin de reconocer la diversidad del desarrollo económico y social de los Estados Miembros así como la diversidad de las empresas y la evolución de la protección de la maternidad en la legislación y la práctica nacionales; Tomando nota de las disposiciones de la Declaración Universal de Derechos Humanos (1948), la Convención de las Naciones Unidas sobre la Eliminación de Todas las Formas de Discriminación Contra la Mujer (1979), la Convención de las Naciones Unidas sobre los Derecho del Niño (1989), la Declaración de Beijing y Plataforma de Acción (1995), la Declaración de la Conferencia Internacional del Trabajo sobre la igualdad de oportunidades y de trato para las trabajadoras (1975), la Declaración de la OIT relativa a los principios y derechos fundamentales en el trabajo y su seguimiento (1998), así como los convenios y recomendaciones internacionales del trabajo destinados a garantizar la igualdad de oportunidades y de trato para los trabajadores y las trabajadoras, en particular el Convenio sobre los trabajadores con responsabilidades familiares, 1981, y S. Folha de São Paulo de 18.10.1981, p. 03. Rev. TST, Brasília, vol, 66, nº 3, jul/set 2000 243 NOTAS E COMENTÁRIOS Teniendo en cuenta la situación de las mujeres trabajadoras y la necesidad de brindar protección al embarazo, como responsabilidad compartida de gobierno y sociedad, y Habiendo decidido adoptar varias propuestas relacionadas con la revisión del Convenio sobre la protección de la maternidad (revisado), 1952, y de la Recomendación sobre la protección de la maternidad, 1952, cuestión que constituye el cuarto punto del orden del día de la reunión, y Habiendo determinado que estas propuestas revistan la forma de un convenio internacional, adopta, con fecha de junio de dos mil, el siguiente convenio, que podrá ser citado como el Convenio sobre la protección de la maternidad, 2000. CAMPO DE APLICACIÓN Artículo 1 A los efectos del presente Convenio, el término «mujer» se aplica a toda persona de sexo femenino, sin ninguna discriminación, y el término «hijo» a todo hijo, sin ninguna discriminación. Artículo 2 1. El presente Convenio se aplica a todas las mujeres empleadas, incluidas las que desempeñan formas atípicas de trabajo dependiente. 2. Sin embargo, todo Miembro que ratifique el presente Convenio podrá, previa consulta con las organizaciones representativas de empleadores y de trabajadores interesadas, excluir total o parcialmente del campo de aplicación del Convenio a categorías limitadas de trabajadores cuando su aplicación a esas categorías plantee problemas especiales de particular importancia. 3. Todo Miembro que haga uso de la posibilidad prevista en el párrafo anterior deberá indicar en la primera memoria que presente sobre la aplicación del Convenio, de conformidad con el artículo 22 de la Constitución de la Organización Internacional del Trabajo, las categorías de trabajadores así excluidas y los motivos de su exclusión. En las memorias siguientes, deberá indicar las medidas adoptadas con el fin de extender progresivamente la aplicación de las disposiciones del Convenio a esas categorías. PROTECCIÓN DE LA SALUD Artículo 3 Todo Miembro, previa consulta con las organizaciones representativas de empleadores y de trabajadores, deberá adoptar las medidas necesarias para garantizar que no se obligue a las mujeres embarazadas o lactantes a desempeñar un trabajo que haya sido determinado por la autoridad competente como perjudicial para su salud o la de su hijo, o respecto del cual se haya establecido mediante evaluación que conlleva un riesgo significativo para la salud de la madre o del hijo. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 244 NOTAS E COMENTÁRIOS LICENCIA DE MATERNIDAD Artículo 4 1. Toda mujer a la que se aplique el presente Convenio tendrá derecho, mediante presentación de un certificado médico o de cualquier otro certificado apropiado, según lo determinen la legislación y la práctica nacionales, en el que se indique la fecha presunta del parto, a una licencia de maternidad de una duración de al menos catorce semanas. 2. Todo Miembro deberá indicar en una declaración anexa a su ratificación del presente Convenio la duración de la licencia antes mencionada. 3. Todo Miembro podrá notificar posteriormente al Director General de la Oficina Internacional del Trabajo, mediante otra declaración, que extiende la duración de la licencia de maternidad. 4. Teniendo debidamente en cuenta la necesidad de proteger la salud de la madre y del hijo, la licencia de maternidad incluirá un período de seis semanas de licencia obligatoria posterior al parto, a menos que se acuerde de otra forma a nivel nacional por los gobiernos y las organizaciones representativas de empleadores y de trabajadores. 5. El período prenatal de la licencia de maternidad deberá prolongarse por un período equivalente al transcurrido entre la fecha presunta del parto y la fecha en que el parto tiene lugar efectivamente, sin reducir la duración de cualquier período de licencia obligatoria después del parto. LICENCIA EN CASO DE ENFERMEDAD O DE COMPLICACIONES Artículo 5 Sobre la base de la presentación de un certificado médico, se deberá otorgar una licencia, antes o después del período de licencia de maternidad, en caso de enfermedad o si hay complicaciones o riesgo de que se produzcan complicaciones como consecuencia del embarazo o del parto. La naturaleza y la duración máxima de dicha licencia podrán ser estipuladas según lo determinen la legislación y la práctica nacionales. PRESTACIONES Artículo 6 1. Se deberán proporcionar prestaciones pecuniarias, de conformidad con la legislación nacional o en cualquier otra forma que pueda ser conforme con la práctica nacional, a toda mujer que esté ausente del trabajo en virtud de la licencia a que se hace referencia en los artículos 4 ó 5. 2. Las prestaciones pecuniarias deberán establecerse en una cuantía que garantice a la mujer y a su hijo condiciones de salud apropiadas y un nivel de vida adecuado. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 245 NOTAS E COMENTÁRIOS 3. Cuando la legislación o la práctica nacionales prevean que las prestaciones pecuniarias proporcionadas en virtud de la licencia indicada en el artículo 4 deban fijarse con base en las ganancias anteriores, el monto de esas prestaciones no deberá ser inferior a dos tercios de las ganancias anteriores de la mujer o de las ganancias que se tomen en cuenta para calcular las prestaciones. 4. Cuando la legislación o la práctica nacionales prevean que las prestaciones pecuniarias proporcionadas en virtud de la licencia a que se refiere el artículo 4 deban fijarse por otros métodos, el monto de esas prestaciones debe ser del mismo orden de magnitud que el que resulta en promedio de la aplicación del párrafo anterior. 5. Todo Miembro deberá garantizar que las condiciones exigidas para tener derecho a las prestaciones pecuniarias puedan ser reunidas por la gran mayoría de las mujeres a las que se aplica este Convenio. 6. Cuando una mujer no reúna las condiciones exigidas para tener derecho a las prestaciones pecuniarias con arreglo a la legislación nacional o cualquier otra forma que pueda ser conforme con la práctica nacional, tendrá derecho a percibir prestaciones adecuadas con cargo a los fondos de asistencia social, siempre que cumpla las condiciones de recursos exigidas para su percepción. 7. Se deberán proporcionar prestaciones médicas a la madre y a su hijo, de acuerdo con la legislación nacional o en cualquier otra forma que pueda ser conforme con la práctica nacional. Las prestaciones médicas deberán comprender la asistencia prenatal, la asistencia durante el parto y la asistencia después del parto, así como la hospitalización cuando sea necesario. 8. Con objeto de proteger la situación de las mujeres en el mercado de trabajo, las prestaciones relativas a la licencia que figuran en los artículos 4 y 5 deberán financiarse mediante un seguro social obligatorio o con cargo a fondos públicos, o según lo determinen la legislación y la práctica nacionales. Un empleador no deberá estar personalmente obligado a costear directamente las prestaciones pecuniarias debidas a las mujeres que emplee sin el acuerdo expreso de ese empleador, excepto cuando: a) esté previsto así en la legislación o en la práctica nacionales de un Miembro antes de la fecha de adopción de este Convenio por la Conferencia Internacional del Trabajo, o b) se acuerde posteriormente a nivel nacional por los gobiernos y las organizaciones representativas de los empleadores y de los trabajadores. Artículo 7 1. Se considerará que todo Miembro cuya economía y sistema de seguridad social no estén suficientemente desarrollados cumple con lo dispuesto en los párrafos 3 y 4 del artículo 6 si el monto de las prestaciones pecuniarias fijado es por lo menos equivalente al de las prestaciones previstas para los casos de enfermedad o de incapacidad temporal con arreglo a la legislación nacional. 2. Todo Miembro que haga uso de la posibilidad enunciada en el párrafo anterior deberá explicar los motivos correspondientes e indicar el monto previsto de las prestaciones pecuniarias en la primera memoria sobre la aplicación del Convenio que Rev. TST, Brasília, vol 66, nº 3, jul/set 2000 246 NOTAS E COMENTÁRIOS presente en virtud del artículo 22 de la Constitución de la Organización Internacional del Trabajo. En sus memorias siguientes, deberá indicar las medidas adoptadas con miras a aumentar progresivamente el monto de esas prestaciones. PROTECCIÓN DEL EMPLEO Y NO DISCRIMINACIÓN Artículo 8 1. Se prohíbe al empleador que despida a una mujer que esté embarazada, o durante la licencia mencionada en los artículos 4 ó 5, o después de haberse reintegrado al trabajo durante un período que ha de determinarse en la legislación nacional, excepto por motivos que no estén relacionados con el embarazo, el nacimiento del hijo y sus consecuencias o la lactancia. La carga de la prueba de que los motivos del despido no están relacionados con el embarazo o el nacimiento del hijo y sus consecuencias o la lactancia incumbirá al empleador. 2. Se garantiza a la mujer el derecho a retomar al mismo puesto de trabajo o a un puesto equivalente con la misma remuneración, al término de la licencia de maternidad. Artículo 9 1. Todo Miembro debe adoptar medidas apropiadas para garantizar que la maternidad no constituya una causa de discriminación en el empleo, con inclusión del acceso al empleo, y ello no obstante el párrafo 1 del artículo 2. 2. Las medidas a que se hace referencia en el párrafo anterior incluyen la prohibición de que se exija a una mujer que solicita un empleo que se someta a un examen para comprobar si está o no embarazada o bien que presente un certificado de dicho examen, excepto cuando esté previsto en la legislación nacional respecto de trabajos que: a) estén prohibidos total o parcialmente para las mujeres embarazadas o lactantes, o b) puedan presentar un riesgo reconocido o significativo para la salud de la mujer y del hijo. MADRES LACTANTES Artículo 10 1. La mujer tiene derecho a una o varias interrupciones por día o a una reducción diaria del tiempo de trabajo para la lactancia de su hijo. 2. El período en que se autorizan las interrupciones para la lactancia o la reducción diaria del tiempo de trabajo, el número y la duración de esas interrupciones y las modalidades relativas a la reducción diaria del tiempo de trabajo serán fijados por la legislación y la práctica nacionales. Estas interrupciones o la reducción diaria del tiempo Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 247 NOTAS E COMENTÁRIOS de trabajo deben contabilizarse como tiempo de trabajo y remunerarse en consecuencia. EXAMEN PERIÓDICO Artículo 11 Todo Miembro debe examinar periódicamente, en consulta con las organizaciones representativas de empleadores y de trabajadores, la pertinencia de extender la duración de la licencia de maternidad prevista en el artículo 4 o de aumentar el monto o la tasa de las prestaciones pecuniarias que se mencionan en el artículo 6. APLICACIÓN Artículo 12 Las disposiciones del presente Convenio deberán aplicarse mediante la legislación, salvo en la medida en que se dé efecto a las mismas por medio de convenios colectivos, laudos arbitrales, decisiones judiciales, o de cualquier otro modo conforme a la práctica nacional. DISPOSICIONES FINALES Artículo 13 El presente Convenio revisa el Convenio sobre la protección de la maternidad (revisado), 1952. Artículo 14 Las ratificaciones formales del presente Convenio serán comunicadas, para su registro, al Director General de la Oficina Internacional del Trabajo. Artículo 15 1. Este Convenio obligará únicamente a aquellos Miembros de la Organización Internacional del Trabajo cuyas ratificaciones haya registrado el Director General de la Oficina Internacional del Trabajo. 2. Entrará en vigor doce meses después de la fecha en que las ratificaciones de dos Miembros hayan sido registradas por el Director General. 3. Desde dicho momento, este Convenio entrará en vigor, para cada Miembro, doce meses después de la fecha en que haya sido registrada su ratificación. Artículo 16 1. Todo Miembro que haya ratificado este Convenio podrá denunciarlo a la expiración de un período de diez años, a partir de la fecha en que se haya puesto inicialmente en vigor, mediante un acta comunicada, para su registro, al Director General de la Oficina Internacional del Trabajo. La denuncia no surtirá efecto hasta un año después de la fecha en que se haya registrado. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 248 NOTAS E COMENTÁRIOS 2. Todo Miembro que haya ratificado este Convenio y que, en el plazo de un año después de la expiración del período de diez años mencionado en el párrafo precedente, no haga uso del derecho de denuncia previsto en este artículo, quedará obligado durante un nuevo período de diez años, y en lo sucesivo podrá denunciar este Convenio a la expiración de cada período de diez años, en las condiciones previstas en este artículo. Artículo 17 1. El Director General de la Oficina Internacional del Trabajo notificará a todos los Miembros de la Organización Internacional del Trabajo el registro de cuantas ratificaciones, declaraciones y actas de denuncia le comuniquen los Miembros de la Organización. 2. Al notificar a los Miembros de la Organización el registro de la segunda ratificación que le haya sido comunicada, el Director General llamará la atención de los Miembros de la Organización sobre la fecha en que entrará en vigor el presente Convenio. Artículo 18 El Director General de la Oficina Internacional del Trabajo comunicará al Secretario General de las Naciones Unidas, a los efectos del registro y de conformidad con el artículo 102 de la Carta de las Naciones Unidas, una información completa sobre todas las ratificaciones, declaraciones y actas de denuncia que haya registrado de acuerdo con los artículos precedentes. Artículo 19 Cada vez que lo estime necesario, el Consejo de Administración de la Oficina Internacional del Trabajo presentará a la Conferencia una memoria sobre la aplicación del Convenio, y considerará la conveniencia de incluir en el orden del día de la Conferencia la cuestión de su revisión total o parcial. Artículo 20 1. En caso de que la Conferencia adopte un nuevo convenio que implique una revisión total o parcial del presente, y a menos que el nuevo convenio contenga disposiciones en contrario: a) la ratificación, por un Miembro, del nuevo convenio revisor implicará, ipso jure, la denuncia inmediata de este Convenio, no obstante las disposiciones contenidas en el artículo 16, siempre que el nuevo convenio revisor haya entrado en vigor; b) a partir de la fecha en que entre en vigor el nuevo convenio revisor, el presente Convenio cesará de estar abierto a la ratificación por los Miembros. 2. Este Convenio continuará en vigor en todo caso, en su forma y contenido actuales, para los Miembros que lo hayan ratificado y no ratifiquen el convenio revisor. Artículo 21 Las versiones inglesa y francesa del texto de este Convenio son igualmente auténticas. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 249 NOTAS E COMENTÁRIOS Relatório do Excelentíssimo Senhor Ministro Gelson de Azevedo ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO 88a. CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DO TRABALHO RELATÓRIO 1. Integrante da Delegação brasileira que compareceu à 88a. Conferência Internacional do Trabalho, na cidade de Genebra, Suíça, na qualidade de observador, cumpre-me informar a essa colenda Corte o quanto segue. 2. A citada conferência foi realizada no período de 30 de maio a 15 de junho de 2000. Para presidi-la foi eleito, por aclamação, o Sr. ALBERTO FLAMARIQUE, Ministro do Trabalho da Argentina, que, em brilhante alocução, destacou ser tarefa de todos os interlocutores sociais - e não apenas dos governos, por meio de políticas públicas -, a responsabilidade pela consecução de medidas objetivando prover trabalho e segurança social dignos para todos, isto é, pela implantação de relações sociais que ponham fim às incertezas e desigualdades hoje existentes, que decorrem da nova ordem econômica mundial da globalização imposta pelo desenvolvimento tecnológico. 3. Constituíram-se, a seguir, as seguintes Comissões de trabalho: I - Comissão de Proposições II - Comissão de Questões Financeiras III - Comissão de Aplicação de Normas IV - Comissão da Convenção e da Recomendação sobre a Proteção à Maternidade V - Comissão do Desenvolvimento de Recursos Humanos VI - Comissão da Segurança e Saúde na Agricultura VII - Comissão de Resoluções Ato contínuo, o Presidente do Conselho de Administração da Conferência apresentou informe relativo ao período 1999/2000, em que, dentre outros temas relevantes, destacou os bons resultados que vem obtendo a campanha realizada pelo Diretor-Geral em favor da ratificação e da promoção das Convenções fundamentais da OIT, a qual, até então, havia registrado cento e sessenta e sete (167) novas ratificações desses instrumentos internacionais; referiu-se, ainda, à análise da política e atividades da OIT relativas às crises econômicas e financeiras e também à sua estratégia e atividades pertinentes aos problemas sociais e de emprego em situações de crise. 4. Nos dias subseqüentes, outras manifestações de relevo ocorreram, a saber: I - do Exmo. Sr. Presidente da República Portuguesa Dr. JORGE FERNANDO BRANCO DE SAMPAIO, de cujo pronunciamento podem ser destacadas as seguintes idéias: Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 250 NOTAS E COMENTÁRIOS a) que a mundialização dos mercados, o incremento do poder das empresas transnacionais e a revolução das tecnologias da informação e da comunicação criaram oportunidades de desenvolvimento sem precedentes, mas também agravaram a situação de desigualdade de imensas regiões do mundo e de populações inteiras; b) que regras, sistemas e organizações aos quais a história reconhece papel decisivo na promoção e defesa dos valores da dignidade humana e da solidariedade social correm sérios riscos e ameaças; c) que o denominado determinismo econômico e tecnológico, pelo qual a ética social deve sacrificar-se à competitividade empresarial e à especulação financeira, pode e deve ser superado pela intervenção do poder público e das organizações internacionais, assegurando-se a efetividade dos direitos civis e políticos e, assim, o fim das desigualdades mencionadas; d) que não há razão para que a estética, a técnica e a ética continuem sendo momentos estanques da vida. Antes, podem unir-se em magnífico laço solidário, num movimento de tomada de consciência da opinião pública internacional acerca das desigualdades, da injustiça e da exclusão, para que, no mundo do trabalho, se realize de forma plena a extraordinária capacidade humana de criação e progresso. II - do Exmo. Sr. Presidente da Conferência Sr. ALBERTO FLAMARIQUE, ao assinalar: a) que a grande tarefa da comunidade internacional é a salvaguarda da paz, que passa, necessariamente, pela realização da justiça social; b) que a racionalidade e uma ética social humanista são os instrumentos mais idôneos para conseguir que a mundialização tenha um rosto realmente humano e possa superar as crescentes desigualdades que se estão produzindo”; c) que “os sindicatos devem compreender que o imobilismo e os velhos esquemas devem dar lugar a essa racionalidade e a essa ética, abandonando estratégias inúteis de confrontação, e adquirir a maturidade que a sociedade reclama através de um diálogo e de um concerto permanente” (...). III - do Exmo. Sr. JUAN SOMAVIA, Secretário-Geral da Conferência, ao destacar: a) que a busca por trabalho digno para todos é de responsabilidade da sociedade na sua totalidade - das empresas, dos trabalhadores, das organizações, dos governos, dos dirigentes políticos e sociais e dos cidadãos; b) que o critério para determinar o êxito das políticas de mundialização não pode ser apenas o do crescimento ou do benefício financeiro, mas também o de saber- se se a economia mundializada responde às necessidades das pessoas; c) que os mercados não são forças da natureza irreversíveis, mas mecanismos sociais imperfeitos que podem ser ajustados para servir melhor às necessidades humanas. Para tanto, requerem soluções radicalmente novas ante os problemas globais da pobreza extrema e dos trabalhadores pobres; Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 251 NOTAS E COMENTÁRIOS d) que “é necessário adotar políticas impregnadas de maior sensibilidade social, mas também é imprescindível que o sistema multilateral assuma uma metodologia mais integrada a fim de que suas organizações deixem de se comportar como atores independentes”; e) que a ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO, por sua vez, como defensora do trabalho digno, está vocacionada para constituir-se em orientadora do pensamento a serviço da comunidade internacional, ademais de possuir potencial incomparável, no mundo, para participar desse empreendimento e resolver tão grandioso problema; IV - do Exmo. Sr. FRANCISCO DORNELLES, Ministro do Trabalho brasileiro, ao enfatizar: a) que a criação e manutenção de condições favoráveis ao desenvolvimento são condições fundamentais para o êxito de uma política de valorização do trabalhador; b) que é prioridade no Programa de Ação do Governo Federal o aumento do número de admissões ao mercado, o fortalecimento sistemático das políticas de fomento do emprego e de capacitação de recursos humanos, assim como o aperfeiçoamento contínuo dos mecanismos de proteção do trabalhador em matéria de saúde e segurança; que tais prioridades vêm sendo atingidas mediante um conjunto de ações sociais, como o seguro desemprego; as bonificações sociais; os programas de geração de empregos e admissões; o Plano de Qualificação Profissional - conduzido pelo Governo Federal em associação com os Estados e as centrais sindicais; os programas de fiscalização e de combate ao trabalho escravo e de erradicação do trabalho infantil; a modernização da legislação trabalhista, baseada na promoção dos direitos coletivos e da via coletiva para a solução dos conflitos de trabalho, de que são exemplo as Comissões de Conciliação Prévia; c) que, no âmbito do Mercosul, o Governo brasileiro comprometeu-se também com o aperfeiçoamento do processo de adoção de decisões concertadas sobre assuntos laborais; d) que o Governo brasileiro foi um dos primeiros a ratificar a Convenção n. 182, que trata das distorções do trabalho infantil e das formas para sua erradicação, ademais de ser favorável à ampliação do período de licença-maternidade para 17 semanas, tema da 88a. Conferência. 5. Sem prejuízo da assistência ao trabalho de outras Comissões, acompanhei de forma intensiva as atividades de duas, a saber: I - Comissão de Revisão das Normas sobre Proteção à Maternidade. Partiu a citada Comissão do pressuposto da necessidade de: a) revisar a Convenção e a Recomendação correspondentes, como forma de seguir promovendo, cada vez mais, a igualdade de todas as mulheres integrantes da força de trabalho, a saúde e a segurança da mãe e da criança; Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 252 NOTAS E COMENTÁRIOS b) reconhecer a diversidade do nível de desenvolvimento sócio-econômico dos Estados membros, assim como a diversidade das empresas e a evolução da proteção à maternidade na legislação e prática nacionais; c) garantir a igualdade de oportunidades e de tratamento para trabalhadores e trabalhadoras, particularmente em relação àqueles com responsabilidade familiar; d) oferecer proteção à gravidez, como responsabilidade compartilhada de governo e sociedade. Concluiu a Comissão por estabelecer a Convenção sobre Proteção à Maternidade, 2000, cujo texto, por ter sido publicado, deixo de agora reproduzir, sem prejuízo de algumas considerações críticas, a saber: a) no artigo 1o, embora se refira à expressão “filho” como “todo filho, sem nenhuma discriminação”, não se contempla, pelo menos de forma expressa, os filhos adotados; b) no artigo 2o, utiliza-se a expressão “problemas especiais de particular importância”, inequivocamente genérica, como possível causa de exclusão das garantias em relação a categorias limitadas de trabalhadoras; c) no artigo 6°.3, permite-se que a remuneração do período de afastamento decorrente de gravidez ou parto seja inferior (no mínimo 2/3) àquela até então percebida, independentemente da liquidez do respectivo sistema de seguridade social e da situação de sua economia. No mesmo sentido e de forma complementar, editou a Recomendação sobre a Proteção à Maternidade, 2000, na qual se preconiza, dentre outras diretrizes: a) extensão da garantia de afastamento do trabalho, por motivo de gravidez e parto, de 14 semanas para 18 semanas, pelo menos; b) garantia de remuneração, no período de afastamento, igual àquela anteriormente percebida no período de trabalho; c) custeio das prestações devidas em decorrência das garantias estabelecidas na Convenção, pelos empregadores e empregados ou exclusivamente por aqueles, calculadas proporcionalmente ao número de empregados, sem distinção de sexo; d) garantia ao pai, no caso de falecimento, de enfermidade ou de hospitalização da mãe, de licença para afastamento por período igual ao que faltava para completar o lapso de afastamento de licença da mãe. II - Comissão de Aplicação de Normas. Dentre as diversas manifestações ocorridas durante os trabalhos dessa Comissão, deve ser destacada a reiteração da queixa realizada pela representação dos trabalhadores brasileiros, de violação da Convenção n. 111, sobre discriminação no emprego, por motivo de sexo, cor e origem étnica. Sustentou-se, na ocasião, que muito pouco havia sido realizado pelas autoridades brasileiras com vistas à eliminação ou redução das práticas discriminatórias mencionadas. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 253 NOTAS E COMENTÁRIOS A representação do Governo brasileiro, ainda que de forma aparentemente improvisada e “afetiva”, ou seja, “não técnica” - expressões efetivamente utilizadas -, ofereceu defesa, relatando as inúmeras iniciativas e práticas adotadas, diretamente ou com a cooperação do Ministério Público e de entidades sindicais, com o escopo de por fim aos poucos casos, embora significativos, de discriminação de que teve conhecimento. O parecer da Comissão foi no sentido de que o relato apresentado pela defesa acerca dos procedimentos governamentais não veio acompanhado de dados estatísticos e de comprovação de atingimento de resultados, estes, sim, do interesse da OIT, para a consecução de seus objetivos. 6. Conclusivamente, pode-se dizer que os ideais que levaram à criação de tuna Organização Internacional do Trabalho, como instrumento apto a dar continuidade às primeiras iniciativas pertinentes à universalização do Direito do Trabalho (OWEN, em 1815; DANIEL LEGRAND, LOUIS BLANQUI, J. SIMON e WOLOWSKI, em 1856, no Congresso Internacional de Beneficência, em Londres; ALBERTO DL MUND, em 1884, na Câmara Legislativa francesa; Guilherme II, em 1889, em Berlim, ao convocar a primeira Conferência Internacional para Estudo das Questões Operárias, realizada em 1890; a fundação da Associação Internacional para a Proteção Legal dos Trabalhadores, na Basiléia, em 1901; as conferências sobre problemas do trabalho realizadas em 1905, 1906 e 1913; o Pacto das Nações, objetivando a paz universal baseada na justiça social) foram mais uma vez realizados na 88a. Conferência Internacional do Trabalho. Para tanto, contribuíram de forma decisiva a posição altaneira e imparcial da ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO na sua luta pela preservação da paz social e da dignidade do trabalhador e a atuação denodada dos cerca de três mil participantes desse prestigiado encontro. Brasília, julho de 2000. GELSON DE AZEVEDO Ministro do TST Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 254 COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO TEM NOVO PRESIDENTE Por designação do Tribunal Pleno, o ministro, José Luciano de Castilho Pereira passou a integrar a Comissão de Jurisprudência e de Precedentes Normativos, desvinculando-se, em conseqüência, da Comissão de Documentação, responsável pela publicação desta Revista - da qual era o Presidente. Com a saída do ministro Luciano, a presidência da Comissão de Documentação passou a ser exercida pelo ministro João Oreste Dalazen, e a vaga aberta foi ocupada pelo ministro Antônio José Barros Levenhagen. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 255 MINISTRO DO TST TORNA-SE DOUTOR No dia 11 de setembro último, na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, o Ministro CARLOS ALBERTO REIS DE PAULA defendeu tese de doutorado sob o título “A especificidade do ônus da prova no processo do trabalho”. A tese foi aprovada com nota dez (10) com louvor, sendo a banca examinadora composta pelos Professores Doutores Aroldo Plínio Gonçalves (orientador), José Alfredo de Oliveira Baracho, Alberto Deodato Maia Barreto Filho, Manoel Galdino da Paixão Júnior e Márcio Túlio Viana. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 256 JURISPRUDÊNCIA AÇÃO RESCISÓRIA. CABIMENTO O acórdão do TST reconheceu a legitimidade do Sindicato e condenou o autor ao pagamento das diferenças salariais pela aplicação das URPs de abril e maio de 1988. Houve recurso extraordinário para o STF apenas quanto ao plano econômico, o qual foi conhecido e provido para limitar a condenação nos termos da jurisprudência daquela Corte. Assim, não pode agora a parte ajuizar rescisória neste Tribunal para discutir apenas a substituição processual. Ação julgada extinta, sem julgamento do mérito. PROCESSO N° TST-AR-436.123/98 - (Ac. SBDI 2) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Ação Rescisória n° TST-AR436.123/98, em que é autor Banco do Brasil S/A e réu Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários do Rio Preto. RELATÓRIO Banco do Brasil S/A propôs ação rescisória contra o Sindicato dos Estabelecimentos Bancários de São José do Rio Preto, pretendendo rescindir o Acórdão n° 5.612/91, proferido pela 3a Turma deste egrégio Tribunal, nos autos do Recurso de Revista n° 5371/90.6 (fls. 145/148). Sustenta o autor que a decisão rescindenda, ao reconhecer a legitimidade do Sindicato como substituto processual, violou os arts. 872, parágrafo único, da CLT e 8°, III, da Carta Magna. Alega que a Lei n° 7.238/84, na qual se baseou o acórdão rescindendo, foi revogada pelo Decreto-Lei n° 2.284/86, não tendo sido restabelecido, em qualquer outra oportunidade, o dispositivo que autorizava o sindicato a atuar como substituto processual. Colaciona julgados desta Corte neste sentido. O réu apresentou contestação às fls. 360/363. Por se tratar de matéria de direito, não foram produzidas provas, tendo sido encerrada a instrução. Razões finais apresentadas pelo banco às fls. 367/370, e pelo sindicato às fls. 372/373. Parecer da douta Procuradoria-Geral pela não-admissão da ação (fl. 377). VOTO A rescisória foi proposta dentro do prazo de 2 (dois) anos. A certidão do trânsito em julgado da decisão rescindenda está à fl. 18 e a procuração às fls. 16/17. A decisão que se pretende rescindir é do Acórdão n° 5612/91, proferido pela 3a Turma desta Corte, no julgamento do Recurso de Revista n° TST-RR-5371/90.6 (fls. 145/148). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 259 JURISPRUDÊNCIA Tal decisão confirmou o acórdão regional que reconhecera a legitimidade do sindicato - autor da reclamatória trabalhista - para postular como substituto processual os reajustes salariais da categoria, com base no art. 3o, § 2o, da Lei n° 7.238/84. O autor invoca como violados os arts. 8o, III, da Constituição Federal e 872, parágrafo único, da CLT. Ocorre, entretanto, que o pedido formulado é juridicamente impossível. Do exame dos autos verifico que o ora autor se utilizou de todos os recursos subseqüentes cabíveis, inclusive o extraordinário. Ao Supremo Tribunal Federal foi devolvida somente a matéria relativa às URPs de abril e maio de 1989, não se tendo discutido a substituição processual, fl. 281. Ora, havendo um acórdão do Supremo em relação ao mérito da causa, como pode uma rescisória desconstituir uma decisão desta Corte relativa à legitimidade do Sindicato e, em conseqüência, tornar sem efeito uma decisão daquele Tribunal? Entendo, assim, que a presente ação deve ser extinta, sem julgamento do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido. A vista do exposto, extingo o processo, sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, VI, do CPC. Isto posto, Acordam os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, julgar extinto o processo sem julgamento do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido, nos termos do artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil. Brasília, 08 de agosto de 2000. Ursulino Santos Filho, Vice-Presidente no exercício da Presidência. José Luciano de Castilho Pereira, relator. AÇÃO RESCISÓRIA. URPS DE ABRIL E MAIO/1988 Ação rescisória. URPs de abril e maio/88. Possibilidade de limitação da condenação à data base apenas em execução. A limitação da condenação ao pagamento das URPs deferidas decorre de norma cogente atinente à política salarial (Decreto-Lei n° 2.425/88, art. 5°), de ordem pública, cuja observância, portanto, não pode ser olvidada pelo juízo executório. Se a sentença exeqüenda foi silente sobre a questão, a limitação pode e deve ser efetuada pelo juízo executório, restando incólume a coisa julgada, que só seria tisnada se a sentença exeqüenda houvesse expressamente afastado a limitação à data base. Recurso ordinário a que se dá provimento. PROCESSO N° TST-ROAR-607.329/99 - (Ac. SBDI 2) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 260 JURISPRUDÊNCIA Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário em Ação Rescisória n° TST-ROAR-607.329/99, em que é recorrente Banco do Brasil S.A. e recorrido Sindicato dos Bancários e Financiários de Alagoas. O 19° Regional ao apreciar a ação rescisória patronal rejeitou a preliminar de carência de ação argüida pelo reclamante réu, por entender que: a) a decisão prolatada em embargos à execução é uma modalidade de sentença e, portanto, rescindível; e b) o fato de se postular a anulação de duas sentenças, por si só, não é suficiente para inviabilizar a via rescisória, sendo apenas necessário haver a unicidade do juízo rescindendo (fls. 286-287). De outra parte, aquele Regional julgou improcedente o pedido da ação rescisória do reclamado autor, aos seguintes fundamentos: a) não houve, na decisão rescindenda, qualquer menção aos dispositivos legais alegadamente violados, carecendo, portanto, de prequestionamento: b) a sentença exeqüenda não determinou que se procedesse à limitação à data base, o que impede que seja estabelecida em execução, sob pena de ofensa à coisa julgada; e c) não se configurou o alegado erro de fato, sendo a hipótese de estrito cumprimento de decisão exeqüenda transitada em julgado. Inconformado, o reclamado autor interpõe recurso ordinário, reiterando o pedido para desconstituir decisão homologatória de cálculos e/ou sentença de embargos à execução, ao argumento de que tais decisões, ao acatarem a inserção da verba denominada de URPs de abril, maio e junho/88, posteriormente à data base da categoria bancária, violaram os arts. 8° e 9°, parágrafo único, do Decreto-Lei n° 2.335/87,1°, 2° e 5° do Decreto-Lei n° 2.425/88 e 5°, II e XXXVI, da Constituição Federal, na medida em que a limitação à data base da categoria decorre do próprio texto legal que instituiu as referidas URPs (fls. 293-310). Admitido o recurso (fl. 314), foram apresentadas contra-razões (fls. 316-330), tendo o Ministério Público do Trabalho, em parecer da lavra da Dra. Heloísa Ma Moraes Rego Pires, opinado pelo conhecimento e não provimento do recurso ordinário (fls. 335-337). É o relatório. VOTO CONHECIMENTO O recurso é tempestivo (fl. 313), tem representação regular (fls. 19 e 20) e encontra-se devidamente preparado (fl. 311), merecendo, assim, conhecimento. Rev. TST, Brasília, vol 66, nº 3, jul/set 2000 261 JURISPRUDÊNCIA MÉRITO DECISÃO RESCINDENDA. CARÊNCIA DE AÇÃO O reclamante réu aduz, em contra-razões, haver impossibilidade jurídica ou carência de ação, na medida em que o Autor requer a rescisão de mais de uma sentença. Ocorre, porém, que, na inicial, o autor requer a rescisão da decisão de homologação de cálculo ou da decisão que julgou os embargos à execução, sendo que tais decisões versam sobre a mesma matéria. A hipótese, portanto, é de pedido em ordem sucessiva, prevista no art. 289 do CPC. Não há, pois, carência de ação. DECISÃO RESCINDENDA. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO DE RESCISÃO DA SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE CÁLCULO O reclamante réu, em contra-razões, argúi a impossibilidade jurídica do pedido de rescisão da sentença homologatória de cálculo. A decisão homologatória dos cálculos, na hipótese (fl. 76v.), não é rescindível, por se tratar de simples homologação de cálculo, inexistindo juízo explícito sobre a exatidão do débito. Assim, decisão rescindenda é aquela que apreciou os embargos à execução do reclamado autor (fl. 124), proferida pela Junta de Conciliação e Julgamento de Arapiraca, Alagoas, no processo de execução da sentença de fls. 37 a 42. TRÂNSITO EM JULGADO. DECADÊNCIA O réu, em contra-razões, aduz ter ocorrido a decadência. O trânsito em julgado da decisão que julgou os embargos à execução ocorreu em 06.02.98, conforme certidão de fl. 239. A ação rescisória foi ajuizada em 02.03.99, portanto, dentro do prazo decadencial estabelecido no art. 495 do CPC. FUNDAMENTOS DA RESCISÓRIA A ação rescisória ajuizada pelo Reclamado veio calcada nos incisos V (violação de lei) e IX (erro de fato) do art. 485 do CPC. Os dispositivos que a Autora pretende violados são os arts. 832, 884 e 897, a, da CLT, 93, IX, e 5°, XXXV, LIV e LV, da Constituição Federal, por falta de fundamentação da decisão rescindenda, bem como os arts. 1°, 2° e 5° do Decreto-Lei n° 2.425/88, 5°, II e XXXVI, da Constituição Federal, 8° e 9°, parágrafo único, do Decreto-Lei n° 2.335/87, sob o argumento de que a decisão rescindenda não poderia acatar a inserção da verba denominada URPs, de abril, maio e junho/88, posteriormente à data base da categoria bancária, na medida em que a limitação à data base da categoria decorre do próprio texto legal que instituiu as referidas URPs. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 262 JURISPRUDÊNCIA Quanto ao erro de fato, o autor aduz que a decisão rescindenda, ao deixar de limitar a condenação à data base, admitiu fato inexistente, por diverso daquele legalmente conhecido. PREQUESTIONAMENTO O recorrido, em contra-razões, aduz ser aplicável, na hipótese, a Súmula n° 298 deste Tribunal. A decisão rescindenda, apesar de não se referir expressamente aos dispositivos legais indicados como violados nesta rescisória, analisou a matéria ora em debate, acerca da possibilidade de imposição da limitação à data base em execução, quando não houver, na decisão exeqüenda, nenhuma consideração quanto à aplicação, ou não, da limitação da condenação à data base da categoria. Portanto, afasto a incidência da Súmula n° 298 sobre a hipótese, com base na Orientação Jurisprudencial n° 118 da SDI. CONTROVÉRSIA O recorrido pretende aplicável à rescisória patronal o óbice das Súmulas n°s 83 deste Tribunal e 343 do STF. A questão, porém, envolve discussão em torno de dispositivo constitucional (art. 5°, II e XXXVI, da Constituição), o que afasta a aplicabilidade das Súmulas n°s 83 do TST e 343 do STF como óbice à procedência da ação rescisória, nos termos da jurisprudência pacífica do STF. VIOLAÇÃO LITERAL DE DISPOSITIVO DE LEI A limitação da condenação ao pagamento das URPs deferidas decorre de norma cogente atinente à política salarial (Decreto-Lei n° 2.425/88, art. 5°), de ordem pública, cuja observância, portanto, não pode ser olvidada. Ainda que a sentença exeqüenda tenha sido omissa sobre a questão, a limitação deve ser efetuada pelo juízo executório. Assim, não há que se falar em omissão da sentença exeqüenda ou preclusão do direito da parte, na medida em que a aplicação da norma em comento decorre de sua natureza de preceito de ordem pública, que não admite afastamento pelo julgador, uma vez que lhe cabe aplicá-lo de ofício. Tal preceito poderia ser afastado na execução se a sentença exeqüenda o tivesse afastado expressamente, como não incidente sobre a espécie, pois nesse caso prevaleceria a coisa julgada sobre a lei. No entanto, tal não ocorreu. Assim, em face da violação do princípio da legalidade, insculpido no art. 5°, II, da Constituição Federal, dou provimento ao recurso ordinário para, julgando procedente a ação rescisória, desconstituir o acórdão rescindendo e, em juízo rescisório, Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 263 JURISPRUDÊNCIA proferindo novo julgamento, limitar a condenação constante do título executivo à data base da categoria. Isto posto, Acordam os Ministros da Egrégia Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, dar provimento ao recurso ordinário para, julgando procedente a ação rescisória, desconstituir o v. acórdão rescindendo e, em juízo rescisório, proferindo novo julgamento, limitar a condenação constante do título executivo à data base da categoria. Brasília, 22 de agosto de 2000. Ursulino Santos Filho, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Ives Gandra da Silva Martins Filho, relator. AÇÃO RESCISÓRIA. LITISPENDÊNCIA Ocorrência em relação ao pedido principal deduzido em ação anterior. Não configuração relativamente ao subsidiário deduzido na ação ajuizada posteriormente, por conta do disposto no art. 289 do CPC. Recurso parcialmente provido. PROC. N° TST-ROAR-424.830/1998 - (Ac. SBD1 2) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário em Ação Rescisória n° TST-RO-AR-424.830/98, em que é recorrente Banco Brasileiro e Comercial S.A. - BBC e recorrido Paulo Sérgio de Oliveira Souza. A egrégia 5a Corte Regional, pelo venerando acórdão de fls. 192/194, apreciando a ação rescisória proposta por Banco Brasileiro e Comercial S. A. - BBC, acolheu preliminar de litispendência formulada em contra-razões e pelo Ministério Público, extinguindo o processo sem julgamento do mérito. O banco manifesta recurso ordinário, pretendendo a reforma do julgado mediante a argumentação deduzida nas razões de fls. 196/200. O recurso foi admitido pelo respeitável despacho de fls. 202. O réu apresentou contra-razões às fls. 203/204. A douta Procuradoria-Geral do Trabalho opina pelo não provimento do recurso (fls. 208/209) É o relatório. VOTO Fundamentou-se o acolhimento da preliminar de litispendência na circunstância de o autor desta rescisória estar reproduzindo ação anteriormente proposta contra o mesmo réu, autuada no âmbito daquela Corte sob o n° 801.95.0054-72. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 Jul/set 2000 264 JURISPRUDÊNCIA Assentou o Colegiado que as duas ações são idênticas, exceto pelo fato de que na primeira, a pretensão desconstitutiva está acompanhada tão-somente de novo julgamento da demanda trabalhista no sentido de improcedência das parcelas referentes ao IPC de junho/87 e URP de fevereiro/89, enquanto nesta, além deste, há pedido sucessivo no sentido da limitação da condenação alusiva às mencionadas parcelas à data base subseqüente da categoria. Concluiu a egrégia Corte a qua que o pedido sucessivo desta demanda encontra-se contido naquele de novo julgamento da causa, não traduzindo, assim, uma diversidade de elementos com relação a ambas as ações. Registrou, ainda, que nada impede que na primeira rescisória seja parcialmente acolhido o pedido apenas para excluir da condenação os valores concedidos posteriormente à data base da categoria. Nas razões em exame procura o autor demonstrar o desacerto da conclusão regional, afirmando que jamais se poderia concluir na primeira ação rescisória pela limitação das parcelas à data base subseqüente porque lá não fora formulada tal pretensão. Insiste na tese de que está descaracterizada a litispendência na hipótese haja vista a diferença de pedidos existente entre as ações. Aqui se engana o recorrente ao insistir na diversidade dos pedidos deduzidos nesta ação e dos que o foram na ação anterior, invocando o fato de que lá os deduzira de forma simples e aqui o fizera sob a égide da cumulação sucessiva de pretensões. Isso pela evidência de os pedidos principais formulados em ambas ações se mostrarem idênticos, detalhe pelo qual assoma a certeza da listispendência tópica pelo concurso dos requisitos suplementares da identidade de causa de pedir e de partes. Na realidade, salientado a ocorrência inconcussa da litispendência em relação aos pedidos principais, a controvérsia cinge-se à indagação se ela se operaria somente em relação a eles ou se estenderia para alcançar o pedido subsidiário. O Regional entendeu que sim porque o pedido sucessivo estaria embutido nas pretensões formuladas na ação precedente, de sorte que admitido o corte rescisório da decisão rescindenda abrir-se-ia para o Regional a possibilidade de deliberar sobre a pretensão de se limitar a sanção jurídica à data base da categoria. Esse posicionamento, no entanto, contraria tanto o art. 293 do CPC, de os pedidos serem interpretados restritivamente pelo que o juízo rescisório da ação anterior se encontra jungido à procedência ou à improcedência da reclamação, quanto o art. 289 do CPC, ao dispor sobre a possibilidade de o juiz conhecer do posterior em não podendo acolher o anterior. Do cotejo das normas em pauta se constata, de um lado, a impossibilidade jurídica de se deliberar sobre pretensão sucessiva não formulada na ação anterior, por conta da proibição do julgamento extra petita, e de outro a presença do requisito legal para conhecimento da pretensão subsidiária concernente à materialização da litispendência em relação ao pedido principal, o inabilitando à cognição da Corte. Desse modo, confinada a litispendência ao pedido principal, dever-se-ia dar prosseguimento à ação para exame do pedido subsidiário, cuja peculiaridade dele não Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 265 JURISPRUDÊNCIA ter a mesma amplitude do pedido da ação precedente atrairia a aplicação dos artigos 104 e 105 do CPC. Ignorando, contudo, a fase processual em que se encontra a rescisória ajuizada anteriormente, a impedir a Corte de decidir em conformidade com as normas em pauta, cabe apenas alertar o Colegiado para a incidência do art. 265, letra a, do CPC na hipótese de ter sido decidida aquela ação de cujo acórdão tenha havido interposição de Recurso. Nesse caso, será forçosa a suspensão deste processo, a fim de que, dependendo do desfecho dado à rescisória anterior, se delibere sobre a pretensão subsidiária, quer para apreciá-la, quer para reputá-la prejudicada. Do exposto, dou provimento parcial ao recurso para restringir a litispendência ao pedido principal, determinando a baixa dos autos para prosseguimento da ação para exame do pedido subsidiário, observada a recomendação lavrada na fundamentação. Isto posto, Acordam os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, dar provimento parcial ao Recurso Ordinário para, restringindo a litispendência ao pedido principal, determinar a baixa dos autos ao egrégio Tribunal Regional do Trabalho de origem, para prosseguimento da ação para exame do pedido subsidiário, observada a recomendação lavrada na fundamentação. Brasília, 02 de maio de 2000. Ursulino Santos Filho, Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho no exercício da Presidência. Antônio José de Barros Levenhagen, relator. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. EVENTUALIDADE. FERROVIÁRIO. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. EVENTUALIDADE O trabalhador de estação ferroviária, que exerce meramente atividade de controle, sem o efetivo manuseio com o elemento perigoso não faz jus ao adicional de periculosidade, porque o risco que corre é o mesmo que qualquer outro indivíduo em seu normal de vida e em face da eventualidade da exposição. Recurso de revista a que se dá provimento. PROCESSO N° TST-RR-451.402/98 Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista PROCESSO n° TST-RR-451.402/98, em que são recorrentes Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA e Ferroviária Novoeste S.A. e recorrido Edson Ferreira da Silva. Inconformadas com o venerando acórdão do egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 24a Região, prolatado às fls. 470/475, interpõem as reclamadas recurso de revista. A Rede Ferroviária Federal S.A., às fls. 482/489 e Ferroviária Novoeste S. A., às fls. 509/517, com base nas alíneas a e c do artigo 896 da CLT. Rev. TST, Brasília, vol, 66, nº 3, jul/set 2000 266 JURISPRUDÊNCIA Ambas as reclamadas insurgem-se quanto à condenação no pagamento do adicional de periculosidade de 30%, calculado na forma do § 1o da CLT, observada a prescrição qüinqüenal. Sustentam violação do artigo 193 da CLT e divergência jurisprudencial, sob o entendimento de que o contato com combustível se deu de forma eventual e que o reclamante não exercia qualquer atividade ou operação considerada perigosa. O recurso foi admitido pelo respeitável despacho de fl. 591, e oferecidas contra- razões às fls. 572/599. Sem remessa dos autos à d. Procuradoria Geral, nos termos do artigo 113, II, do RITST. É o relatório. VOTO RECURSOS DE REVISTA DA REDE FERROVIÁRIA FEDERAL S.A. E DA FERROVIÁRIA NOVOESTE S.A. O recurso da RFFSA é tempestivo (certidão de fl. 480, dia 30/01/98 e protocolo de fl. 482, dia 09.02.98), houve correto preparo (custas e depósito da condenação efetuados pela segunda reclamada) e o subscritor da petição está regularmente legitimado (procuração de fl. 142). O recurso da Ferrovia Novoeste S.A. é tempestivo (certidão de fl. 480, dia 31.01.98 e protocolo de fl. 509, dia 09.02.98), houve correto preparo (custas e depósito da condenação às fls. 590 e 589, respectivamente) e o subscritor da petição está regularmente legitimado (procuração de fl. 21). CONHECIMENTO Em face da identidade do tema recursal, analisa-se em conjunto os recursos interpostos, em decorrência do princípio da economia processual. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE Com relação ao tema epigrafado, decidiu o Regional dar provimento ao recurso ordinário do reclamante para condenar a reclamada no pagamento do adicional de periculosidade, no percentual de 30%, calculado na forma do § 1o do artigo 193 da CLT, observada a prescrição qüinqüenal, sob o fundamento de que o laudo pericial concluiu que o recorrente trabalhava sob condições perigosas, nos termos da NR-16, exposto que estava exposto a incêndios e explosões em vagões-tanque. Firmou o seguinte, ao invocar a pertinência do disposto no Precedente n° 5 da SDI do TST: “Dá-se prevalência, aqui, data venia, ao laudo oficial, cabendo ressaltar que mesmo o perito assistente indicado pela recorrida, chegando a conclusão Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 267 JURISPRUDÊNCIA diferente quanto à periculosidade, confirma que pelas estações onde o recorrente trabalhava passavam diariamente 06 (seis) comboios de vagões-tanque (fls. 353). Assim, outra não é a conclusão senão a que reconhece o inegável risco de vida a que estava sujeito o recorrente. A prova dá conta, ainda, de que não se trata, no caso, de contato eventual, mas intermitente, com inflamáveis ou explosivos.” Nas revistas, alegam as reclamadas violação do artigo 193 da CLT e divergência jurisprudencial, sob o entendimento de que o contato com combustível se deu de forma eventual e/ou que o reclamante não exercia atividade considerada perigosa. Não há falar em violação do artigo 193 da CLT, ante as disposições do Enunciado n° 221 do TST, todavia, conheço por divergência jurisprudencial, dada a eventualidade da exposição. PROVIMENTO No caso dos autos, o reclamante trabalhava em estação ferroviária por onde passavam um média de seis comboios ao dia carregando combustível, numa espécie de atividade de controle, sem o efetivo contato ou manuseio com o elemento perigoso. O risco portanto, é o mesmo que qualquer indivíduo corre no seu normal de vida, e não o total como dito pelo Regional. Entendo que o pedido é improcedente. Ante o exposto, dou provimento ao recurso de revista para julgar improcedente o pedido relativamente ao adicional de periculosidade. Isto posto, Acordam os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, conhecer do recurso por divergência jurisprudencial e, no mérito, dar- lhe provimento para julgar improcedente o pedido de adicional de periculosidade. Brasília, 26 de abril de 2000. José Luiz Vasconcellos, presidente e relator. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ULTRATIVIDADE DA NORMA COLETIVA Tendo a empresa e o sindicato profissional pactuado que se procederia à perícia técnica para identificar as áreas de risco, em função das quais seriam pagos os adicionais de periculosidade, nos percentuais correspondentes ao tempo de exposição, alcançando quer os empregados admitidos anteriormente, quer os que o fossem posteriormente, depara-se com o consentido efeito ultrativo conferido à cláusula coletiva, insuscetível de ser infirmado à sombra do art. 614, § 3º , da CLT, ou do precedente do Enunciado n° 277 do TST, por conta do princípio ali subjacente do pacta sunt servanda. PROCESSO N° TST-RR-346.395/97- (Ac. 4a Turma) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 268 JURISPRUDÊNCIA Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR346.395/97, em que é recorrente Paulo Acácio de Castro Barbosa e recorrida Telecomunicações do Pará S/A - Telepará. O TRT da 8a Região, às fls. 104/108, deu provimento ao recurso ordinário da reclamada para excluir da condenação a diferença do adicional de periculosidade. Os embargos de declaração opostos, às fls. 110/111, foram acolhidos às fls. 114/117. Irresignado, o reclamante interpõe recurso de revista às fls. 119/123, apontando ofensa ao art. 614, §3°, da CLT, contrariedade ao Enunciado n° 277 do TST e indicando arestos para confronto. O recurso foi admitido à fl. 125. As contra-razões não foram apresentadas. A Procuradoria-Geral do Trabalho não foi consultada por força da Resolução Administrativa n° 322/96. É o relatório. VOTO CONHECIMENTO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. PROPORCIONALIDADE. NEGOCIAÇÃO COLETIVA Imprescindível destacar, de plano, a inexistência da propalada violação doa art. 614, § 3o, da Consolidação, uma vez que o Regional não firmou tese de que os instrumentos normativos poderiam continuar a viger após o termo final do prazo ali preconizado. É que reportando-se à decisão dos embargos de declaração se constata que, malgrado não o abordasse expressamente, deixou consignada a tese de a persistência do instrumento normativo em que se acertou a aplicação do Decreto 93.412/86 se dever à sua inserção nos contratos individuais do trabalho. Desse modo, a controvérsia cinge-se a alegada contrariedade ao Enunciado n° 277 do TST e à assinalada dissensão com os arestos trazidos à colação. Esses, porém, além de não atenderem aos requisitos do Enunciado n° 337, inciso I, desta Corte, são inservíveis como paradigmas, pois um deles é originário da Seção de Dissídios Coletivos e o outro de Turma deste Colegiado, a teor do art. 896, a, da CLT. Já em relação à contrariedade ao Enunciado n° 277, em que se firmou tese de as cláusulas coletivas não se incorporarem aos contratos de trabalho, é preciso alertar para o fato de que, embora o Regional se posicionasse na contramão do precedente, fê- lo levando em conta as peculiaridades das negociações coletivas visando a operacionalização do Decreto n° 93.412/86. Com efeito, segundo se verifica da fundamentação de fls. 115 da decisão dos embargos, a negociação entabulada entre a recorrida e o sindicato de classe visara pôr Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 269 JURISPRUDÊNCIA fim a dúvidas em torno da aplicação da legislação extravagante, culminando com o acordo de 1990 firmado também com o objetivo de dar efetividade à matéria da cláusula sexta do acordo de 1987. Em razão desse compromisso, o sindicato profissional encaminhou à empresa proposta de pagamento do adicional de periculosidade nos percentuais de 4,5% e 8,5%, a partir da qual fora celebrado novo instrumento normativo, cuja existência, malgrado não constasse dos autos, foi extraída pelo Regional da manifestação do recorrente de fls. 65/66. Desse breve histórico, e sobretudo do acordo de 1990, cujo teor foi transcrito a fls. 115 da decisão dos embargos, é fácil deduzir que, a despeito de o Colegiado ter aludido à sua integração nos contratos individuais de trabalho, a ultratividade lá assinalada decorreu da própria natureza do pactuado. É que, segundo estabelecido entre as partes, proceder-se-ia à perícia técnica para identificar as áreas de risco, em função das quais seriam pagos os adicionais de periculosidade, nos percentuais correspondentes ao tempo de exposição, alcançando quer os empregados admitidos anteriormente, quer os que o fossem posteriormente, a dar o tom do consentido efeito ultrativo conferido à cláusula, insuscetível de ser infirmado à sombra do art. 614, § 3°, da CLT, ou do precedente do Enunciado n° 277 do TST, por conta do princípio ali subjacente do pacta sunt servanda. Não conheço. Isto posto, Acordam os Ministros da 4a Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do recurso de revista do reclamante. Brasília, 24 de maio de 2000. Milton de Moura França, presidente. Antônio José de Barros Levenhagen, relator. ADICIONAL DE PRODUTIVIDADE. PROJEÇÃO AD FUTURUM Recurso da reclamada. Do adicional de produtividade. Projeção ad futu- rum. A colenda SDI-Plena, em 22.06.98, decidiu no julgamento do processo TST-E-RR 95.022/93, por maioria, ser aplicável o En. 277/TST às cláusulas que concedem adicional de produtividade, que é o caso dos autos. Recurso conhecido e provido. Recurso da reclamante. Não se conhece de revista quando não caracterizados os requisitos do art. 896 celetário. PROCESSO N° TST-RR-111. 748/94 - (Ac. 3a Turma) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 JURISPRUDÊNCIA Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR111.748/94, em que são recorrentes Anete Maria Santos Costa e Varig S/A - Viação Aérea Rio-Grandense e recorridos os mesmos. A reclamante ingressou em juízo pleiteando o pagamento de diferenças decorrentes de adicional de produtividade de 4% estipulado no Dissídio Coletivo TST-DC 06/79. O egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 2a Região, por meio do venerando acórdão de fls. 250/253, deu provimento parcial ao recurso ordinário da reclamada, para admitir apenas a prescrição das parcelas anteriores a 05.10.86. Inconformadas com a respeitável decisão regional, ambas as partes interpõem recurso de revista. A reclamante, às fls. 254/262, com fulcro nas alíneas a e b da CLT, alegando violação dos arts. 7°, inciso VI, da Carta Magna e art. 468 da CLT, Instrução Normativa n° 01/TST, contrariedade com o Enunciado n° 277/TST. Traz arestos para cotejo. A reclamada, às fls. 263/270, com fulcro nas alíneas a e c do art. 896 da CLT, alegando violação do disposto no art. 172 do Código Civil Brasileiro, art. 6o do CPC, arts. 11 e 872 da CLT, art. 7°, inciso XXIX, da Carta Magna, Instrução Normativa n° 01/TST, contrariedade com os Enunciados n°s 246 e 277 do TST e dissenso pretoriano. As revistas foram admitidas pelo despacho de fl. 284. Contra-razões da reclamante, à fl. 286, e da reclamada, às fls. 294/298. A douta Procuradoria-Geral do Trabalho, pelo parecer de fls. 302/306, opinou pelo conhecimento de ambos os recursos, pelo provimento do recurso da reclamada e não provimento do apelo da reclamante. É o relatório. VOTO RECURSO DA RECLAMADA O recurso é tempestivo (certidão de fl. 253-v, 30.08.93, segunda-feira e protocolo de fl. 263 - 03.09.93 - sexta-feira), o preparo correto (custas, fl. 234, depósito do valor da condenação, fls. 233/234) e o subscritor da petição está regularmente legitimado (procuração, fl. 271). CONHECIMENTO DO TERMO INICIAL DA FLUÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL. AÇÃO DE CUMPRIMENTO O egrégio Tribunal a quo negou provimento ao recurso ordinário da reclamada, quanto à tese da prescrição total, mandando observar as parcelas prescritas anteriormente a 05.10.86, nos termos do Enunciado n° 308/TST, consignando que: Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 271 JURISPRUDÊNCIA “Inexiste prescrição extintiva do direito de ação. Com o ajuizamento do dissídio coletivo de 1979 pelo Sindicato representativo da categoria profissional, restou interrompida a prescrição, a qual recomeçou a fluir somente a partir do trânsito em julgado da decisão proferida em embargos de divergência, proferida pelo Colendo STF, consoante publicação de 27.10.88. Como a presente ação foi proposta em 28.09.90, restou observado o biênio. O fato de ser dispensável o trânsito em julgado de sentença normativa, para propositura de ação de cumprimento, nos termos do Enunciado 246/TST, não obriga ao ajuizamento da referida ação, quando pendente de julgamento processo de âmbito coletivo, já que a tal lei não obriga (arts. 172/173, subsidiários), tanto que o art. 10 da Lei n° 7.701 de 21.12.88 faculta (e não obriga) o ajuizamento de ação individual, objetivando o cumprimento de norma coletiva.” (fls. 252/253). Em suas razões de revista, a reclamada sustenta que o direito previsto em convenção coletiva, pendente de recurso sem efeito suspensivo, não pode ser exercitado após trânsito em julgado da sentença normativa. Aduz que, se o direito à ação tornou- se exercitável a partir da publicação do acórdão do colendo Tribunal Superior do Trabalho, que julgou o dissídio em 14.04.81, é a partir deste momento que se caracteriza a inércia do seu titular. Alega violação dos arts. 11 e 872 da CLT, 172 do CCB e art. 6° do CPC, à Lei n° 4.725/65, afronta ao Enunciado n° 246 do TST e dissenso pretoriano. Esta colenda Corte Superior, editando o En. 350, dispôs que: “Prescrição. Termo inicial. Ação de cumprimento. Sentença normativa O prazo de prescrição com relação à ação de cumprimento de decisão normativa flui apenas a partir da data de seu trânsito em julgado.” Desta forma, estando a veneranda decisão regional em consonância com o referido Verbete Sumular, superadas estão as divergências apresentadas a fl. 267. Assim decidindo, o egrégio Regional andou bem, aplicando corretamente as disposições legais pertinentes, não se tendo como falar em violação dos arts. 11 e 872 da CLT, 172 do CCB e art. 6° do CPC, bem como afronta com o Enunciado n° 246 do TST que, efetivamente, não obriga o ajuizamento da ação antes do trânsito em julgado da sentença normativa. A empresa não indica qual o dispositivo da Lei n° 4.725/65 que entende violado. A Orientação Jurisprudencial n° 94, da colenda SDI, fixou-se no sentido de que: “EMBARGOS. EXIGÊNCIA. INDICAÇÃO EXPRESSA DO DISPOSITIVO LEGAL TIDO COMO VIOLADO. E-RR 164691/95, SDI-Plena, Em 19.05.97, a SDIPlena decidiu, por maioria, que não se conhece de Revista (896, c) e de Embargos (894, b) por violação legal ou constitucional quando o recorrente não indica expressamente o dispositivo de lei ou da Constituição tido como violado. Precedentes: E-RR 141461/94, Ac. 3717/97, Min. Cnéa Moreira, DJ 14.11.97, Decisão unânime, E-RR 265784/96, Ac. 3650/97, Min. Vantuil Abdala, DJ 19.09.97, Decisão unânime, E-RR 191899/95, Ac. 3620/97, Min. Rider de Brito, DJ 29.08.97, Decisão unânime, E-RR Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 272 JURISPRUDÊNCIA 189291/95, Ac. 3151/97, Min. Rider de Brito, DJ 01.08.97. Assim, por este ângulo também não se tem como conhecer do recurso interposto, no particular. Não conheço. DA PRESCRIÇÃO PARCIAL A reclamada alega. ainda. que não se trata de prescrição de prestações periódicas, mas de prescrição total decorrente de ato único do empregador, na forma do que preceitua o En. 198/TST, estando, pois, irremediavelmente prescrita a “ação”. Traz arestos para cotejo. Entretanto, os arestos transcritos às fls. 268/269 são inservíveis ao fim colimado, eis que oriundos de Turmas desta colenda Corte Superior, hipótese não revista no art. 896 celetário. Quanto ao Enunciado n° 198/TST, também não se presta para demonstrar confronto, por não mais existir à época da interposição da revista (protocolo de fl. 263, 03.09.93), em face de ter sido cancelado pela Resolução Administrativa n° 04/89/TST, de 14.04.89. Não conheço. DA PROJEÇÃO AD FUTURUM DO ADICIONAL DE PRODUTIVIDADE Trata-se da questão do adicional de produtividade dos aeroviários estabelecido em norma coletiva, sua projeção para o futuro e aplicabilidade do En. 277 da Corte. O egrégio Regional consignou, sobre o tema, que: “Não se trata de simples projeção ‘ad futurum’ dos efeitos de cláusula normativa. Trata-se de majoração salarial que não pode ser suprimida, sob pena de nulidade, a teor do disposto no art. 468, da CLT.” A reclamada, inconformando-se, alega confronto com o En. 277/TST e dissenso pretoriano. Entendo que não há como se aplicar ao caso vertente os termos do En. 277, o qual preleciona: “As condições de trabalho alcançadas por força de sentença normativa vigoram no prazo assinado, não integrando, de forma definitiva, os contratos.” A norma que instituiu o adicional de produtividade (MP 1875 e suas reedições, art. 13, § 2°), estatuiu que “qualquer concessão de aumento salarial a título de produtividade deverá estar amparada em indicadores objetivos.” (grifou-se) Nestes termos, o adicional, embora como tal titulado, tem natureza salarial. Quando se trata de reajuste salarial, não se pode pretender que se esgote o direito à permanência do pagamento com o vencimento do prazo da norma coletiva que o fixou. Em caso contrário, a cada dissídio coletivo, deveríamos retroagir ao salário que antecedeu o primeiro dos dissídios sucessivos para, então, aplicar um percentual a ser acrescido à base salarial estritamente durante o período de vigência da norma coletiva. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 273 JURISPRUDÊNCIA Nunca se ousou afirmar que o reajuste salarial conferido em norma coletiva fosse deduzido ao término da vigência da norma. Entretanto, a colenda SDI-Plena, em 22.06.98, decidiu no julgamento do processo TST-E-RR 95.022/93, por maioria, ser aplicável o En. 277 às cláusulas que concedem adicional de produtividade. Assim, com ressalva do meu ponto de vista, conheço da revista por atrito com o En. 277/TST. DA COMPENSAÇÃO No tópico, sustenta que, se reconhecido que o adicional de produtividade integra o salário para todos os fins, o instituto da compensação não pode ser desprezado em função da Instrução Normativa n° 01, desta colenda Corte Superior. O venerando acórdão regional, a fl. 253, entendeu que: “Por se consubstanciar em salário o acréscimo de 4% de produtividade, inexiste direito a qualquer compensação, já que não há prova de pagamento de tal acréscimo. A compensação somente pode ser mantida, quando se trata de pagamento por idênticos títulos. Em sendo parcela salarial, integra o salário para todos os fins, inclusive em seus reflexos nos demais títulos contratuais.” A empresa não indica expressamente violação a nenhum dispositivo constitucional ou legal, tampouco apresenta divergência para fundamentar seu recurso, desatendendo, assim ao disposto no art. 896 consolidado. Oportuno, ainda, salientar que a Instrução Normativa n° 01 deste colendo Tribunal Superior foi revogada pela Instrução n° 04/93, de 14.06.93, antes, portanto, da interposição da revista (protocolo de fl. 263, 03.09.93). Não conheço do recurso no particular, por desfundamentado. DO PROVIMENTO Como conseqüência do conhecimento da revista no tema do adicional de produtividade - projeção “ad futuram”, dou-lhe provimento para limitar a concessão do referido adicional ao prazo de vigência do instrumento normativo. RECURSO DA RECLAMANTE CONHECIMENTO O recurso é tempestivo (certidão de fl. 253-v, 30.08.93, segunda-feira e protocolo de fl. 254 - 02.09.93 - quinta-feira) e o subscritor da petição está regularmente legitimado (procuração, fl. 08). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 274 JURISPRUDÊNCIA DA PRESCRIÇÃO PARCIAL Com relação ao recurso de revista da reclamada, foi ele conhecido e provido para limitar a concessão do referido adicional de produtividade ao prazo de vigência do instrumento normativo. O venerando acórdão regional, às fls. 252/253, entendeu inexistir prescrição extintiva do direito de ação, pois com o ajuizamento do Dissídio Coletivo de 1979, pelo Sindicato representativo da categoria profissional, restou interrompida a prescrição, a qual recomeçou a fluir somente a partir do trânsito em julgado da decisão proferida nos Embargos de Divergência, proferida pelo Excelso Supremo Tribunal Federal, consoante publicação de 27.10.88. No entanto, admitiu a prescrição parcial, nos termos do Enunciado n° 308/TST, para considerar prescritas as parcelas anteriores a 05.10.86. A reclamante levanta-se contra a prescrição das parcelas anteriores a 5/10/86. Isto equivale a afirmar que, dentro da coerência exigível numa sentença, a empregada não teria direito a nada. Se a vigência da norma se exauriu em 1° de dezembro de 1979 e se a prescrição atingiu as parcelas anteriores à atual Carta Magna, nenhum direito foi reconhecido à reclamante. Bem por isso, levanta-se ela contra o reconhecimento da prescrição parcial. Aduz a obreira que, quando da propositura da reclamatória, já se encontrava em plena vigência a atual Carta Magna. Todavia, os direitos nela perseguidos remontam a novembro de 1979, data a partir da qual o egrégio Supremo Tribunal Federal reconheceu em favor da Recorrente, o direto à percepção dos indigitados 4% de produtividade, sendo que o venerando acórdão daquela Corte Suprema veio a ser publicado tão-somente em 27 de outubro de 1988. Alega ofensa do art. 7°, inciso VI, da Carta Magna, do art. 468 da CLT, à Instrução Normativa n° 01/82/TST, afronta ao Enunciado n° 277/TST e dissenso pretoriano. Não obstante tais argumentos, não conseguiu a reclamante dar ensejo ao conhecimento de sua revista, no particular. A ofensa do disposto no artigo consolidado e constitucional não viabiliza o conhecimento da revista, posto que o venerando acórdão Regional aplicou tais dispositivos de forma favorável à recorrente, não se vislumbrando, portanto, o interesse em dela recorrer, por tal fundamento. Acrescente-se que o entendimento regional, de que estavam prescritas as parcelas anteriores a 05.10.86, não significa que não tenha reconhecido o direito material da parte. Quanto à alegada contrariedade à Instrução Normativa n° 01/82/TST, além do egrégio Regional não analisar a presente questão, até porque foi revogada pela Instrução n° 04/93, de 14.06.93, antes, portanto, da interposição da revista (protocolo de fl. 254, 02.09.93), a mesma não serve ao pretendido, nos termos do art. 896 da CLT, já que não é dispositivo de Lei Federal ou Constitucional. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 275 JURISPRUDÊNCIA No que pertine ao Enunciado n° 277/TST, também inviável o conhecimento, por afronta ao mesmo, uma vez que não trata de questão referente à prescrição, mas vigência de condições de trabalho limitada ao do instrumento normativo. Os arestos trazidos a cotejo às fls. 257/258 não se prestam ao fim colimado, ante o não-atendimento do disposto no En. 337/TST, pois não indicam a fonte de publicação, além de que os acórdãos juntados na íntegra, às fls. 274/283, encontram-se em cópias não autenticadas, desatendendo, assim, ao disposto art. 830 da CLT. Não conheço. Isto posto, Acordam os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, conhecer da revista da reclamada apenas quanto ao tema do adicional de produtividade - projeção “ad futurum”, por atrito com o En. 277/TST, com ressalva de entendimento do Exmo. Ministro Relator e, no mérito, dar-lhe provimento para limitar a concessão do referido adicional ao prazo de vigência do instrumento normativo e, ainda por unanimidade, não conhecer da revista da reclamante. Brasília, 11 de abril de 2000. José Luiz Vasconcellos, presidente e relator. AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DESPACHO EM QUE SE APRECIA PEDIDO DE LIMINAR EM AÇÃO CAUTELAR INOMINADA INCIDENTE Na apreciação das liminares inaudita altera parte, a cognição recai somente sobre o que foi afirmado peio Autor. Não logrando infirmar os termos do despacho agravado, nega-se provimento ao agravo regimental. PROCESSO N° TST-AG-AC-621.686/2000- (Ac. SEDC) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo Regimental em Ação Cautelar n° TST-AG-AC-621.686/2000, em que é agravante Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo e é agravada Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo. Sabesp. A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - Sabesp ajuíza ação cautelar inominada incidental, com pedido de concessão de liminar inaudita altera parte, com o objetivo de suspender movimentos grevistas instaurados pelos Sindicatos das categorias profissionais, protestando pela imposição de multa, em caso de desobediência, e apuração de responsabilidade civil, penal e trabalhista. Sustenta a requerente que os empregados promoviam, mediante coordenação sindical, as chamadas paralisações “pipocas”, na tentativa de afetar as atividades empresariais, mas sem deixar evidência comprovável da existência dos movimentos paredistas, inviabilizando, dessa forma, qualquer providência eficaz no sentido de coibir as atitudes havidas por ilícitas. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 276 JURISPRUDÊNCIA Diante dos efetivos prejuízos resultantes à população, conforme sustenta a Sabesp, esta suscitou dissídio coletivo de greve perante o Tribunal Regional do Trabalho da 2a Região, não logrando obter o resultado alvitrado, visto que o processo, a final, restou extinto sem apreciação do mérito, ao entendimento de não ter sido caracterizada a existência do movimento paredista, cuja declaração de abusividade era perseguida, ensejando a interposição de recurso ordinário para esta Corte. Deferida a liminar, na forma pleiteada, o Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo pugna pela sua modificação, ex vi do presente agravo regimental. Examinados os autos, determinei a sua colocação em Mesa. É o relatório. VOTO O agravante não logrou infirmar os termos do despacho agravado, dentre outras, pelas razões que se seguem. Preliminarmente a cautelar inominada intentada é incidente ao Recurso Ordinário interposto da decisão proferida pelo TRT da 2a região que extinguiu o processo sem o julgamento do mérito. Não se trata assim de ação principal como pretende o Agravante. O fato de por diversas oportunidades a cautelar anteceder o Recurso Ordinário, invertendo-se a prevenção nesta Corte, decorre da diferença de movimentação de ambas as ações. A originária aguarda os entraves administrativos inerentes à remessa do processo ao Tribunal ad quem, ao passo que a cautelar é ajuizada diretamente no órgão destinatário do recurso, sendo que, na hipótese dos autos, por se tratar de período de férias coletivas, sequer houve distribuição, tendo esta vindo diretamente à Presidência, para que, na forma regimental, fosse examinada a liminar. Quanto ao mérito, louve-se, inicialmente, a preocupação do Sindicato em cuidar de evitar qualquer concretização paredista, enquanto aguarda manifestação final relativa ao despacho que ora se tenta impugnar. É mister que se entenda, também, que o Tribunal Superior do Trabalho, em face dos prejuízos que adviriam acaso persistisse uma paralisação da categoria profissional, responsável pelo abastecimento e tratamento de água e de coleta de esgoto de importantes municípios de São Paulo, inclusive a própria Capital, resolveu precatar-se concedendo liminar, “no sentido de que sejam intimados os Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo - Sintaema e Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas de Santos, Baixada Santista, Litoral Sul e Vale do Ribeira - Sintius a se absterem da prática de movimento grevista abusivo, ou paralisação dos serviços de tratamento e fornecimento de água e captação e tratamento de esgoto, de modo a afetar as garantias legais de atendimento às necessidades essenciais da coletividade, sob pena de responsabilização ‘trabalhista, civil ou penal’ (art. 15 da lei citada) e de aplicação de multa, caso a população não volte a ter a prestação dos serviços indispensáveis a que tem direito.” Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 277 JURISPRUDÊNCIA Por outro lado, impende esclarecer que o órgão jurisdicional, ao apreciar pedido de liminar em ação cautelar, não goza da oportunidade de aprofundar-se no exame das provas, de forma exauriente, visto que esta modalidade de providência no juízo de sua cognição é sumaríssima. Além disso, no caso dos autos, como afirma o Agravante, inexistia qualquer greve em andamento. Todavia, o próprio recorrente assere, a fls. 524-5, in verbis: “Antes de mais nada, porque inexistiu em qualquer momento, prejuízo para a população. O atendimento às necessidades inadiáveis da comunidade foi mantido nos termos de esquema de emergência desenhado cuidadosamente e cujo mecanismo de funcionamento foi apresentado previamente à Procuradoria Regional do Trabalho. Afinal de contas, por qual outro motivo, a douta Procuradoria, sempre tão zelosa com os interesses da sociedade, não adentrou com nenhuma medida judicial para prevenir o atendimento às necessidades essenciais? Não se cuida de mera coincidência. Os serviços foram mantidos religiosamente conforme o esquema previamente elaborado e apresentado, sendo certo que não houve em nenhum momento, ameaça à qualidade e à quantidade do fornecimento de água e esgoto.” Confirmando sua versão, acrescenta, ao final de seu arrazoado, à fl. 528, verbis: “Os trabalhadores em serviços essenciais são eternos reféns destas mentiras. Basta assustar o Tribunal como os fantasmas de que falte água, luz, transporte, etc., e lá virá o braço do Judiciário impedindo a greve. É claro que o Tribunal tem o poder e o dever de cuidar de que a greve não resulte em falta de água para a população. No caso, contudo, a greve estava sendo feita sem que houvesse tal perigo, preservando-se rigorosamente o interesse popular. No entanto, o temor de uma eventual calamidade pública faz com que baste a empresa trazer meia dúzia de mentiras para gerar este fantasma, para conseguir a medida liminar.” Existe, assim, incontestável contradição. Se a categoria não estava em movimento paredista, como se explicam as medidas necessárias ao atendimento das atividades essenciais? Desse modo, o que não restou provado na exordial da cautelar, conforme sustenta, e cujo despacho pretende impugnar, qual seja, a existência de greve, por que então os esquemas especiais montados pelo sindicato? Vê-se, pois, que a providência desta Corte, proibindo movimentos grevistas, foi correto, na medida em que se infere desta contradição a ocorrência da greve que o sindicato quer negar. Por fim, a matéria alegada no agravo regimental, quanto ao tema referente às reivindicações concedidas pelo Regional e suspensas pela Presidência desta Corte, não pode se constituir em questões de discussão em nível de cautelar, uma vez que são objeto do recurso ordinário. Aqui cabe considerar que a tutela cautelar, consoante se extrai da lição de Piero Calamandrei (Introduzione ello Studio Sistematico dei Provvedimenti Cautelari, in Studi di Direito Processuale, Padova, 193 6 - XIV, pág. 21), visa a assegurar a eficácia do próprio processo (instrumentalidade ao quadrado, na feliz expressão do mestre de Firenze), protegendo indiretamente o direito substantivo objeto do litígio. Daí porque não se exige a cabal demonstração do direito substantivo litigioso, restringindo o fumus boni iuris à expectativa de uma situação jurídica futura favorável, mas susceptível de acarretar um segundo dano, tendo em vista a supressão ou a redução de meios que possibilitem uma rápida solução do conflito intersubjetivo de interesses (periculum in Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 278 JURISPRUDÊNCIA mora). Em face dessas características, que identificam a urgência da providência jurisdicional, inseriu-se na ação cautelar o instituto processual da liminar, com o escopo de obter-se, de forma antecipada e provisória, algo que só seria conseguido com a prolação da sentença. Assim, com referência à cognição, nas liminares, ela é plena quanto à extensão e sumária quanto à profundidade do conhecimento do juiz. Em verdade, a liminar, em razão da urgência, não se coaduna com uma cognição exauriente, tendo em vista que este tipo de cognição ocasiona a demora que ela busca exatamente atenuar. Aliás, a cognição sumária sempre foi uma das características das liminares, desde a sua origem, com os interditos romanos (Cf. Galeno Lacerda, Mandados e Sentenças Liminares, in Revista Forense, 236/14, pág. 18). Nos pedidos liminares inaudita altera parte, por sua vez, a cognição recai somente sobre o que foi afirmado pela requerente, à luz dos elementos fornecidos pela petição inicial e pelos documentos que a instruem, vez que não há produção de outras provas além da documental. Pelo exposto, não infirmados os termos do despacho impugnado, nego provimento ao agravo regimental. Isto posto, Acordam os Ministros da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 10 de agosto de 2000. Wagner Pimenta, presidente e relator. APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. VERBAS RESCISÓRIAS Com a aposentadoria espontânea, cessa o contrato de trabalho, nos moldes do artigo 453 da Consolidação das Leis do Trabalho, sendo que, da continuidade da prestação de serviço, surge um novo contrato. Por isso, indevido o pagamento de qualquer parcela que decorra de prestação de serviço posterior à aposentadoria. Recurso de revista conhecido e não provido. PROCESSO N° TST-RR-489.978/98 - (Ac. 5a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR489.978/98, em que são recorrentes Lázaro Bolina e Rede Ferroviária Federal S.A. RFFSA e recorridos os mesmos. O colendo TRT da Terceira Região considerou indevida a pretensão do autor de obter a multa de 40% do FGTS relativamente ao primeiro contrato, mantendo a condenação no tópico relativo ao adicional de insalubridade em grau máximo. O reclamante, inconformado, opôs embargos declaratórios, a fls. 200/202, apontando omissão e contradição no venerando acórdão embargado. A reclamada, igualmente inconformada, opôs embargos declaratórios a fls. 203/204. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 279 JURISPRUDÊNCIA Os embargos declaratórios foram rejeitados (fls. 207/209), diante da ausência de omissão e contradição. Inconformadas, recorrem ambas as partes. O reclamante recorre de revista a fls. 211/218, pretendendo a reforma do julgado, com fundamento no permissivo legal consolidado, a fim de que se reconheça a unicidade dos contratos celebrados com a reclamada. Acosta arestos para o cotejo de teses. A reclamada, em seu apelo revisional (fls. 228/230), sustenta a impossibilidade de se reconhecer o grau máximo de insalubridade, sustentando, ainda, a existência de contratos de trabalho distintos e a ausência de concurso público. O apelo vem amparado em divergência jurisprudencial. Despacho de admissibilidade a fls. 232. Contra-razões a fls. 233/234. Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, de acordo com o art. 113 do Regimento Interno do TST. É o relatório. VOTO RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE CONHECIMENTO Apelo tempestivo, com representação regular. APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO O Tribunal de origem, ao apreciar a controvérsia, consignou o seguinte entendimento: “Em processos semelhantes, este Relator tem sustentado que, nos casos de aposentadoria voluntária, por tempo de serviço, não há que se falar em indenização, ou aplicabilidade da penalidade de 40% sobre os depósitos fundiários efetuados, nos termos do que preceitua o verbete do Enunciado 295/TST, nem em cômputo de ambos os períodos trabalhados, em face do que estabelece o art. 453/CLT, com a redação que lhe foi dada pela Lei n° 6.204, de 29/04/75.” (fls. 185). O reclamante, em seu apelo revisional, sustenta que a continuidade da prestação de serviços, após a concessão de aposentadoria, afasta a possibilidade de reconhecimento da rescisão do primeiro contrato de trabalho. Entende, assim, que a aposentadoria por tempo de serviço não pode ser considerada como uma forma de extinção do contrato de trabalho. O aresto de fls. 213/214 abriga tese contrária àquela sufragada Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 280 JURISPRUDÊNCIA pelo Regional, no sentido de que a aposentadoria espontânea, por si só, não extingue o contrato de trabalho. Conheço, por conflito pretoriano. MÉRITO APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO A Instância a qua considerou ter ocorrido a extinção do contrato de trabalho, ante a aposentadoria voluntária do reclamante, daí por que teve por indevido o pagamento de parcelas rescisórias atinentes ao contrato de trabalho que se extingue em decorrência da aposentadoria. Cumpre salientar que a Lei n° 6.204/75, de 29/04/75, ratificou o entendimento de que a aposentadoria espontânea é causa extintiva do contrato de trabalho, e acresceu, às duas exceções que já constavam do art. 453 da CLT - despedida por falta grave e recebimento de indenização legal -, mais uma, a aposentadoria espontânea. No caso dos autos, a partir da data de concessão da aposentadoria (22/05/95), formou-se novo vínculo entre as partes, dissolvido em 11/10/95, sendo descabida a hipótese de unicidade dos períodos trabalhados para efeito de percepção das parcelas indenizatórias. Por isso, entendo que a aposentadoria voluntária é causa de extinção do contrato de trabalho, fazendo cessar as obrigações a partir de então. No mesmo sentido, têm-se os seguintes precedentes: RR-480.926/98, Ac. 5a T., Rel. Juiz Convocado Levi Ceregato, DJ17/09/99; RR-331.156/96, Ac. 5a T., Rel. Juiz Convocado Levi Ceregato, DJ 03/09/99; RR-326.728/96, Ac. 5a T., Rel. Juiz Convocado Levi Ceregato, DJ 03/09/99; E-RR-266.486/96, Ac. SDI, Rel. Ministro Candeia de Souza DJ 18/06/99; RR-296.572/96, Ac. 5a T., Rel. Min. Armando de Brito, DJ 14/05/99. Ante o exposto, nego provimento ao recurso de revista do reclamante. RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA CONHECIMENTO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE Acerca do tema, assim se posicionou o douto Colegiado de origem: “A perícia concluiu objetivamente a fls. 136: ‘Realizada a perícia com base na legislação vigente, nas informações prestadas durante a diligência e no ambiente periciado, o perito oficial tem a concluir: a) Caracterizada insalubridade no grau máximo por exposição a creosoto, produto cancerígeno. Dado o método de trabalho do autor, o mesmo esta- Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 281 JURISPRUDÊNCIA va em acentuado risco de sofrer graves irritações de pele, bem como o de contrair câncer de pele.’ Logo, não há por que deixar de reconhecer o direito ao adicional, em grau máximo, com fundamento no trabalho do ilustre ‘expert’.” (fls. 185/186). Em seu apelo revisional, sustenta a reclamada que a sua atividade não abrange a fabricação do creosoto, limitando-se a empresa a transportá-lo. A despeito do inconformismo demonstrado pela reclamada, não merece prosperar o seu apelo. A matéria, tal como decidida pelo Tribunal de origem, encontra óbice intransponível no Verbete Sumular 126, na medida em que o Tribunal, ao apreciar a controvérsia, amparou-se no laudo pericial acostado aos autos. Qualquer modificação no julgado seria possível somente mediante a reapreciação do conjunto fático-probatório dos autos, a fim de que fosse discutido o aspecto da ocorrência de manuseio do creosoto. Não conheço do recurso, no particular, com fundamento no Enunciado 126 da Súmula desta corte. Prejudicada a análise do tema relativo aos contratos distintos, em virtude da decisão proferida no recurso do reclamante. Isto posto, Acordam os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, à unanimidade, conhecer da revista do reclamante, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, negar-lhe provimento; e não conhecer da revista da reclamada. Brasília, 28 de junho de 2000. Rider Nogueira de Brito, presidente. João Batista Brito Pereira, relator. COISA JULGADA. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. CONFIGURAÇÃO Um dos princípios lógicos básicos é o da identidade, segundo o qual “dois entes iguais a um terceiro são iguais entre si" (cfr. Ivan José Sanguined, “Lógica, EUNSA -1989- Pamplona, pg. 217). Quando o §2° do artigo 301 fala em identidade de partes, causa de pedir e pedido, utiliza conceito que não pode ser desconectado do principio lógico que o embasa. A identidade, no caso, se verifica pela aplicação do princípio lógico à equação: uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido (§ 2° do artigo 301 do CPC). A identidade se verifica não pelo rótulo das partes, mas pelas conclusões, que, em processos anteriores, identificaram, sob o prisma funcional (discutidos nos vários processos), o pólo ativo das distintas reclamatórias. Nesse sentido, é possível admitir a coisa julgada oblíqua, dentro de uma interpretação lógica do § 2° do artigo 301 do CPC, sob pena de se ter decisões contraditórias no tempo. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 282 JURISPRUDÊNCIA Recurso conhecido e provido. PROCESSO Nº TST-RR-356.025/97 - (Ac. 4a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR356.025/97, em que é recorrente Banco de Crédito Real de Minas Gerais S.A. e é recorrida Matildes Marques de Lima. O 3° Regional rejeitou as preliminares de coisa julgada e de cerceamento do direito de defesa e, no mérito, manteve a sentença que havia deferido o pagamento de diferenças salariais em face do reconhecimento da equiparação salarial com o paradigma Mariângela Batista Silva, bem como ratificou o entendimento de que a época própria para a correção monetária do valor do salário é aquela em que o mesmo se tornou devido, ou seja, a da própria prestação laboral, motivo pelo qual a atualização dos salários de um determinado mês deve ser feita pelo índice do próprio mês, e não pelo do mês em que o artigo 459 da CLT permite que o pagamento seja efetuado (fls. 131-136). Opostos embargos declaratórios pelo reclamado (fl. 138), a Corte de origem negou-lhes provimento e aplicou a multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, por considerá-los meramente protelatórios (fls. 141-143). Inconformado, recorre de revista o banco reclamado, com espeque nas alíneas a e c do artigo 896 da CLT, no tocante aos seguintes pontos: a) preliminarmente, argúi a nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional, apontando ofensa aos artigos 832 da CLT e 93, inciso IX, da Constituição Federal/88, divergência jurisprudencial e contrariedade ao Enunciado n° 297/TST; b) insurge-se contra a aplicação da multa de 1 % (um por cento) sobre o valor da causa imposta pelo TRT, considerando violados os arts. 535, inciso II, e 538, parágrafo único, do CPC e contrariado o Enunciado n° 297/TST; c) sustenta a ocorrência de coisa julgada oblíqua, fulcrado exclusivamente em dissenso pretoriano; e d) manifesta-se irresignado no que tange à equiparação salarial concedida e quanto à época própria para a incidência da correção monetária, tudo com espeque em divergência jurisprudencial (fls. 145-157). Admitido o recurso (fl. 197), tendo a reclamante apresentado contra-razões (fls. 198-200) e sendo dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do item III da Resolução Administrativa n° 322/96 desta Corte. É o relatório. VOTO PRESSUPOSTOS GENÉRICOS O apelo é tempestivo, tem representação regular (fls. 84-85), encontrando-se devidamente preparado com custas recolhidas (fl. 115) e depósito efetuado no limite Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 283 JURISPRUDÊNCIA legal (fls. 116 e 196). Atende, portanto, aos pressupostos de admissibilidade comuns a qualquer recurso. PRESSUPOSTOS ESPECÍFICOS CONHECIMENTO PRELIMINAR DE NULIDADE POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL Pugna o recorrente para seja decretada a nulidade do acórdão proferido, haja vista que não foi enfrentada a violação do artigo 472 do CPC, solicitada por meio de embargos declaratórios. Sustenta que, tanto na defesa como nas razões do recurso ordinário patronal, restou consignado o argumento de que a Reclamante não se poderia beneficiar de decisão prolatada em reclamatória trabalhista da qual não fora parte e que elevou os salários do paradigma por ele indicado, em face de ter sido este último vencedor em pleito relativo à equiparação com outro modelo apontado, sob pena de violação do artigo 472 do CPC. Argumenta que o TRT de origem, a despeito de ter sido provocado a pronunciar-se pelo prisma do mencionado preceito, não chegou nem mesmo a citá-lo, configurando a negativa de prestação jurisdicional. Aponta violação dos artigos 832 da CLT e 93, inciso IX, da Constituição Federal. Por outro lado, sugere divergência jurisprudencial e contrariedade ao Enunciado n° 297/TST. De plano, insta ressaltar que dissenso pretoriano e contrariedade a verbete sumular desta Corte não rendem ensejo ao conhecimento de recurso de revista pela via da preliminar de nulidade por negativa de prestação jurisdicional, ante os termos da Orientação Jurisprudencial n° 115 do TST, segundo a qual só se admite o conhecimento do recurso, invocando negativa de prestação jurisdicional se vier calcado em violação dos artigos 832 da CLT, 458 do CPC e 93, IX, da CF/88. Resta analisar as violações indigitadas. Quando do julgamento dos embargos declaratórios, verifica-se que, muito embora não tenha sido feita menção expressa ao artigo 472 do CPC (que trata do instituto processual da coisa julgada), houve emissão de tese sobre o conteúdo desse preceito, porquanto a Turma Regional - transcrevendo trecho do acórdão então embargado demonstrou que já havia afastado a suposta ocorrência de coisa julgada, pois, no acórdão prolatado diante do recurso ordinário patronal, entendera que as causas de pedir eram diversas. Assim, não há como acolher a tese de que teriam sido violados os artigos 832 da CLT e 93, inciso IX, da Carta Magna, haja vista que o julgado tido como nulo possui todos os elementos de convicção do julgador, não faltando ao pronunciamento judicial nenhum requisito essencial à sua validade. Rev. TST, Brasília, vol 66, nº 3, jul/set 2000 284 JURISPRUDÊNCIA Por oportuno, ressalte-se que a assertiva do Recorrente, de que o acórdão regional estaria eivado de nulidade, por não ter feito menção expressa ao artigo 472 da CLT, cai por terra diante do entendimento reiterado da SDI desta Corte, segundo o qual, por meio da Orientação Jurisprudencial n° 118 do TST, considera que existindo tese explícita sobre a matéria, na decisão recorrida, desnecessário contenha nela referência expressa do dispositivo legal para ter-se como prequestionado este, consoante exigência do Enunciado n° 297 do TST. Precedentes: ERR-189682/95; ERR-233574/95; e ERR240046/96. Logo, NÃO CONHEÇO do recurso pela preliminar. MULTA DE 1% (UM POR CENTO) SOBRE O VALOR DA CAUSA ANTE O CARÁTER PROCRASTINATÓRIO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO Não se conforma o banco com a imposição da multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, imposta pelo Colegiado de origem, o qual considerou meramente procrastinatórios seus embargos de declaração. Aduz que os declaratórios tiveram como único objetivo ver sanada a omissão relativa ao artigo 472 do CPC, constante do acórdão embargado, pouco importando que a Turma já houvesse se manifestado sobre a tese levantada, já que efetivamente não houve pronunciamento expresso acerca do dispositivo legal referido. Outrossim, explica que pretendia, além da regularização da omissão existente, prequestionar matéria que viria a ser objeto de ulterior recurso de revista, motivo por que considera violados os artigos 535, inciso II, e 538, parágrafo único, do CPC. Sem razão o recorrente. Conforme já referido na análise do item 1.1 (preliminar de nulidade), a prestação jurisdicional já havia se aperfeiçoado quando da prolação do acórdão examinador do recurso ordinário e, se não houve registro expresso do art. 472 do CPC, é patente que a violação desse preceito legal restou afastada, ante o entendimento de que não se teria configurado a coisa julgada. Os declaratórios eram despiciendos e apenas mostraram o desconhecimento do recorrente quanto à Orientação Jurisprudencial n° 118 do TST. Diante disso, não procede o argumento de que os embargos declaratórios não se revestiam de cunho protelatório, razão pela qual não vislumbro violados os dispositivos do CPC tidos por vulnerados. Não conheço. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. EXISTÊNCIA DE COISA JULGADA Em suas razões de recurso ordinário, sustentou o Reclamado que a Justiça do Trabalho não poderia reavaliar a equiparação salarial, porquanto já havia pronunciado inexistência de identidade de trabalho da ora Reclamante e do Sr. Ivan Ceolin de Oliveira, sendo que o trabalho do Sr. Ivan era idêntico ao da Sra. Valéria Pinheiro Barbosa, Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 285 JURISPRUDÊNCIA cujo trabalho também era idêntico ao da Sra. Mariângela Batista Silva, apontada como paradigma pela ora recorrida. Sobre o tema em exame, assentou o Regional que há coisa julgada no que diz respeito à lide e às questões decididas na primeira ação e, não, à relação jurídica global havida entre as partes. Registrou que na ação anterior nada se aventou acerca da equiparação salarial com a Sra. Mariângela Batista da Silva, não havendo como se acolher a preliminar de coisa julgada em relação ao pedido de equiparação com o Sr. Ivan Ceolin de Oliveira. Consignou que o pronunciamento desta Justiça Especializada acerca da equiparação salarial entre a autora e o Sr. Ivan Ceolin de Oliveira não tem o condão de ser identificado com o pedido de equiparação salarial daquele então paradigma com a Sra. Valéria Pinheiro Barbosa, pois nem mesmo ocorre a identidade de partes (fl. 133). Fulcrado exclusivamente em uma única divergência jurisprudencial (fls. 148149), investe o recorrente contra o decisum regional, afirmando que, no caso, ocorreu a coisa julgada de forma oblíqua, pois, se a Justiça, em ações anteriores, já proclamou que Mariângela e Ivan são iguais a Valéria e que a reclamante é diferente de Ivan, inegavelmente, a autora não exerce trabalho idêntico ao de Mariângela. Ora, o aresto colacionado diverge diametralmente do acórdão recorrido, pois consagra a tese da ocorrência da coisa julgada oblíqua, ao entender que, quando o reclamante, o qual teve indeferido o pedido de equiparação salarial com paradigma apresentado em ação anteriormente decidida, ajuíza nova reclamação contra o mesmo reclamado, desta vez apresentando como paradigma outro empregado da empresa que, por sua vez, conseguiu o reconhecimento judicial de equiparação salarial com o primeiro paradigma apresentado pelo autor, há coisa julgada impedindo a nova reclamatória. Assim, conheço por divergência jurisprudencial. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. ÔNUS DA PROVA A tese defendida pelo Regional foi no sentido de que à Reclamante incumbia o ônus de provar a identidade de funções com o paradigma por ela indicada, ao passo que competia ao Reclamado o ônus de provar os fatos modificativos do direito obreiro, dentre estes a diferença de produtividade e de perfeição técnica no trabalho prestado. Aduz o reclamado que o TRT se equivocou ao entender que o ônus da prova acerca da diversidade de produtividade e de perfeição técnica competia ao Empregador, pois, na forma do artigo 333, inciso I, do CPC, à autora incumbe provar os fatos constitutivos do direito alegado, dentre os quais, no caso de equiparação salarial, figurariam a identidade de função, a de produtividade e a de perfeição técnica. Por este prisma, argumenta que, não tendo a autora provado que trabalhava com a mesma produtividade e perfeição técnica, não haveria respaldo para se deferir a equiparação salarial postulada. Apresentou um aresto para confronto (fl. 150). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 286 JURISPRUDÊNCIA A divergência jurisprudencial resta estabelecida na medida em que o paradigma, fazendo alusão à Súmula n° 68 do TST, transfere ao autor o ônus de provar a identidade de funções. Nessas condições, conheço do recurso. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. ENUNCIADO N° 120/TST Aduziu o reclamado, em suas razões de recurso ordinário, que o Enunciado n° 120/TST não abrange a possibilidade de deferimento de equiparação salarial com base em decisão judicial proferida em ação trabalhista que concedeu isonomia salarial entre o ora paradigma e outro modelo indicado por esta, haja vista que esse entendimento geraria uma cadeia sem fim de equiparação salarial. O Regional rejeitou esta argumentação, ou seja, entendeu aplicável o Enunciado n° 120 desta Corte, sob o fundamento de que a identidade de função foi postulada em relação à Sra. Mariângela Batista Silva, não tendo a reclamante se beneficiado da ação ajuizada pelo ora paradigma. Assentou que o banco se esqueceu que a autora somente faz jus à equiparação salarial em razão da decisão pronunciada neste processo e que se deveu à prova da identidade de funções com o paradigma. Ressaltou que a decisão judicial do ora paradigma, per si, não gera a equiparação salarial com outros empregados, por isso não há que se falar em ‘cascata ou cadeia’, porquanto apenas os funcionários que comprovarem a identidade de funções nos exatos termos do artigo 461 da CLT farão jus à equiparação salarial (fl. 134). Na revista, o banco reitera ser inaplicável in casu o Enunciado n° 120/TST. Por outro lado, aponta violação do art. 461 da CLT, sob o argumento de que a decisão regional admitiria a possibilidade de equiparação salarial não com o paradigma indicado, mas sim como o modelo apontado por este em sua reclamatória, inviabilizando-se, assim, a verificação da presença dos requisitos exigidos pelo art. 461 supramencionado e criando uma cascata de equiparação que jamais teria fim. Apresenta arestos para o cotejo. Finalmente, tem como vulnerado o art. 472 do CPC, sob o argumento de que não poderia a reclamante beneficiar-se de decisão prolatada em reclamatória trabalhista da qual não participou como parte, transcrevendo um julgado para o confronto de teses à fl. 154. Em que pese ao inconformismo patronal, o recurso não prospera neste particular. Com efeito, o Regional, observando a diretriz da Súmula n° 120 do TST, registrou expressamente que somente fazem jus à equiparação salarial o empregado que comprove a identidade de função nos exatos termos do art. 461 da CLT. Este posicionamento encontra-se em perfeita consonância com os ditames do referido preceito consolidado, bem como com a orientação abraçada no Enunciado n° 120/TST, segundo o qual “presentes os pressupostos do art. 461 da CLT, é irrelevante a circunstância de que o desnível salarial tenha origem em decisão judicial que beneficiou o paradigma.” Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 287 JURISPRUDÊNCIA A hipótese trata exatamente da situação teorizada no referido enunciado, pois versa sobre pedido de equiparação salarial com paradigma que, por sua vez, obteve equiparação salarial com outro modelo, por meio de decisão judicial. Ainda que assim não fosse, e a despeito da faticidade da discussão dos autos (Enunciado n° 126 do TST), insta ressaltar que os arestos trazidos pelo Recorrente não impulsionariam o apelo, por inespecíficos, pois todos adotam tese no sentido de que a equiparação salarial somente seria devida caso restasse comprovado o preenchimento dos requisitos do artigo 461 da CLT em relação ao primeiro empregado que deu ensejo a toda a “cadeia” de equiparações, sendo que, nos presentes autos, não restou suficientemente esclarecido qual seria, de fato, o empregado que teria encabeçado todas as equiparações mencionadas no acórdão regional. Incide a diretriz da Súmula n° 296 do TST. Finalmente, não há falar em violação do art. 472 da CLT - nos moldes preconizados pela alínea c do art. 896 da CLT - e nem em divergência com o último aresto de fl. 154 - ante a inespecificidade deste -, porque, in casu, consoante bem asseverado no v. acórdão regional (fl. 134), “a recorrida não se beneficiou da ação ajuizada pela ora paradigma (...) a autora somente faz jus à equiparação salarial em razão da decisão pronunciada neste processo e que se deveu à prova da identidade de funções com a paradigma. ’’ (grifos nossos) Assim, diante dos fundamentos acima expostos, não conheço do recurso, neste particular. CORREÇÃO MONETÁRIA DOS DÉBITOS TRABALHISTAS. ÉPOCA PRÓPRIA No que tange ao tema em epígrafe, o TRT negou provimento ao recurso ordinário patronal, asseverando que o índice de correção monetária a ser aplicado é o do próprio mês trabalhado. Na revista, aduz o empregador que não se pode manter o entendimento de que são aplicáveis, para a atualização monetária das parcelas deferidas na presente reclamatória, os índices de correção monetária do mês trabalhado, haja vista que a atualização monetária só tem lugar quando verificada a mora do devedor. Transcreve arestos às fls. 155-157). Conheço do recurso por dissídio pretoriano, uma vez que o segundo aresto de fl. 156 esposa tese oposta à consagrada no venerando acórdão recorrido, no sentido de que a lei confere ao empregador a faculdade de efetuar o pagamento de salários dos empregados até o quinto dia útil do mês subseqüente ao mês da efetiva prestação de serviços, razão pela qual o índice a ser aplicado é o do mês em que o pagamento se tornou exigível. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 288 JURISPRUDÊNCIA MÉRITO EQUIPARAÇÃO SALARIAL. EXISTÊNCIA DE COISA JULGADA Um dos princípios lógicos básicos é o da identidade, segundo o qual “dois entes iguais a um terceiro são iguais entre si” (cfr. Ivan José Sanguineti, “Lógica”, EUNSA 1989 - Pamplona, pg. 217). O caso dos autos enquadra-se perfeitamente na subsunção a tal princípio, na medida em que o reconhecimento judicial da equiparação entre os paradigmas A, B e C, e da não equiparação entre o reclamante D e o paradigma A, não pode ter como conclusão, em um terceiro processo, da equiparação entre D e B. A única conclusão lógica é a da impossibilidade de equiparação entre D e B, sob pena de ir contra a conclusão firmada no primeiro processo judicial. Quando o § 2° do artigo 301 fala em identidade de partes, causa de pedir e pedido, utiliza conceito que não pode ser desconectado do princípio lógico que o embasa. A identidade, no caso, se verifica pela aplicação do princípio lógico à equação: uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido (§ 2° do artigo 301 do CPC). 1° processo: A x B - A é igual a D 2° processo: C x B - C é diferente de A 3° processo: C x B - C é igual a D (aberratio) A identidade se verifica não pelo rótulo das partes, mas pelas conclusões, que, em processos anteriores, identificaram, sob o prisma funcional (discutidos nos vários processos), o pólo ativo das distintas reclamatórias. Nesse sentido, é possível admitir a coisa julgada oblíqua, dentro de uma interpretação lógica do § 2° do artigo 301 do CPC, sob pena de se ter decisões contraditórias no tempo. Se é verdadeiro que, no caso, Mariângela e Ivan são iguais a Valéria e que, em reclamatória anterior a Reclamante foi reconhecida como diferente de Ivan, não pode obter na presente ação o reconhecimento de identidade funcional com Mariângela. Pelo exposto, dou provimento ao recurso de revista para, reformando o acórdão regional, extinguir o processo sem julgamento do mérito, com base no artigo 267, V, do CPC. Reputam-se prejudicados os demais temas conhecidos no recurso de revista. Isto posto, Acordam os Ministros da 4a Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista apenas quanto aos temas coisa julgada equiparação salarial, equiparação salarial - ônus da prova e correção monetária dos débitos trabalhistas - época própria, todos por divergência jurisprudencial. No mérito, dar-lhe provimento para, reformando o acórdão regional, extinguir o processo sem julgamento do mérito, com base no artigo 267, V, do CPC. Reputam-se prejudicados os demais temas conhecidos no recurso de revista. Brasília, 05 de abril de 2000. Milton de Moura França, presidente. Ives Gandra da Silva Martins Filho, relator. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 289 JURISPRUDÊNCIA COMPENSAÇÃO DE JORNADA. ACORDO TÁCITO. DEVOLUÇÃO DE DESCONTOS O art. 7°, XIII, da Constituição Federal admite o regime de compensação de horários, desde que pactuado mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho. Fica, assim, afastada a possibilidade de se invocar a existência de acordo tácito como forma de validar a compensação de jornada, porque tal modalidade de ajuste não encontra respaldo no texto constitucional. A necessidade de pactuação por escrito do regime de compensação de horários harmoniza-se com os princípios fundamentais do Direito do Trabalho, relativos à proteção do trabalho humano subordinado, além de representar uma maior segurança ao economicamente mais fraco, na medida em que evita a possibilidade de o empregador exigir a compensação deforma aleatória. DEVOLUÇÃO DE DESCONTOS. Se o Tribunal Regional não consigna a efetiva existência de demonstração concreta de vício de vontade no ato da autorização dos descontos salariais por parte do empregado, não há como prosperar a determinação de devolução dos valores descontados, porque tal determinação, fundamentada em simples presunção de vício, entra em atrito com os termos do Enunciado n° 342 do TST. Recurso em parte conhecido e provido. PROCESSO N° TST-RR-582.916/99 - (Ac. 2a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR582.916/99, em que é recorrente Banco Bradesco S/A e recorrida Inah Ramos Brasil. RELATÓRIO O egrégio 1o Regional, por intermédio do venerando acórdão de fls. 275/281, negou provimento ao recurso ordinário do reclamado no tocante aos temas relativos às horas extras, ajuda-alimentação, devolução dos descontos e multa normativa. Todavia, deu provimento parcial ao apelo da obreira para deferir as diferenças derivadas da integração da ajuda alimentação para o cálculo da maior remuneração da autora, com reflexos nas parcelas postuladas na inicial. Inconformado, recorre de revista o reclamado, pelas razões de fls. 282/294. Recurso admitido à fl. 298. Contra-razões às fls. 299/300. Os autos não foram enviados à douta Procuradoria-Geral. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 290 JURISPRUDÊNCIA VOTO Recurso próprio, tempestivo, devidamente preparado (fl. 295) e a representação é regular (fl. 296). HORAS EXTRAS CONHECIMENTO O Regional, afirmando que restou corretamente analisada a prova produzida nos autos, manteve a respeitável sentença de origem na parte em que condenara o reclamado ao pagamento de uma hora extra diária até agosto de 1993, tendo por base o depoimento testemunhal, e ao pagamento da diferença de horas extras, a ser apurada com base nos registros contidos nos cartões de ponto, para o período posterior a agosto de 1993. Nas razões recursais, sustenta o recorrente que a decisão regional não pode prosperar, pois era da recorrida o ônus de comprovar o labor extraordinário, ônus do qual não se desincumbiu. Traz arestos para confronto. Contudo, a tese contida nos arestos transcritos pelo Recorrente (fls. 283/286), no sentido de ser do empregado o ônus de provar a existência de horas extras, em nada dissente da decisão recorrida, na medida em que o Regional, além de não ter analisado a questão especificamente por este prisma, deixou claro que a condenação estava ajustada aos elementos probatórios dos autos. Logo, estando o entendimento adotado pelo Regional calcado no acervo probatório produzido, não há como se viabilizar a pretensão revisional, tendo em vista os termos do Enunciado n° 126 do TST. Não conheço. COMPENSAÇÃO DE JORNADA. ACORDO TÁCITO CONHECIMENTO Consignou o Regional, ao manter o deferimento das horas extras, que a compensação de jornada feita de forma tácita e aleatória pelo reclamado afronta a orientação jurisprudencial acerca da matéria, devendo existir ajuste - coletivo ou individual de forma escrita. Sustenta o recorrente que a compensação acordada prescinde da formalidade do acordo escrito, sendo plenamente aceitável em nosso ordenamento jurídico o ajuste de forma tácita. Colaciona arestos para confronto e aduz que, na remota hipótese de ser desconsiderado o regime de compensação acordado tacitamente, deve ser aplicado ao presente caso o Enunciado n° 85 do TST. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 291 JURISPRUDÊNCIA O terceiro aresto de fl. 287 dissente da decisão recorrida, pois assevera que, respeitados os limites máximos diário e semanal previstos em lei, é válido o acordo tácito de prorrogações de jornadas, em conformidade com a própria natureza do contrato de trabalho, que prescinde de solenidades especiais para sua formação. Conheço, por dissenso. MÉRITO Sem razão o recorrente. O art. 7°, XIII, da Constituição Federal admite o regime de compensação de horários, desde que pactuado mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho. Fica, assim, afastada a possibilidade de se invocar a existência de acordo tácito como forma de validar a compensação de jornada, porque tal modalidade de ajuste não encontra respaldo no texto constitucional. A necessidade de pactuação por escrito do regime de compensação de horários harmoniza-se com os princípios fundamentais do Direito do Trabalho, relativos à proteção do trabalho humano subordinado, além de representar uma maior segurança ao economicamente mais fraco, na medida em que evita a possibilidade de o empregador exigir a compensação de forma aleatória. De resto, deve ser observado que, a par de o Regional não ter analisado de forma específica a possibilidade de aplicação ao presente caso do comando contido no Enunciado n° 85 do TST, é certo que aquela Corte deixou claro que a controvérsia não se restringe apenas ao não-atendimento das exigências legais para a adoção do regime de compensação de horário, já que, além de tácita, a compensação era procedida de forma aleatória, sendo, portanto, inviável limitar-se a condenação apenas ao adicional respectivo, consoante pleiteia o Recorrente. Nego provimento ao recurso. DIFERENÇAS E INTEGRAÇÕES SOBRE HORAS EXTRAS CONHECIMENTO Relativamente ao presente tópico, o recorrente limita-se a afirmar que, diante da modificação da decisão regional, que espera e confia ele seja realizada por esta Corte, e não havendo horas extras a serem deferidas, improcede qualquer reflexo e integração dela decorrente. Todavia, o recorrente não apontou, nem mesmo em atenção ao princípio da eventualidade, qualquer violação legal ou dissenso jurisprudencial, estando o seu recurso, assim, completamente desfundamentado. Não conheço. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 292 JURISPRUDÊNCIA AJUDA-ALIMENTAÇÃO CONHECIMENTO Ao manter a respeitável sentença de origem, no particular, afirmou o Regional que o reclamado não logrou êxito em comprovar a satisfação integral da ajuda alimentação devida à Obreira por força de norma coletiva. O recorrente, ao pleitear a reforma do julgado, sustenta que a Recorrida não estava sujeita a horário extraordinário, como consignado pela MMª JCJ e pelo Regional. Diz que as convenções coletivas da categoria até setembro de 1990 eram expressas em relação à necessidade de prorrogação de 55 (cinqüenta e cinco) minutos da jornada bancária de 6 (seis) horas para o pagamento da ajuda de custo alimentação e que, a partir dessa data, o referido benefício fora estendido a toda a categoria, tendo sido sempre pago corretamente. Porém, apesar de demonstrar o seu inconformismo com a condenação, o recorrente novamente deixa de apontar a existência de violação legal e de colacionar aresto para confronto de teses, carecendo o seu apelo, dessa forma, da necessária fundamentação. Não conheço. DEVOLUÇÃO DOS DESCONTOS CONHECIMENTO O Regional aduziu que os descontos efetuados para custeio de seguro de vida e para manutenção de caixa beneficente afrontam o princípio da intangibilidade salarial assegurado no art. 462 da CLT, devendo ser mantida a condenação imposta em primeiro grau, sendo certo que a mesma sequer viola o entendimento jurisprudencial consagrado pelo Enunciado n° 342 do TST, pois compete ao empregador comprovar que a autorização para a realização do desconto foi obtida de forma livre, ante a presunção de coação exercida pelo economicamente mais forte na relação de emprego. Arrematou dizendo que, não havendo prova da adesão imaculada da obreira, conclui-se que os descontos foram realizados de forma ilegal. Em seu recurso, diz o recorrente que a recorrida expressamente autorizou os descontos relativos aos contratos firmados com a Cia. de Seguros e Caixa Beneficente e que o ato da contratação foi realizado entre pessoas capazes, tratando de objeto licito e sem qualquer vício de consentimento a fim de ensejar a pretendida nulidade. Invoca os termos do Enunciado n° 342 do TST e apresenta arestos para confronto de teses. A pretensão revisional prospera. O referido Enunciado n° 342 do TST reconhece como inválidos apenas aqueles descontos salariais efetuados com fulcro em autorização obtida mediante coação ou outro defeito viciador do ato jurídico. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 293 JURISPRUDÊNCIA De outro lado, a colenda SBDI1 desta Corte, por meio da Orientação Jurisprudencial de n° 160, firmou o seguinte entendimento: “DESCONTOS SALARIAIS. AUTORIZAÇÃO NO ATO DA ADMISSÃO. VALIDADE. É inválida a presunção de vício de consentimento resultante do fato de ter o empregado anuído expressamente com descontos salariais na oportunidade da admissão. É de se exigir demonstração concreta do vício de vontade.” (Precedentes: E-RR 233032/1995, Min. Rider de Brito, DJ de 26/3/99; E-RR 324582/1996, Min. Nelson Daiha, DJ de 26/3/99). No caso dos autos, o Regional determinou a devolução dos descontos com base na presunção de coação exercida pelo economicamente mais forte na relação de emprego, não tendo deixado claro que efetivamente restou demonstrada concretamente a existência de tal vício no ato da adesão da Obreira. Dessa forma, conheço do Recurso por atrito com o Enunciado n° 342 do TST. MÉRITO Conhecido por atrito com o Enunciado n° 342 do TST, dou provimento ao Recurso para excluir da condenação a determinação de devolução dos valores descontados a título de seguro de vida e caixa beneficente. MULTA NORMATIVA CONHECIMENTO O Regional, quanto ao presente tópico, aduziu que “(...) Não houve condenação de multas cumulativas por cada infração cometida pelo empregador, como sustentado no apelo patronal, eis que a r. sentença de 1o grau limitou o deferimento da multa normativa pela incorreção no pagamento de horas extras (...)”, fl. 278. O recorrente, fundamentando seu apelo em dissenso jurisprudencial, diz que merece reforma o acórdão regional, porque não ocorreu qualquer descumprimento de cláusulas normativas da categoria. O primeiro aresto (fls. 293/294), contudo, apresenta tese não discutida perante o Regional, qual seja, a de que o não-pagamento de horas extras não implica descumprimento de norma coletiva, daí não ser adequada a aplicação de multa convencional, pois o direito às horas extras controvertidas decorre de lei, não de CCT. Na decisão recorrida, aquela Corte limitou-se a analisar a questão sob o prisma da existência ou não de condenação de multas cumulativas por cada infração cometida pelo empregador. Não analisou, o Regional, a controvérsia pela ótica de a ausência do pagamento de horas extras implicar ou não descumprimento de norma coletiva, tal como o faz o primeiro paradigma. Óbice do Enunciado n° 296/TST. O segundo paradigma (fl. 294), por sua vez, é proveniente de turma deste Tribunal, não se enquadrando nas exigências do art. 896, letra a, da CLT. Não conheço. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 294 JURISPRUDÊNCIA Isto posto, Acordam os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do recurso quanto às horas extras. Por unanimidade, conhecer do recurso quanto à compensação de jornada - acordo tácito, mas negar-lhe provimento. Por unanimidade, não conhecer do recurso quanto às diferenças e integrações sobre horas extras e quanto à ajuda alimentação. Por unanimidade, conhecer do recurso quanto à devolução dos descontos e dar-lhe provimento para excluir da condenação a determinação de devolução dos valores descontados a título de seguro de vida e caixa beneficente. Por unanimidade, não conhecer do recurso quanto à multa normativa. Brasília, 23 de agosto de 2000. Vantuil Abdala, presidente. José Luciano de Castilho Pereira, relator. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. PLANO DE APOSENTADORIA COMPLEMENTAR (PAC). PROPORCIONALIDADE O Banco Itaú S/A., por meio da Circular BD-10/65, instituiu um plano de complementação de aposentadoria para os empregados. Para a obtenção do direito ao beneficio, os obreiros estariam sujeitos, dentre outros, à implementação do requisito da idade mínima de 55 anos, nos estritos termos da Circular BB-5/66, regulamentadora daquela, e da Circular RP-40/74. Considerando a existência de condição suspensiva, que até o advento da Lei n° 6.435/77 não tinha sido implementada pelo reclamante, não cabe falar em direito adquirido à complementação de aposentadoria integral, na forma das condições anteriormente vigentes. Inteligência do Enunciado n° 97 do TST e do art. 1.090 do Código Civil. Recurso de revista conhecido e provido. PROCESSO N° TST-RR-346.349/97 - (Ac. 1a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR346.349/97, em que são recorrentes Banco Itaú S/A. e outro e recorrido Antônio Dias. As fls. 738/746, o Tribunal Regional do Trabalho da 2a Região, analisando o recurso ordinário patronal, rejeitou a exceção de incompetência em razão da matéria e a preliminar de nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional. No mérito, deu parcial provimento ao apelo tão-somente para afastar a dupla consideração da gratificação natalina nos cálculos do complemento, entendendo correta a decisão de primeiro grau, que reconheceu o direito do autor à complementação de aposentadoria integral e condenou os reclamados ao pagamento dos honorários periciais, na forma do Enunciado n° 236 do TST. No que tange à discussão acerca das regras aplicáveis ao direito questionado, consignou que, quando da adesão do autor ao plano de aposentadoria complementar PAC, instituído pelo Banco Itaú S/A. e gerido e administrado pela Fundação Itaubanco, Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 295 JURISPRUDÊNCIA as normas regulamentares inseridas nas Circulares BD 10/65 e BB 5/66 incorporaram- se definitivamente ao contrato de trabalho celebrado entre as partes, tomando ilícitas quaisquer alterações que resultassem em prejuízos ao empregado, ainda que por mútuo consentimento, consoante se extrai da exegese dos arts. 5°, inciso XXXVI, da Carta Política e 468 da CLT e dos Verbetes Sumulares n°s 51 e 288 do TST. Foram opostos embargos declaratórios pelos recorrentes (fls. 747/750), objetivando suprir omissões ocorridas na decisão a qua. Todavia o colegiado rejeitou-os, haja vista a inexistência dos requisitos previstos no art. 535 do CPC (fls. 751/753). Interpõem recurso de revista os reclamados, com espeque nas alíneas a, b e c do art. 896 da CLT (fls. 754/811). Requerem, de início, que seja reconhecida a nulidade do acórdão regional proferido em sede de embargos declaratórios por negativa de prestação jurisdicional, invocando, para tanto, os arts. 5°, incisos XXXV e LV, e 93, inciso IX, da Constituição Federal; 535 e 536 do CPC e 795 e 832 da CLT, o Enunciado n° 184 do TST e conflito pretoriano (fls. 757/763). No tocante às diferenças de complementação de aposentadoria, alegam que o decisum, ao consignar que ao recorrido não se aplicava o critério de cálculo proporcional, conquanto não tenha aquele atendido ao requisito de idade mínima de 55 anos previsto no plano de aposentadoria complementar - PAC, violou o disposto nos arts. 3° e 6°, §§ 1° e 2°, da LICC; 5°, incisos II e XXXVI, da Lei Maior; 42, §§ 5° e 11, da Lei n° 6.435/77; 24, parágrafo único, do Decreto n° 81.240/78; 74, 114, 118,121 e 1.090 do Código Civil, contrariou os Enunciados n°s 97 e 288 do TST e divergiu dos arestos trazidos a divergência (fls. 766/804). Requerem, ainda, alternativamente, que o reajuste da complementação de aposentadoria seja anual, em face do advento da Medida Provisória n° 542/94, convolada na Lei n° 9.060/95. Fulcram o apelo, no particular, em violação do princípio da legalidade insculpido no inciso II do art. 5° da Carta Magna. Por fim, insurgem-se contra a condenação aos honorários periciais, apontando contrariedade ao Verbete Sumular n° 236 desta corte e dissídio de teses (fls. 809/811). Despacho de admissibilidade à fl. 866. Contra-Razões às fls. 869/875. A Procuradoria-Geral do Trabalho não se manifestou em face do disposto na Lei Complementar n° 75/93. É o relatório. VOTO CONHECIMENTO PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL Os reclamados argúem a nulidade do acórdão regional de fls. 751/753 por negativa de prestação jurisdicional, sustentando que as questões trazidas nos embargos declaratórios por eles opostos - no pertinente às diferenças de complementação de aposentadoria e aos honorários periciais - não foram devidamente apreciadas pelo Tribu Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 296 JURISPRUDÊNCI nal Regional do Trabalho da 2a Região. Nesses termos, indicam vulneração dos arts. 5o, incisos XXXV e LV, e 93, inciso IX, da Carta Política; 535 e 536 do CPC e 795 e 832 da CLT, contrariedade ao Enunciado n° 184 desta corte e conflito pretoriano (fls. 757/763). No que tange à primeira matéria, aduzem, em síntese, que o Tribunal a quo deixou de adotar tese explícita acerca de aspectos essenciais ao desate da lide, referentes ao plano de aposentadoria complementar (PAC), à Circular n° RP-40/74 e à Lei n° 6.435/77. Também argumentam, quanto aos honorários periciais, que o colegiado não se manifestou sobre pontos relativos ao laudo pericial e tampouco sobre o fato de que a complementação de aposentadoria é matéria de direito, cuja análise não dependeria da realização de perícia. Nos termos do art. 249, § 2o, do CPC e em observância ao princípio da celeridade processual, deixo de apreciar a presente prefaciai de nulidade, em face da possibilidade de ser proferida decisão favorável aos recorrentes. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. PLANO DE APOSENTADORIA COMPLEMENTAR (PAC). PROPORCIONALIDADE Não obstante o fato de ter reconhecido expressamente que o recorrido à época não implementava todas as condições necessárias à exigibilidade do benefício questionado, não estando, pois, habilitado ao exercício do direito (art. 6o, § 2o, da LICC), o Tribunal Regional manteve o entendimento declinado pelo juízo de primeiro grau, considerando o acerto do julgado na escolha das normas para o cálculo da complementação de aposentadoria. Invocou, para tanto, o principio básico da primazia das normas e condições mais benéficas ao empregado, assim como a intangibilidade do ato jurídico perfeito e acabado (art. 5o, inciso XXXVI, da Constituição Federal); fundamentos norteadores dos Enunciados n°s 51 e 288 do TST. E, ainda: “Quando da adesão do autor ao plano (1o de janeiro de 1966 segundo a defesa), as normas regulamentares inseridas nas Circulares B.D. 10 e B.B. 5 incorporaram-se definitivamente ao contrato de emprego, com o mesmo peso vinculante de qualquer cláusula contratual, tomando-se inalteráveis em desfavorecimento do obreiro e muito menos pela exclusiva vontade patronal. É o que emerge da força obrigatória dos contratos em geral e do artigo 468 consolidado em especial. “Pacta sunt servanda”. Nem mesmo à lei federal superveniente é dado modificar condições assim estratificadas pelo consenso, formando em consonância com as leis vigentes à época do respectivo aperfeiçoamento. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 297 JURISPRUDÊNCIA Regras elementares de hermenêutica e de direito intertemporal desmontam a tese recursal. Aliás, homenageadas já estavam nos preceitos que reestruturaram e consolidaram o plano nos termos da Circular C.P.G. 457/74”. (Fl. 744). Em face da argumentação acima exposta, afastou o Tribunal a quo a tese patronal, consubstanciada no art. 5°, inciso II, da Carta Magna e na Lei n° 6.435/77, de que foram modificadas as condições vigentes ao tempo da celebração do contrato de trabalho do empregado. No recurso de revista, os reclamados defendem a reforma da decisão regional, com apoio em ofensa aos arts. 3° e 6°, §§ 1° e 2°, da LICC; 5°, incisos II e XXXVI, da Lei Maior; 42, §§ 5° e 11, da Lei n° 6.435/77; 24, parágrafo único, do Decreto n° 81.240/78; 74,114, 118, 121 e 1.090 do Código Civil e em contrariedade aos Enunciados n°s 97 e 288 do TST. Também trazem arestos com o fito de caracterizar o conflito de teses (fls. 766/804). Utilizam-se os recorrentes dos argumentos sintetizados a seguir: 1) o Banco Itaú S/A. instituiu o plano de aposentadoria complementar - PAC (Circular BD10/65), gerido e administrado pela Fundação Itaubanco, cujo regulamento foi baixado pela Circular BB-5/66; 2) A Circular BB-5/66 impôs requisitos a serem preenchidos, pelos empregados para a obtenção da vantagem, dentre os quais se destaca o da idade mínima, a ser fixada pelo Conselho de Administração do Banco; 3) as circulares BD10/65 e BB-5/66 foram consolidadas pela RP-40/74, que manteve as normas básicas para a concessão da complementação de aposentadoria; 4) a Circular RP-40/74 fixou em 55 anos o requisito idade mínima já previsto na Circular BB-5/66; 5) a jurisprudência do TST, consubstanciada no Enunciado n° 97, declina entendimento de que, instituída a complementação de aposentadoria por ato da empresa, expressamente dependente de sua regulamentação, as condições desta devem ser observadas como parte integrante da norma; 6) não poderia ter sido deferida ao autor a complementação de aposentadoria de forma integral, e sim proporcional, na forma do Plano B do regulamento do PAC, conforme se infere dos termos da Lei n° 6.535/77 e do Decreto n° 81.240/78; 7) não incidência dos Verbetes Sumulares n°s 51 e 288 desta corte, porque as alterações feitas no regulamento do PAC decorreram do cumprimento de normas legais cogentes; e 8) inexistência de direito adquirido do empregado de se aposentar pela previdência social. À análise. É incapaz de dar azo à revista a alegação de ofensa ao art. 24, parágrafo único, do Decreto n° 81.240/78, haja vista que tal hipótese não encontra respaldo na alínea c do art. 896 consolidado. Não é apta, igualmente, a impulsionar o apelo revisional a suscitada vulneração dos arts. 5°, inciso XXXVI, da Carta Política; 74, 114, 118, 121 e 1.090 do Código Civil e 3° e 6°, §§ 1° e 2°, da LICC, uma vez que a admissibilidade do recurso de revista, amparada na alínea c do art. 896 da CLT, pressupõe violação direta, literal e inequívoca dos preceitos invocados. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 298 JURISPRUDÊNCIA Não se cogita de vulneração do art. 5o, inciso II, da Lei Maior, haja vista que o Supremo Tribunal Federal, em voto do Excelentíssimo Ministro Marco Aurélio, proclamou a impossibilidade fática de violação literal e direta desse dispositivo constitucional no julgamento do AG-AI-157.990-1-SP, DJU 12/5/95, p. 12.996. A ofensa à norma infraconstitucional deve preceder à do referido dispositivo constitucional, de modo que, somente após caracterizar-se aquela, pode-se, indireta e reflexivamente, concluir que esta foi desrespeitada. Na verdade, são as regras infraconstitucionais que viabilizam o mencionado preceito constitucional, emprestando- lhe efetividade no mundo jurídico. O recurso de revista, todavia, logra alcançar êxito por divergência de teses. O Acórdão paradigma de fls. 766/769 consagra tese oposta à defendida pelo colegiado a quo, pois, ao analisar situação análoga à dos autos, declina entendimento de que: 1) não há falar em alterações do PAC, porque a Circular BD-10/65, que o instituiu, fazia referência expressa a que o plano seria implementado conforme regulamento posterior (Circular BB-5/66); 2) a Circular BB-5/66 previa, no item 3.4, o requisito idade mínima, que foi fixada em 55 anos pela Circular RP-40/74; 3) descabe a alegação de direito adquirido à complementação de aposentadoria, pois a aludida condição não foi implementada pelo empregado; 4) ao caso se aplicam os termos do Enunciado n° 97 do TST; 5) o Enunciado n° 288 não se pode sobrepor aos preceitos da Lei n° 6.435/77 e do Decreto n° 81.240/78 e 6) o benefício deve ser analisado nos termos do art. 1.090 do Código Civil. Conheço do recurso de revista, pois. MÉRITO COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. PLANO DE APOSENTADORIA COMPLEMENTAR (PAC). PROPORCIONALIDADE Discute-se na hipótese vertente a existência de direito do reclamante ao percebimento da complementação de aposentadoria integral, sem as limitações impostas pela Lei n° 6.435/77, regulamentada pelo Decreto n° 81.240/78. Não há como analisar, debater e definir a controvérsia concernente às diferenças de complementação de aposentadoria sem proceder ao exame das regras aplicáveis ao direito questionado, inseridas no plano de aposentadoria complementar (PAC) instituído pelo Banco Itaú S/A. e gerido e administrado pela Fundação Itaubanco - e nas legislações mencionadas. Consoante se extrai dos autos, o Banco, por intermédio da Circular BD-10/65, datada de 10.12.65 e regulamentada pela Circular BB-5/66, de 8/3/66, instituiu um plano de complementação de aposentadoria para os empregados, tendo o recorrido a ele aderido em 01.01.66. A Circular BB-5/66 impôs condições a serem satisfeitas pelos empregados, de forma cumulativa, para a aquisição do direito à filiação ao plano de complementação de aposentadoria - PAC. Dentre as exigências estabelecidas, tem-se que os obreiros Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 299 JURISPRUDÊNCIA deveriam atingir a idade mínima a ser fixada pelo Conselho de Administração do banco. Registre-se, de início, que a regulamentação baixada pela Circular BB-5/66 não configura alteração unilateral ao PAC, pois a circular que o instituiu fazia referência expressa à circunstância de que o aludido plano seria implantado conforme regulamento posteriormente divulgado, o que ocorreu em 08.03.66. Em 28.05.74, foi editada a Circular RP-40/74, que, mantendo as normas básicas para a concessão da complementação de aposentadoria, insertas nas circulares retromencionadas, fixou a idade mínima de 55 anos como pressuposto à obtenção da vantagem. A parte não pode perder de vista que o fato de o limite de idade ter sido especificado tão-somente em 28.05.74 não desobriga o reclamante - admitido anteriormente a essa data e jubilado em data posterior à vigência da RP-40/74 - do implemento daquela condição. Isso porque, à época da edição da referida circular, o empregado ainda não havia adquirido o direito à aposentadoria. Também aqui não há falar em alteração contratual lesiva ao empregado, visto que a Circular RP-40/74, ao fixar a condição da idade mínima em 55 anos, apenas consolidou a norma inserta na Circular BB-5/66, a qual estava vinculado o autor. Para reforçar esses argumentos, destaca-se a jurisprudência desta corte, firmada no Enunciado n° 97, de que “instituída complementação de aposentadoria, por ato da empresa, expressamente dependente de sua regulamentação, as condições desta devem ser observadas como parte integrante da norma.” Avançando no exame da matéria, é também necessário consignar que o requisito da idade mínima foi expressamente reconhecido pela Lei n° 6.435/77, regulamentada pelo Decreto n° 81.240/78, que dispõe sobre as entidades de previdência privada, enfeixando normas de ordem pública. Frise-se, por ser oportuno, que as referidas legislações estipularam que os participantes dos planos de previdência privada que, até aquele momento, ainda não tinham implementado as condições para se aposentarem, como é o caso do autor, fariam jus à complementação de aposentadoria de acordo com as normas do plano a que estavam vinculados, ressalvando, contudo, a aplicação do critério da proporcionalidade. Em face dessas novas disposições legais, que passaram a nortear a complementação de aposentadoria, a Fundação Itaubanco reformulou seus estatutos e o regulamento do PAC, introduzindo modificações nas normas internas do Banco, cujos termos foram divulgados pela Circular RP-40/80, de janeiro de 1980. Veja-se que não há falar em direito adquirido do autor à complementação de aposentadoria integral (Plano A do PAC), na forma das condições anteriormente vigentes, pois, quando publicada a Lei n° 6.435/77, havia condição suspensiva que não fora implementada pelo reclamante, conforme expressamente reconhecido pelo Tribunal a quo. Nessa perspectiva, correto o enquadramento do recorrido na “Situação Especial B” do PAC, com a conseqüente apuração do benefício de forma proporcional. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 300 JURISPRUDÊNCIA À guisa de ilustração, citam-se os seguintes precedentes: RR-359.966/97, 2a Turma, Relator Exm° Sr. Ministro Vantuil Abdala, decisão unânime, DJ 10/3/00; RR530.077/99, 4a Turma, Relator Exm° Sr. Juiz Convocado Márcio Rabelo, decisão unânime, DJ 17/12/99 e ERR-131.726/94, SDI, Ac. 2.492/97, Relator Exmo. Sr. Ministro Francisco Fausto, decisão unânime, DJ 27/6/97. Ante o exposto e considerando a exegese do art. 1.090 do Código Civil, dou provimento ao recurso de revista para julgar improcedente a reclamatória, ficando invertido o ônus da sucumbência quanto aos honorários periciais, cuja responsabilidade fora atribuída ao Banco Itaú S/A., e às custas processuais. Prejudicado o exame da preliminar de nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional, em face da norma inserta no art. 249, § 2°, do CPC e do outro tema versado no recurso de revista. CONCLUSÃO Conhecer do recurso de revista apenas quanto ao tema da complementação de aposentadoria - Plano de aposentadoria complementar (PAC) - Proporcionalidade, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, dar-lhe provimento para julgar improcedente a reclamatória, ficando invertido o ônus da sucumbência quanto aos honorários periciais, cuja responsabilidade fora atribuída ao Banco Itaú S/A., e às custas processuais. Prejudicado o exame da preliminar de nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional, em face da norma inserta no art. 249, § 2°, do CPC e do outro tema versado no recurso de revista. Isto posto, Acordam os Ministros da 1a Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, conhecer do recurso de revista apenas quanto ao tema da complementação de aposentadoria - Plano de aposentadoria complementar (PAC) - Proporcionalidade, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, por maioria, dar-lhe provimento para julgar improcedente a reclamatória, ficando invertido o ônus da sucumbência quanto aos honorários periciais, cuja responsabilidade fora atribuída ao Banco Itaú S/A., e às custas processuais, vencido o Exm° Sr. Juiz Convocado Vieira de Melo Filho. Prejudicado o exame da preliminar de nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional, em face da norma inserta no art. 249, § 2°, do CPC e do outro tema versado no recurso de revista. Brasília, 31 de maio de 2000. Almir Pazzianotto Pinto, presidente. Ronaldo José Lopes Leal, relator. CONFLITO TRABALHISTA NO ESPAÇO. TRABALHO NO EXTERIOR Conflito de leis do trabalho no espaço. Empregado brasileiro que celebra contrato para realizar trabalho no exterior. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 301 JURISPRUDÊNCIA Os direitos e obrigações trabalhistas são regidos pela lei do local em que são prestados os serviços - lex loci executionis, em face do contido nos artigos 17 da Lei de Introdução ao Código Civil e 198 do Código de Bustamante, verdadeiro Código de Direito Internacional Privado, vigente no Brasil, porque ratificado pelo Decreto n° 18.871, de 13 de agosto de 1929. A melhor doutrina é uníssona em tal sentido. Segundo Arnaldo Süssekind, o princípio da regência dos atos pela lei do lugar da execução - lex loci executionis -posiciona-se como cardeal para a solução dos conflitos de leis trabalhistas no espaço, não só na de execução, como também na de cessação do contrato de trabalho - (Conflitos de Leis do Trabalho Freitas Bastos). Revista não conhecida. PROCESSO N° TST-RR-165.909/95 - (Ac. 4a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR165.909/95, em que é recorrente Hélio Mário Guerreiro Ribeiro e recorrida Companhia Siderúrgica Nacional. A Corte regional declarou a improcedência da ação, dando provimento ao recurso ordinário da reclamada, pois aplicável à espécie o Enunciado de Súmula n° 207 do TST, que preconiza ser a legislação trabalhista do local da prestação de serviços a que deve reger a relação jurídica de trabalho no exterior (fls. 89/92). Inconformado, o reclamante interpõe recurso de revista, com fulcro nas alíneas a e c do artigo 896 da CLT (fls. 93/103). Alega, de plano, equívoco do Colegiado a quo quanto à interpretação emprestada ao documento de fl. 14. Suscita afronta aos artigos 114, 173 e 5o, incisos XXXV e LV, da Constituição Federal, 651, § 2o, da CLT e Lei n° 7.064/82. Transcreve arestos para cotejo jurisprudencial. Admitida a revista pelo despacho de fl. 105, no efeito devolutivo, foram apresentadas contra-razões a fls. 107/118. A Procuradoria-Geral opina no sentido do não-conhecimento e não-provimen- to. Relatados. VOTO Tempestivo (fl. 92/93), subscrito por advogados habilitados nos autos (fl. 05) e efetuado o pagamento das custas a contento (fl. 62). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 302 JURISPRUDÊNCIA CONHECIMENTO CONFLITO DE LEIS TRABALHISTAS NO ESPAÇO. EMPREGADO BRASILEIRO QUE CELEBRA CONTRATO PARA TRABALHAR NO EXTERIOR A Corte regional firmou entendimento no sentido da aplicação do Enunciado n° 207 do TST, sob o fundamento de que há documento nos autos comprovando que, tanto o contrato quanto o trabalho, foram realizados na cidade de Nova Iorque e julgou improcedente o pedido (fls. 89/91). Inconformado, o reclamante interpõe recurso de revista, com fulcro nas alíneas a e c do artigo 896 consolidado (fls. 93/103). Alega, inicialmente, equívoco quanto ao enquadramento jurídico dos fatos, tendo em vista constar do documento de fl. 14, que, aliás, foi expressamente citado no aresto regional, que “a CSN aprovou a contratação dos serviços de V.Sa., como representante do gabinete do Ministro da Indústria e Comércio...”. Daí a competência da Justiça do Trabalho brasileira para julgar a demanda, como preconizado no artigo 114 da Constituição Federal, não havendo cogitar de improcedência do pedido, mas de incompetência. Diz desrespeitado o art. 114 da Carta da República, além de invocar o art. 5°, XXXV e LV, também da Constituição Federal, para dar suporte à assertiva de negativa de prestação jurisdicional. Aduz que ao caso aplica-se o art. 651, § 2°, da CLT, porque se trata de demanda envolvendo empresa brasileira e empregado brasileiro que trabalha na sua filial nos Estados Unidos. Invoca, ainda, ofensa à Lei n° 7.064/82 e inaplicabilidade do Enunciado de Súmula n° 207 do TST. Em relação à negativa de prestação jurisdicional, a revista encontra-se desfundamentada, porquanto, apesar de a parte indicar afronta a art. 5°, incisos XXXV e LV, da Carta Política, não cuidou de apontar qual o ponto do recurso sobre o qual a Corte regional não tenha se manifestado. Registre-se que a fundamentação sucinta não equivale à ausência de entrega da prestação jurisdicional. Tem-se, ainda, que a parte sequer opôs embargos de declaração para instar o Regional a se pronunciar sobre determinado tema que entendia não estar suficientemente examinado. Quanto ao art. 173 da Carta Magna, incide o Enunciado de Súmula n° 297 do TST, em face da carência do indispensável prequestionamento. No concernente à Lei n° 7.064/82, melhor sorte não socorre o reclamante, pois não cuidou de indicar expressamente qual o dispositivo tido como ofendido, procedimento inafastável nesta esfera recursal, em face da natureza extraordinária do recurso de revista. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 303 JURISPRUDÊNCIA Em relação ao artigo 114 da Constituição Federal e ao dispositivo 651, § 2°, da CLT, a revista não se credencia ao conhecimento, tendo em vista que as instâncias ordinárias se manifestaram sobre a competência. Ademais, não se pode confundir competência de lei e competência jurisdicional. Aquela diz respeito ao problema de saber se a lei aplicável ao caso é a lei nacional ou estrangeira. Esta refere-se à competência do tribunal do país para julgar a questão. Como escreve Enrico Tullio Liebman, “pertencem à jurisdição brasileira todas aquelas causas que, seguindo as regras internas da competência territorial, pertencem à competência de um juiz brasileiro”. Pouco importa que a lei aplicável seja a estrangeira. E, em tal hipótese, quando o juiz brasileiro tiver de aplicar a lei estrangeira, “ter-se-á em vista a disposição desta, sem considerar-se qualquer remissão por ela feita a outra lei” -art. 16 da LICC. De maneira que, no direito brasileiro, não se admite o retomo ou a devolução (teoria do reenvio), em matéria de conflito de leis no espaço. E o art. 651 da Consolidação fixa a competência do juiz brasileiro pelo lugar de prestação do serviço, “ainda que o empregado tenha sido contratado no estrangeiro” (in Instituições de Direito do Trabalho - 16a Edição, vol. 1, págs. 174/177, Arnaldo Süssekind, Délio Maranhão, Segadas Vianna e Lima Teixeira). No que tange aos arestos transcritos para cotejo de julgados, aplica-se o Enunciado de Súmula n° 296 desta Corte, pois cuidam de hipóteses em que o empregado foi contratado no Brasil, premissa não abraçada pelo acórdão regional. Registre-se, por importante, que dispõe o art. 198 do Código de Bustamante ser TERRITORIAL a legislação de proteção social do trabalhador, que assim revela expressamente “TAMBIÉN ÉS TERRIORIAL LÁ LEGISLACIÓN SOBRE ACCIDENÍES DEL TRABAJO Y PROTECCIÓN SOCIAL DEL TRABAJADOR”. Rege, assim, a lei do lugar do trabalho, contra a qual não pode prevalecer a autonomia da vontade. Neste sentido a Súmula n° 207 do Tribunal Superior do Trabalho. Em princípio, o artigo 9°, caput, da Lei de Introdução ao Código Civil brasileiro dispõe que “para qualificar e reger as obrigações aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem”, revelando, com isso, que o legislador pátrio adotou como regra o princípio segundo o qual a lei do local da celebração rege o contrato - lex loci actum. Porém, mais adiante, em seu art. 17, comprovando que toda regra tem exceção, a Lei de Introdução estabeleceu, por outro lado, a excludente de que: “As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes.” Em conseqüência, tendo o Brasil adotado a política de relacionamento internacional da reciprocidade, ratificada através do Decreto n° 18.874, de 13.8.89, o Código de Bustamante, verdadeiro Código de Direito Internacional Privado é explícito no que prevê que as leis de acidentes do trabalho e proteção social ao trabalhador são de natureza territorial - artigo 198. Vale dizer: a relação jurídica que aproxima empregado e empregador e os torna senhores de direitos e obrigações é regida pela legislação vigente no país em que prestados os serviços e, portanto, executado o contrato. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 304 JURISPRUDÊNCIA A melhor doutrina é uníssona em tal sentido. Segundo ARNALDO SÜSSEKIND, o princípio da regência dos atos pela lei do lugar da execução - lex loci executionis posiciona-se como cardeal para a solução dos conflitos de leis trabalhistas no espaço, não só na de execução, como também na de cessação do contrato de trabalho - (Conflitos de Leis do Trabalho - Freitas Bastos). As normas relativas ao trabalho, em sua maioria, são imperativas, aspecto a relegar a plano secundário a vontade das partes. A autonomia pertinente a esta última cede lugar à conveniência de o próprio Estado disciplinar a solução dos conflitos sociais, atento às peculiaridades reinantes e aos anseios da sociedade e, portanto, à “impossibilidade de derrogação”, por tal forma, da legislação de trabalho - (DEVEALI). Assim, preserva-se também a igualdade de tratamento de empregados que prestam serviços em uma mesma localidade. Este fato é ressaltado por DURAND e JAUSSAUD, em Tratado de Direito do Trabalho, conforme salienta SÜSSEKIND na monografia referida: “A competência reconhecida à lex loci executionis apresenta a grande vantagem de unificar o regime das relações de trabalho, pois que a lei local já determina as regras administrativas de política do trabalho. Ela permite, enfim, que se submeta às mesmas regras o pessoal de um mesmo estabelecimento.” Outro não é o posicionamento de Gilda Maciel Corrêa Meyer Russomano, para quem o regime igualitário é pedra angular do moderno Direito do Trabalho e, sem dúvida, a territorialidade das suas leis contribui para que ele seja mantido, na prática. E acrescenta, com mestria: “Não se pode levar em consideração a sede da empresa: daí poderiam advir, como acentuamos, vantagens para o empregador, em detrimento das prerrogativas atribuídas ao empregado pelo Direito do Trabalho. O lugar da prestação de serviço, ao contrário, além de ser campo comum dos interesses do empregado e do empregador, como também ocorre com o critério do lugar da celebração do contrato, é o cenário em que se desenvolve a vida profissional do trabalhador e aí surgem ou crescem os problemas que resultam da execução do contrato.” “Em síntese, a solução dos conflitos de leis relativas ao conteúdo do contrato individual de trabalho é obtida através de aplicação da norma em vigor no lugar da execução do trabalho, por todas as razões expostas, visto que o trabalho é o objeto do contrato e o lugar de sua execução surge como elemento relevante. Mas o princípio da ordem pública reforça essa conclusão, porque - embora funcione caso a caso, por assim dizer, a posteriori - a maioria, a quase totalidade das leis trabalhistas de direito privado que regulam o contrato individual de trabalho.” No direito comparado, Manoel Alonso Oléa aponta estar o princípio da territorialidade justificado, não só pelo fato de as normas de Direito do Trabalho serem cogentes, de ordem pública, como também pela circunstância de as prestações, que entre Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 305 JURISPRUDÊNCIA si devem as partes estar ligadas, geograficamente, ao lugar da execução do contrato (Derecho del Trabajo, Madrid, 1971, página 295). No mesmo sentido concluem Eduardo Espinola e Eduardo Espinola Filho, Serpa Lopes, Pontes de Miranda e Oscar Tenório. Portanto, em se tratando de conflito envolvendo matéria ligada ao Direito do Trabalho, a necessidade de preservação da própria soberania do Estado leva à pertinência da legislação vigente no local em que cumpridas as cláusulas contratuais. Neste mesmo sentido já decidiu este c. TST, conforme se verifica pelos precedentes abaixo: “Conflito de Leis do Trabalho no Espaço -1.O princípio segundo o qual a lei do local da celebração rege o contrato - lex loci actum - artigo nono da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro - não é absoluto, cedendo lugar ao relativo a regência pela lei do local em que executado o contrato - lex loci executionis - quando em jogo a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes - artigo dezessete da aludida norma de sobredireito. 2. As normas de proteção ao trabalhador são cogentes, atraindo limitação ao princípio da lex loci actum. 3. Os direitos e obrigações trabalhistas são regidos pela lei do local em que prestados os serviços - lex loci executionis - face ao contido nos artigos dezessete da Lei de Introdução ao Código Civil e cento e noventa e oito do Código de Bustamante, verdadeiro Código de Direito Internacional Privado, vigente no Brasil, porque ratificado pelo Decreto número dezoito mil e oitocentos e setenta e quatro, de treze de agosto de mil novecentos e vinte e nove. 4. Em matéria trabalhista dá-se a aplicação da lex loci executionis face ao princípio da territorialidade (Código de Bustamante) pertinente diante da natureza cogente das normas respectivas (Süssekind), que são de ordem pública internacional (Délio Maranhão), aspecto a afastar a possibilidade de derrogação pela vontade das partes (Deveali), da necessidade de tratamento idêntico dos empregados que ombreiam (Durand, Jaussaud e Gilda Russomano), e do fato de as prestações que entre si devem as partes estarem ligadas, geograficamente, ao lugar de execução do contrato (Manoel Afonso Olea)” (Proc. TST-RR-3.621/83, Ac. 2.085/85, pub. no DJ de 2.8.85, Min. Marco Aurélio). “Lex loci executionis. 1. Pelo princípio da lex loci executionis adotado pela legislação brasileira, artigo nono da Lei de Introdução do Código Civil julga-se o conflito pela lei do lugar onde foi prestado o serviço, mesmo que contratado o prestador no Brasil. 2. Revista conhecida e provida” (Proc. TST-RR6.417/83, Ac. laT-4.794/84, pub. no DJ de 22.2.85, Min. Coqueijo Costa). Assim, pode-se afirmar que toda vez que a matéria discutida for regida por normas cogentes e, portanto, de ordem pública, o disposto no artigo 9o da Lei de Introdução ao Código Civil quanto à regência das obrigações pela lei do lugar em que pactuadas - lex loci actum - cede lugar ao consagrado princípio da lex loci executionis. Nas controvérsias trabalhistas, o acerto da aplicação da lei do local da execução do contrato decorre de interpretação sistemática dos artigos 9° e 17 da norma de sobre- Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 306 JURISPRUDÊNCIA direito, que é a lei de Introdução ao Código Civil e do contido no artigo 198 do Código de Bustamante, apontado como de Direito Internacional Privado e vigente no Brasil, porque ratificado mediante o Decreto n° 18.871, de 13 de agosto de 1929. Com estes fundamentos, não conheço do recurso de revista. Isto posto, Acordam os Ministros da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer do recurso de revista. Brasília, 24 de setembro de 1997. Wagner Antônio Pimenta, presidente. Milton de Moura França, relator. DISSÍDIO COLETIVO AJUIZADO POR EMPRESA. FALTA DE LEGITIMIDADE E DE INTERESSE PROCESSUAL Não existe no ordenamento jurídico qualquer norma determinando que as relações coletivas de trabalho sejam obrigatoriamente disciplinadas por instrumento normativo ou sentença normativa. Celebrar Convenções ou Acordos Coletivos de Trabalho não constitui obrigação imposta aos sindicatos profissionais, nem às empresas ou sindicatos da categoria econômica. Tanto isso é verdadeiro que a CLT, ao estabelecer a possibilidade da estipulação de condições de trabalho por meio de instrumentos coletivos, exige como requisito essencial a negociação entre as partes. No vazio normativo, ou seja, na ausência de instrumento negociado ou de sentença normativa, aplicam-se às relações de trabalho as regras estabelecidas na legislação. Sendo a ação coletiva uma ação da categoria, considerada como o conjunto dos trabalhadores de um mesmo ramo produtivo ou de uma mesma profissão, cujo objetivo é obter melhores condições de trabalho e remuneração, conclui-se que falta à CEPISA legitimidade e interesse processual para o ajuizamento deste Dissídio Coletivo. 2. Processo extinto sem julgamento do mérito. Art. 267, IV e VI, do CPC. PROCSO N° TST-RODC-617.110/99 - (Ac. SDC) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário em Dissídio Coletivo n° TST-RODC-617.110/99, em que são recorrentes Companhia Energética do Piauí - Cepisa e Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas no Estado do Piauí - Sintepi e outros e recorridos os mesmos. A Companhia Energética do Piauí - Cepisa ajuizou ação coletiva em relação aos Sindicatos dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas no Estado do Piauí - Sintepi, Sindicato dos Engenheiros no Estado do Piauí - Senge e Sindicato dos Técnicos Industriais no Estado do Piauí - Sintec. A empresa relata que constituiu comissão de negociação assim que recebeu a pauta de reivindicações e que foram realizadas várias reuniões com os suscitados, porém Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 307 JURISPRUDÊNCIA as reivindicações dos trabalhadores mostraram-se muito distantes da possibilidade de atendimento por parte da empresa, considerada a atual situação administrativa, econômica e jurídica em que se encontra, após integrada ao grupo Eletrobrás e, assim, sujeita aos preços públicos e ao controle do Estado. A suscitante diz que algumas cláusulas pleiteadas pelos trabalhadores constituem mera repetição de regras legais e, por isso, poderiam ser suprimidas sem prejuízo. Assim, fundamenta o ajuizamento da ação na impossibilidade de celebrar novo acordo coletivo de trabalho com os suscitados e traz as reivindicações dos trabalhadores com as alterações que entende cabíveis ou o motivo pelo qual não concorda com a instituição da cláusula. Junta as atas de quatorze reuniões de negociação realizadas com os suscitados (fls. 59/96), o acordo coletivo de trabalho anterior (fls. 98/105), documentos comprovando o pagamento do abono indenizatório instituído no instrumento coletivo anterior em compensação à supressão de condições contidas em acordos pretéritos (fls. 107/226), e protocolos assinados durante a negociação (fls. 229/32). Da ata da primeira audiência, juntada às fls. 264/5, consta que a suscitante argüiu a ilegitimidade passiva de dois dos sindicatos contra os quais ajuizou a ação - Sindicato dos Técnicos Industriais no Estado do Piauí - Sintec e do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Piauí - Senge. O prosseguimento da audiência foi adiado por uma vez, a pedido dos suscitados, em face da continuação das negociações entre as partes (fls. 272 e 280). Renovado o pedido de adiamento, foi indeferido (fls. 291/2 e 298). A ata da continuação da audiência encontra-se às fls. 304/5. Na contestação, às fls. 306/41, os suscitados defendem a legitimidade do Sindicato dos Técnicos Industriais do Estado do Piauí e do Sindicato dos Engenheiros do Estado do Piauí e trazem as cláusulas reivindicadas com suas justificativas. Acompanham a defesa ata da assembléia geral extraordinária e a lista de presença respectiva (fls. 390/408), cópia do edital de convocação (fl. 10), as atas das reuniões de negociação realizadas com a suscitante (fls. 411/34) e a contraproposta da empresa (fls. 437/43). O Ministério Público do Trabalho ofereceu parecer às fls. 455/93. As fls. 495/7, a empresa informa ao Tribunal que decidira conceder o auxílio-alimentação constante da Cláusula 32 das reivindicações, mas com outra redação, requerendo a homologação ad referendum, “por motivos de legalidade dos pagamentos que serão realizados”. Os suscitados, notificados para se manifestarem sobre essa petição, informaram que rejeitam essa proposta (fl. 659). O Ministério Público do Trabalho, às fls. 668/9, complementou o parecer anteriormente oferecido. Pelo acórdão de fls. 708/99, o egrégio TRT rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva do Senge e do Sintec, argüida pela suscitante, ante a incompatibilidade entre essa argüição e o ajuizamento do dissídio, pois a empresa indicou esses sindicatos como suscitados e requereu fossem citados para responderem aos termos das propostas Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 308 JURISPRUDÊNCIA por ela apresentadas. No mérito, deferiu algumas cláusulas nos termos propostos pelos suscitados e outras, com a redação que lhe conferia a suscitante. Deferiu ainda algumas condições com a redação dada pelo Exmo. Juiz Relator. Inconformada, a empresa interpõe recurso ordinário (fls. 812/840), renovando a argüição de ilegitimidade do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Piauí - Senge e do Sindicato dos Técnicos Industriais no Estado do Piauí - Sintec. Alega que a legitimidade não é fixada pelo autor da ação, mas pela lei, e que, sendo essas entidades representativas de categorias diferenciadas, não podem figurar como parte no processo. No mérito, insurge-se contra a concessão de dezessete cláusulas. Recorrem também os suscitados (fls. 842/50), em razão do indeferimento total ou parcial de várias cláusulas. Ambos os recursos foram admitidos pelo despacho de fl. 854. A Companhia Energética do Piauí - Cepisa requereu a concessão de efeito suspensivo, tendo sido deferido relativamente às cláusulas 2a, 6a, 11a, 13a, 15a (em parte), 16a, 17a (em parte), 27a, 28a (em parte), 31a, 33a, 43a, 44a e 55a, por meio do despacho de fls. 857/860. Contra-razões apresentadas pela Suscitante às fls. 864/72 e pelos suscitados às fls. 874/87. O Ministério Público do Trabalho, em parecer exarado às fls. 897/04, argúi preliminar de extinção do processo sem julgamento de mérito, em face da ausência de formalidade essencial ao ajuizamento do dissídio coletivo, relativa à irregularidade na lista de presença e na ata da assembléia geral. É o relatório. VOTO Regulares os pressupostos extrínsecos de admissibilidade dos recursos ordinários da Suscitante e dos suscitados, relativos à tempestividade (fls. 810 e 812; fls. 810 e 842), à representação processual (fl. 254; fls. 273/4 e 342) e ao preparo (fl. 841; fl. 852). PRELIMINAR DE EXTINÇÃO DO FEITO ARGÜIDA DE OFÍCIO PELO RELATOR Segundo a Teoria Geral do Processo, o interesse de agir decorre da lesão ao direito material, cabendo ao titular desse direito, caso queira, ajuizar ação para que o Estado-juiz, apreciando-a, restaure o direito lesado. O ajuizamento da ação coletiva objetiva a criação de novas condições de trabalho e remuneração, mais favoráveis à categoria profissional do que aquelas previstas legalmente. Portanto, no caso dessa ação, não existe o restabelecimento de direito lesado, mas a criação de direito novo, objetivo, instituído para disciplinar as relações trabalhistas entre partes em conflito, decorrente do exercício do poder normativo, conferido Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 309 JURISPRUDÊNCIA à Justiça do Trabalho por determinação constitucional e cuja atuação está restrita às lacunas da legislação. O interesse de agir, no dissídio coletivo, está relacionado à alteração das condições da prestação de serviço e da situação econômica, da qual decorre a necessidade do estabelecimento de novas regras que venham a disciplinar a relação de trabalho no âmbito de uma determinada categoria. O art. 873 da CLT refere-se a alterações que tornem injustas as normas estabelecidas anteriormente. Esse interesse é principalmente da categoria profissional insatisfeita com as normas coletivas que, no momento, regem a sua relação com os empregadores, pois estes têm o poder de conceder aos seus empregados todo e qualquer beneficio que desejem, sem a necessidade do consentimento deles e, muito menos, da permissão ou autorização da Justiça do Trabalho. Da mesma forma, podem as empresas, na ausência de norma coletiva em vigor, deixar de deferir aos seus empregados as vantagens que constavam desse instrumento, sem que com isso provoque lesão a qualquer direito, considerada a existência de regras básicas estabelecidas na legislação aplicável às relações de trabalho. Desobedecidas essas regras, cabe aos empregados, seja por meio de ação individual plúrima, seja pela atuação do sindicato da categoria como substituto processual, buscar a restauração do seu direito. No caso ora examinado, o acordo coletivo anterior vigorou de 1o de fevereiro a 31 de outubro de 1998 (fls. 98/105). Pela documentação trazida aos autos, verifica-se que as reuniões de negociação tiveram início em 5/11/98. Há um ajuste de prorrogação do acordo coletivo até 12/2/99 (fl. 232), data em que a empresa ajuizou este dissídio. Considerado o fato de que os sindicatos profissionais não o fizeram, é de se indagar qual o interesse da empresa em ajuizar esta ação, na ausência de instrumento coletivo em vigor, já que exaurido o prazo ajustado de prorrogação do Acordo celebrado no ano anterior. É certo que não existe no ordenamento jurídico qualquer norma determinando que as relações coletivas de trabalho sejam obrigatoriamente disciplinadas por instrumento normativo ou sentença normativa. O art. 114, § 2o, da Constituição Federal diz que “é facultado” aos sindicatos o ajuizamento de dissídio coletivo, no caso de recusa de qualquer das partes à negociação. A Consolidação das Leis do Trabalho, em seu art. 513, alínea b, dispõe que é “prerrogativa” dos sindicatos celebrar convenções coletivas. Ora, prerrogativa significa privilégio, concessão ou vantagem com que se distingue um determinado grupo, regalia. Portanto, celebrar convenções ou acordos coletivos de trabalho não constitui obrigação imposta aos sindicatos profissionais, nem às empresas ou sindicatos da categoria econômica. Tanto isso é verdadeiro que a CLT, ao estabelecer a possibilidade da estipulação de condições de trabalho por meio de instrumentos coletivos, exige como requisito essencial a negociação entre as partes. No vazio normativo, ou seja, na ausência de instrumento negociado ou de sentença normativa, aplicam-se às relações de trabalho as regras contidas na legislação, como já dito anteriormente. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 310 JURISPRUDÊNCIA Ressalte-se que as condições trazidas pela empresa ao exame da Justiça do Trabalho, em sua maioria, dependem tão-somente da sua liberalidade, como, por exemplo, entre outras, as cláusulas IX - Participação nos Lucros e Resultados, X - Produtividade, XI - Anuênio, XIV - Empréstimo Férias, XX - Adiantamento/Salário, XXI - Adiantamento de 13° Salário nas Férias, XXIII - Adicional de Condutor Autorizado, XXIV - Adicional de Participação nos Lucros - Incorporação ao Salário, XXVII Hora Universidade (ausência facultada aos empregados estudantes em curso superior), XXIX - Aniversário (ausência no dia), XXXII - Auxílio-Alimentação, XXXIII - Fornecimento de Refeições Gratuitas em Dobra de Turno, XXXIV - Incentivo à Aposentadoria, XXXVII - Adicional de 20% a título de Auxílio-Creche, XXXIX - Assistência Médico-Hospitalar e Odontológica, XLIV - Recrutamento Interno (obrigatoriedade de aproveitamento interno para provimento de vagas e de realização de concurso público), XLVI - Acompanhamento/Segurança do Trabalho (desvinculação do setor de segurança do trabalho da área de medicina assistencial e oferecimento de condições para que essas áreas cumpram suas obrigações), XLVII - Apoio ao Serviço Social, L Política Habitacional, LII - Análise da Água, LIII - Reuniões Bimestrais, LIV - Atividades Sindicais - Diretores/Delegados (permissão de ausência do expediente para desenvolver atividades sindicais), LVI - Disposições de Empregados (disposição de empregados para outros órgãos), LVIII - Incentivo à Autoformação Profissional, LXI Eleição de Empregado para o Conselho de Administração, LXIII - Redução da Jornada de Trabalho (sem prejuízo de salários). Nada impediria a empresa, já que frustrada a tentativa de negociação com a categoria profissional, de continuar concedendo aos empregados as condições que lhe aprouvesse, pois não está submetida ao cumprimento de qualquer ajuste coletivo, deixando à categoria, se assim o quisesse, pois é ela a principal interessada na melhoria das condições de trabalho, a faculdade de promover o Dissídio Coletivo. Parece-me totalmente incoerente a empresa comparecer perante a Justiça do Trabalho, sem que seja a isso compelida por qualquer determinação legal, para submeter ao seu crivo reivindicações cuja forma de atendimento ela já definiu previamente e as quais poderia prover de imediato, se o desejasse. Registre-se, por oportuno, que não consta dos autos notícia de que a categoria profissional tenha paralisado suas atividades. Há nos autos apenas um expediente da empresa, dando notícia de que fora comunicada da deflagração de greve por um dia, datado de 12/3/99 (fls. 285/7), mas há também um pedido de adiamento da audiência de conciliação, formulado pelos suscitados naquela mesma data, cuja justificativa é a necessidade de mais tempo para negociar com a empresa (fl. 272). Ademais, merece análise o fato de que a empresa ajuizou este dissídio coletivo em relação aos Sindicatos dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas no Estado do Piauí - Sintepi, Sindicato dos Engenheiros no Estado do Piauí - Senge e Sindicato dos Técnicos Industriais no Estado do Piauí - Sintec e, mesmo assim, desde a primeira audiência vem argüindo a ilegitimidade dos dois últimos. É inconcebível que a suscitante, havendo participado de várias reuniões com esses sindicatos, firmando com eles protocolos relativos ao desenvolvimento das ne- Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 311 JURISPRUDÊNCIA gociações coletivas para renovação do acordo coletivo de trabalho, nos quais foi ajustada, inclusive, a prorrogação do instrumento, venha argüir a sua ilegitimidade para figurar no pólo passivo desta ação, ao singelíssimo argumento de que por “exigência técnica” incluiu esses sindicatos como suscitados, “para que, no plano processual fosse revelado, em toda a dimensão aquilo que o conflito espelhava no plano dos fatos, corrigindo-se, a posteriori, a deformação” (fl. 816). Tal argüição é incompatível com o ajuizamento do dissídio, na forma em que procedido, e denota atitude de desrespeito para com o Judiciário. Ante todo o exposto e sendo a ação coletiva uma ação da categoria, considerada como o conjunto dos trabalhadores de um mesmo ramo produtivo ou de uma mesma profissão, cujo objetivo é obter melhores condições de trabalho e remuneração, conclui-se que falta à Cepisa legitimidade e interesse processual para o ajuizamento deste dissídio coletivo, o que conduz à extinção do feito sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, inciso VI, do CPC. Em atenção ao douto Ministério Público do Trabalho, examino também a preliminar argüida no parecer de fls. 897/904, de extinção do processo, sem julgamento do mérito, ante a ausência de formalidade essencial ao ajuizamento da ação, que consiste na impossibilidade da aferição do quorum da assembléia geral que autorizou os Sindicatos a celebrarem acordo. Dispõe o art. 612 da CLT que os sindicatos somente poderão celebrar convenções ou acordos coletivos de trabalho por deliberação da assembléia geral especialmente convocada para esse fim, consoante o disposto nos respectivos Estatutos. Estabelece ainda esse dispositivo que a validade da assembléia geral depende do comparecimento e votação, em primeira convocação, de 2/3 (dois terços) dos interessados, se se tratar de acordo, e, em segunda, de 1/3 (um terço) dos membros. A ata da assembléia geral que aprovou a pauta de reivindicações e autorizou a celebração de acordo ou o ajuizamento de dissídio, juntada às fls. 396/408, não revela o número de associados em condições de votar, para que seja possível aferir se o quorum estabelecido no art. 612 da CLT foi atingido, considerado o número das assinaturas constantes das listas de presença de fls. 390/5. Se não há comprovação do quorum legal, nula a deliberação e ilegítimos os Sindicatos para atuarem em nome da categoria respectiva, o que leva à extinção do processo sem julgamento do mérito, conforme a orientação jurisprudencial desta Seção. (Precedentes: RODC-401.710/97, Min. Ursulino Santos, DJ 12/6/98, unânime; RODC384.299/97, Min. Armando de Brito, DJ 17/4/98, unânime; RODC-384.308/97, Juiz Convocado Fernando E. Ono, DJ 30/4/98, unânime; RODC-373.220/97, Juiz Convocado Fernando E. Ono, DJ 30/4/98; unânime; RODC-384.186/97, Min. Armando de Brito, DJ 03/4/98, unânime; RODC-350.498/97, Min. Antônio Fábio, DJ 20/3/98, unânime). Acrescente-se a isso o fato de que tanto a ata da assembléia da categoria quanto a lista de presença foram juntadas aos autos em cópia não autenticada, o que não atende à exigência contida no item VII, c e d, da Instrução Normativa n° 4/93 do TST. Ainda Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 312 JURISPRUDÊNCIA relativamente à ata, registre-se que dela não consta a forma de votação adotada para a aprovação da pauta de reivindicações, nem se esta se deu por maioria ou por unanimidade, estando nela consignado apenas que “após longos debates, e ajustes das mais diversas solicitações, foi aprovada a seguinte proposta...” Tal procedimento atenta contra o art. 524, caput e alínea e, da CLT, que estabelece como forma de votação o escrutínio secreto para pronunciamento sobre dissídio de trabalho. Quanto à convocação para a assembléia, dispõe o referido art. 524, alínea e, da CLT, que deve ser feita “de acordo com os estatutos da entidade sindical”. O mesmo comando é encontrado no art. 612, quando dispõe que a autorização ao Sindicato para celebrar acordo/convenção depende da deliberação da assembléia geral convocada para esse fim, “consoante o disposto nos respectivos estatutos”. Porém, o sindicato não trouxe aos autos o seu estatuto, de modo a permitir ao Tribunal certificar-se de que o edital de convocação para a assembléia obedeceu à forma preestabelecida. Ressalte-se, ainda, que esse edital foi juntado aos autos também em cópia não autenticada (fl. 410). Ademais, sendo a Suscitante a concessionária do serviço público federal de distribuição de energia elétrica no Estado do Piauí, possui unidades administrativas em outras localidades, além da capital do Estado. Esse fato está comprovado nos autos, conforme se vê pelo acordo coletivo 86/87 (fls. 618/26), no qual se encontra cláusula estabelecendo pagamento em dia único para os empregados “lotados na Capital e no interior do Estado” (fl. 623). O Sindicato dos Urbanitários, por sua vez, tem por base territorial todo o Estado do Piauí, segundo se constata pelo documento de fl. 343. Consta dos autos a realização de assembléia apenas na capital do Estado, onde se encontra a sede da empresa. Sendo a base territorial do Sindicato representativo da categoria abrangente de mais de um município, a realização de assembléia de trabalhadores unicamente na sede inviabiliza a manifestação da totalidade dos interessados no dissídio, o que conduz à insuficiência de quorum deliberativo e, por conseguinte, também por esse motivo, à extinção do processo sem julgamento do mérito. Esse é o entendimento predominante desta Seção. (Precedentes: RODC-384.283/97, Min. Moacyr R. Tesch, DJ 19/6/98, unânime; RODC-3 84.227/97, Juiz Convocado Fernando E. Ono, DJ 30/4/98, unânime; RODC-344.158/97, Ac. 1090/97, Min. Armando de Brito, DJ 10/10/97, unânime; RODC-296.106/96, Ac. 461/97, Min. Orlando T. Costa, DJ 23/5/97, unânime; RODC-296.110/96, Ac. 391/97, Min. Armando de Brito, DJ 16/5/97, unânime; RODC-237.953/95, Ac. 1450/96, Min. Orlando T. Costa, DJ 7/3/97, unânime; RODC-192.051/95, Ac. 344/96, Juiz Convocado Irany Ferrari, DJ 24/5/96, unânime). Todos essas irregularidades são constatadas no presente feito. Têm relevância e levam à extinção do processo com base no art. 267, inciso IV, do CPC, nos termos da jurisprudência desta Seção. Porém, considerando que este Dissídio Coletivo não foi ajuizado pelo sindicato dos trabalhadores, que veio a juízo como Suscitado, apenas respondendo aos termos da ação proposta pela empresa, acolho as razões acima explicitadas apenas como complemento aos fundamentos da extinção do feito argüida de ofício. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 313 JURISPRUDÊNCIA Por esses motivos, julgo extinto o feito sem apreciação do mérito, nos termos do art. 267, IV e VI, do Código de Processo Civil, restando prejudicado o exame dos recursos ordinários interpostos. Isto posto, Acordam os Ministros da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, acolhendo a preliminar arguida de ofício pelo Exmo. Ministro Relator, extinguir o processo sem apreciação do mérito, em face da ilegitimidade da Companhia Energética do Piauí - CEPISA para propor a ação, restando prejudicado o exame dos recursos interpostos. Brasília, 13 de abril de 2000. Almir Pazzianotto Pinto, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Rider Nogueira de Brito, relator. FUNDAÇÃO ESTADUAL. DECRETO-LEI N° 779/69 Febem. Fundação estadual. Decreto-Lei n° 779/69. Revela-se aplicável o disposto no Decreto-Lei n° 779/69 à FEBEM criada por lei estadual, com patrimônio constituído pelo poder público e objetivo social, sem fins lucrativos. PROCESSO N° TST-RR-350.340/97- (Ac. 3a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR350.340/97, em que é recorrente Ministério Público do Trabalho e recorridos Jorge Luiz Camilo de Souza e Fundação Estadual do Bem-Estar do menor - Febem (SP). O egrégio TRT da 2a Região pelo acórdão de fls.550/553, complementado pelo de fls.561/565, não conheceu do recurso de ofício, por não se tratar de nenhuma das hipóteses previstas no inciso V do artigo 1° do Decreto-Lei n° 779/69, como também não conheceu do recurso ordinário da reclamada, por intempestivo e deserto. Recorre de revista do Ministério Público do Trabalho às fls. 566/584, argüindo preliminar de nulidade do acórdão regional por negativa de prestação jurisdicional, assim como insurge-se contra a decisão que não conheceu do recurso ordinário voluntário da reclamada e de remessa de ofício, alegando tratar a Febem (SP) de fundação com personalidade jurídica de direito público. Aponta violados os artigos 93, IX, CF/88; 832 da CLT; 460, II do CPC; incisos IV, V, VI do artigo 1° do DL 779/69. Alega, ainda, dissenso pretoriano. O recurso foi admitido pelo despacho de fl. 614, e contra-arrazoado às fls.616/620. Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, porquanto eventual interesse público encontra-se defendido nas razões recursais. É o relatório. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 314 JURISPRUDÊNCIA VOTO CONHECIMENTO Recurso tempestivo. PRELIMINAR DE NULIDADE DO ACÓRDÃO REGIONAL POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL Argúi o Ministério Público do Trabalho preliminar de nulidade do acórdão regional por negativa de prestação jurisdicional, alegando, em síntese, que mesmo tendo instado aquela Corte, mediante embargos declaratórios, esta quedou-se inerte a respeito da manifestação da aplicabilidade dos incisos IV e VI do artigo 1° do DL n° 779/69. Aponta violado os artigos 93, IX, da CF/88, 832 da CLT e 460, inciso II, do CPC e dissenso pretoriano. Não lhe assiste razão. O Regional, em sede de embargos, esclareceu que uma vez tendo concluído ser a Febem uma fundação com personalidade jurídica de direito privado que não se encontra amparada pelo disposto no inciso V do artigo 1º, do DL 779/69, não há se falar em remessa necessária. Assim, a matéria acerca da qual o Ministério Público pretendia pronunciamento explícito, para fins de prequestionamento, encontra-se claramente evidenciada no acórdão regional, considerando que a questão devolvida no recurso de revista, em verdade, traduz-se na aplicabilidade das benesses do DL 779/69 à reclamada, em face de sua natureza jurídica. Com estes fundamentos não há falar em ofensa aos artigos 93, IX, da CF/88, 832 da CLT e 460, inciso II, do CPC. De igual forma, a jurisprudência transcrita revela-se inespecífica, porquanto parte da premissa da existência da nulidade invocada, hipótese que não se amolda a dos autos. Incide a orientação do Enunciado 296 do TST. Não conheço. FEBEM. NATUREZA JURÍDICA. APLICABILIDADE DO DL 779/69. REMESSA DE OFÍCIO O egrégio Regional não conheceu do recurso de ofício, bem como julgou deserto e intempestivo o recurso ordinário da reclamada, porquanto entendeu que a reclamada é fundação de direito privado, que embora mantida pelo poder público, não se beneficia das prerrogativas do DL 779/69. Afirmou que pela análise da Lei Estadual n° 185/73 (Promenor) instituidora e da Lei Estadual n° 985/76, que alterou a denominação para Febem, conclui-se que esta trata de fundação com personalidade jurídica de direito privado. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 315 JURISPRUDÊNCIA Examinando as normas específicas, registrou que a Febem não teve criação com a lei instituidora, que apenas autorizou o poder público a instituí-la (art. 1° da Lei Estadual n° 185/73 e parágrafo único do art. 1° da Lei Estadual 985/76). Entendeu, também, irrelevante o fato das atribuições da entidade serem de interesse público, isto em face da prestação desses serviços não tratarem de atos privativos das pessoas jurídicas de direito público. Ainda, asseverou que a Febem não é mantida exclusivamente pelo poder público, pois conforme prevê o art. 3° da Lei n° 185/73, ela tem receita própria composta de doações, legados, auxílios, contribuições, etc. Aduziu que o regime jurídico do pessoal da Febem é o da legislação trabalhista (art. 13 da Lei Estadual n° 185/73). Por fim, registrou que dentre as prerrogativas das pessoas jurídicas de direito público apenas foi atribuída à Febem a isenção de tributos estaduais que incidam sobre seus serviços. O Ministério Público insurge-se contra a decisão que não conheceu do recurso ordinário voluntário da reclamada e de remessa de ofício, alegando tratar a Febem (SP) de fundação com personalidade jurídica de direito público. Aponta violados os incisos IV, VI, do artigo 1°, do DL 779/69, assim como, alega dissenso pretoriano. Alega que ao contrário do entendimento regional os artigos 2°, 7°, 8°, 12°, 9°, 10° e 40 da Lei Estadual n° 185/73, demonstram a natureza jurídica de direito público da Reclamada, quando regulamenta o seu objetivo, patrimônio, designação de dirigente, composição do corpo diretor e do conselho fiscal. O 3° aresto de fl.581, colacionado na íntegra às fls. 604/607, revela-se específico, porque, não obstante versar sobre a forma de execução aplicável à Reclamada, o certo é que para concluir que esta é beneficiária do DL 779/69, examinou a controvérsia envolvendo as leis regulamentadoras da referida entidade. O último modelo transcrito à fl.582, também, demonstra conclusão oposta àquela adotada pelo regional. Conheço, pois, por divergência jurisprudencial. MÉRITO FEBEM. NATUREZA JURÍDICA. APLICABILIDADE DO DL 779/69. REMESSA DE OFÍCIO O DL 779/69 regulamenta dentre as prerrogativas da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das autarquias ou fundações de direito público federais, estaduais ou municipais que não exploram atividade econômica, a dispensa de depósito para interposição de recurso, a remessa de ofício das decisões que lhe forem total ou parcialmente contrárias, o pagamento de custa a final, bem como do prazo em dobro para recorrer. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 316 JURISPRUDÊNCIA No caso trata-se de fundação criada e mantida pelo Poder Público, cuja discussão envolve a aplicação das benesses do DL 779/69. A Constituição Federal de 1988, encampando a doutrina existente, instituiu as fundações públicas, transformando-as em entidades de direito público, ao lado das autarquias e das entidades paraestatais. Caracterizam-se pela realização de atividades não lucrativas e atípicas do Poder Público, cujo interesse merece o amparo estatal; criação por lei específica; orçamento igual das entidades estatais; contratos precedidos de licitação; proibição de acumulação remunerada de cargo, emprego ou função. A Febem (SP) criada pela Lei Estadual n° 185/73, com as modificações inseridas pela Lei Estadual n° 985/76, autorizou o poder executivo estadual a instituí-la (art. 1o), com objetivo de estabelecer diretrizes e normas de política do bem-estar do menor a serem aplicadas no território estadual (art. 2o). Seu patrimônio (art. 3o) foi constituído pela dotação consignada anualmente no orçamento do Estado, pelos bens e direitos que lhe foram doados por entidades interessadas nos seus objetivos, pelas doações, auxílios, contribuições e legados que lhe foram ou venham a ser feitos, pelos bens que vierem a adquirir a qualquer título, pelas rendas eventuais inclusive as resultantes de depósitos e aplicações de capitais, bem assim a prestação de serviços. Ora, pelo que se percebe claramente a Febem foi criada por lei estadual, com patrimônio constituído pelo Poder público, com objetivo social, do qual não se detecta fins lucrativos, de forma que plenamente aplicável o disposto no Decreto Lei n° 779/69. Assim, deveria o TRT ter examinado a remessa de ofício, bem como, observada as garantias previstas nos incisos III, IV e VI do artigo 1o do DL 779/69. Com estes fundamentos dou provimento ao recurso para determinar o retomo dos autos ao TRT de origem a fim de que julgue a remessa de ofício e o recurso ordinário da Reclamada como entender de direito. Isto posto, Acordam os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso por divergência e, no mérito, dar-lhe provimento para determinar o retomo dos autos ao TRT de origem, a fim de que julgue a remessa de ofício e o recurso ordinário da reclamada como entender de direito. Brasília, 01 de dezembro de 1999. Carlos Alberto Reis de Paula, ministro no exercício eventual da Presidência e relator. HONORÁRIOS PERICIAIS. VALOR SUPERIOR AO SUGERIDO PELO PERITO Ação rescisória. Honorários periciais. Fixação em valor superior ao sugerido pelo perito. Inexistência de julgamento ultra petita. Em que pese ao arbitramento dos honorários periciais em valor superior ao postulado pelo perito ser procedimento pouco usual, não constitui julgamento Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 317 JURISPRUDÊNCIA ultra petita e muito menos enseja nulidade da decisão, uma vez que o pedido é da parte litigante, e não dos auxiliares da Justiça, sendo a, fixação dos honorários periciais faculdade discricionária do juiz, que pode, diante do trabalho efetivamente realizado, arbitrar valor inferior ao sugerido peio perito. Se pode menos, pode mais, pois não se trata de pedido da causa, mas de despesas processuais. Recurso ordinário desprovido. PROCESSO N° TST-ROAR-619.951/99 - (Ac. SBDI 2) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário em Ação Rescisória n° TST-ROAR-619.951/99, em que é recorrente Edifício Garagens Automáticas 25 de Março e recorrido Wenceslau Alves Teixeira. O 2° Regional julgou extinto o processo, sem julgamento do mérito, referente à ação rescisória proposta pelo reclamado autor, por entender que, tendo as Partes se conciliado, a decisão que transitou em julgado e passível de rescisória é a que homologou o acordo entre as partes, sendo incabível o corte rescisório em relação à sentença que arbitrou os honorários periciais (fls. 88/89). Inconformado, o autor interpõe recurso ordinário, sustentando que: a) o acordo homologado atingiu, tão-somente, parte da sentença rescindenda; b) discute-se, na presente ação, a majoração, pela Junta, dos honorários periciais (fls. 90-91). Admitido o recurso (fl. 93), não foram apresentadas contra-razões, tendo o Ministério Público do Trabalho, em parecer da lavra do Dr. Marco Vinicio Zanchetta, opinado pelo não-provimento do recurso ordinário (fls. 101-102). É o relatório. VOTO CONHECIMENTO O recurso é tempestivo, tem representação regular (fls. 11 e 58) e encontra-se devidamente preparado (fl. 92), razão pela qual dele conheço. MÉRITO A decisão rescindenda é aquela proferida pela 58a JCJ de São Paulo, que julgou procedente em parte a reclamação, condenando o reclamado, além do pagamento das diferenças de verbas rescisórias e adicional de insalubridade, em honorários periciais (fls. 18-22). O trânsito em julgado da decisão apontada como rescindenda ocorreu em 22/11/97, após o decurso do prazo de oito dias da homologação do acordo de fl. 48. A ação rescisória foi ajuizada em 10/03/98, portanto, dentro do prazo decadencial estabelecido no art. 495 do CPC. A ação rescisória ajuizada pela Reclamada veio calcada no inciso V (violação de lei) do art. 485 do CPC. Os dispositivos que a Autora pretende violados são os arts. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 318 JURISPRUDÊNCIA 460 do CPC 794 e 797 da CLT e 5°, XXXVI, da Constituição Federal, sob o argumento de que a sentença, ao ampliar o valor dos honorários periciais em quantia superior ao postulado pelo perito, julgou ultra petita, ofendendo a coisa julgada e o direito adquirido da reclamada. O recorrente, em seu recurso ordinário, afirma que o acordo atingiu parte da sentença, não alcançando o arbitramento dos honorários periciais, razão pela qual é possível rescindir a sentença proferida pela 58a Junta de São Paulo. Os dispositivos apontados como violados na ação rescisória (arts. 460 do CPC, 794 e 979 da CLT e 5° da Constituição Federal) não foram prequestionados e debatidos na decisão rescindenda. No entanto, por tratar-se de ofensas legais que teriam ocorrido por ocasião da própria prolação da decisão rescindenda, é de se afastar a aplicação do óbice da Súmula n° 298 do TST. Apesar de o arbitramento dos honorários periciais em valor superior ao postulado pelo perito ser procedimento pouco encontradiço, não constitui julgamento ultra petita e muito menos enseja nulidade da decisão, uma vez que o pedido é da parte litigante, e não dos auxiliares da Justiça, sendo a fixação dos honorários periciais faculdade discricionária do juiz, que pode, diante do trabalho efetivamente realizado, arbitrar valor inferior ao sugerido pelo perito. Se pode menos, pode mais, pois não se trata de pedido da causa, mas de despesas processuais. In casu, o arbitramento dos honorários periciais se deu Um ano após a sugestão do valor fornecido pelo perito. Assim, não ocorreu a alegada violação literal dos art. 460 do CPC, 794 e 797 da CLT, conforme exige o art. 485, V, do CPC. Ante o exposto, nego provimento ao recurso ordinário. Isto posto, Acordam os Ministros da Egrégia Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário. Brasília, 22 de agosto de 2000. Ursulino Santos Filho, vice-presidente no exercício da Presidência. Ives Gandra da Silva Martins Filho, relator. INTEMPESTIVIDADE. EMBARGOS DECLARATÓRIOS Prazo recursal Suspensão. Embargos declaratórios não conhecidos porque intempestivos. Se os embargos de declaração não foram conhecidos pelo Regional porque intempestivos, não há que se falar em suspensão do prazo recursal, donde se conclui pela intempestividade da Revista. Não está a Parte contrária obrigada a arguir a intempestividade da Revista nas contra-razões, uma vez que os pressupostos genéricos dos recursos devem ser examinados de oficio, não sendo necessário que a Parte recorrida alerte o órgão julgador para possíveis irregularidades. Afronta ao artigo 896 da CLT configurada. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 319 JURISPRUDÊNCIA Embargos conhecidos e providos para restabelecer a r. decisão regional, restando prejudicado o exame dos demais itens do recurso. PROCESSO N° TST-E-ED-RR-175.538/95 - (Ac. SBDI1) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Embargos de Declaração em Recurso de Revista n° TST-E-ED-RR-175.538/95.4, em que são embargantes Ladislau Alves da Silva e outros e embargada União Federal. Havendo sido designado redator deste acórdão, adoto o relatório do Ministro Relator originário: “A egrégia 3a Turma desta Corte, às fls. 298/300, deu provimento ao recurso de revista da União Federal para autorizar seu ingresso no pólo passivo da relação processual, a partir do oferecimento do documento de fls. 216/217, ficando, em conseqüência, declarada a nulidade do processo a partir de então e, conseqüentemente, das venerandas decisões de fls. 248/256 e de fls. 273/274. Opostos embargos de declaração pelos reclamantes, foram acolhidos apenas para prestar esclarecimentos (fls. 313/317). Inconformados, os autores interpõem embargos às fls. 319/329. Trazem arestos à colação, alegam contrariedade aos Enunciados n°s 126, 296, 297 e 333 do TST e apontam como violados os arts. 5o, XXXV e XXXVI, e 93, IX, da Constituição Federal; 20 da Lei n° 8.029/90; 128, 267, § 3o, 460, 467 e 535 do CPC; 794, 795, 796, 832, 836 e 896 da CLT. O apelo foi admitido pelo respeitável despacho de fls. 331/332. Não houve impugnação, conforme a certidão de fl. 339. A douta Procuradoria-Geral do Trabalho, às fls. 341/342, opina pelo conhecimento, e desprovimento dos embargos.” É o relatório, na forma regimental. VOTO O recurso é tempestivo (fls. 318/319) e está subscrito por advogado devidamente habilitado nos autos (fls. 10, 11 e 295). TEMPESTIVIDADE DO RECURSO DE REVISTA. OFENSA AO ARTIGO 896 DA CLT CONHECIMENTO Argumentam os embargantes que, nos declaratórios, afirmaram que o Regional não conheceu dos embargos declaratórios da União Federal, por considerá-los intempestivos e, por via de conseqüência, também intempestiva a revista. Os embargantes não expõem os temas ordenadamente. Este mesmo aspecto é tratado mais adiante no item 4 sob a rubrica da intempestividade. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 320 JURISPRUDÊNCIA Creio que este tema deve ser examinado em primeiro lugar, porque caso se chegue à conclusão de que a revista não poderia ser conhecida porque intempestiva, do ponto de vista do interesse dos reclamantes embargantes, estaria resolvida a questão a seu favor. Afirmam os reclamantes em seus embargos que “o Regional não conheceu dos embargos declaratórios apresentados pela União Federal, ao argumento de que ela não era parte e, pois, assim, não poderia embargar, e, ainda que sua habilitação for (sic) indeferida e ela, União, notificada pessoalmente da decisão, sendo certo que seu Procurador, por isso, chegou pessoalmente a fazer carga dos autos em cartório e que os devolveu sem petição (fls. 245 verso). Afirma ainda que, como terceiro, os embargos estariam intempestivos. Alertado dessas questões nos declaratórios, o venerando acórdão embargado sustenta que em contra-razões não argüiram a intempestividade”. Afirmam, agora, em suas razões de embargos à SDI, que se trata de pressuposto extrínseco, objetivo, apreciável de ofício pelo Juízo, independente das partes terem ou não alegado a intempestividade ou qualquer outro requisito externo do Apelo. Asseveram que, nesse ponto, a Turma violou o art. 267, parágrafo 3°, do CPC. Argumentam que, se os embargos de declaração eram intempestivos, a decisão transitou em julgado, e sua reabertura nessa fase processual implicou literal afronta à coisa julgada, com violação do inciso XXXVI, do art. 5° da CF, do art. 467 do CPC, 836 e 896 da CLT. Articulam ainda com divergência jurisprudencial. Razão assiste aos embargantes. Com efeito, o 20° Regional, pelo acórdão de fls. 273/275, não conheceu dos embargos declaratórios manifestados pela União Federal. A egrégia 3ª Turma, pelo acórdão de fls. 298/300, conheceu do recurso de revista da União, por violação do art. 20 da Lei n° 8.029/90, quanto à preliminar de nulidade e, no mérito, deu-lhe provimento para autorizar o ingresso da União Federal no pólo passivo da relação processual, a partir do oferecimento do documento de fls. 216/17, ficando, em conseqüência, declarada a nulidade do processo a partir de então e, conseqüentemente, das venerandas decisões de fls. 248/256 e de fls. 273/274, prejudicado o exame do segundo item do recurso de revista. Pelos declaratórios de fls. 303/309, os reclamantes, alertando que os declaratórios da União não tinham sido conhecidos, porque não sendo a União parte no processo, não poderia aforá-los, e se fosse considerada como terceiro, aquele recurso seria intempestivo, pediram que fosse apreciada a vulneração dos Enunciados 126, 296 e 297 do TST, bem como a violação do art. 896 da CLT. Respondendo aos declaratórios, disse a Turma que é verdade que não se conheceu dos embargos de declaração de fls. 264. Contudo, interposto recurso de revista pela União Federal, os ora embargantes nada alegaram em contra-razões, especialmente em relação aos “ED” e à intempestividade do “RR”. Divirjo, todavia, da decisão turmária. Se os embargos de declaração de fls. 264/266, manifestados pela União Federal, não foram conhecidos pelo 20° Regional, pelo que se verifica do acórdão de fls. 273/275, entendo que a revista manifestada pela União pelas razões de fls. 280/283, não poderia ter sido conhecida, porque intempestiva. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 321 JURISPRUDÊNCIA Da decisão regional de fls. 250/256, a União Federal, que até então não havia sido admitida a figurar no pólo passivo da ação, foi notificada, no dia 06.06.94 (fl. 259v), da baixa dos autos; no dia 20.07.94 (fls. 261 e 262), foi notificada para ciência da decisão regional; no dia 1/8/94 (fl. 264), manifestou os declaratórios de fls. 264/266, que não foram conhecidos. Portanto, não suspendendo o prazo para o recurso de revista, e notificada a União para ciência da decisão proferida no recurso ordinário em 20.07.94 (fl. 262), quando interpôs a revista, em 26.09.94 (fl. 280), esse apelo estava irremediavelmente fora do prazo legal, motivo por que não deveria ter sido conhecido. A egrégia 3a Turma, no acórdão de fls. 313/317, respondendo aos declaratórios dos reclamantes, confirma que os declaratórios manifestados pela União contra a acórdão regional não foram conhecidos, mas argumenta que “os ora embargantes nada alegaram em contra-razões, especialmente em relação aos “ED” e à intempestividade do “RR” (fl. 314). Todavia, os pressupostos genéricos dos recursos devem ser examinados de ofício, não sendo necessário que a parte recorrida alerte o órgão julgador para possíveis irregularidades. Logo, a revista da União Federal não poderia ter sido conhecida porque manifestamente intempestiva, restando configurada, portanto, a alegada afronta ao artigo 896 da CLT. Conheço dos embargos por violação do artigo 896 da CLT. MÉRITO Havendo conhecido dos embargos por ofensa ao artigo 896 consolidado, porque a Revista não merecia ser conhecida, dou-lhes provimento para proclamar a intempestividade do recurso de revista da União Federal e, em conseqüência restabelecer a respeitável decisão regional, restando prejudicados os demais temas dos embargos. Isto posto, Acordam os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por maioria, conhecer dos embargos apenas quanto ao tema intempestividade, por violação do artigo 896 da CLT, vencido o Exmo. Sr. Ministro Relator e, no mérito, por unanimidade, dar-lhes provimento para proclamar a intempestividade do recurso de revista da União e, em conseqüência, restabelecer a decisão regional, ficando prejudicados os demais temas do recurso. Observações: I - Redigirá o acórdão o Exmo. Sr. Ministro Rider Nogueira de Brito; II - O Exmo. Sr. Juiz Convocado Levi Ceregato, ora relator, não proferiu voto quanto ao conhecimento dos embargos, em razão de o Exmo. Sr. Ministro Suplente Juraci Candeia de Sousa, relator à época do início do julgamento, ter deixado consignado seu voto no sentido de não conhecer integralmente dos embargos, ficando, portanto, vencido. Brasília, 20 de setembro de 1999. Almir Pazzianotto Pinto, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Rider Nogueira de Brito, redator designado. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 322 JURISPRUDÊNCIA JUIZ CLASSISTA. RECONDUÇÃO Cargo de juiz classista. Não há distinção entre o titular e o classista para efeito de recondução. Interpretação do art. 116 da CF. Levando-se em consideração que a interpretação das normas deve ser feita estritamente, conclui-se que o cargo de juiz classista, a que alude o art. 116 da CF, abrange tanto o titular como o suplente. Se o legislador quisesse distinguir o juiz classista titular do suplente, para efeito de recondução, tê-lo-ia feito expressamente. Tem-se, portanto, que o cargo de juiz classista deve ser considerado como um só, quer esteja se referindo ao titular ou ao suplente, pois ambos são representantes de categoria econômica ou profissional. A mesma interpretação foi dada pelo STF no caso dos membros da CIPA, ao entender que a estabilidade dos membros da CIPA deveria ser estendida ao suplente do diretor, em face de a Carta Magna não fazer distinção entre a suplência e a titularidade do cargo de direção da CIPA. Esta Corte já firmou jurisprudência no mesmo sentido, conforme se vê no Enunciado 339. Por analogia, a mesma interpretação deve ser dada ao artigo 116 da CF, quando permite a recondução do juiz classista uma única vez. Recurso provido para, julgando procedente a impugnação à investidura de juiz classista, determinar o afastamento imediato do Impugnado, nos termos do artigo 662, parágrafo 5°, da CLT. PROCESSO N° TST-ROIJC-591.638/99 - (Ac. Pleno) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário em Impugnação de Investidura de Juiz Classista n° TST-ROIJC-591.638/99, em que é recorrente Ministério Público do Trabalho da 13a Região e recorrido Noel José de Oliveira - juiz classista dos empregados da 2a JCJ de João Pessoa. O egrégio TRT da 13a Região, ao apreciar a impugnação à investidura do juiz classista Noel José de Oliveira, rejeitou a preliminar de inépcia da inicial, sob o fundamento de que o fato de não constar da peça vestibular a qualificação do Impugnado não causou qualquer prejuízo a sua citação, uma vez que se trata de pessoa que exerceu por duas vezes o cargo de suplente de juiz classista em Juntas que compõem a jurisdição daquele TRT, encontrando-se todas as informações necessárias em seus assentamentos na Secretaria de Pessoal. No mérito, julgou improcedente a impugnação, consignando na ementa, verbis (fl. 226): “O fato de o candidato a titular de juiz classista ter exercido por duas vezes o cargo de suplente, portanto, com uma recondução, não obstacula a sua nomeação para o exercício de cargo de titular, haja vista não restar configurado o instituto de recondução, pois os cargos não se confundem. Trata-se de funções isoladas e distintas.” Inconformado, o Ministério Público do Trabalho interpõe recurso ordinário perante esta colenda Corte, sob as seguintes alegações: a - que o juiz impugnado exerceu Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 323 JURISPRUDÊNCIA o primeiro mandato de juiz classista como suplente dos empregados na 3a JCJ de João Pessoa, no período de 1992 a 1995, e o segundo mandato como suplente dos empregados na 2a JCJ de João Pessoa, no período de 1995 a 1998; b - que a recente nomeação para juiz classista titular da 2a JCJ de João Pessoa traduz a segunda recondução do impugnado; c - que, de acordo com os artigos 116, parágrafo único, da Constituição Federal, e 4°, parágrafo único, da Instrução Normativa n° 12 do TST, não há possibilidade de recondução por mais de uma vez, de juiz classista de Junta de Conciliação e Julgamento, ostente ele a condição de titular ou de suplente; d - que o propósito do legislador constituinte foi o de evitar a permanência prolongada de uma mesma pessoa no exercício da representação das categorias profissionais e econômicas, a fim de proporcionar a renovação dos representantes dos segmentos do capital e do trabalho no âmbito desta Justiça Especializada; e - que o ato de nomeação do juiz impugnado agrediu também o artigo 2°, inciso II, alínea i, da Instrução Normativa n° 12/TST, uma vez que no currículo apresentado pelo impugnado não foram descritos os cargos de juiz classista que já havia exercido nem foram indicadas as autoridades às quais serviu durante os mandatos omitidos. Pede, finalmente, que seja determinada a devolução das quantias recebidas em decorrência do mandato ora impugnado (fls. 240/250). O recurso foi recebido pelo despacho de fl. 253. O impugnado apresentou contra-razões às fls. 256/257. Deixo de remeter os autos ao Ministério Público do Trabalho para emissão de parecer, em face de o recorrente ser o próprio Ministério público. É o relatório. VOTO CONHECIMENTO Cumpridas as formalidades legais de tempestividade e representação, merece conhecimento o recurso. Conheço. MÉRITO Discute-se nos presentes autos se o cargo de suplente de juiz classista está abrangido pela expressão “juiz classista” constante da norma contida no artigo 116 da CF. Entendo assistir razão ao recorrente. Com efeito, a matéria ora discutida está regulada pela Constituição Federal, devendo, portanto, ser analisada a norma pertinente, qual seja, o artigo 116, que assim dispõe, verbis: “Art. 116. A Junta de Conciliação e Julgamento será composta de um juiz do trabalho, que a presidirá, e dois juízes classistas temporários, representantes dos empregados e dos empregadores. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 324 JURISPRUDÊNCIA Parágrafo único. Os juízes classistas das Juntas de Conciliação e Julgamento serão nomeados pelo Presidente do Tribunal Regional do Trabalho, na forma da lei, permitida uma recondução.” Da leitura do dispositivo supratranscrito, verifica-se que a Carta Magna refere- se ao cargo de juiz classista, não fazendo distinção entre o titular e o suplente. Levando-se, pois, em consideração que a interpretação das normas deve ser feita estritamente, conclui-se que o referido cargo abrange tanto o juiz classista titular como o juiz classista suplente. Se o legislador quisesse distinguir o juiz classista titular do juiz classista suplente, para efeito de recondução, teria feito expressamente. Conclui-se, portanto, que o cargo de juiz classista deve ser considerado como um só, quer esteja se referindo ao titular ou ao suplente, pois ambos são representantes de categoria econômica ou profissional. Destarte, não fazendo a Constituição Federal distinção entre a condição de suplente e a de titular, não há como aceitar a distinção feita pelo acórdão regional. Podemos citar como exemplo a interpretação dada pelo STF à estabilidade dos membros da CIPA, que é no sentido de estender a referida estabilidade ao suplente do diretor, em face de a Carta Magna não fazer distinção entre a suplência e a titularidade do cargo de direção da CIPA. Esta Corte já firmou jurisprudência no mesmo sentido, conforme se vê no Enunciado 339 que consagra o entendimento de que a partir da Carta Magna de 1988, o empregado eleito suplente de cargo de direção da CIPA passou a ter direito à estabilidade, uma vez que a CF, no artigo 10, inciso II, alínea b, do ADCT, refere-se ao empregado eleito para cargo de direção, não fazendo distinção entre o titular e o suplente. Por analogia, a mesma interpretação deve ser dada ao artigo 116 da CF, quando permite a recondução do juiz classista uma única vez. Deixo, todavia, de determinar ao juiz impugnado que devolva a quantia recebida em face do exercício do cargo de juiz classista titular da 2a JCJ de João Pessoa, uma vez que esta colenda Corte só tem determinado a devolução da quantia recebida, na hipótese de restar caracterizada nos autos fraude no processo de habilitação, o que, in casu, não se verifica. Ante o exposto, dou provimento ao recurso para, julgando procedente a impugnação à investidura do juiz classista Noel José de Oliveira, determinar o seu afastamento imediato, nos termos do artigo 662, parágrafo 5o, da CLT. Isto posto, Acordam os Ministros do Tribunal Pleno do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, dar provimento ao recurso para, julgando procedente a impugnação à investidura do juiz classista Noel José de Oliveira, determinar o seu afastamento imediato, nos termos do artigo 662, parágrafo 5o, da CLT, com ressalvas de entendimento dos Exmos. Ministros José Luciano de Castilho, Milton de Moura França e Antônio José de Barros Levenhagen. Brasília, 27 de abril de 2000. Almir Pazzianotto Pinto, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Rider Nogueira de Brito, relator. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 325 JURISPRUDÊNCIA JUSTIÇA GRATUITA. HONORÁRIOS PERICIAIS O benefício da justiça gratuita, previsto no art. 789, § 9°, da CLT, abrange somente a dispensa das custas processuais, não ensejando a liberação do pagamento dos honorários periciais. Recurso de revista a que se nega provimento. PROCESSO N° TST-RR-461.501/98 - (Ac. 5a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR461.501/98, em que é recorrente Odamil Cafaro e recorridas Rede Ferroviária Federal S.A - RFFSA e Ferroviária Novoeste S.A. O Tribunal Regional do Trabalho da 24a Região, mediante o acórdão de fls. 355/361, negou provimento ao recurso ordinário interposto pelo reclamante, mantendo a decisão proferida pelo Juízo de primeiro grau, pela qual a reclamatória fora julgada improcedente e o reclamante condenado ao pagamento dos honorários do perito. Opostos embargos de declaração (fls. 365/370), foram eles rejeitados pelo Tribunal a quo (acórdão, fls. 375/377). Inconformado, o reclamante interpôs recurso de revista (fls. 380/391), com fulcro no art. 896 da CLT. Em suas razões recursais, insurgiu-se contra a decisão pela qual foram rejeitados os embargos de declaração, indicando violação do art. 535, II, do CPC, e contra a condenação ao pagamento dos honorários periciais, apontando ofensa ao art. 5°, LXXIV, da Constituição Federal e divergência jurisprudencial. O recurso foi admitido pela decisão de fls. 399. Houve apresentação de contra-razões pela Rede Ferroviária Federal S/A (fls. 400/403) e pela Ferroviária Noroeste S/A (fls. 404/407). Os autos não foram remetidos ao Ministério Público do Trabalho por não estar configurada hipótese prevista no art. 113 do Regimento Interno desta Corte. É o relatório. VOTO CONHECIMENTO EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC O Tribunal a quo rejeitou os embargos de declaração opostos pelo reclamante, afirmando que no acórdão embargado ficara claro o entendimento de não ter sido violado o art. 5°, LXXIV, da Constituição Federal e de não ter havido omissão nem obscuridade na decisão embargada. Alegou o recorrente que tal decisão importa em afronta ao disposto no art. 535, II, do CPC. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 326 JURISPRUDÊNCIA Não vislumbro a violação apontada, uma vez que os embargos mereceram conhecimento e foram analisados pelo Tribunal a quo. Não conheço. honorários periciais O Tribunal Regional manteve a condenação do reclamante ao pagamento dos honorários periciais, em face da incidência da orientação expressa no Enunciado n° 236 do TST. Consignou que não deve ser confundida a assistência judiciária prevista nas Leis n°s 1.060/50 e 5,584/70 com a gratuidade da justiça, porque esta não abrange os honorários periciais. O recorrente insurgiu-se contra tal decisão, apontando violação do art. 5°, LXXIV, da Constituição Federal e divergência jurisprudencial. Não vislumbro afronta ao dispositivo constitucional, pois nele está assegurada a assistência judiciária gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. No âmbito da Justiça do Trabalho, a teor do art. 14 da Lei n° 5.584/70, tal assistência é prestada pelo sindicato profissional a que pertence o trabalhador. Na hipótese, o Reclamante não se beneficiou da assistência judiciária regulamentada na lei mencionada, apenas lhe foi concedido o benefício da justiça gratuita no que concerne às custas processuais (decisão, fls. 343), em face da disposição expressa no § 9° do art. 789 da CLT. No entanto, no julgado transcrito a fls. 390, oriundo do Tribunal Regional da 4a Região, há entendimento no sentido de ser concedida a isenção dos honorários periciais quando concedida a justiça gratuita nos moldes do art. 789, § 9°, da CLT, tese essa que se contrapõe à expendida no acórdão recorrido. Conheço, por divergência jurisprudencial. MÉRITO HONORÁRIOS PERICIAIS Nos termos da Lei n° 1.060, na assistência judiciária aos necessitados se inclui a dispensa de pagamento dos honorários periciais. Entretanto, no âmbito da Justiça do Trabalho, tal assistência deve ser prestada pelo sindicato profissional a que pertence o trabalhador. Na hipótese em exame, não se configurou tal situação. Houve concessão do benefício da justiça gratuita nos termos do art. 789, § 9°, da CLT, no qual há previsão de dispensa das custas processuais, nada se dispondo acerca da dispensa da remuneração do trabalho do perito. Nesse sentido, já se manifestou a Seção Especializada em Dissídios Individuais, in verbis: Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 JURISPRUDÊNCIA HONORÁRIOS PERICIAIS - ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA - LEI N° 1.060/50 A “assistência judiciária” a que se refere a Lei n° 1.060/50 só poderá ser concedida, na área da justiça do trabalho, de acordo com o previsto na Lei n° 5.584/70, artigos 14 a 19. Somente se a obtiver é que o empregado poderá ser liberado do pagamento de honorários periciais. O benefício da “justiça gratuita” previsto no § 9o do artigo 789 da CLT tem alcance limitado às custas e emolumentos, podendo ser concedido até de ofício. Não enseja, contudo, a liberação do pagamento de honorários periciais a que tiver sido condenado o empregado. Recurso de embargos desprovido. (RR-85.523/93, SBDI1, DJ. 06/09/96, Rel. Min. Manoel Mendes de Freitas) Diante do exposto, nego provimento ao recurso de revista. Isto posto, Acordam os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, à unanimidade, conhecer do recurso apenas quanto aos honorários periciais, por divergência jurisprudencial, e, no mérito, negar-lhe provimento. Brasília, 02 de agosto de 2000. Rider Nogueira de Brito, presidente. Gelson de Azevedo, relator. LIMITAÇÃO DO LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO MULTITUDINÁRIO No processo do trabalho, o art. 842 da CLT, que trata da reclamação plúrima, estabelece como requisitos para o acúmulo de reclamações num só processo apenas a identidade de matéria e o mesmo empregador. No caso dos autos, em se tratando de matéria exclusivamente de direito e tendo em vista a homogeneidade na causa de pedir e no pedido, não se justifica a limitação do litisconsórcio multitudinário. Contudo, no processo do trabalho, existe a previsão legal, contida no art. 843, § 2°, da CLT, de que, se por motivo ponderoso, devidamente comprovado, não for possível ao empregado comparecer pessoalmente, poderá fazer-se representar por outro empregado que pertença à mesma profissão ou pelo seu sindicato. Revista de que se conhece e a que se dá provimento para, anulando as decisões ordinárias, determinar a remessa dos autos à Vara do Trabalho de origem a fim de que profira novo julgamento, devendo o juiz, com base no art. 843, § 2°, da CLT, dar oportunidade aos autores para que indiquem os seus representantes em número que entendam adequado para o prosseguimento da ação ou para que se façam representar pelo sindicato da categoria. PROCESSO N° TST-RR-346.306/97-(Ac. 1a Turma) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 328 JURISPRUDÊNCIA Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista N° TST-RR346.306/97, em que são recorrentes Abadia da Silva Pereira Fagundes e outros e é recorrida Fundação Educacional do Distrito Federal - FEDF. Os presentes autos foram redistribuídos por força do parágrafo único do art. 4° e do item I do art. 7° do Ato Regimental n° 5 - RA 678/2000. A decisão de primeiro grau, às fls. 18.870/18.873, foi no sentido de limitar o litisconsórcio ativo aos 10 primeiros reclamantes e extinguir o processo, sem julgamento do mérito, quanto aos demais 9.426 reclamantes, tendo encontrado fundamento nos arts. 46, parágrafo único, do CPC e 267, IV, do CPC. O egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 10a Região, às fls. 19.028/19.034, complementado às fls. 19.042/19.044, manteve a limitação do litisconsórcio ativo composto de 9.436 reclamantes, tendo em vista a impossibilidade material e o comprometimento da causa. Inconformados, os reclamantes recorrem de revista, às fls. 19.046/19.050, com fundamento nas alíneas a e c do artigo 896 da Consolidação das Leis do Trabalho. O recurso foi admitido pelo Despacho de fl. 19.052 e impugnado às fls. 19.056/19.063. O Ministério Público do Trabalho, às fls. 19.070/19.072, opinou pelo conhecimento e provimento do apelo. É o relatório. VOTO CONHECIMENTO LIMITAÇÃO DO LITISCONSÓRCIO ATIVO COMPOSTO DE 9.436 RECLAMANTES O Regional confirmou a limitação do litisconsórcio ativo, imposta pela JCJ de origem, conforme o seguinte fundamento: “O número de Reclamantes a postular o mesmo direito nesta causa é de, espantosamente, 9.436. Subtraindo os 10 remanescentes, em face da extinção do processo, dos quais 04 tiveram a ação arquivada por ausência, restaram 9.426 Recorrentes que objetivam afastar a extinção do processo para que seja desmembrada a ação, o que mais provavelmente, se acontecer, ocorreria em grupos de 10 autores, num total de aproximadamente 942 processos. O elevado número de Reclamantes já denuncia a impossibilidade material de manejo destes autos, valendo trazer a informação de que somente para autuação foram gastos 45 dias, e com toda razão observou a Junta os percalços que podem surgir no curso desta ação como pretendiam os Reclamantes, pois Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 329 JURISPRUDÊNCIA grande é a possibilidade de substituição de partes por espólio, provocando a paralisação do processo. A excessiva cumulação subjetiva, ainda que comuns o pedido e a causa, compromete a solução do litígio, autorizando a oportuna intervenção do Juízo para incidentalmente reparar o excesso por meio de decisão interlocutória e extinguir o processo sem julgamento de mérito em relação aos acionantes acima do 10°, exclusive. Incogitável o desmembramento do processo em 942 outros para o mesmo Juízo, sob pena de tumultuar os procedimentos organizacionais do Judiciário, máxime de trabalho conjunto entre este e as partes, com o objetivo de desmembrar as ações ônus não compete ao ente público.” (fls. 19.031/32) Os reclamantes opuseram declaratórios, às fls. 19.036/19.037, a fim de sanar omissão quanto ao pronunciamento referente ao disposto no art. 5°, XXXV, da Constituição Federal. O juízo de segundo grau, às fls. 19.042/19.044, acolheu os declaratórios apenas para prestar os seguintes esclarecimentos: “Não há como considerar violado o disposto no art. 5°, XXXV, da CF, por extinção do processo a partir do 10° Reclamante, afastando-se desta maneira a alegação de exclusão da apreciação pelo Judiciário da ameaça a direito. A impossibilidade material de manejo e correta averiguação da situação funcional de cada autor, constatadas neste processo com elevado número de Reclamantes - repita-se, 9.436 -, seria, na verdade, uma das causas que nos levariam à obstrução da mais perfeita possível entrega da prestação jurisdicional, excluindo, ao revés, certamente para vários autores, a correta apreciação pelo Judiciário da ameaça aos respectivos direitos.” (fl. 19.044) Na revista, os autores apontam violação do art. 5°, XXXV, da Lei Maior e transcrevem um aresto às fls. 19.048/19.050. Sustentam, em síntese, que a limitação do litisconsórcio não pode acarretar a extinção do processo, mas o desmembramento da ação com o regular prosseguimento de cada uma das ações. Assim, a decisão recorrida, ao não determinar a separação ou desdobramento das ações, mas a pura e simples extinção do processo, sem julgamento do mérito, com relação aos outros 9.426 reclamantes, excluiu da apreciação do Poder Judiciário a lesão ao direito dos autores, noticiada na reclamação. O único aresto trazido autoriza o conhecimento da revista, visto que o julgado evidencia tese contrária, segundo a qual, uma vez limitado o litisconsórcio, com base nos arts. 46 e 47 do CPC, a conseqüência jurídica a ser observada é a separação ou o desdobramento dos litígios em feitos distintos, mas nunca a extinção do processo sem julgamento do mérito. Conheço por divergência jurisprudencial. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 330 JURISPRUDÊNCIA MÉRITO LIMITAÇÃO DO LITISCONSÓRCIO ATIVO COMPOSTO DE 9.436 RECLAMANTES No processo do trabalho, o art. 842 da CLT, que trata da reclamação plúrima, estabelece como requisitos para o acúmulo de reclamações num só processo apenas a identidade de matéria e o mesmo empregador. No caso dos autos, verifica-se a existência de identidade de matéria, pois se observa que o objeto da ação, para todos os reclamantes, é a discussão sobre o direito aos repousos semanais remunerados durante o período em que eram regidos pela CLT, ou seja, antes da conversão ao regime estatutário. O pedido, na reclamação, é de pagamento do repouso semanal remunerado na razão de 1/6 do salário percebido pelos reclamantes professores com base na interpretação da Lei n° 605/49 c/c o art. 320 da CLT, matéria que já se encontra sumulada nesta corte superior do trabalho por meio do Enunciado n° 351 do TST. Logo, em se tratando de matéria exclusivamente de direito e tendo em vista a homogeneidade na causa de pedir e no pedido, não se justifica a limitação do litisconsórcio multitudinário. Vale destacar, também, que, ainda que fosse possível a limitação do litisconsórcio, não se poderia extinguir o processo, sem julgamento do mérito, com base no art. 267, IV, do CPC, quanto aos litisconsórcios excedentes. Seria o caso de desdobramento das ações em processos diversos, conforme os ensinamentos do ilustre Nelson Nery Júnior, em seu Código de Processo Civil Comentado, editado pela Revista dos Tribunais (2“ edição), 1996, pág. 413, art. 46-6: “Ao despachar a petição inicial, deve o juiz verificar se há litisconsórcio multitudinário, avaliando se é o caso de propor o desdobramento das ações.” E mais adiante, quando afirma (art. 46-13): “o juiz apenas limita, mas não extingue nem recusa o litisconsórcio.” Por outro lado, o inciso IV do art. 267 do CPC determina a extinção do processo, sem julgamento do mérito, quando se verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo. Tais pressupostos de constituição e de desenvolvimento, consoante as magníficas lições do brilhante Humberto Theodoro Júnior (Curso de Direito Processual Civil, vol. 1,19a edição, Editora Forense, 1997, item 317), agrupam-se em duas categorias: subjetiva e objetiva. A primeira liga-se aos sujeitos do processo, que são o juiz e as partes e diz respeito ao requisito da competência e da ausência de impedimento e suspeição do órgão jurisdicional. Quanto às partes, relaciona-se com a capacidade civil de exercício, bem como à necessidade de representação por advogado. A segunda categoria (pressupostos objetivos), corresponde à regularidade dos atos processuais, segundo a lei que o disciplina, mormente quanto à forma do rito, quando for da substância dos atos, e à ausência de fatos impeditivos do processo. Logo, pelo fundamento da limitação de litisconsórcios, não é possível a extinção do processo sem julgamento do mérito, com base no art. 267, IV, do CPC, pois não se verificaria a ausência de quaisquer pressupostos processuais, subjetivos ou objetivos. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 jul/set 2000 331 JURISPRUDÊNCIA Voltando à discussão dos autos, não é possível a limitação do litisconsórcio em face da homogeneidade da causa de pedir e do pedido e também por se tratar de discussão de matéria exclusivamente de direito. Contudo, no processo do trabalho, existe a previsão legal, contida no art. 843, § 2o, da CLT, de que, se por motivo ponderoso, devidamente comprovado, não for possível ao empregado comparecer pessoalmente, poderá fazer-se representar por outro empregado que pertença à mesma profissão ou pelo seu sindicato. Então, aplicando-se o referido dispositivo consolidado à situação dos autos, conclui-se pela impossibilidade do comparecimento pessoal, na audiência de julgamento, de todos os quase 10 mil reclamantes existentes nos autos, fato esse notório, que independe de comprovação. Entretanto, em se tratando de ação plúrima composta de 9.436 reclamantes, o juiz deve, com base no art. 843, § 2o, da CLT, dar oportunidade aos autores para que indiquem os seus representantes em número que entendam adequado para o prosseguimento da ação ou para que se façam representar pelo sindicato da categoria. Assim, as decisões ordinárias, que haviam limitado o litisconsórcio aos 10 primeiros autores e extinguido o processo sem julgamento do mérito, devem ser anuladas. É que, não sendo cabível a limitação do litisconsórcio e não havendo previsão legal para a referida extinção, houve, nos moldes do art. 5o, XXXV, da Carta Magna, a exclusão de apreciação pelo Judiciário da possibilidade de lesão aos direitos dos demais reclamantes. Diante de todo o exposto, dou provimento ao recurso de revista para, anulando as decisões ordinárias, determinar a remessa dos autos à Vara do Trabalho de origem a fim de que profira novo julgamento, devendo o juiz, com base no art. 843, § 2o, da CLT, dar oportunidade aos autores para que indiquem os seus representantes em número que entendam adequado para o prosseguimento da ação ou para que se façam representar pelo sindicato da categoria. Isto posto, Acordam os Ministros da 1a Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, conhecer do recurso de revista por divergência jurisprudencial e, no mérito, dar-lhe provimento para, anulando as decisões ordinárias, determinar a remessa dos autos à Vara de Trabalho de origem a fim de que profira novo julgamento, devendo o juiz, com base no art. 843, § 2o, da CLT, dar oportunidade aos autores para que indiquem os seus representantes em número que entendam adequado para o prosseguimento da ação ou para que se façam representar pelo sindicato da categoria. Brasília, 31 de maio de 2000. Almir Pazzianotto Pinto, presidente. Ronaldo José Lopes Leal, relator. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 332 JURISPRUDÊNCIA MANDADO DE SEGURANÇA. LIMITAÇÃO DA COMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ALTERAÇÃO DE REGIME JURÍDICO Decisão impugnada por mandado de segurança consistente na determinação de implantação em folhas de pagamento de diferenças salariais sobre parcelas vencidas e vincendas de servidores empregados que, no curso da relação processual, transformaram-se em funcionários públicos estatutários. Sobrevindo a implantação de regime jurídico único estatutário (Lei n° 8.112/90), cessou a competência material da Justiça do Trabalho para equacionar o dissídio individual do servidor público federal, impondo-se a limitação da condenação tão-somente aos pedidos decorrentes da relação de emprego. Recurso ordinário a que se dá provimento. PROCESSO N° TST-RXOFROMS-464.201/98 - (Ac. SBDI 2) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Remessa de Ofício e Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n° TST-RXOFROMS-464.201/98, sendo recorrente Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, recorridos Ricardo Pereira dos Santos e outros e autoridade coatora Juiz Auxiliar da 38a JCJ de São Paulo (SP). O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS impetrou mandado de segurança contra decisão proferida pelo Exmo. Juiz Auxiliar da 38a JCJ de São Paulo, que indeferiu requerimento de suspensão da decisão que havia determinado a implantação das diferenças salariais decorrentes do IPC de janeiro de 1989 (70,28%) nas folhas de pagamento dos então reclamantes. O egrégio TRT da 2a Região (fls. 363/365) denegou a segurança, por ausência de direito líquido e certo, tendo em vista o descabimento do mandamus contra decisão transitada em julgado. Inconformado, interpôs o Impetrante recurso ordinário, reiterando o argumento relativo à incompetência da Justiça do Trabalho em virtude da mudança de regime jurídico, o que caracterizaria a existência de direito líquido e certo do Impetrante (fls. 284/295). Não houve contra-razões. A douta Procuradoria Geral do Trabalho opina pelo não-provimento do recurso (fls. 377/380). É o relatório. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 333 JURISPRUDÊNCIA CONHECIMENTO RECURSO DE OFÍCIO E RECURSO ORDINÁRIO Preliminarmente, entendo que a hipótese comporta o conhecimento do recurso de ofício, a teor do disposto no art. 1o, inciso V, do Decreto-Lei n° 779/69, visto tratar- se de acórdão proferido pelo egrégio 2° Regional, desfavorável aos interesses do Impetrante, autarquia federal. Ante o exposto, determino a reautuação, para que conste recurso de ofício e recurso ordinário em mandado de segurança. Conheço de ambos os recursos, visto que regularmente interpostos. MÉRITO DOS RECURSOS Tendo em vista a identidade de matérias, analiso conjuntamente os recursos de ofício e recurso ordinário em mandado de segurança. Para melhor entendimento da controvérsia, convém que se proceda a um brevíssimo retrospecto dos fatos. Ricardo Pereira dos Santos e outros ajuizaram a reclamação trabalhista n° 2.438/89, pleiteando a integração das diferenças decorrentes do IPC de janeiro de 1989 (70,28%) nos salários vencidos e vincendos (fls. 14/20), cujo pedido restou julgado improcedente pela MMª 38a JCJ de São Paulo/SP (fls. 26/28). Interposto recurso ordinário pelos Reclamantes, a r. sentença restou reformada pelo egrégio 2° Regional, que condenou o Instituto Nacional do Seguro Social -INSS ao pagamento do IPC de janeiro de 1989, no índice de 70,28%, sobre parcelas vencidas e vincendas (fls. 35/37). Iniciado o processo de execução, mediante precatório n° 560/94, os reclamantes apresentaram requerimento no sentido de compelir o então reclamado a efetuar o cumprimento da obrigação de fazer consistente na implantação da vantagem deferida na folha de pagamento, que resultou na prolação da decisão ora impugnada (fl. 162): Desde o mês de maio/96 pelo menos, vem-se determinando à reclamada que procedesse à integração dos valores a que foi condenada, conforme despacho de fls. 346, até o presente momento não atendido. Não tem razão a reclamada, portanto, quando alega ter-lhe sido concedido prazo exíguo. As demais alegações de fls. 386/389 ferem a coisa julgada, contradizendo inclusive seus próprios cálculos, com os quais os reclamantes se limitaram a concordar. Não há que se falar ainda em incompetência desta Justiça Especializada após a instituição do Regime Jurídico Único dos funcionários da União (1990), pois se trata da parcela anterior à modificação do regime, decorrente do contrato de emprego. Não tendo a reclamante cumprido a determinação deste Juízo até o momento, expeça-se ofício ao Ministério Público Federal para as apurações necessárias. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 334 JURISPRUDÊNCIA Daí o presente mandado de segurança, em que o então Executado basicamente reitera a alegação de incompetência material da Justiça do Trabalho para decidir questões relativas a servidores federais, submetidos ao regime jurídico único estatutário com o advento da Lei n° 8.112/90, sustentando que, a rigor, impunha-se a limitação da condenação ao mês anterior à data base (janeiro de 1990). O egrégio Regional, todavia, denegou a segurança, sob a seguinte fundamentação (fls. 364/365 -g.n.): No caso em exame, não se vislumbra onde residiria o direito líquido e certo que daria suporte à utilização do ‘mandamus’. Embora a Impetrante persiga o ato executório que determinou a imediata incorporação do título judicial nos ganhos mensais dos litisconsortes, na verdade, o ato atacado é o Acórdão proferido pela Quarta Turma deste Tribunal, que deferiu o pagamento de diferenças salariais decorrentes da aplicação do reajuste salarial de 70,28%. Cumpre destacar de imediato, que inexiste direito líquido e certo contra decisão judicial transitada em julgado, princípio que se encontra declarado no Enunciado 33 do C. TST, e na Súmula 268 do STF. Demais disso, como bem salientado pelo d. representante do Ministério Público do Trabalho, a matéria debatida no presente ‘mandamus’ ‘traz ínsito questionamento que ao longo do tempo mereceu interpretações dissonantes, tanto no que pertine à competência da Justiça do Trabalho para dirimir a controvérsia em torno da aplicabilidade ou não das perseguidas diferenças salariais aos servidores celetistas, posteriormente integrados ao regime jurídico único estatutário, quanto à eventual limitação de tais créditos à data da transformação do regime celetista, inobstante a coisa julgada.’ Ocorre, todavia, que a medida eleita pela impetrante afigura-se inadequada para tal discussão, na medida em que o remédio heróico não possui natureza rescisória, capaz de desconstituir a 'res judicata’. Destarte, ausentes quaisquer dos pressupostos autorizadores da concessão da segurança, não há como se reconhecer eventual direito líquido e certo da impetrante que pudesse ser reparado pela via mandamental que se revela, repita-se, inadequada para o acolhimento da pretensão. Contra o venerando acórdão regional, o impetrante interpôs recurso ordinário, pugnando pela reforma do v. acórdão regional. Merece reforma o v. acórdão ora recorrido. O venerando acórdão regional partiu de uma premissa equivocada para extrair a conclusão no sentido de não ser cabível o mandado de segurança à espécie. Com efeito, absteve-se o egrégio Regional de apreciar a demanda tal como proposta. Efetivamente, o presente mandado de segurança não ataca acórdão transitado em julgado e, portanto, não infirma a coisa julgada. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 335 JURISPRUDÊNCIA Impugna-se, como visto, a decisão judicial ulterior proferida em execução, consistente em não obstar a implantação em folha de pagamento de diferenças decorrentes de adiantamento salarial. Por conseguinte, não colhe o fundamento único em que se louvou o venerando acórdão recorrido, segundo o qual o mandado de segurança ataca a coisa julgada. No mérito, entendo que razão assiste ao impetrante. Transparece do processo principal que o venerando acórdão exeqüendo determinou a condenação no pagamento de diferenças salariais decorrentes de lei de política salarial. A rigor, portanto, tais diferenças deveriam ser deferidas tão-somente até a limitação da data base da categoria, ou seja, até dezembro de 1989, conforme orientação jurisprudencial consagrada na Súmula n° 322 desta colenda Corte. Em outras palavras, tais diferenças jamais poderiam ser incluídas e implantadas em folha de pagamento, sob pena de transmudarem-se em aumento salarial e incorporarem-se aos salários ad perpetuam, o que contrariaria frontalmente a natureza da parcela: adiantamento salarial compensável na data base. De toda sorte, a violação a direito líquido e certo do Impetrante, antes de mais nada, advém da circunstância de a implantação das diferenças em folhas de pagamento abranger condenação relativa a período de regime jurídico celetista e período de regime jurídico estatutário. Inquestionável que os litisconsortes ingressaram em juízo ostentando ainda a qualidade de empregados públicos, pleiteando vantagens derivantes do contrato de emprego. Contudo, no curso da tramitação do processo trabalhista, sobreveio a Lei n° 8.112/90 transformando-os em funcionários públicos estatutários. Entendo que dita a competência material da Justiça do Trabalho a qualidade jurídica com que se reside em Juízo. Assim, se e enquanto os empregados ingressaram em Juízo como empregados públicos, inafastável a competência material da Justiça do Trabalho. Entretanto, desde o momento em que se despojaram dessa qualidade, ipso facto também se deu a cessação de tal competência. Nesse sentido, aliás, a contrario sensu, é a Súmula 97 do STJ: Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar reclamação de servidor público relativamente a vantagens trabalhistas anteriores à instituição do regime jurídico único. Certo que quando proferido o v. acórdão que determinou o pagamento das aludidas diferenças salariais (1°. 12.92), vigorava plenamente o art. 240, alínea e, da Lei n° 8.112/90, que outorgava à Justiça do Trabalho competência para o dissídio individual do servidor público federal. Entretanto, sabidamente, por meio da ADIn n° 492-1, a inconstitucionalidade do preceito legal em foco foi proclamada pelo Supremo Tribunal Federal. E a declaração em apreço tem eficácia retroativa (ex tunc), consoante jurisprudência sedimentada Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 336 JURISPRUDÊNCIA da Suprema Corte e da mais prestigiosa doutrina. Por conseguinte, é como se não houvesse no mundo jurídico a fixação da aludida competência. Ademais, não se pode olvidar o disposto no art. 87, parte final, do CPC, que assim reza (g.n.): Art. 87. Determina-se a competência no momento em que a ação é proposta. São irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem o órgão judiciário ou alterarem a competência em razão da matéria ou da hierarquia. Entendo que o preceito em foco permite impor limitação à competência material da Justiça do Trabalho a partir da implantação do regime jurídico único estatutário no âmbito federal (Lei n° 8.112/90). Ora, a hipótese vertente revela justamente a exceção contida na parte final do invocado dispositivo legal, pois houve alteração da competência material do órgão judicante. Efetivamente, implantado o regime jurídico único estatutário, de natureza pública, regido pelo Direito Administrativo, os conflitos intersubjetivos de interesse escaparam inteiramente à órbita da competência material da Justiça do Trabalho. A propósito, o colendo Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou acerca da aplicabilidade imediata da mudança de competência material: A alteração de competência ratione materiae tem aplicação imediata, se não ressalvada na lei que trouxe a modificação, e se aplica independentemente da fase em que se encontre o processo. (STJ - 2a Seção, CC 948-GO, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, DJ de 09.04.90) Por outro lado, se não for fixada a limitação, a Justiça do Trabalho terá competência para julgar qualquer outro pedido referente ao Regime Jurídico Único, porque a situação não muda substancialmente desta, em que houve, no interregno do ajuizamento da ação e do julgamento, a mudança do regime jurídico. Na hipótese em apreço, convém atentar para a circunstância de que caberia ao Exmo. Juiz condutor do processo de execução observar o disposto no art. 471, inciso I, do CPC, aplicado subsidiariamente ao Processo Trabalhista, que lhe permite DECIDIR, NOVAMENTE, QUESTÕES JÁ DECIDIDAS, RELATIVAS À MESMA LIDE, EM SE TRATANDO DE RELAÇÃO JURÍDICA CONTINUATIVA, como é o caso dos autos, SE SOBREVEIO MODIFICAÇÃO NO DIREITO MATERIAL, PODENDO DETERMINAR O IMPEDIMENTO DA EXECUÇÃO, SEM CABER FALAR-SE EM AFRONTA À COISA JULGADA. Fere, portanto, direito líquido e certo do Impetrante a não-limitação da condenação em execução e conseqüente determinação de implantação das diferenças salariais em folhas de pagamento ad perpetuam. Impunha-se a observância do art. 471, inciso I, do CPC, conjugado com a eficácia retroativa de declaração de inconstitucionali- Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 337 JURISPRUDÊNCIA dade pelo STF do preceito legal que outorgava competência à Justiça do Trabalho para lide de servidor estatutário. Ante o exposto, dou provimento ao recurso ordinário para conceder a segurança e sustar a determinação de implantação das diferenças salariais em folhas de pagamento dos litisconsortes passivos, a partir de 12.12.90. Isto posto, Acordam os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho: I - preliminarmente, determinar a reautuação do feito para que conste, também, a remessa oficial; II - pelo voto prevalente da Presidência, nos termos do artigo 252 do Regimento Interno desta Corte, vencidos os Excelentíssimos Ministros Ronaldo José Lopes Leal, José Luciano de Castilho Pereira e Antônio José de Barros Levenhagen, dar provimento ao recurso ordinário e à remessa de ofício para, reformando a veneranda decisão regional recorrida, conceder a segurança impetrada e sustar a determinação de implantação das diferenças salariais, em folha de pagamento dos litisconsortes passivos, a partir da convolação do Regime Jurídico Único, em 12 de dezembro de 1990. Brasília, 29 de fevereiro de 2000. Ursulino Santos Filho, Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho, no exercício da Presidência. João Oreste Dalazen, relator. MANDADO DE SEGURANÇA. DECISÃO CONCESSIVA DE TUTELA ANTECIPADA DE REINTEGRAÇÃO AO SERVIÇO. ADMISSIBILIDADE É notória a orientação jurisprudencial dominante nesta Corte sobre a inadmissibilidade do mandado de segurança para cassar ato concessivo de tutela antecipada se esse o foi no corpo da sentença ou, tendo-o sido o curso do processo, acabou ratificado na decisão definitiva, hipótese em que se tem preconizado o cabimento da cautelar inominada para imprimir efeito suspensivo ao recurso ordinário acaso interposto. Ocorre que compulsando os autos se constata que a tutela foi concedida em decisão à parte e não obstante o fosse na mesma data da prolação da sentença de mérito, dessa não constou qualquer registro sobre a sua convalidação. Daí a certeza do cabimento do mandado de segurança, não só porque os efeitos da tutela antecipada não se confundem com os da sentença definitiva, mas sobretudo por causa do conteúdo interlocutório da decisão, em condições de atrair a regra da irrecorribilidade imediata das interlocutórias do art. 893, § 1 °, da CLT. De outro lado, além do equívoco de se ter postulado a tutela antecipada do artigo 273 do CPC, equívoco que fora endossado pela decisão que a concedera, pois em se tratando, de obrigação de fazer a norma pertinente é a do art. 461 daquele Código, as próprias razões da decisão que a deferira dilucidam a não-ocorrência dos requisitos previstos indiferentemente num e noutro dos dispositivos em tela. Com efeito, depois de a douta autoridade dita coatora ter descartado a Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 338 JURISPRUDÊNCIA nulidade da resilição contratual pelo prisma da Convenção 158 da CLT, das normas regulamentares do impetrante recorrido ou mesmo de preceitos da Constituição do Estado, entendeu de acolhê-la por se tratar de empregado concursado de Sociedade de Economia Mista, a inviabilizar o exercício do poder potestativo, deixando subentendido a existência de estabilidade no emprego. Sucede que a tese ali abraçada não se mostra assim tão pacífica, como aliás o confessou o próprio magistrado de origem ao salientar " ser cediço que a questão da contratação/dispensa no âmbito da Administração Pública não é questão de fácil deslinde ”, tendo em vista a larga dissensão doutrinária e jurisprudencial se a exigência do concurso público altera o sentido da norma do art. 173 da Constituição ou é capaz de sugerir a idéia de a resilição imotivada trazer implícita a do direito à estabilidade no cotejo com o art. 7°, inciso I, daquele Texto. Isso porque, além de o art. 173 ser enfático ao equiparar as Sociedades de Economia Mista às Pessoas Jurídicas de Direito Privado, no que concerne, por exemplo, à aplicação do Direito do Trabalho, o art. 7°, inciso I, optou por priorizar a indenização compensatória em detrimento da estabilidade como forma de proteção da relação de emprego, a desautorizar, ao menos em sede de liminar, a ordem de imediata reintegração ao serviço por conta da inexistência de estabilidade ou garantia de emprego que a sustentasse. PROCESSO N° TST-ROMS-570.743/99 - (Ac. SBDI 2) Vistos, relatados e discutidos estes autos de recurso ordinário em mandado de segurança n° TST-RO-MS-570.743/99, em que é recorrente José Olympio de Carvalho Júnior e recorrido Banco do Estado do Rio de Janeiro S.A. - Banerj (em liquidação extrajudicial) e autoridade coatora Juiz Presidente da 1a JCJ de Volta Redonda (RJ). Mandado de segurança impetrado pelo Banco do Estado do Rio de Janeiro S.A. - Banerj (em liquidação extrajudicial) contra ato do MM. Juiz Presidente da 1a JCJ de Volta Redonda (RJ), consistente na expedição de mandado com determinação de imediato cumprimento da sanção jurídica alusiva à reintegração ao serviço do autor da ação trabalhista mediante concessão de antecipação da tutela no corpo da sentença. O impetrante, depois de alertar para a higidez da resilição contratual em face da existência de interesse público a justificá-la, conclui assinalando a ilegalidade da determinação judicial por envolver obrigação de fazer refratária à execução provisória. O egrégio 1° Regional, pelo venerando acórdão de fls. 173/176, concedeu a segurança por entender válida a dispensa do empregado frente ao contido no art. 173 da Constituição Federal. O litisconsorte passivo necessário manifesta recurso ordinário pretendendo demonstrar o desacerto do julgado mediante argumentação deduzida às fls. 184/195. O recurso foi admitido pelo respeitável despacho de fls. 211 e contra-arrazoado às fls. 211/222. A douta Procuradoria-Geral do Trabalho opinou às fls. 226/227 pelo não-provimento do recurso. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 339 JURISPRUDÊNCIA É o relatório. VOTO É notória a orientação jurisprudencial dominante nesta Corte sobre a inadmissibilidade do mandado de segurança para cassar ato concessivo de tutela antecipada se esse o foi no corpo da sentença ou, tendo-o sido o curso do processo, acabou ratificado na decisão definitiva, hipótese em que se tem preconizado o cabimento da cautelar inominada para imprimir efeito suspensivo ao recurso ordinário acaso interposto. Ocorre que compulsando os autos se constata que a tutela foi concedida em decisão à parte e não obstante o fosse na mesma data da prolação da sentença de mérito, dessa não constou qualquer registro sobre a sua convalidação. Daí a certeza do cabimento do mandado de segurança, não só porque os efeitos da tutela antecipada não se confundem com os da sentença definitiva, mas sobretudo por causa do conteúdo interlocutório da decisão, em condições de atrair a regra da irrecorribilidade imediata das interlocutórias do art. 893, § 1o, da CLT. A quase totalidade das razões que amparam a irresignação do litisconsorte recorrente, para obter a restauração da ordem de imediata reintegração ao serviço, remete ao mérito da ação trabalhista, sabidamente refratário à cognição estreita do mandado de segurança, balizada pelo exame da ilegalidade ou abusividade do ato atacado. Nesse sentido, além do equívoco de se ter postulado a tutela antecipada do artigo 273 do CPC, equívoco que fora endossado pela decisão que a concedera, pois em se tratando de obrigação de fazer a norma pertinente é a do art. 461 daquele Código, as próprias razões da decisão que a deferira dilucidam a não-ocorrência dos requisitos previstos indiferentemente num e noutro dos dispositivos em tela. Com efeito, depois de a douta autoridade dita coatora ter descartado a nulidade da resilição contratual pelo prisma da Convenção 158 da CLT, das normas regulamentares do impetrante recorrido ou mesmo de preceitos da Constituição do Estado, entendeu de acolhê-la por se tratar de empregado concursado de sociedade de economia mista, a inviabilizar o exercício do poder potestativo, deixando subentendido a existência de estabilidade no emprego. Sucede que a tese ali abraçada não se mostra assim tão pacífica, como aliás o confessou o digno magistrado de origem ao salientar “ser cediço que a questão da contratação/dispensa no âmbito da Administração Pública não é questão de fácil deslinde”, tendo em vista a larga dissensão doutrinária e jurisprudencial se a exigência do concurso público altera o sentido da norma do art. 173 da Constituição ou é capaz de sugerir a idéia de a resilição imotivada trazer implícita a do direito à estabilidade no cotejo com o art. 7o, inciso I, daquele texto. Isso porque, além de o art. 173 ser enfático ao equiparar as Sociedades de Economia Mista às Pessoas Jurídicas de Direito Privado, no que concerne, por exemplo, à aplicação do Direito do Trabalho, o art. 7o, inciso I, optou por priorizar a indenização compensatória em detrimento da estabilidade como forma de proteção da relação de Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 340 JURISPRUDÊNCIA emprego, a desautorizar, ao menos em sede de liminar, a ordem de imediata reintegração ao serviço por conta da inexistência de estabilidade ou garantia de emprego que a sustentasse. Desse modo, é fácil inferir a ausência dos requisitos quer do art. 273, quer do art. 461, do CPC, visto que, a despeito de ser inequívoco o fato relacionado à dispensa imotivada, não se vislumbra a verosimilhança do direito à reintegração e nem a relevância do fundamento da demanda, considerando inclusive a hesitação da autoridade de conceder a medida sublinhando não ser a questão de fácil deslinde (sic). Não sensibiliza, por outro lado, a versão de ineficácia da medida se o seu cumprimento fosse postergado ao trânsito em julgado da sentença de mérito, não tanto porque receberia todos os salários e demais vantagens do período mediado entre a dispensa e a reintegração, mas pela possibilidade de se habilitar, à semelhança de milhares de trabalhadores, à percepção do seguro-desemprego, cujo valor irrisório deve ser debitado à política econômica do Governo Federal. Tampouco comove o argumento de que a imediata reintegração não traria prejuízos ao impetrante recorrido, em virtude de os salários serem pagos em retribuição aos serviço prestado. É que o prejuízo de que se cogita não é exclusivamente patrimonial, embora esse também ocorra com os encargos sociais provenientes da precipitada imposição de mão-de-obra, mas principalmente de ordem jurídica com a inobservância dos artigos 273 e 461 do CPC. Ante o exposto, nego provimento ao recurso. Isto posto, Acordam os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário. Brasília, 27 de junho de 2000. Ursulino Santos Filho, Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho no exercício da Presidência. Antônio José de Barros Levenhagen, relator. MANDADO DE SEGURANÇA. REINTEGRAÇÃO. DIRIGENTE SINDICAL Mandado de segurança. Reintegração. Dirigente sindical. Empregado estável. Suspensão. Inquérito judicial para apuração de falta grave. Liminar concedida em processo trabalhista determinando a reintegração de dirigente sindical que se encontrava suspenso em razão de ajuizamento de inquérito para apuração de falta grave. A regra do art. 659, inc. X, da CLT, assecuratória da liberdade sindical, pressupõe dispensa imotivada ou suspensão disciplinar arbitrária do dirigente sindical perpetrada pelo empregador e aferível pelo Juiz mediante cognição sumária. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 341 JURISPRUDÊNCIA Não incide se o empregador ordena suspensão disciplinar preventiva do empregado acusado de prática de falta grave e ajuíza " inquérito ”para apurá-la. A luz do art. 494 da CLT, constitui direito líquido e certo do empregador ordenar a suspensão disciplinar preventiva do empregado exercente de cargo de direção sindical ou titular de estabilidade decenal acusado de falta grave, "até decisão final do processo". Recurso ordinário interposto pelo empregado Litisconsorte passivo conhecido e desprovido. PROCESSO N° TST-ROMS-414.613/97- (Ac. SBDI 2) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n° TST-ROMS-414.613/97, em que é recorrente Moacir Jardim, recorrida Siderúrgica Rio-Grandense S.A. e autoridade coatora MM. Juiz Presidente da Junta de Conciliação e Julgamento de São Jerônimo (RS). Siderúrgica Rio-Grandense S.A. impetrou mandado de segurança, com pedido de liminar, contra ato do MM. Juiz Presidente da JCJ de São Jerônimo (RS), mediante o qual, em ação trabalhista, deferiu liminar determinando a reintegração do ora litisconsorte Passivo no emprego. Sustentou a impetrante que o litisconsorte passivo cometeu falta grave, consistente na apresentação de atestado médico falso para justificar falta ao trabalho, justificando, assim, sua suspensão para o ajuizamento de inquérito judicial. Assegurou ainda que o empregado não detinha estabilidade em virtude de não se encontrar “alinhado dentre aqueles empregados aos quais se refere o art. 522, consolidado" (fl. 04). Nesse contexto, alegou a impetrante que a liminar concedida em ação trabalhista violaria direito líquido e certo constitucionalmente assegurado no art. 5°, inciso LV, da Constituição da República. O egrégio Quarto Regional concedeu a segurança, sob os fundamentos sintetizados na ementa de fl. 273: MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA LIMINAR QUE DETERMINA A REINTEGRAÇÃO DE DIRIGENTE SINDICAL AFASTADO PARA APURAÇÃO DE FALTA GRAVE. O artigo 494 da CLT faculta ao empregador a suspensão do contrato de trabalho, mantido com empregado estável, acusado de falta grave. Direito líquido e certo da impetrante, de manter a suspensão até a decisão final do processo, nos termos do disposto no parágrafo único do mencionado artigo. De outro lado, a estabilidade no emprego, de que trata o artigo 8°, inciso VIII, da Constituição Federal, somente beneficia os empregados que ocupam cargo de dirigente sindical com eleição prevista em lei, não bastando a previsão estatutária. Prescreve o art. 522 da CLT, como limite necessário ao abuso de direito, como o art. 543, § 4°, do mesmo diploma legal. Segurança concedida. Inconformado, o litisconsorte passivo interpôs recurso ordinário (fls. 283/286), sustentando que os fundamentos adotados pelo Tribunal para conceder a segurança Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 342 JURISPRUDÊNCIA não se encontram pacificados na atual jurisprudência. Sustenta que a controvérsia acerca do direito, ou não, à estabilidade não constituiria objeto próprio para mandado de segurança. Admitido o recurso (fl. 289), sem contra-razões (certidão, fl. 293). A douta Procuradoria Geral do Trabalho opina pelo não-provimento do recurso (fls. 292/292). É o relatório. CONHECIMENTO Conheço do recurso ordinário, visto que regularmente interposto. MÉRITO DO RECURSO Como visto, o presente mandado de segurança impugna decisão proferida pelo MM. Juiz Presidente da JCJ de São Jerônimo (RS) que, na ação trabalhista, deferiu liminar de reintegração do empregado litisconsorte passivo, que se encontrava suspenso para responder a inquérito judicial por falta grave. O egrégio TRT a quo concedeu a segurança pleiteada sob o fundamento de que o artigo 494 da CLT faculta ao empregador suspender o contrato de trabalho do empregado estável acusado de falta grave. Considerou, ainda, que o empregado não detinha estabilidade sindical em razão de o cargo para o qual se elegera não se encontrar previsto no artigo 522 do Estatuto Consolidado (fls. 273/280). Dessa decisão recorre o litisconsorte passivo, sustentando a existência de controvérsia jurisprudencial acerca do direito questionado, bem como a impropriedade de se discutir em mandado de segurança o alcance do artigo 522 da CLT (fls. 283/286). No que pertine ao direito do empregado à estabilidade em virtude de eleição para cargo de direção previsto nos estatutos da entidade sindical, comungo da tese do Recorrente segundo o qual não se trata de matéria típica para discussão em mandado de segurança, pois dai não emerge direito líquido e certo, dada a notória controvérsia jurídica reinante a respeito. De todo modo, devo ressaltar que a orientação jurisprudencial desta Corte sedimentou-se no sentido de que apenas detêm a estabilidade prevista no art. 543 da CLT os empregados eleitos para cargo de direção sindical previsto no artigo 522 da CLT. Sobressai na hipótese vertente a circunstância de a liminar determinar a reintegração de empregado suspenso preventivamente, na forma do artigo 494 da CLT, em virtude de inquérito ajuizado, destinado a apurar falta grave. É certo que o art. 659, inc. X, da CLT, faculta ao Juiz a concessão de liminar em processo trabalhista objetivando “reintegrar no emprego dirigente sindical afastado, suspenso ou dispensado pelo empregador”. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 343 JURISPRUDÊNCIA Contudo, não se pode interpretar e aplicar esse preceito legal dissociado do sistema em que se acha insculpido, mormente dissociando-o da norma do art. 494 da CLT. Penso que a regra do art. 659, inc. X, da CLT, assecuratória da liberdade sindical, pressupõe dispensa imotivada ou suspensão disciplinar arbitrária do dirigente sindical perpetrada pelo empregador e aferível pelo Juiz mediante cognição sumária. Então, sim, faculta-se ao Juiz reintegrá-lo prontamente no emprego para que possa levar a cabo o mandato sindical. Não se pode olvidar, todavia, que paralelamente também vigem os arts. 494 e 543, § 3°, fine, da CLT. Infere-se desses preceitos que a dispensa do empregado exercente de cargo de direção sindical somente pode dar-se por falta grave apurada mediante inquérito judicial, à semelhança do antigo titular de estabilidade decenal. Ora, em semelhante circunstância, o art. 494, da CLT, confere ao empregador a faculdade de ordenar a suspensão disciplinar preventiva do empregado “até decisão final do processo”. De sorte que se, de um lado, há inafastável dever de o empregador submeter à Justiça do Trabalho a autorização para resolução do contrato de trabalho do dirigente sindical, de outro, constitui direito patronal inconcusso afastá-lo do serviço preventivamente. A suspensão disciplinar preventiva, de resto, não raro traduz exigência imperiosa e elementar destinada à plena elucidação da falta imputada e a coibir a continuidade de eventual lesão patrimonial. Sem mais, não me parece sequer minimamente razoável compelir-se o empregador, mediante liminar, a manter a serviço empregado virtualmente acusado, por exemplo, de prática de ato de improbidade e que já decaiu inteiramente de sua confiança. Insta ter presente que, de todo modo, caso não logre provar a acenada falta grave, o empregador será obrigado a pagar ao empregado salários a que teria direito no período da suspensão disciplinar preventiva. Vale dizer: a suspensão disciplinar dá-se por conta e risco do empregador. Na espécie, forçoso convir que a empresa adotou o procedimento pautado pela estrita legalidade. Considerando que o empregado, detentor da garantia de emprego de dirigente sindical, supostamente praticara falta grave, suspendeu-o e ajuizou inquérito judicial para apuração da alegada falta grave, no prazo estabelecido em lei, como lhe faculta o artigo 494 da CLT (fls. 19/21). Desta sorte, o acolhimento de pedido de reintegração provisória no emprego, a toda evidência, revestiu-se de ilegalidade, pois vulnerou o direito do empregador previsto no artigo 494 da CLT de suspender preventivamente o empregado estável no curso de inquérito judicial para apuração de falta grave. Entendo, assim, que o ato judicial ora impugnado padecia de ilegalidade porquanto exorbitou do poder geral de antecipar a tutela de mérito ante a expressa limitação legal de que a suspensão opera-se “até decisão final do processo”. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 344 JURISPRUDÊNCIA Nesse sentido, inclusive, vem-se pautando a jurisprudência desta Col. Corte, de que são exemplos os seguintes precedentes: ROMS-374/86, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 14.04.89; RXOFMS-89.876/93, Rel. Min. Francisco Fausto, DJ de 01.09.95; RXOF-89.772/93, Rel. Min. Armando de Brito, DJ de 01.07.94; RXOF-38.240/91, Rel. Min. Ermes Pedro Pedrassani, DJ de 30.10.92; ROMS-38.121/91, Rel. Min. Ermes Pedro Pedrassani, DJ de 04.09.92; ROAG-6.147/90, Rel. Min. José Ajuricaba da Costa e Silva, DJ de 24.05.91; ROMS-571/87, Rel. Min. Guimarães Falcão, DJ de 12.09.90, entre outros. Em conclusão, houve-se com o costumeiro acerto o egrégio Tribunal “a quo”. Ante o exposto, nego provimento ao recurso ordinário. Isto posto, Acordam os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário. Brasília, 15 de fevereiro de 2000. Ursulino Santos Filho, Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho no exercício da Presidência. João Oreste Dalazen, relator. MASSA FALIDA. MULTA DO ARTIGO 477 DA CLT. INAPLICABILIDADE Se o crédito trabalhista deve ser apurado pela Justiça do Trabalho, mas satisfeito no Juízo universal da falência, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal, revela-se juridicamente razoável a conclusão de que a massa falida deva ser isenta do ônus de pagar a multa pelo atraso na quitação das parcelas rescisórias, afastando-a da incidência do artigo 477 da CLT. Recurso de revista conhecido e provido. PROCESSO N° TST-RR-647.851/00 - (Ac. 5a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR647.851/00, em que é recorrente massa falida de Tropical Alimentos Ltda. e são recorridos Adriana Martins Santana e outros. Irresignando-se com o venerando acórdão proferido pelo colendo 15° Regional (fls. 180/181), interpõe recurso de revista a reclamada (fls. 184/186). Apreciando o recurso ordinário por ela interposto, o colendo Tribunal de origem manteve a condenação ao pagamento da multa prevista no artigo 477 da CLT. A recorrente postula a reforma do julgado para afastar da condenação a multa prevista no artigo 477 da CLT. Transcreve arestos para evidenciar conflito jurisprudencial. Admitido o recurso mediante o respeitável despacho de fls. 194 e não apresentadas contra-razões. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 345 JURISPRUDÊNCIA Não houve audiência da Procuradoria-Geral do Ministério Público do Trabalho, na forma da Lei Complementar n° 75/93 (art. 83) e RITST (art. 113). É o relatório. VOTO CONHECIMENTO Revista tempestiva (fls. 183/184), firmada por procurador habilitado (fls. 44) e isenta de preparo, conforme o Enunciado n° 86 do TST. MULTA DO ARTIGO 477 DA CLT. MASSA FALIDA O colendo Tribunal de origem manteve a condenação da reclamada ao pagamento da multa prevista no artigo 477 da CLT, sob o fundamento de que “a quitação das verbas decorrentes da rescisão contratual dentro do prazo legal é de responsabilidade do administrador da massa que poderia ter disponibilizados os bens guardados para referido fim já que não está autorizado ao descumprimento da legislação obreira.” (fls. 181) O aresto colacionado (fls. 185/186) registra que a multa prevista no artigo 477 da CLT não se aplica à massa falida, estabelecendo conflito de teses bastante ao conhecimento da matéria. Conheço, por divergência jurisprudencial. MÉRITO MULTA DO ARTIGO 477 DA CLT. MASSA FALIDA Discute-se a aplicação de multa por atraso no pagamento das verbas rescisórias, imposta à reclamada pelo Tribunal de origem, com fundamento no art. 477, § 8°, da CLT. Consoante o posicionamento predominante na jurisprudência em formação e considerada a particularidade da hipótese em análise, o empregador não incorre em mora dolosamente, nem pretende postergar o pagamento das parcelas rescisórias para beneficiar-se de alguma forma. Ao contrário, deixa de satisfazer a obrigação, porque nem mesmo para manter em atividade o próprio negócio dispunha de recursos. Peço vênia para transcrever, a título de exemplificação, os seguintes julgados: “MASSA FALIDA-DOBRA SALARIAL (ARTIGO QUATROCENTOS E SESSENTA E SETE DA CLT)-MULTA DO ARTIGO QUATROCENTOS E SETENTA E SETE DA CLT. A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR, REITERADAMENTE, TEM-SE POSICIONADO NO SENTIDO DE QUE O ESTADO FALIMENTAR EXCLUI A INCIDÊNCIA DA DOBRA SALARIAL PREVISTA NO ARTIGO QUATROCENTOS E SESSENTA E SETE DA CLT E Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 346 JURISPRUDÊNCIA DA MULTA DO ARTIGO QUATROCENTOS E SETENTA E SETE DA CLT. ISTO PORQUE A MASSA FALIDA ESTÁ IMPEDIDA DE SATISFAZER CRÉDITOS FORA DO JUÍZO UNIVERSAL DA FALÊNCIA, NOS TERMOS DO DECRETO-LEI SETE MIL SEISCENTOS E SESSENTA E UM DE QUARENTA E CINCO - LEI DE FALÊNCIA. REVISTA PROVIDA. (Proc. TST-RR467.520, 2ª Turma, DJ 18.12.1998, Redatora Designada Ministra Regina Ezequiel). MASSA FALIDA. MULTA DO ARTIGO 477 DA CLT. INAPLICABILI- DADE. Se o crédito trabalhista deve ser apurado pela Justiça do Trabalho, mas satisfeito no juízo universal da falência, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal, revela-se juridicamente razoável a conclusão de que a massa falida deva ser isenta do ônus de pagar a multa pelo atraso na quitação das parcelas rescisórias, afastando-a da incidência do art. 477 da CLT. Ao síndico não é dado, salvo em caso excepcional expressamente autorizado pelo juízo falimentar, efetuar pagamentos, porque não tem disponibilidade de bens e recursos para atender aos créditos, ainda que de natureza trabalhista. Acrescente-se que, se a própria Lei de Falências (art. 23, III, do Decreto-lei 7.661/45) afasta a possibilidade de a massa ser compelida a efetuar pagamento de valores cobrados a titulo de penas pecuniárias por infração das leis penais e administrativas, parece mais do que razoável concluir-se em igual sentido, no que tange a multa do art. 477 da CLT, que, em última análise, possui a mesma natureza jurídica'. (Proc. TST-RR-304.732/96, 4a Turma, DJ 12.12.97, Rel. Min. Milton de Moura França).” Nesse mesmo sentido cumpre registrar os seguintes precedentes: TST-RR416.909/98, 2a Turma, DJ 09.04.99, Rel. José Alberto Rossi, decisão unânime; TSTRR-434.574/98, 3a Turma, DJ 26.02.99, Rel. José Carlos Perret Schulte, decisão unânime; TST-RR-434.579/98, 5a Turma, DJ 23.10.98, Rel. Nelson Antônio Daiha, decisão unânime. Dou provimento ao recurso, para excluir da condenação o pagamento da multa de que trata o artigo 477 consolidado. Isto posto, Acordam os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, conhecer do recurso de revista por divergência e, no mérito, dar-lhe provimento, para afastar da condenação a multa prevista no artigo 477 da CLT. Brasília, 28 de junho de 2000. Rider Nogueira de Brito, presidente. João Batista Brito Pereira, relator. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 347 JURISPRUDÊNCIA MEDIDA CAUTELAR INCIDENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. LIBERAÇÃO DE FGTS Medida cautelar incidental em mandado de segurança. Alvará judiciai para liberação do FGTS. Legitimidade da Caixa Econômica Federal, na condição de operadora do FGTS, para opor-se ao levantamento. Liminar deferida. Concessão definitiva da cautelar, uma vez presentes os pressupostos do fumus boni iuris e do periculum in mora. Demonstrada de forma inequívoca a legitimidade da Caixa Econômica Federai para ingressar em juízo em defesa do FGTS (art. 20 da Lei n° 8.036/90 e orientação jurisprudencial pacífica do TST), resulta que a decisão que a proclama parte ilegítima e ainda denega a segurança que impetrou, com objetivo de impedir a movimentação do FGTS por servidores públicos municipais, em período expressamente vedado pelo art. 6°, § 1° da Lein” 8.162, de 8 de janeiro de 1991, que passaram do regime da CLT para o estatutário, desafia remédio jurídico extremo, qual seja, a concessão de cautelar incidental para emprestar efeito suspensivo ao seu recurso ordinário. Desconhecer o manifesto fumus boni juris e a inquestionável irreparabilidade de dano decorrente da liberação do FGTS, no contexto fático-legal descrito, atento exclusivamente a uma ortodoxia processual, é negar a próprio razão de ser do Estado-Juiz. No universo das providências jurisdicionais, cabe ao juiz, atento à dinâmica das relações jurídicas e da realidade processual, encontrar a solução que preserve o direito. PROCESSO N° TST-AC-510.719/98 - (Ac. SBD12) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Ação Cautelar n° TST-AC510.719/98, em que é autora Caixa Econômica Federal e réus Sindicato dos Servidores Municipais de Fraiburgo e município de Fraiburgo. Trata-se de ação cautelar inominada, ajuizada por Caixa Econômica Federal CEF, com pedido de sua concessão liminar inaudita altera pars, incidental nos autos de Mandado de Segurança n° 286/98, impetrado perante o TRT da 12a Região, objetivando efeito suspensivo ao recurso ordinário interposto contra a decisão que denegou a segurança, bem como o restabelecimento da liminar concedida no Regional, que suspendeu o cumprimento dos alvarás expedidos para levantamento do FGTS. Deu à causa o valor de R$1.000,00 (mil reais). Foi concedida a cautelar liminarmente (fls. 161/163). Regularmente citado, o réu respondeu a fls. 170/174. Parecer da Procuradoria-Geral do Trabalho, pela procedência da ação cautelar (fls. 182/184). Instadas as partes a informar sobre o processamento do recurso ordinário, que deu ensejo à presente cautelar (fl. 186), a autora esclareceu à fl. 190 que referido recurso teve o seu processamento denegado, por deserto, tendo interposto agravo de Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 jul/set 2000 348 JURISPRUDÊNCIA instrumento, com fulcro no Enunciado n° 161 do TST, tendo em vista que foi condenada na obrigação de fazer e não de pagar. Relatados. VOTO Trata-se de ação cautelar inominada, ajuizada por Caixa Econômica Federal CEF, com pedido de sua concessão liminar inaudita altera pars, incidental nos autos de mandado de Segurança n° 286/98, impetrado perante o TRT da 12° Região, objetivando efeito suspensivo ao recurso ordinário interposto contra a decisão que denegou a segurança, bem como o restabelecimento da liminar concedida no Regional, que suspendeu o cumprimento dos alvarás expedidos para levantamento do FGTS. Alega que houve acordo nos autos de ação trabalhista para liberação do FGTS, através de guias sem a multa legal. Afirma ainda que, ao tomar conhecimento dos alvarás, ingressou com mandado de segurança com pedido de liminar, argüindo não só a incompetência da Justiça do Trabalho para apreciar referido pedido de expedição de alvará, em se tratando de jurisdição voluntária, como também o fato de que não fora citada para integrar a lide, irregularidade que macula todo o processo. Pondera, também que, na qualidade de operadora do FGTS e, portanto, sua responsável, conforme emerge do art. 20 da Lei n° 8.036/90, estava legitimada a intervir no feito tão logo dele tomou conhecimento. Insiste que o sindicato réu carece de legitimidade para pleitear a movimentação do FGTS em nome dos substituídos, trazendo em abono de sua assertiva o Enunciado n° 310 do TST, ressaltando, ademais, que a mudança de regime jurídico de celetista para estatutário não autoriza o saque do FGTS, face proibição até mesmo de lei municipal que preconiza que a extinção do regime jurídico não extingue o vínculo empregatício. Finalmente, registra a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora, o primeiro, assentado no fato de que há expressa proibição legal à liberação do FGTS (art. 6o, § 1o, da Lei n° 8.162 de 8 de janeiro de 91) em caso de conversão de regime jurídico de trabalho, e, quanto ao segundo, argumenta que os depósitos fundiários têm por finalidade gerar recursos para a construção de casas populares, destinadas à população de baixa renda, e para as obras de saneamento básico e infra-estrutura urbana, providências de indiscutíveis benefícios à comunidade, circunstância evidenciadora de seu relevante aspecto social e que não pode ser comprometido por interesses individuais, como na hipótese em exame, de saques não contemplados na Lei n° 8.036/90. Enfatiza ainda mais que a liberação dos depósitos, se deferida, acarretará dano irreparável, ante a impossibilidade de ressarcimento, fundamento maior para justificar a concessão liminar da presente cautelar. Assiste-lhe razão. Como se sabe, o fumus boni iuris, que se identifica pela plausibilidade do direito, ou, no dizer dos doutos, “na aparência do bom direito”, e o periculum in mora, que Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 349 JURISPRUDÊNCIA se consubstancia no fato de se praticar lesão ao direito impossível de reparação, decorrente do atraso na entrega da tutela jurisdicional assecuratória do direito pleiteado, estão plenamente evidenciados nos autos. Revelam os autos que o Sindicato dos Servidores Municipais de Fraiburgo promoveu ação individual plúrima com base nos artigos 840 e seguintes da CLT, contra o Município de Fraiburgo, pleiteando, dentre outros títulos, o fornecimento de guias para o saque de FGTS. Na audiência inaugural, as partes firmaram acordo consistente na liberação do FGTS, sem a multa legal, consignando o respectivo termo que as guias seriam entregues diretamente ao procurador dos reclamantes, sem sua responsabilidade de pagamento, “caso o órgão administrativo não o faça” (fl. 101). Apresentadas as guias para o devido saque, a Caixa Econômica Federal, recusou-se a atender o pedido de liberação dos depósitos fundiários e, ato concomitante, impetrou mandado de segurança com pedido de liminar para sustar o cumprimento do ato judicial. Argumentou ser incompetente a Justiça do Trabalho para conhecer do pedido, declinando a Justiça Federal como competente e, igualmente, argüiu a nulidade do processo, sob o fundamento de ser a hipótese de jurisdição voluntária, que por isso mesmo, exigia sua regular citação e a do Ministério Público. Finalmente, ressaltou a arbitrariedade do ato e a ilegitimidade da entidade sindical para pleitear o alegado direito. A decisão que apreciou o mandado de segurança concluiu pela ilegitimidade da Caixa Econômica Federal para a impetração e denegou a segurança, cassando a liminar que o relator, monocraticamente, concedera para sustar a liberação do FGTS. Afirma a ora requerente que interpôs recurso ordinário a esta Corte, enfatizando a sua condição de gestora do Fundo e, conseqüentemente, a sua legitimidade para impetrar a segurança. Sem adentrar o exame de mérito do venerando acórdão que julgou o mandado de segurança, mas atento à presença dos pressupostos do fumus boni iuris e periculum in mora, creio ser indispensável a concessão, em caráter definitivo, da liminar pleiteada na inicial. Os artigos 3°, 4°, 5° e 8° da Lei n° 8.036, de 11 de maio de 1.990, revelam que o Conselho Curador do FGTS tem competência para dirimir dúvidas quanto à aplicação das normas relativas ao FGTS, e, igualmente, registram que a gestão da aplicação do FGTS será efetuada pelo Ministério da Ação Social, com a Caixa Econômica Federal, na condição de seu Agente Operador. Dentro da competência que lhe foi dada, o Conselho Curador editou a Resolução n° 52 (DOU 22.11.91, Seção I, pág. 26491) definindo, dentre outras questões, a competência da Caixa Econômica Federal para defender judicial e extrajudicialmente o FGTS (item III da Resolução). Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 350 Deste breve retrato emerge que a conclusão do Regional, ao afirmar que a requerente não é parte legítima para estar em juízo, em defesa do FGTS, não se compatibiliza com as normas invocadas, razão pela qual há, pelo menos em tese, o bom direito a seu favor. O entendimento que tem prevalecido nesta Corte, inclusive na Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, é no sentido da legitimidade da CEF para opor- se a levantamento de quantia depositada no FGTS, nos casos de mudança do regime jurídico único de servidor público. Precedentes: ROAG 316.128/96, Rel. Min. Antônio Maria Thaumaturgo Cortizo, Decisão 22.2.99, DJ 23.4.99; ROMS 110.059/94, Rel. Min. Francisco Fausto, Decisão 4.4.95, DJ 5.5.95; AI 70668/93, Rel Min. José Luiz Vasconcellos, Decisão 14.4.94, DJ 2.9.94; ROMS 46334/92, Rel. Min. Ermes Pedro Pedrassani, Decisão 2.2.93, DJ 26.2.93; ROMS 46369/92, Rel. Min. Ermes Pedro Pedrassani, Decisão 16.12.92, DJ 19.2.93; ROMS 46370/92, Rel. Min. Ermes Pedro Pedrassani, Decisão 1.12.92, DJ 19.2.93; ROAG 312182/96, Rel. Min.. Antônio Maria Thaumaturgo Cortizo, Decisão 3.5.99, DJ 11.6.99. De outra parte, considerando que os depósitos do FGTS estão na iminência de ser liberados, por força de alvará judicial já expedido, tenho como presente a inevitável possibilidade, se não concedida a liminar, de dano irreparável à requerente. Com efeito, é sabido que há expressa proibição legal de movimentação dos depósitos fundiários em razão de conversão do regime jurídico de trabalho, sem se falar que os depósitos, enquanto em poder do órgão gestor, destinam-se a investimentos de cunho social e, portanto, são insuscetíveis de subtração da esfera jurídica de seu titular, sob pena de comprometimento de sua destinação legal. Exatamente por vislumbrar a relevância dos fundamentos deduzidos pela Caixa Econômica Federal, nos autos do mandado de segurança, o relator, e a própria Seção Especializada em Dissídios Individuais do TRT da 12ª Região, houve por bem em conceder a liminar (conf. fls. 148/155), liminar esta posteriormente cassada pelo acórdão que declarou a ilegitimidade ativa da impetrante. Não restando outra via processual à requerente, e considerando a possibilidade efetiva de dano irreparável, se concedida a liberação imediata do FGTS, dada a notória dificuldade que terá para reembolsar-se junto aos empregados, foi deferida a liminar, que nesta oportunidade transmuda-se em definitiva, para sustar a ordem judicial de levantamento do FGTS, até o trânsito em julgado do mandado de segurança ou até o julgamento do agravo de instrumento interposto contra o r. despacho que não admitiu o processamento do recurso ordinário respectivo, caso lhe seja negado provimento, consoante fundamentação supra. Custas pelo réu, calculadas sobre o valor dado à causa, de R$1.000,00 (mil reais), no importe de R$20,00 (vinte reais). Isto posto, Acordam os Ministros da Subseção II de Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por maioria, vencidos os Excelentíssimos Senhores Ministros José Luciano de Castilho Pereira, Ronaldo José Lopes Leal, João Oreste Dalazen e Thaumaturgo Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 JURISPRUDÊNCIA Cortizo, julgar procedente a ação cautelar, confirmando a liminar de folhas 161-3, que determinou a suspensão da execução que se processa nos autos da Reclamação Trabalhista de n° RT-783/97, em curso perante a MMa Junta de Conciliação e Julgamento de Videira (SC), até o trânsito em julgado da decisão proferida no Mandado de Segurança n° 286/98. Custas pelos réus, calculadas sobre o valor atribuído à causa de R$ 1.000,00, no importe de R$20,00, dispensado o recolhimento. Brasília, 31 de agosto de 1999. Ursulino Santos Filho, Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho. Milton de Moura França, relator. PENHORA. EMPRESA PÚBLICA ESTADUAL Não há, no caso, demonstração plausível de que os bens são impenhoráveis, nem há prova pré-constituída de que a penhora em dinheiro inviabilizaria o funcionamento da Impetrante. Recurso a que se nega provimento. PROCESSO N°TST-ROAG-413.607/97-(Ac. SBDI 2) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário em Agravo Regimental n° TST-ROAG-413.607/97, em que é recorrente Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Ceará - Emater (CE) e recorrida União Federal. RELATÓRIO A Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Ceará - Emater (CE) impetrou mandado de segurança, com pedido de liminar, contra ato do Juiz do Trabalho da 3a JCJ de Fortaleza (CE), que, executando sentença de conhecimento, determinara o bloqueio e seqüestro das contas da impetrante, onde tem depositado seus numerários para fazer face aos seus compromissos de ordem financeira no exercício e cumprimento do seu serviço público peculiar. Sustentou ser ilegal e abusiva a ordem por se tratar de empresa pública estadual, sem fins lucrativos, sendo impenhoráveis os seus bens, art. 173, § 2°, da Carta Magna. A inicial do mandado foi indeferida, liminarmente, porque incabível, fl. 38. A impetrante interpôs agravo regimental, pelas razões de fls. 46/49, o qual foi desprovido (fls. 59/60). Daí o recurso ordinário da impetrante, procurando o processamento de seu mandado, fls. 62/69. Recebido à fl. 110, o apelo foi contra-arrazoado às fls. 125/128, opinando, a douta Procuradoria-Geral, pelo seu conhecimento e desprovimento (fls. 132/133). VOTO Recurso próprio, tempestivo e subscrito por advogado habilitado nos autos. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 352 JURISPRUDÊNCIA Não há como ser modificada a decisão regional. A impetrante não demonstrou que os seus bens eram impenhoráveis, tendo invocado o art. 173 da Constituição Federal, que não se refere à impenhorabilidade de bens, mas sim à impossibilidade de as empresas públicas e as sociedades de economia mista gozarem de privilégios fiscais não extensivos aos do setor privado. Por outro lado, não há prova pré-constituída de que a penhora em dinheiro inviabilizaria o funcionamento da impetrante. A vista do exposto, nego provimento ao recurso. Isto posto, Acordam os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário. Brasília, 15 de agosto de 2000. Ursulino Santos Filho, Vice-Presidente, no exercício da Presidência. José Luciano de Castilho Pereira, relator. PENHORABILIDADE DE BEM VINCULADO A CÉDULA DE CRÉDITO RURAL O art. 186 do Código Tributário Nacional assegura a preferência do crédito decorrente da legislação do trabalho sobre qualquer outro, inclusive sobre o crédito tributário. Nesse sentido, é válida a penhora efetivada em sede de execução trabalhista sobre bem vinculado a cédula de crédito rural, pois o crédito trabalhista, por sua natureza salarial, não poderia ser preterido em relação ao interesse da entidade bancária financiadora da atividade rural. É de se notar que, diferentemente da cédula de crédito industrial garantida por alienação fiduciária, na cédula rural pignoratícia ou hipotecária o bem permanece no domínio do devedor, ora executado, não constituindo óbice à penhora na esfera trabalhista. Inteligência dos artigos 69 do Decreto-Lei n° 167/67, 889 da CLT, 10 e 30 da Lei n° 6.830/80. Recurso de embargos não conhecido. PROCESSO N° TST-E-RR-446.3 73/98 - (Ac. SBDI 1) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Recurso de Revista n° TST-E-RR-446.373/98, em que é embargante Banco do Brasil S.A. e embargados Josinaldo Urbano dos Santos e Companhia Agroindustrial Nossa Senhora do Carmo. A egrégia Quarta Turma, às fls. 111/113, não conheceu do recurso de revista do reclamado, que tratava da impenhorabilidade de bem vinculado a cédula de crédito rural. Entendeu que o egrégio Regional, ao concluir que o art. 186 do Código Tributário Nacional ampara a penhora em questão, não violou o art. 5°, inciso XXXVI, da Carta Magna. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 353 JURISPRUDÊNCIA Inconformado, o Banco do Brasil interpõe recurso de embargos, às fls. 115/121, sustentando que o respeitável decisum embargado violou os arts. 896 da CLT e 5o, incisos XXXV, LIV e LV, da Constituição Federal. Para tanto, aduz que restou demonstrado no seu recurso de revista a afronta ao art. 5o, inciso XXXVI, da Carta Magna, sustentando a impossibilidade de penhora de bem vinculado a hipoteca cedular, vedada, inclusive, pelo art. 69 do Decreto-Lei n° 167/67. Salienta, ainda, que a manutenção do posicionamento adotado pelo egrégio Regional e confirmado pela colenda Quarta Turma implica afronta ao art. 5o, incisos II, XXXV, XXXVI, LIV e LV, da Carta Magna. Admitido através do respeitável despacho de fls. 126/127, o recurso não recebeu impugnação. Os autos não foram enviados à douta Procuradoria-Geral do Trabalho. É o relatório. VOTO VIOLAÇÃO DO ART. 896 DA CLT. PENHORABILIDADE DE BEM VINCULADO A CÉDULA DE CRÉDITO RURAL Conhecimento Discute-se no presente feito sobre a penhorabilidade ou não de bem vinculado a cédula de crédito rural pignoratícia e hipotecária. O egrégio Regional, analisando o agravo de petição interposto pelo terceiro interessado, Banco do Brasil, entendeu regular a penhora em questão, tomando por fundamento a Lei de Executivo Fiscal, Lei n° 6.830/80, aplicável por força do art. 889 da CLT, e o artigo 186 do Código Tributário Nacional, que estabelece o absoluto privilégio do crédito trabalhista. A colenda Quarta Turma não conheceu do recurso de revista interposto pelo Banco do Brasil, por entender que a respeitável decisão regional, ao julgar subsistente a penhora com fulcro no art. 186 do Código Tributário Nacional, não vulnerou a literalidade do art. 5o, inciso XXXVI, da Constituição Federal. Inconformado, o Banco do Brasil ingressa com os presentes embargos, sustentando que a respeitável decisão turmária violou os artigos 896 da CLT e 5o, incisos XXXV, LIV e LV, da Constituição Federal, pois restou demonstrada no seu recurso de revista a violação aos princípios do ato jurídico perfeito e do direito adquirido de que trata o artigo 5o, inciso XXXVI, da Carta Magna. Argumenta o embargante a impossibilidade de penhora de bem vinculado a hipoteca cedular, vedada pelo Decreto-Lei n° 167/67. Aduz, ainda, que o posicionamento adotado viola o artigo 5o, incisos II, XXXV, XXXVI, LIV e LV, da Magna Carta. Razão não assiste ao ora embargante. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 354 JURISPRUDÊNCIA O Banco do Brasil ajuizou embargos de terceiro com a finalidade de desconstituir a penhora de bem vinculado a cédula de crédito rural, invocando o art. 69 do Decreto-Lei n° 167, de 14.02.67. Seus argumentos são no sentido de que a operação de crédito efetuada com base no referido diploma legal encontra amparo no direito adquirido e no ato jurídico perfeito, e que a decisão em contrário acabou por violar o art. 5°, inciso XXXVI, da Carta Magna. Não obstante o art. 69 do Decreto-Lei n° 167/67 estabelecer a impenhorabilidade do bem gravado por cédula de crédito rural, o entendimento regional não induz à violação do ato jurídico perfeito e do direito adquirido. Com efeito, dispõe o mencionado dispositivo legal, verbis: “Os bens objeto de penhor ou de hipoteca constituídos pela cédula de crédito rural não serão penhorados, arrestados ou seqüestrados por outras dívidas do emitente ou do terceiro empenhador ou hipotecante, cumprindo ao emitente ou ao terceiro empenhador ou hipotecante denunciar a existência da cédula às autoridades incumbidas da diligência ou a quem a determinou, sob pena de responderem pelos prejuízos resultantes de sua omissão.” O magistrado, ao interpretar a lei, não leva em conta apenas a literalidade do preceito. Ao contrário, deve o julgador lançar mão de todos os meios de interpretação postos ao seu alcance, buscando sempre a finalidade da norma e o bem comum. Nesse sentido é que cabe perquirir a validade ou não da penhora de bem gravado por cédula de crédito rural pignoratícia e hipotecária, considerando não só os estritos termos do art. 69 do Decreto-Lei n° 167, de 14.02.67, mas a condição privilegiada do crédito trabalhista e o contexto legal em que este se insere. Primeiramente, é de se notar que a execução no processo do trabalho atende às disposições constantes do Capítulo V do Título X da Consolidação das Leis do Trabalho. O art. 889 da CLT dispõe, ainda, que “aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal”. Analisando a Lei n° 6.830/80, que trata exatamente da cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública, e, portanto, aplicável à questão por força do mencionado art. 889 da CLT, encontramos o seu art. 10, que preceitua o seguinte: “Não ocorrendo o pagamento, nem a garantia da execução de que trata o artigo 9°, a penhora poderá recair em qualquer bem do executado, exceto os que a lei declare absolutamente impenhoráveis. ” Nesse mesmo sentido estabelece o art. 30 da Lei n° 6.830/80 que: “Sem prejuízo dos privilégios especiais sobre determinados bens, que sejam previstos em lei, responde pelo pagamento da Dívida Ativa da Fazenda Pública a totalidade dos bens e das rendas, de qualquer origem ou natureza, do sujeito passivo, seu espólio ou sua massa, inclusive os gravados por ônus real ou cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, seja qual for a data da Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 355 JURISPRUDÊNCIA constituição do ônus ou da cláusula, excetuados unicamente os bens e rendas que a lei declara absolutamente impenhoráveis. ” Verifica-se, pois, que na execução dos créditos trabalhistas são aplicáveis, subsidiariamente, as normas pertinentes à Lei de Executivo Fiscal, dentre as quais as acima transcritas e que asseguram a penhora sobre quaisquer bens do executado, exceto aqueles que a lei declare a absoluta impenhorabilidade. Resta estabelecer, então, se a hipótese em apreço envolve bens absolutamente impenhoráveis. O Código de Processo Civil arrola em seu art. 649 os bens absolutamente impenhoráveis, sobre os quais nem mesmo o crédito trabalhista pode se sobrepor. Da leitura dos dispositivos retromencionados não se depreende que o bem gravado por cédula de crédito rural seja absolutamente impenhorável, quer pela análise do art. 69 do Decreto-Lei n° 167, de 14.02.67, que assim não estabelece, quer por não estar previsto dentre as hipóteses de absoluta impenhorabilidade de que trata o art. 649 do Código de Processo Civil. O crédito trabalhista é privilegiado em face da sua própria natureza alimentar, e, como tal, não poderia ser preterido em relação à impenhorabilidade do bem dado em garantia por cédula de crédito rural, que se destina a resguardar o interesse particular das instituições financeiras que financiam a atividade agrícola. Esse privilégio do crédito trabalhista encontra-se assegurado, expressamente, pelo art. 186 do Código Tributário Nacional, ao dispor que: “O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for a natureza ou o tempo da constituição deste, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho.” Dessa forma, não se tratando de bem absolutamente impenhorável, nos termos da legislação acima citada, o bem vinculado a cédula de crédito rural é perfeitamente penhorável no processo de execução trabalhista, dada a preferência do crédito trabalhista, por sua natureza alimentar e em face das disposições legais anteriormente citadas. Cumpre ressaltar que o excelso Supremo Tribunal Federal, nos autos dos recursos RE-144.984-5 e RE-144.940-0, publicados no DJ-01.07.96, adotou posicionamento no sentido de que os bens gravados por cédula de crédito industrial através de alienação fiduciária não podem ser alcançados por execução trabalhista. No entanto, o caso dos autos difere totalmente daquele analisado pela Suprema Corte. O fundamento central do excelso Supremo Tribunal Federal na referida hipótese é o de que a alienação fiduciária em garantia transfere ao credor fiduciário o domínio da coisa alienada, independentemente da tradição efetiva do bem, razão pela qual não pode ser alcançado por execução na qual não se revele como devedor. De fato, o art. 19, incisos I, II e III, do Decreto-Lei n° 413/69 estabelece que a garantia instituída em cédula de crédito industrial pode se dar de três formas, quais sejam penhor, hipoteca ou alienação fiduciária. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 356 JURISPRUDÊNCIA E, como já se disse, no caso específico da alienação fiduciária, o domínio do bem dado em garantia real fica com o adquirente fiduciário, ou seja, integra o patrimônio do banco financiador. O mesmo, no entanto, não ocorre quanto à hipoteca e ao penhor, pois nestes o domínio do bem permanece na pessoa do emitente da garantia real. O ilustre professor Caio Mário da Silva Pereira, ao tratar da alienação fiduciária, não deixa dúvidas quanto ao acima afirmado, ao dispor que: “Ao contrário do que ocorre na situação pignoratícia ou hipotecária, com a alienação fiduciária a coisa já está na propriedade e na posse (indireta embora) do credor. (...) No penhor, como na hipoteca, a coisa é do devedor e do devedor continua sendo, gravada embora do ônus real; na alienação fiduciária a coisa já passa à titularidade do credor, descabendo a proibição de vir ele a ser seu dono.” (In Instituições de Direito Civil, 12a ed., vol. IV, pág.309) Dessa forma, permanecendo o bem no domínio do tomador do empréstimo garantido por cédula de crédito rural pignoratícia e hipotecária, não há que se falar em sua impenhorabilidade na execução trabalhista, em face do privilégio do crédito trabalhista. Cabe transcrever o pensamento do eminente professor Cristovão Piragibe Tostes Malta, que em sua obra A execução no processo trabalhista, pág. 126, posicionou- se, com propriedade, no sentido da prevalência do crédito trabalhista sobre o bem hipotecado, verbis: “A idéia de que a hipoteca acompanha o bem penhorado, assim assegurando ao credor hipotecário garantia maior que a do exeqüente trabalhista é incompatível com o processo do trabalho, pelo menos partindo-se da premissa de que o crédito trabalhista é de maior hierarquia que a de qualquer outro. Os bens hipotecados podem, como já se viu, ser penhorados para satisfação de créditos trabalhistas e, sendo alienados em praça, liberam-se da hipoteca.” Mostra-se, assim, totalmente diverso do presente caso o posicionamento adotado pelo excelso Supremo Tribunal Federal, que somente encampa a hipótese em que cédula de crédito industrial encontra-se garantida por alienação fiduciária, e não quando a cédula, quer a rural, quer a industrial, estiver garantida por penhor ou hipoteca. Por todo o exposto, a revista não merecia conhecimento por ofensa aos princípios da intangibilidade do ato jurídico perfeito e do direito adquirido, inscritos no art. 5o, inciso XXXVI, da Carta Magna, em virtude do privilégio do crédito trabalhista assegurado pelo Código Tributário Nacional e pelas normas supracitadas, restando incólume o art. 896 da CLT. Os demais dispositivos constitucionais invocados pelo embargante, quais sejam os incisos II, XXXV, LIV e LV do art. 5o da Constituição Federal sequer foram enfrentados pela Corte de origem, posto que invocados apenas em sede de recurso de embargos. Assim, a matéria, no particular, carece do indispensável prequestionamento, incidindo o óbice do Enunciado n° 297 do Colendo TST. Não configurada, pois, a hipótese do art. 894 da CLT. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 357 JURISPRUDÊNCIA Não conheço. É o meu voto. Isto posto, Acordam os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não conhecer dos embargos. Brasília, 28 de agosto de 2000. José Luiz Vasconcellos, Vice-Presidente, no exercício da Presidência. Vantuil Abdala, relator. PLANO DE DEMISSÃO INCENTIVADA. ADESÃO A transação, na sua bilateralidade, pressupõe concessões recíprocas e extingue obrigações certas e questionáveis. O ato, por sua força quitadora, não permite questionamentos a respeito de obrigações anteriores à sua celebração. Recurso de revista a que se dá provimento. PROCESSO N° TST-RR-653.383/2000 - (Ac. 5a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR653.383/2000, em que é recorrente Banco do Estado de Santa Catarina S.A. - BESC e recorrida Leunilde Chaefer Rudnicki. O Tribunal Regional do Trabalho da 12a Região rejeitou a preliminar de carência de ação invocada no recurso ordinário do reclamado, por considerar que “a quitação genérica não tem força liberatória das verbas porventura devidas durante o pacto laboral” (fls. 59). Com referência à pré-contratação de horas extras, negou provimento ao recurso ordinário com base no Enunciado n° 199 do TST. Considerou, ainda, que as gratificações contratualmente avençadas devem integrar a base de cálculo das horas extras. O recurso ordinário da reclamante foi provido apenas com relação ao tema dos honorários advocatícios, que foram fixados em 15% (quinze por cento) do valor da causa. O presente recurso de revista, interposto pelo reclamado, foi processado por força do provimento dado ao agravo de instrumento n° TST-AI-602.122/99.2. Nas suas razões recursais (fls. 68/83), o recorrente afirma que a recorrida, ao aderir espontaneamente ao Programa de Incentivo à Demissão Voluntária, efetuou transação extrajudicial, dando ao recorrente quitação do extinto contrato de trabalho, “quitação esta devidamente homologada pela Delegacia Regional do Trabalho, sem qualquer ressalva quanto à regularidade da dissolução do contrato” (fls. 70). Indica, com referência à pré-contratação das horas extras, violação dos arts. 11 da CLT e 7°, XXIX, a, da Constituição Federal e contrariedade aos Enunciados n°s 294 e 308 desta Corte. Insurge-se também contra a conclusão adotada na decisão regional sobre a base de cálculo das horas extras e, quanto aos honorários advocatícios, indica afronta ao art. 14 da Lei n° 5.584/70. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 358 JURISPRUDÊNCIA Processo não submetido a parecer do Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 113 do Regimento Interno deste Tribunal. É o relatório. VOTO CONHECIMENTO PLANO DE DEMISSÃO INCENTIVADA. TRANSAÇÃO O Tribunal Regional, ao rejeitar a preliminar de carência de ação argüida pelo reclamado, consignou o seguinte: “Em que pese o posicionamento do recorrente, entendo que a adesão ao Plano de Demissão Incentivada não implica a quitação do contrato de trabalho pelo simples fato de a autora perceber, por ocasião da rescisão, valores bem superiores ao de uma rescisão normal, porque como o próprio nome indica tem o objetivo de enxugar a máquina estatal e incentivar os empregados a aderi-lo. Além do que, a quitação do contrato de trabalho, dada através do requerimento de fls. 386, é genérica, não especifica quais os títulos a que se está dando quitação e qual o valor pertinente a cada um. Dado que as normas de Direito do Trabalho são imperativas e irrenunciáveis, não se pode presumir que a autora tenha quitado todo o contrato de trabalho, com a inserção de uma simples frase, que condiciona a adesão ao Plano de Demissão Voluntária. A especificação da parcela e do seu valor no termo de rescisão contratual é que valida a sua quitação”, (fls. 58/59) Sustenta o recorrente que a recorrida, ao aderir espontaneamente ao Programa de Incentivo à Demissão Voluntária, efetuou transação extrajudicial, dando ao empregador quitação do extinto contrato de trabalho, quitação essa devidamente homologada pelo sindicato de classe, sem ressalvas e sem menção ao não cumprimento das demais normas ajustadas, o que teria tornado a transação perfeita e acabada. Transcreve arestos para confronto. Com efeito, no julgado transcrito a fls. 72 está revelado o dissenso jurisprudencial viabilizador do prosseguimento do recurso de revista, pois dele consta a tese de ser incabível a pretensão do autor de receber as parcelas das quais abriu mão quando de sua adesão ao Plano de Demissão Voluntária do reclamado. Conheço do recurso, por divergência jurisprudencial. MÉRITO PLANO DE DEMISSÃO INCENTIVADA. TRANSAÇÃO O Plano de Demissão Incentivada Conforme restou consignado na decisão recorrida, a transação decorrente da adesão ao Plano de Demissão Voluntária deu ao Banco a certeza de cumprimento de todas as obrigações relacionadas com o contrato de trabalho. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 359 JURISPRUDÊNCIA O professor Arnaldo Süssekind, no tocante ao tema em discussão, leciona: “Mas a transação (...) corresponde a ato bilateral, mediante concessões recíprocas, extingue obrigações questionáveis (res dúbia). Não se confunde, pois, com mera quitação de verbas induvidosamente exigíveis ao ensejo da terminação do contrato de trabalho” (In: Instituições de Direito do Trabalho, 15 ed. atual. São Paulo, Editora Ltr, 1995, p. 219-220). Depreende-se desse ensinamento que a ocorrência de transação entre as partes extingue a obrigação com relação a títulos antes exigíveis, bem como daqueles passíveis de questionamento, em virtude de concessões recíprocas. A intenção do recorrente, ao implantar o Plano de Demissão Voluntária, foi de beneficiar aqueles que a ele aderissem com o pagamento de valor superior ao que seria realmente devido no caso de rescisão de contrato sem justa causa. Celebrada transação dessa ordem, que pressupõe recíprocas concessões, não cabe cogitar de créditos ou de débitos remanescentes. Desse modo, a existência de transação válida efetuada entre as partes tem como conseqüência a quitação de todas as parcelas trabalhistas, inclusive aquelas constantes da sentença de origem. Assim já decidiu a Terceira Turma desta Corte, em acórdão da lavra do eminente Ministro Manoel Mendes: “Transação. Efeitos. Compensação. A transação levada a efeito de forma regular deve ser respeitada em sua integralidade, não sendo possível pinçar apenas parte da avença, em benefício de um dos estipulantes, sob pena de quebra do equilíbrio das concessões havidas. Compensação deferida em respeito ao ajuste” (Proc. n° TST-RR-214.636/95, Rel. Min. Manoel Mendes de Freitas, 3a Turma, DJ 03.04.98). Diante do exposto, dou provimento ao recurso de revista, para julgar improcedente a ação, uma vez que a adesão ao Plano de Demissão Voluntária tem como efeito a quitação das obrigações trabalhistas. Resta prejudicado o exame do recurso quanto à análise dos demais temas. Isto posto, Acordam os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, à unanimidade, conhecer do recurso apenas quanto ao tema relativo ao “Plano de Demissão Incentivada - Transação” por divergência jurisprudencial e, no mérito, dar-lhe provimento para julgar improcedente a ação, com inversão do ônus da sucumbência, ficando prejudicado o exame do recurso quanto à análise dos demais temas. Brasília, 02 de agosto de 2000. Rider Nogueira de Brito, ministro presidente. Gelson de Azevedo, relator. PRECLUSÃO. COISA JULGADA Liquidação de sentença. Art. 879, § 2°, da CLT. Preclusão. Coisa julgada. Executado que, intimado sob pena de preclusão, abstém-se de impugnar o cálculo de liquidação apresentado pelo Reclamante. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 360 JURISPRUDÊNCIA A preclusão de que cuida o art. 879, § 2°, da CLT dirige-se à parte e pressupõe cálculo confiável, ou do contador do juízo, ou de um perito contábil nomeado ad hoc pelo juízo. O silêncio do executado não inibe a iniciativa do juiz que preside a execução de, retificando inexatidões manifestas do cálculo anteriormente homologado sem emissão de juízo de valor, afeiçoá-lo ao comando emergente da sentença condenatória e, assim, à coisa julgada material advinda do processo de cognição. Intolerável e absurdo conceber-se o Juiz como um espectador frio e distante que, em nome da pseudo coisa julgada oriunda da inércia do devedor, assiste impassível ao processo alcançar seu momento crucial e culminante: o da quantificação do débito. Constatado patente descompasso entre a condenação e a liquidação homologada, em afronta à coisa julgada material, viabiliza-se o conhecimento e provimento do recurso de revista, por infringência ao art. 5°, inc. XXXVI, da Constituição Federal. PROCESSO N° TST-RR-590.898/99 - (Ac. 1ª Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR590.898/99, em que é recorrente Hering Têxtil S/A e recorrido Carlos Eduardo Villa do Nascimento. Irresignada com o venerando acórdão proferido pelo egrégio Primeiro Regional (fls. 540/541), a reclamada interpôs recurso de revista (fls. 572/585). O egrégio Tribunal a quo, ao julgar o agravo de petição interposto pelo reclamante, assim se posicionou: acolheu a preliminar de nulidade da respeitável decisão de fls. 439/445, por ofensa à coisa julgada, restabelecendo a respeitável sentença de liquidação de fl. 415. Insiste agora a recorrente no acolhimento do recurso de revista quanto ao seguinte tema: coisa julgada — violação ao artigo 5°, inciso XXXVI, da Constituição da República. O recurso restou processado em virtude de provimento ao agravo de instrumento, em apenso. Não houve audiência da Procuradoria-Geral do Trabalho, na forma da Lei Complementar n° 75/93 (artigo 83) e do RITST (artigo 113). É o relatório. CONHECIMENTO PRELIMINAR DE DESERÇÃO SUCITADA PELO RECLAMANTE EM CONTRA-RAZÕES O reclamante pugna pelo não-conhecimento do recurso de revista interposto pela reclamada, sustentando-lhe a deserção visto que a recorrente não teria procedido ao pagamento das custas processuais. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 361 JURISPRUDÊNCIA Não assiste razão ao reclamante. A cobrança de custas autorizada pelo § 4° do artigo 789 da CLT concerne apenas ao processo de conhecimento. As custas são fixadas em sentença no processo de cognição; inexigível recolhimento de custas pela parte em recurso interposto de decisão proferida em execução trabalhista, por falta de amparo legal, na medida em que declarada a inconstitucionalidade do § 2° do art. 789 da CLT. Rejeito a preliminar. Satisfeitos os pressupostos comuns de admissibilidade, examino os específicos do recurso de revista. NULIDADE DA SENTENÇA DE FLS. 439/445. OFENSA À COISA JULGADA, AO DEVIDO PROCESSO LEGAL E À AMPLA DEFESA Como visto, cuida-se de recurso de revista interposto contra decisão proferida em agravo de petição e, portanto, em processo de execução de sentença trabalhista. Logo, defrontamo-nos com recurso cuja admissibilidade condiciona-se à demonstração inequívoca de vulneração direta à Constituição da República (CLT, art. 896, § 2°). Na espécie, o egrégio Tribunal “a quo” deu provimento ao agravo de petição interposto pelo Reclamante para, acolhendo preliminar de nulidade da respeitável sentença de liquidação de fls. 439/445, por afronta à coisa julgada, restabelecer a respeitável decisão de fl. 415, que originariamente homologara o cálculo de liquidação apresentado pelo ora recorrido. Eis o teor da veneranda decisão ora impugnada: “O agravante quer que seja decretada a nulidade da sentença de fls. 439/445, sob o argumento de que houve violação ao inciso XXXVI do art. 5° da Constituição Federal/88 quando o Juiz a quo, desconsiderando sentença já transitada em julgado e alegando erro material, proferiu nova decisão. O cerne da questão é o seguinte: o agravante apresentou os cálculos de fls. 403/411. Foi aberto prazo preclusivo de 10 (dez) dias para a executada se manifestar (despacho de fls. 400), sendo que esta se manteve silente, conforme certidão de fls. 414/verso. Não havendo qualquer impugnação, foi proferida a seguinte decisão (fls. 415): 'Isto posto, julgo corretas as contas do exeqüente, fixando o crédito do reclamante em R$ 694.013,67, atualizado até nov/94, de acordo com o demonstrativo de fls. 400/411 ’, desta decisão foi a parte notificada em 15.03.95 (fls. 415/verso). Embora já transitada em julgado a sentença, inexplicavelmente a agravada ingressa em 21.05.95, com nova petição (fls. 455/463) requerendo reconsideração da decisão e apresentando cálculos. O Juízo a quo, surpreendentemente, reconsidera, alegando erro material constante nos cálculos e profere nova decisão, (fls. 439/445) daí porque requer o agravante a nulidade da sentença. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 362 JURISPRUDÊNCIA Nestas condições, não resta dúvida de que houve ofensa à coisa julgada, não comportando qualquer modificação a sentença de fls. 415, pois já transitada em julgado. Acolho a preliminar para decretar nula a sentença de fls. 439/445, restabelecendo a sentença de fl. 415 dos autos”, (fls.540/541) Irresigna-se a reclamada contra essa decisão, mediante o presente recurso de revista, alegando vulneração ao art. 5o, incisos LIV, LV e XXXVI, da Constituição da República. De pronto, cumpre rechaçar a acenada violação ao art. 5o, incisos LIV e LV, da Constituição Federal. Argumenta a recorrente que o venerando acórdão perpetrou ofensa ao aludido mandamento constitucional “por supressão de instância”, na medida em que o recorrido “atacou a sentença de liquidação antes de realizada a penhora”, o que constituiria infringente “violação ao devido processo legal e supressão de instância”. Sucede, no entanto, que o venerando acórdão recorrido não feriu a questão senão sob o ângulo da coisa julgada. Logo, ressentindo-se de prequestionamento os temas versados pelos preceitos constitucionais em foco, totalmente inviável o conhecimento do recurso sob esse argumento. Incide, na espécie, a diretriz sufragada pela Súmula n° 297, do Tribunal Superior do Trabalho. Resta perquirir se andou bem a Corte Regional no que enfrentou a coisa julgada. Do quanto expôs o venerando acórdão ora impugnado transparece o seguinte quadro nos autos: a Recorrente, intimada a impugnar os cálculos de liquidação apresentados pelo autor, sob pena de preclusão, absteve-se de fazê-lo, daí resultando a sentença homologatória de fl. 415, fixando o débito em R$ 694.013,67, atualizado até nov/94; seguiu-se a decisão de fls. 439/445 em que, ao fundamento de sanar erros manifestos no cálculo anteriormente homologado e afeiçoá-lo à coisa julgada material, o juízo de primeiro grau, de ofício, restringiu o crédito homologado a R$ 154.626,65 em 30.06.95. Daí adveio agravo de petição do reclamante mediante o qual logrou alcançar declaração de nulidade desta última decisão e o revigoramento da decisão originária homologatória dos cálculos de liquidação. A meu juízo, o venerando acórdão recorrido incidiu em duplo equívoco infringente da coisa julgada. O primeiro equívoco residiu em incensar a decisão originária homologatória dos cálculos de liquidação, emprestando-lhe o atributo de coisa julgada material equivalente à oriunda do processo de cognição, ao ponto de divisar na decisão subseqüente afronta à dita coisa julgada e de anular a aludida decisão. Ora, não há lei que confira à sentença meramente homologatória de cálculo não impugnado pelo adversário o atributo de coisa julgada material. A sanção que o art. 879, § 2o, da CLT contempla para a parte que, intimada, abstém-se de impugnar o valor do cálculo do antagonista sabidamente é a preclusão. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 363 JURISPRUDÊNCIA Entretanto, mesmo a possibilidade em tese de reputar-se operada a preclusão para a recorrente impugnar o cálculo não autorizaria o egrégio Regional a extrair a conclusão a qual abraçou. Em primeiro lugar porque, como sustentei na sessão de julgamento do agravo de instrumento que destrancou o presente recurso, na hipótese vertente somente se poderia cogitar de preclusão se se cuidasse de cálculo do contador do juízo e, por conseguinte, preparado por um serventuário do juízo ou por intermédio de um perito contábil nomeado ad hoc pelo juízo e, assim, confiável. Não, porém, se o órgão jurisdicional defronta-se, como aqui, com a não-impugnação do cálculo unilateral de uma das partes. É bem verdade que a lei não distingue. Mas me parece de uma clareza meridiana e de elementar bom senso que somente se pode cogitar da preclusão aludida no art. 879, § 2°, da CLT, em se tratando de não-impugnação de um cálculo minimamente confiável, sob pena de consentir-se em completo desvirtuamento da sentença de liquidação: ao invés de promover a mera quantificação do débito, teria o condão de criar ou extinguir direitos em absoluto contraste e descompasso com a sentença exeqüenda, unicamente em virtude de um cochilo do executado e da virtual esperteza de um credor malicioso. Em segundo lugar, só para argumentar, ainda que se devesse entender que para a recorrente deu-se a preclusão para discutir o cálculo, obviamente a perda da faculdade de fazê-lo dirige-se unicamente à parte. No sistema do processo trabalhista, todavia, nada obsta a que o Juiz, de ofício, determine o acertamento do cálculo do débito, visto que a lei assegura-lhe a iniciativa da execução e, por conseguinte, da liquidação (CLT, art. 878). De resto, intolerável e absurdo conceber-se o Juiz como um espectador frio e distante que, em nome da pseudo coisa julgada oriunda da inércia do devedor, assiste impassível ao processo alcançar seu momento crucial e culminante: o da quantificação do débito. Não, o Juiz não é e não pode ser um convidado de pedra no processo, comodamente encastelado em torre de marfim: bem ao contrário, presidindo o processo, há de ser um personagem de olhos bem abertos e vigilantes para que nenhum dos litigantes se sirva do processo para dele obter enriquecimento sem causa, tampouco para deixar prevalecer um tecnicismo estéril no processo, em detrimento da verdadeira coisa julgada material. O segundo equívoco em que incorreu o venerando acórdão recorrido, data venia, residiu em anular a decisão que buscou dar prevalência à verdadeira coisa julgada material, oriunda do processo de conhecimento. Manifesto que ao fazê-lo, restaurando e endossando a primitiva decisão homologatória do cálculo, o venerando acórdão infringiu a coisa julgada, a pretexto de garantir a autoridade de uma nova e pretensa coisa julgada, emanada da execução, e que prevaleceria sobre a advinda do processo de conhecimento. É noção comezinha de processo que a sentença exeqüenda deve ser liquidada e executada fielmente, isto é, tal qual nela se contém, sem ampliação ou restrição (CLT, art. 878, § 1°; CPC, art. 610). Isto se impõe precisamente em homenagem, respeito e obséquio à coisa julgada material operada pela decisão que equaciona a lide no processo de conhecimento, elevada à dignidade constitucional. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 364 JURISPRUDÊNCIA Na espécie, o venerando acórdão recorrido, ao endossar a decisão originária homologatória dos cálculos de liquidação apresentados pelo Reclamante, divorciou-se por completo da sentença condenatória exeqüenda transitada em julgado. Bem o demonstra a judiciosa, detalhada e criteriosa decisão de fls. 439/445, da ilustre lavra do Dr. Cláudio Mascarenhas Brandão, cujo zelo, prudência e preparo intelectual faço questão de ressaltar aqui. A douta decisão em tela, secundada por planilha de cálculo do próprio juízo, evidencia, parcela por parcela, o patente descompasso entre a condenação e a liquidação homologada, ao ponto de esta apontar um crédito que atingia quase R$ 700.000,00 em novembro de 1994, por direitos advindos de 05 anos de contrato de trabalho de um vendedor. A afronta à coisa julgada resulta, por exemplo: a) de cômputo do adicional de produtividade sem observar o período de vigência de cada norma coletiva e de modo cumulativo, em desacordo com o pedido e com a condenação; b) de cômputo de diferenças salariais de planos econômicos (URP de fevereiro/89 e IPC de junho/87) sem limitação à data base, o que contradiz a natureza de adiantamento salarial da parcela acolhida pela sentença exeqüenda. Ante o exposto, conheço do recurso, por violação ao art. 5°, inc. XXXVI, da Constituição Federal. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. MULTA. ARTIGO 538 DO CPC Por fim, sustenta a recorrente que os segundos embargos declaratórios interpostos não visavam à procrastinação do feito, não podendo subsistir, assim, a condenação ao pagamento da multa prevista no artigo 538 parágrafo único do CPC. Observa-se que nos embargos declaratórios de fls. 543/550 discutia-se, em linhas gerais, a possibilidade de o juiz corrigir, de ofício, erros e inexatidões materiais na forma do artigo 463, inciso I, do CPC; buscou-se, ainda, no referido recurso, o prequestionamento de dispositivos legais e constitucionais. Negado provimento a esse recurso, nos embargos subseqüentes de fls. 558/566 a Reclamada, não obstante haja reiterado a existência dos vícios já apontados nos primeiros, acenou com a ausência de pronunciamento a respeito dos dispositivos objeto de prequestionamento. A egrégia Turma Regional, atribuindo aos segundos embargos caráter nitidamente protelatório, aplicou à reclamada a multa prevista no parágrafo único do artigo 538 do CPC. A Recorrente indica infringência ao artigo 5°, inciso LV, da Carta Magna. Data venia, não vislumbro escopo procrastinatório algum da Reclamada, mas unicamente ânimo de prequestionar matérias para impulsionar o recurso de revista. Sucede, todavia, que em se tratando de recurso de revista em execução, somente se viabiliza por ofensa direta à Constituição da República, não o autorizando a ofensa reflexa ou indireta, entendida como tal a que importar, antes de tudo, transgressão à legislação infraconstitucional. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 365 JURISPRUDÊNCIA Este último é precisamente o caso que transparece dos autos, em que a decisão pode ter vulnerado o parágrafo único do artigo 538 do CPC, mas não o mandamento constitucional que assegura ampla defesa e recursos a ela inerentes. Ante o exposto, não conheço do recurso, no particular. MÉRITO DO RECURSO NULIDADE DA SENTENÇA DE FLS. 439/445. OFENSA À COISA JULGADA Conhecido o recurso, por vulneração ao art. 5o, inc. XXXVI, da Constituição Federal, dou-lhe provimento para restabelecer integralmente a sentença de liquidação de fls. 439/445. Isto posto, Acordam os Ministros da Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, rejeitar a preliminar de deserção do recurso, argüida em contra-razões; unanimemente, conhecer do recurso apenas quanto à nulidade da sentença, por violação ao art. 5o, inciso XXXVI, da Constituição Federal, e, no mérito, dar-lhe provimento para restabelecer integralmente a r. sentença de liquidação de fls. 439/445. Brasília, 24 de maio de 2000. Almir Pazzianotto Pinto, Ministro Presidente. João Oreste Dalazen, Ministro Relator. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE AD CAUSAM LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL. CONVENÇÃO COLETIVA Preliminar de ilegitimidade ad causam, Não cabe a esta instância extraordinária o revolvimento de fatos e provas, visto que análise de matéria dessa natureza se esgota nas instâncias ordinárias, conforme determina o Enunciado n° 126 do TST. Não conheço. Empresa em processo de liquidação e extrajudicial. Convenção coletiva de trabalho. Não se exige do banco estatal em liquidação extrajudicial o cumprimento de convenção coletiva de trabalho celebrada após o início do processo de liquidação, tendo em vista a paralisação da atividade econômica do empregador e, portanto, a correspondente da categoria profissional Recurso de revista parcialmente conhecido e provido. PROCESSO N° TST-RR-313.972/96-(Ac. 1a Turma) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 366 JURISPRUDÊNCIA Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR313.972/96, em que é recorrente Bandern - Banco do Estado do Rio Grande do Norte S.A e são recorridos Manoel Silva Pepeu e outros. O TRT da 21a Região deu parcial provimento ao recurso do reclamado para determinar que da condenação aos reajustes salariais sejam deduzidas as antecipações ocorridas no período laborado. Manteve a sentença primeira no pertinente às preliminares de suspensão da ação e de ilegitimidade ad causam e à condenação do banco ao pagamento das parcelas previstas em convenção coletiva. O reclamado interpõe recurso de revista com supedâneo no art. 896 da CLT, pretendendo a reforma do julgado quanto à preliminar de ilegitimidade ad causam e o pagamento de parcelas previstas em convenção coletiva. Fundamenta o apelo em afronta aos arts. 10 e 448 da CLT e em divergência jurisprudencial. Despacho de admissibilidade a fls. 658. Não foram apresentadas as contra-razões, conforme certidão exarada a fls. 659. A Procuradoria-Geral do Trabalho, em Parecer de fls. 665/666, opina pela rejeição da preliminar de ilegitimidade ad causam e, quanto ao pagamento de parcelas previstas em convenção coletiva, pelo provimento do recurso. É o relatório. VOTO CONHECIMENTO PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE AD CAUSAM O TRT da 21a Região, ao analisar a preliminar suscitada, rejeitou-a, sob o argumento de que não há subsídios capazes de reconhecer a absorção da reclamante pelo Estado. Afirmou que a empregada não figura nas relações acostadas às fls. 101/103 referentes aos empregados absorvidos pelo Estado. Inconformado, o Banco do Estado do Rio Grande do Norte, em seu recurso de revista, renova a preliminar de ilegitimidade ad causam, afirmando que o Regional não observou a documentação integrante dos autos. Alega que a absorção da reclamante ficou comprovada no Diário Oficial do Estado, na relação nominal dos empregados que permanecem no Banco após o acordo celebrado e na opção da empregada em ser absorvida pelo Estado do Rio Grande do Norte. Aponta violação dos arts. 10 e 448 da CLT e traz aresto para confronto de teses. Pede pela aplicação do art. 267, VI, do CPC. É impróspera a pretensão do reclamado. Da leitura atenta do acórdão impugnado, observa-se que aquele órgão colegiado não acolheu a preliminar de ilegitimidade ad causam porque não ficou comprovada a absorção da reclamante pelo Estado. Fundamentou o julgado nos documentos trazidos aos autos. Ora, não cabe a esta instância extraordinária o revolvimento de fatos e provas, visto que análise de matéria dessa natureza se esgota nas instâncias ordinárias, conforme determina o Enunciado n° 126 do TST. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 jul/set 2000 367 JURISPRUDÊNCIA Assim sendo, ante o óbice do verbete sumular mencionado, é impossível a análise de violações legais e de divergência jurisprudencial. Não conheço. EMPRESA EM PROCESSO DE LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL. CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO A corte do Regional manteve a condenação ao cumprimento das obrigações estabelecidas em normas coletivas aplicáveis às categorias profissional e econômica a que se vinculam as partes. O acórdão registra o entendimento de que a celebração de convenção coletiva de trabalho pressupõe a negociação da entidade representativa dos empregados com o sindicato da categoria patronal, não se exigindo a participação de cada um dos integrantes da atividade empresarial, pois a finalidade do ente sindical é representar os interesses da categoria (fls. 643/645). O recorrente insurge-se contra a decisão do Regional, alegando que, estando em processo de liquidação extrajudicial desde 1990, não está obrigado ao cumprimento de normas coletivas, de cujas negociações não tenha participado, celebradas após a liquidação. Transcreve arestos para confronto de teses (fls. 652/654). O aresto trazido a colação à fl. 652 demonstra a existência de entendimento divergente a respeito da matéria, pois nele se registra a tese de que não se aplicam à empresa em processo de liquidação extrajudicial os efeitos decorrentes de convenção coletiva de trabalho celebrada após a decretação da liquidação. Conheço do recurso por divergência jurisprudencial. MÉRITO EMPRESA EM PROCESSO DE LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL. CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO Discute-se, in casu, se a empresa em processo de liquidação extrajudicial está obrigada ao cumprimento de convenção coletiva de trabalho celebrada após o início do processo de liquidação extrajudicial pela entidade sindical representativa da categoria econômica a que pertencia. É inconteste que o processo de liquidação extrajudicial do recorrente foi iniciado em 1990. De acordo com a teoria normativista, acolhida pelo direito brasileiro, as convenções coletivas - normas jurídicas que mais se aproximam das leis do que dos contratos - aplicam-se aos empregados e aos empregadores que pertençam ao âmbito da representação profissional ou econômica das entidades sindicais convenentes. O direito positivo sedimentou a mencionada teoria nos seguintes termos do art. 611 da CLT: “Convenção Coletiva de Trabalho é o acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais sindicatos representativos de categorias econômicas e Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 368 JURISPRUDÊNCIA profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais do trabalho.” Em observância à previsão legal, não há entidade patronal considerada representante do recorrente na convenção coletiva celebrada após o início do processo de liquidação extrajudicial. Assim sendo, não se exige do banco estatal em liquidação extrajudicial o cumprimento de convenção coletiva de trabalho celebrada após o início do processo de liquidação, tendo em vista a paralisação da atividade econômica do empregador e, portanto, a correspondente da categoria profissional. Ora, se a convenção coletiva abrange apenas as categorias convenentes e se entidade em liquidação extrajudicial deixa de compor a categoria, tendo em vista a perda da capacidade negocial coletiva, impõe-se a conclusão de que o instrumento normativo não a alcança. Isto posto, Acordam os Ministros da 1a Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, conhecer do recurso de revista apenas quanto à aplicação da convenção coletiva à empresa em processo de liquidação extrajudicial, e, no mérito, dar-lhe provimento para excluir da condenação o pagamento de todas as diferenças salariais decorrentes das convenções coletivas de trabalho celebradas após o início do processo de liquidação extrajudicial. Brasília, 31 de maio de 2000. Almir Pazzianotto Pinto, presidente. Ronaldo José Lopes Leal, relator. PROFESSOR. JORNADA DE TRABALHO EXTRAORDINÁRIA O excesso de jornada de trabalho do professor, cujo limite encontra-se estabelecido no art. 318 da Consolidação das Leis do Trabalho, deve ser remunerado com o adicional previsto no art. 7°, XVI, da Constituição da República. Recurso de revista a que se nega provimento. PROCESSO N° TST-RR-348.113/97 - (Ac. 5a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR348.113/97, em que é recorrente município de Belo Horizonte e recorridos Lúcia Maria Ceolim Mendes e outros. A Quinta Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, mediante o acórdão de fls. 102/106, conheceu da remessa necessária e do recurso ordinário interposto pelo Reclamado, mas negou-lhes provimento, com base no seguinte fundamento: “CATEGORIA PROFISSIONAL DE PROFESSOR. JORNADA EXTRAORDINÁRIA DE TRABALHO. DIREITO AO ADICIONAL RESPECTIVO. A jornada máxima de trabalho do professor, estabelecida no texto consolidado em razão da sujeição da categoria profissional às normas de tutela ali Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 369 JURISPRUDÊNCIA previstas, é de 06 (seis) aulas diárias ou trinta semanais. O trabalho prestado além desses limites tem caráter extraordinário e deve ser remunerado com o acréscimo do adicional fixado no texto constitucional.” Os embargos de declaração opostos contra essa conclusão foram rejeitados, por não se enquadrarem nas hipóteses de cabimento descritas no art. 535 do CPC. Pelas razões de fls. 115/123, o Município interpôs recurso de revista, sustentando que a Corte regional, ao rejeitar seus embargos de declaração, incorreu em negativa de prestação jurisdicional e cerceamento de defesa. Por essa razão, indicou ofensa aos arts. 128, 131, 463, 515 e 535 do CPC e 832 da CLT. Asseverou que o Tribunal de origem, ao conceder o pagamento das aulas excedentes como se fossem horas extras, de 50% (cinqüenta por cento) do valor das aulas normais, infringiu frontalmente o art. 321 da CLT, uma vez que “o referido dispositivo literalmente expressa que os professores serão remunerados por aulas excedentes com importância correspondente ao número respectivo das mesmas” (fls. 119). Trouxe arestos para confronto. Admitido o recurso pela decisão de fls. 127, foram oferecidas contra-razões a fls. 128/134. O Ministério Público do Trabalho, em parecer de fls. 166/167, opina pelo não provimento do recurso. É o relatório. VOTO CONHECIMENTO PRELIMINAR DE NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA E NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL A Corte de origem consignou que a jornada de trabalho máxima da categoria dos professores é de seis horas diárias ou trinta horas semanais, sendo que as excedentes desses limites devem ser remuneradas com o adicional constitucional atribuído ao trabalho extraordinário. Registrou, ainda, que a norma do art. 321 da CLT não restringe o direito à percepção do adicional de trabalho extraordinário, tanto porque se destina a hipóteses em que o aumento do número de aulas não ultrapasse o limite da jornada contratual, como porque não pode aquela norma contrariar o que preceituado constitucionalmente no art. 7°, XVI, da Constituição Federal. Em sede de embargos de declaração, o Tribunal Regional, embora rejeitando- os, afirmou expressamente que houve o devido “enquadramento da norma constitucional do inciso XVI do art. 7° e, especificamente, da limitação da jornada diária prevista nos artigos 318 e seguintes do texto consolidado” (fls. 112). Diante desse registro, não há margem à conclusão no sentido da nulidade do acórdão recorrido por negativa de prestação jurisdicional ou cerceamento de defesa, visto que a Corte de origem emitiu pronunciamento fundamentado à luz da legislação trabalhista e dos direitos sociais assegurados constitucionalmente. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 jul/set 2000 370 JURISPRUDÊNCIA Restam afastadas, portanto, as alegadas vulnerações dos arts. 832 da CLT, 535 do CPC e 5°, LV, da Constituição Federal. Relativamente à indicada afronta aos arts. 128, 131, 463 e 515 do CPC e 8° e 468 da CLT, observa-se que o Tribunal Regional não analisou a controvérsia à luz dos referidos dispositivos legais, pelo que sua argüição realizada apenas nesta oportunidade se revela preclusa. Cumpria à parte a oposição de embargos de declaração com vistas a obter pronunciamento explícito acerca dos mencionados preceitos legais, sem o que se torna inviável o conhecimento da revista, em face da ausência de prequestionamento, a teor do Enunciado n° 297/TST. Não conheço. PROFESSOR. JORNADA DE TRABALHO EXTRAORDINÁRIA. ADICIONAL No que tange ao tema em epígrafe, o Tribunal Regional entendeu que o disposto nos arts. 318 e seguintes da CLT não retira dos professores o direito ao adicional de trabalho extraordinário previsto no art. 7°, XVI, da Constituição Federal em decorrência do excesso de aulas ministradas. O Município indicou afronta ao art. 321 da CLT e trouxe arestos para confronto. O recurso merece conhecimento, visto que no primeiro aresto transcrito a fls. 121 há entendimento divergente daquele da decisão recorrida, pois, contrariamente à conclusão do Tribunal Regional, nele se assevera que o conceito jurídico-legal contido no art. 321 da CLT não se confunde com o da hora extra, “sendo indevida a aplicação do adicional previsto no inciso XVI do art. 7° da Constituição da República na remuneração da aula excedente”. Conheço, por divergência jurisprudencial. MÉRITO PROFESSOR. JORNADA DE TRABALHO EXTRAORDINÁRIO. ADICIONAL Debate-se, in casu, se é devido ou não o pagamento do adicional constitucional de trabalho extraordinário em razão do excesso de aulas ministradas, tendo em vista os limites estabelecidos no art. 318 da CLT para a jornada da categoria profissional dos professores. O art. 318 da CLT diz, textualmente, que “num mesmo estabelecimento de ensino não poderá o professor dar, por dia, mais de 4 (quatro) aulas consecutivas, nem mais de 6 (seis), intercaladas”. A jornada de trabalho do professor está, portanto, limitada a quatro aulas consecutivas ou a seis intercaladas. Caso esse limite seja excedido, o empregador deverá re Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 Jul/set 2000 371 JURISPRUDÊNCIA munerar as horas suplementares com o adicional de 50% (cinqüenta por cento), previsto no art. T, XVI, da Carta Magna. Nesse mesmo sentido, Mozart Victor Russomano, em sua obra Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho, volume I, 17a edição, página 360, Editora Forense, manifestou-se: “Se se verificar que o professor deu número de aulas superior ao normal, por necessidade do serviço do estabelecimento de ensino, será sua remuneração acrescida de tantas vezes o preço da aula quantas aulas excedentes haja dado (art. 321), com o acréscimo do art. 7o, inciso XVI, da Constituição Federal.” Esta Corte já decidiu semelhante situação da mesma maneira: “PROFESSOR. TRABALHO EXTRAORDINÁRIO ALÉM DO LIMITE LEGAL. O escopo do art. 321 da CLT do referido preceito celetista reside em enquadrar na órbita do ‘jus variandi’ do empregador a possibilidade de aumentar o número de aulas contratualmente ajustadas, sem que disso resulte alteração ilícita do contrato de trabalho (art. 468 da CLT). Por isso, não garantida ao professor a contraprestação pelo trabalho oriundo dessa modificação como jornada extraordinária, mas apenas a remuneração normal conforme previsto no art. 320 da CLT, desde que respeitado o limite legal. Na hipótese de descumprimento da jornada máxima estabelecida pelo diploma consolidado, deve o empregador sujeitar-se ao pagamento do adicional pelo trabalho suplementar. Do contrário, far-se-ia letra morta do comando legal, pois a remuneração do trabalho extraordinário de forma superior ao normal visa, exatamente, desestimular a prática reiterada de exigir-se do empregado a prestação de serviços além do limite fixado” (RR-187.732/95, Rel. Min. Armando de Brito, 5a Turma, Acórdão n° 9.257/97, DJ 21.11.97). Cumpre ressaltar que tal entendimento não acarreta violação da determinação contida no art. 321 da CLT, segundo a qual “sempre que o estabelecimento de ensino tiver necessidade de aumentar o número de aulas marcado nos horários, remunerará o professor, findo cada mês, com uma importância correspondente ao número de aulas excedentes”, pois não veda que sobre tais aulas excedentes haja incidência do adicional pelo trabalho realizado em caráter suplementar. Tal interpretação decorre da necessidade de compatibilizar o teor do referido dispositivo da CLT com o preceituado no art. 7o, XVI, da Constituição Federal, em relação ao qual o dispositivo consolidado jamais poderia dispor em sentido contrário, sob pena de se ferir o princípio da isonomia revelado no caput do seu art. 5o. Diante do exposto, nego provimento ao recurso de revista. Isto posto, Acordam os Ministros da Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, à unanimidade, conhecer do recurso de revista, apenas quanto ao tema “professor-jor- Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 372 JURISPRUDÊNCIA nada de trabalho extraordinário - adicional” por divergência jurisprudencial e, no mérito, negar-lhe provimento. Brasília, 03 de maio de 2000. Rider Nogueira de Brito, presidente. Gelson de Azevedo, relator. REINTEGRAÇÃO. DISPENSA IMOTIVADA Sociedade de economia mista. Dispensa imotivada. Reintegração. Impossibilidade. Estabilidade do art. 41 da Constituição Federal de 1988. Inamplicabilidade. O empregado público, ainda que admitido mediante concurso público, de ingresso (artigo 37, II, da CF/88) sob o regime da legislação trabalhista, não se beneficia da estabilidade assegurada no art. 41 da CF, destinada apenas aos servidores públicos civis, submetidos ao regime estatutário, e ocupantes de cargos públicos criados por lei. A expressa referência a "cargo ” e a " nomeação ”, contida no caput do artigo 41 da CF e em seu § 1°, exclui a aplicação do dispositivo para os servidores admitidos ou contratados para o desempenho de emprego ou função pública. O artigo 173, § 1o, da Constituição da República é categórico ao afirmar que a empresa pública e a sociedade de economia mista sujeitam-se ao regime próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas. Da exegese do mencionado preceito constitucional, depreende-se que a reclamada, sociedade de economia mista, deve observar, para a contratação e demissão de seus empregados, o que estabelece a CLT e a legislação complementar, podendo, por essa razão, dispensá-los imotivadamente ou sem justa causa, no regular exercício do direito potestativo. Embargos não providos. PROCESSO N° TST-E-RR-279.741/96 - (Ac. SBDI 1) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos em Recurso de Revista n° TST-E-RR-279.741/96, em que é embargante Onésio Serra Mendonça e embargado Banco de Crédito Real de Minas Gerais S.A. - Credireal. A colenda Terceira Turma desta Corte negou provimento ao recurso de revista interposto pelo reclamante, mantendo o venerando acórdão do Regional, que teve como lícita a sua dispensa imotivada. Para tanto, asseverou inexistir qualquer vedação constitucional ao exercício, pelas sociedades de economia mista, do direito potestativo de despedir imotivadamente seus empregados, ante a regra inserta no artigo 173, § 1°, da Constituição Federal (fls. 185/187). Os embargos de declaração que se seguiram (fls. 189/190) foram rejeitados, pelos fundamentos constantes no v. acórdão de fls. 200/202. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 373 JURISPRUDÊNCIA Inconformado, o reclamante interpõe recurso de embargos (fls. 204/211). Sustenta, em linhas gerais, que o ato administrativo prescinde de motivação para que seja revestido de legalidade, e, por via de conseqüência, a sua dispensa somente poderia ter ocorrido ante a presença de justo motivo, tendo em vista o fato de haver ingressado nos quadros do reclamado mediante concurso público. Por outro lado, argumenta que o reclamante era detentor de estabilidade concedido no regulamento interno do banco reclamado. Reproduz farto entendimento doutrinário em amparo da sua tese. Aponta como violados os arts. 37, caput e inciso II; 39 e 41 da Constituição Federal. Colaciona arestos. Despacho de admissibilidade à fl. 213. Contra-razões a fls. 215/216. Dispensada a remessa dos autos à douta Procuradoria-Geral do Trabalho, ante o contido no artigo 113 do RITST, c/c a Resolução Administrativa n° 322/96 desta Corte. Relatados. VOTO Os embargos são tempestivos (fls. 203 e 204), estão subscritos por advogado habilitado nos autos (fls. 12, 181 e 182). CONHECIMENTO DISPENSA IMOTIVADA A colenda Terceira Turma desta Corte negou provimento ao recurso de revista interposto pelo reclamante, mantendo o venerando acórdão do Regional, que teve como lícita a sua dispensa imotivada. Para tanto, asseverou inexistir qualquer vedação constitucional ao exercício, pelas sociedades de economia mista, do direito potestativo de despedir imotivadamente seus empregados, ante a regra inserta no artigo 173, § 1°, da Constituição Federal (fls. 185/187). Inconformado, o reclamante interpõe recurso de embargos (fls. 204/211). Sustenta, em linhas gerais, que o ato administrativo não prescinde de motivação para que seja revestido de legalidade, e, por via de conseqüência, a sua dispensa somente poderia ter ocorrido ante a presença de justo motivo, tendo em vista o fato de haver ingressado nos quadros do reclamado mediante concurso público. Por outro lado, argumenta que era detentor de estabilidade concedida no regulamento interno do banco reclamado. Reproduz farto entendimento doutrinário em amparo da sua tese. Aponta como violados os arts. 37, caput, e inciso II; 39 e 41 da Constituição Federal. Colaciona arestos. O quarto e o quinto paradigmas de fls. 210/211, oriundos, respectivamente, das egrégias 1ª e 3a Turmas desta Corte, autorizam o conhecimento dos embargos, ao fixar tese no sentido da impossibilidade de se proceder à dispensa imotivada dos emprega Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 374 JURISPRUDÊNCIA dos de empresas públicas e sociedades de economia mista, não obstante o disposto no artigo 173, § 1o, da Carta Magna, sob pena de desvirtuar o objetivo do concurso público, igualmente elevado à dignidade constitucional. Conheço dos embargos, por divergência jurisprudencial. MÉRITO DISPENSA IMOTIVADA Cuida-se, na hipótese, de empregado público que, ainda que admitido aos serviços da reclamada, empresa de economia mista, mediante concurso público de ingresso, nos termos do artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, e sob o regime da legislação trabalhista, não se beneficia da estabilidade assegurada no artigo 41 da Carta Magna apenas aos servidores públicos civis. Realmente, a estabilidade prevista no artigo 41 da Constituição, inserido em seção cujos preceitos referem-se especificamente aos servidores públicos civis da administração direta, das autarquias e das fundações públicas, destina-se tão-somente aos servidores públicos, também denominados funcionários públicos, submetidos ao regime estatutário, e investidos em cargos públicos criados por lei, que lhes confere denominação própria, define suas atribuições e fixa o padrão de vencimento ou remuneração. Efetivamente, dispõe o artigo 41, caput, que “são estáveis, após dois anos de efetivo exercício, os servidores nomeados em virtude de concurso público”. Nos termos do seu parágrafo 1o, “o servidor público estável só perderá o cargo em virtude de sentença judicial transitada em julgado ou mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa”. Segundo a cátedra da renovada administrativista Maria Sylvia Zanella di Pietro, in "Direito Administrativo”, 5o, ed. Atlas: “A referência a cargo e a nomeação exclui a aplicação do dispositivo para os servidores admitidos ou contratados para o desempenho de emprego ou função pública”. Conclui, a festejada autora, que constitui requisito para a estabilidade a efetividade do servidor, ou seja, a sua condição de funcionário nomeado por concurso para ocupar cargo público que só possa ser provido por essa forma. É certo que a Constituição de 1988, no artigo 19 de seu ADCT, atribuiu, em caráter excepcional, a estabilidade a servidores que não preencheram esse requisito, desde que estivessem em exercício na data da sua promulgação, há pelo menos cinco anos continuados. No entanto, tal benefício só alcançou os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, da administração direta, autarquias e fundações públicas, excluindo os empregados das empresas públicas e da sociedade de economia mista. Nesse contexto, tem-se que os empregados públicos, submetidos ao regime da CLT, não se beneficiam da estabilidade prevista no artigo 41 da Constituição Federal de 1988. Nesse sentido são os seguintes precedentes do TST: E-RR-274.517/96, Rel. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 375 JURISPRUDÊNCIA Ministro Moura França, DJ de 08.10.99; E-RR-45.463/92, Rel. Min. Afonso Celso, DJ 9.2.96; E-RR-45.241/92, Rel. Ministro Ursulino Santos, DJ de 3.11.95; ROAR322.980/96, Relator Juiz Convocado Domingos Spina, DJ de 12.11.99. Nesse mesmo sentido, recentemente se pronunciou o excelso Supremo Tribunal Federal, em voto da lavra ilustre do Ministro Moreira Alves, proferido nos autos do processo AG (AgRg) 245.235-PE - 1a Turma, DJ de 12.11.99, decisão unânime. Com efeito, os empregados públicos, ocupantes de empregos públicos, são contratados sob o regime da legislação trabalhista. O artigo 173, § 1°, da Constituição da República é categórico ao afirmar que as empresas públicas e as sociedades de economia mista sujeitam-se ao regime próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias. Esse comando constitucional, por outro lado, não sofreu qualquer alteração com o advento da Emenda Constitucional n° 19/98, pelo menos no que tange a estas duas entidades (CF, art. 173, § 1°, inciso II). Da exegese do mencionado preceito constitucional, depreende-se que a ré, sociedade de economia mista, deve observar, para a contratação e demissão de seus empregados, o que estabelece a CLT e a legislação complementar. E, nesse contexto, inviável falar-se em motivação de seu ato, quando despede seu empregado, dado que lhe é plenamente assegurado o direito potestativo de resilição unilateral do contrato de trabalho. Registre-se, por fim, que os autos não revelam que fosse o reclamante, à época da sua dispensa, detentor de qualquer espécie de estabilidade regulamentar. Sendo assim, o exame da controvérsia por esse prisma resta suplantado pelo óbice da preclusão (Enunciado n° 297 do TST). Com esses fundamentos, nego provimento aos embargos. Isto posto, Acordam os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer dos embargos por divergência jurisprudencial, mas negar-lhes provimento. Brasília, 3 de abril de 2000. Almir Pazzianotto Pinto, Vice-Presidente no exercício da Presidência. Milton de Moura França, relator. REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO Os direitos instituídos em cláusulas de acordo coletivo de trabalho vigoram, tão-somente, durante o período de vigência nela previsto. PROCESSO N° TST-RR-240.686/96 - (Ac. 3a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR240.686/96, em que são recorrentes Centrais Geradoras do Sul do Brasil S/A - Gerasul e Elir Pedro Machado e são recorridos os mesmos. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 376 JURISPRUDÊNCIA Esta Turma, em decisão proferida em 15/10/97 (fls. 539/544), conheceu do recurso de revista da Eletrosul, no que tange ao vínculo empregatício, por divergência com os arestos de fl.327 (1°, 2° e 4°). Em seguida, passou ao exame do recurso de revista adesivo do reclamante por conter matéria de exame preferencial (nulidade). O recurso adesivo do Reclamante foi conhecido, por violação ao art. 832 da CLT, e provido para, declarando a nulidade da decisão relativa aos embargos de declaração, determinar a volta dos autos ao egrégio TRT de origem para novo julgamento, “observando-se os Enunciados n°s 126,296 e 297/TST, ficando prejudicado o exame do recurso da reclamada quanto ao mérito” (fl.544). Consignou o acórdão (relatado pelo eminente Ministro Manoel Mendes de Freitas) verbis: “Com a devida vênia, não se pode deixar de reconhecer que os dados constantes da decisão regional são insuficientes para que o Reclamante possa ter chance de exame cabal da matéria no recurso de revista, tendo em vista a impossibilidade de revolvimento de fatos e provas (Enunciado 126/TST). Ao julgador de segundo grau não basta dizer que está mantendo a sentença e que dela não recorreu o reclamante. Não recorreu porque a sentença foi- lhe favorável e, não bastasse, decidiu a matéria com exame de todos os detalhes do contrato de prestação de serviços (reclamada e multioperacional), assim como do relacionamento entre o Reclamante e a Reclamada. Sem esses elementos fáticos, impossível o exame cabal da matéria no campo de um recurso extraordinário como o de revista, que se limita ao exame da matéria de direito, com base no quadro fático delineado no julgamento do recurso ordinário. Conhecedor da técnica desse recurso especial, o reclamante, inteligentemente, tentou obter do egrégio Regional os elementos necessários para debate tranqüilo no recurso de revista. Infelizmente, não o conseguiu. É sabido que não vale o julgamento por simples remissão ao julgamento anterior. Se o egrégio Regional entende que a fundamentação da sentença é perfeita, deve transcrevê-la na fundamentação. Só assim seus fundamentos ficarão fazendo parte do acórdão do recurso ordinário. Basta, no caso, ler a sentença e a decisão do recurso ordinário para verse que, data venia, a prestação jurisdicional, em segundo grau, foi incompleta. Conheço do recurso adesivo por ofensa ao art. 832 da CLT. MÉRITO Tendo conhecido do recurso adesivo do reclamante por ofensa ao art. 832 da CLT, cumpre determinar-se a devolução dos autos ao egrégio Regional para completar-se a prestação jurisdicional, em função dos embargos de declaração opostos pelo reclamante. Com efeito, fatos e provas de interesse real para o julgamento do recurso de revista devem ser esclarecidos no julgamento do recurso ordinário, tendo em Rev. TST, Brasília, vol. 66, n3 3, jul/set 2000 377 JURISPRUDÊNCIA vista as limitações a respeito impostas ao julgador do recurso de natureza extraordinária (Enunciado n° 126/TST). Pelo exposto e respeitosamente, Dou provimento ao recurso adesivo do reclamante para, declarando a nulidade da decisão dos embargos de declaração, determinar a volta dos autos ao egrégio Tribunal de origem para novo julgamento, observando-se os Enunciados n°s 126, 296 e 297/TST, ficando prejudicado o exame do recurso da reclamada quanto ao mérito. Isto posto, Acordam os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, conhecer da revista da reclamada, por divergência e, quanto ao recurso adesivo do reclamante, unanimemente dele conhecer, por violação do art. 832 da CLT e, no mérito, dar-lhe provimento para, declarando a nulidade da decisão dos embargos de declaração, determinar a volta dos autos ao egrégio Tribunal de origem, a fim de que profira novo julgamento, observando-se os Enunciados n°s 126, 296 e 297, ficando prejudicado o exame do recurso da reclamada, quanto ao mérito. A Turma deferiu juntada do instrumento procuratório, requerida da Tribuna pelo douto patrono do 2o recorrente.” (fls. 542/544). Contra a decisão desta Turma, conforme certificado à fl.546, não houve interposição de qualquer recurso. O feito retomou ao egrégio TRT de origem, que proferiu novo julgamento dos embargos de declaração do autor, esclarecendo verbis: “Os elementos caracterizadores da relação de emprego insculpidos no art. 3o da CLT estão presentes, conforme demonstra o conjunto probatório dos autos. O autor foi contratado pela empresa Multioperacional para exercer o cargo de Assistente Técnico III junto a obra da usina termeléctrica do Jacuí pertencente à Eletrosul. A Eletrosul e a Multioperacional fumaram contrato de prestação de serviços de apoio técnico e administrativo, fls. 62/74, em 14/10/86. Assim dispõe a cláusula 3a do referido contrato: ‘Durante a vigência deste instrumento caberá à Eletrosul: coordenar, orientar e fiscalizar a execução dos serviços, especificando e distribuindo as tarefas ao pessoal posto à sua disposição; atestar o levantamento das horas efetivamente trabalhadas pelo pessoal da contratada; fornecer a relação de pessoal necessária, indicando a qualificação desejada e as respectivas faixas salariais para o atendimento das exigências dos serviços; fornecer relação dos materiais, ferramentas ou equipamento necessários ao desenvolvimento das atividades; fornecer alimentação aos funcionários da contratada lotados na obra do Jacuí; fornecer transporte de ida e volta para o canteiro de obras aos empregados da contratada...’. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 378 JURISPRUDÊNCIA A cláusula 5ª do contrato revela que a Eletrosul reembolsa a prestadora de serviços de todos os salários e indenizações pagos aos seus empregados, além dos encargos sociais, com acréscimo de 22% a título de taxa de administração. Segundo os depoimentos dos prepostos da reclamada em outros processos, fls. 75/76, a obra da Termelétrica do Jacuí era coordenada, gerenciada e dirigida pela Eletrosul sendo que na obra existiam empregados contratados diretamente por ela e também pela Multioperacional, que todos os empregados trabalhavam conjuntamente. O doc. da fl. 101 demonstra que o Autor exercia o cargo de Assistente Técnico III, subordinado à Gerência Civil da Divisão OBJA, que pertence ao Departamento de Construção de Termelétricas da Eletrosul. Por outro lado o doc das fls. 111/130, Manual de Pessoal revela que o cargo exercido pelo autor pertence ao Quadro de Cargos da Eletrosul. Portanto, restou provado que o autor prestava serviços diretamente à Eletrosul, junto à obra da Usina Termelétrica do Jacuí. Salienta-se que os serviços prestados pelo autor não eram eventuais, mas essenciais ao desenvolvimento da atividade-fim da reclamada, tanto que esta tem empregados em quadro próprio de pessoal que executam as mesmas funções que o reclamante, sob sua fiscalização, por tempo indeterminado. Cumpre referir que o Acórdão das fls.312/316, manteve a decisão de primeiro grau, fls. 171/175, quanto ao reconhecimento da relação de emprego, sob fundamento de que houve intermediação de mão-de-obra, aplicando o Enunciado 256 do C. TST” (fls.552/553). A respeitável decisão acima transcrita transitou em julgado em 13/05/98, conforme certificado à fl.555. Mediante despacho de fl.556, foi determinado que se desse ciência às partes da baixa dos autos do egrégio TRT. Em 22/07/98, foi protocolizado na Junta de Conciliação e Julgamento de Guaíba requerimento da Eletrosul (fl.559) no sentido de suspender a execução e enviar os autos ao TST para julgamento do mérito do recurso de revista da empresa. Apóia-se o pedido em que: “o processo pende de apreciação de Recurso de Revista da iniciativa da empresa, haja vista que o C. TST, recebeu o recurso patronal e não adentrou no mérito por considerar que o egrégio TRT deveria pronunciar-se acerca da preliminar de nulidade do acórdão, levantada pelo Reclamante. Após o novo julgamento do questionamento obreiro, necessariamente deveria ter retomado os autos ao C. TST para julgamento do mérito, o que ainda não foi procedido” (fl.559). A respeito, manifestou-se o reclamante às fls. 576/577. Afirma haver equívoco da reclamada ao pretender nova remessa do feito ao TST, porque não houve sobrestamento do recurso, que restou prejudicado em razão da nulidade da decisão relativa aos embargos de declaração; logo, houve o trânsito em julgado da decisão. Assim, solici Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 379 JURISPRUDÊNCIA tou a expedição do mandado de reintegração, conforme determinado pela decisão de fls. 312/316. Mediante despacho de fl.578, que nada aduz acerca do mandado de reintegração, foi determinada a remessa dos autos ao egrégio TRT para análise do postulado pela reclamada. No TRT, a juíza relatora proferiu o seguinte despacho: “Em atenção ao despacho da fl.578, registra-se que o egrégio TST, no acórdão das fls. 539/544, deu provimento ao recurso de revista adesivo do reclamante para, declarando a nulidade da decisão dos embargos de declaração, determinar a volta dos autos a este Tribunal, a fim de que fosse proferido novo julgamento, assim como declarou prejudicado o exame do mérito do recurso de revista da reclamada. Neste é postulada a reforma da decisão deste Regional no que tange à manutenção do reconhecimento do vínculo empregatício entre as partes. No novo julgamento dos embargos de declaração (fls.551/553), a 2ª Turma deste Regional supriu a omissão apontada apreciando os elementos caracterizadores da relação de emprego estabelecidos no art. 3° da CLT. O egrégio TST julgou prejudicado o exame do mérito do recurso de revista da reclamada. Considerando o objeto da Revista interposta pela reclamada, conclui-se que a decisão do colendo TST julgou prejudicado o exame do mérito naquele momento processual, ou seja, até que a prestação jurisdicional deste Tribunal estivesse completa. Por todo o exposto, determina-se a remessa dos presentes autos ao Exmo. Juiz Presidente do TRT da 4a Região para que tome as providências que entender cabíveis” (fl. 582). Subindo os autos a esta Corte, a ELETROSUL, em 25/02/99, protocolizou o requerimento de fls.586/587 noticiando a cisão parcial da empresa, com a criação da Gerasul - Centrais Geradoras do Sul do Brasil S/A, conforme ata da centésima primeira assembléia extraordinária, realizada em 23/12/97. Em conseqüência, postula a substituição processual da Eletrosul pela Gerasul, dada a cisão noticiada, e a reautuação do presente processo para que conste o nome da Gerasul - Centrais Geradoras do Sul do Brasil S/A em substituição ao da Eletrosul. Em razão de o relator originário encontrar-se aposentado, o eminente Ministro Presidente desta Turma determinou a distribuição do feito dentre os Ministros integrantes desta e remeteu ao relator sorteado a apreciação do pedido de substituição do pólo passivo da demanda (de fls.586/590). Mediante despacho de fl.594, concedi prazo para manifestação do reclamante quanto ao requerimento de fls. 586/587, o qual aduziu que “nada tem a opor quanto à substituição processual das Centrais Elétricas do Sul do Brasil S/A - Eletrosul, pelas Centrais Geradoras do Sul do Brasil - Gerasul, demonstrada nos autos do processo em epígrafe pelos documentos acostados às fls. 586/590”. Daí o despacho de fl. 598 medi Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 380 JURISPRUDÊNCIA ante o qual determinei a reautuação do presente feito para que, em lugar das Centrais Elétricas do Sul do Brasil S/A - Eletrosul, passe a constar a Reclamada Centrais Geradoras do Sul do Brasil - Gerasul. É o relatório. VOTO RECURSO DE REVISTA DAS CENTRAIS GERADORAS DO SUL DO BRASIL S/A-GERASUL Esclarecimento Preliminar Esta Turma, pelo acórdão de fls.539/544, como já dito, conheceu do recurso de revista da reclamada quanto ao tema vínculo empregatício. Havendo preliminar de nulidade no recurso adesivo do autor, passou-se ao seu exame. O recurso de revista adesivo do reclamante foi conhecido e provido para, “declarando a nulidade da decisão dos embargos de declaração, determinar a volta dos autos ao egrégio Tribunal de origem, a fim de que profira novo julgamento, observando-se os Enunciados n°s 126,296 e 297, ficando prejudicado o exame do recurso da Reclamada, quanto ao mérito” (fl.544). Datíssima vênia, não é o caso, a meu ver, de considerar prejudicado o exame do recurso de revista da empresa. Entendo, com o eminente Ministro José Luiz Vasconcellos, prolator do despacho de fl.592, que, conhecido o recurso de revista principal (interposto pela Eletrosul), sem o que não teria sido possível sequer o conhecimento do recurso de revista adesivo do reclamante (quiçá o seu provimento), que a expressão prejudicado poderia ter sido utilizada caso o recurso não tivesse logrado conhecimento. Assim não tendo ocorrido, forçoso extrair da decisão desta Turma, em lugar de prejudicado, a expressão sobrestado, porque, sacramentado o conhecimento da revista principal no tocante ao vínculo empregatício, cabe a esta Turma enfrentar não só o mérito respectivo mas, também, o exame do conhecimento e, se for o caso, do mérito do outro item constante da revista principal (reintegração no emprego), sob pena de incompleta prestação jurisdicional. CONHECIMENTO REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO O egrégio TRT (fl.315) deu provimento ao recurso ordinário do Reclamante para determinar a sua reintegração no emprego no mesmo cargo antes ocupado, com o pagamento de salários e demais vantagens desde a demissão até a efetiva reintegração. Apóia-se a respeitável decisão em que o autor foi demitido em 10/10/90, “'durante a vigência do acordo coletivo de trabalho de fls. 36/43, que prevê em sua cláusula 2a a garantia de emprego, sendo que o parágrafo 5° da referida cláusula assim dispõe: Não comprovada a justa causa perante a Justiça do Trabalho ou a assiduidade incompatível com a necessidade do serviço, conforme previsto nesta cláusula, será assegurada a reintegração do empregado despedido, consideradas as vantagens contratuais e le- Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 381 JURISPRUDÊNCIA gais Nestes termos, com base na cláusula citada o reclamante tem direito a reintegração no emprego no mesmo cargo que antes ocupava, sendo que a paralisação das obras da termoelétrica do Jacuí, alegada pela Juíza a qua, não impede a reintegração do autor. Assim sendo, cabe a reintegração do autor com o pagamento dos salários e demais vantagens até a efetiva reintegração” (fl.315). Aduziu mais a respeitável decisão verbis: “O autor postulou a reintegração no emprego, invocando garantia prevista em acordo coletivo, o que não foi aceito em 1° Grau, tendo a Juíza a qua lhe deferido apenas os salários e demais vantagens pessoais relativas ao período de vigência da cláusula assecuratória do emprego” (fl.314). No recurso de revista (fls.325/334), afirma a Eletrosul que o acordo coletivo de trabalho dos eletricitários vigente à época previa a garantia de emprego. Contudo, tal acordo vigorou tão-somente até 30/10/90, limite da data base dos empregados da recorrente e o reclamante foi demitido em 10/10/90. Logo, contrariado o Enunciado n° 277/TST e divergentes os paradigmas de fls. 332/333. Ao caso não se aplica o Enunciado n° 277/TST, porque relativo à sentença normativa enquanto no caso se cuida de acordo coletivo de trabalho. Excluído o primeiro aresto de fl. 332, os demais (fls.332/333) não são divergentes porque não enfrentam a mesma hipótese em discussão. O segundo aresto (fl.332) faz referência a cláusula de acordo coletivo de trabalho que reitera a adoção de política de preservação de emprego; o terceiro aborda cláusula concessiva de estabilidade provisória; o quarto aborda o Enunciado n° 277/TST, o qual trata de sentença normativa e não de acordo coletivo de trabalho; o quinto faz referência a cláusula de acordo coletivo de trabalho que reitera a adoção de política de preservação de emprego; o sexto analisa sentença normativa; o sétimo é genérico; o oitavo aborda empregados despedidos anteriormente à sua estipulação; e o nono analisa garantia de emprego estabelecida em acordo coletivo, aduzindo que “não dá direito ao empregado dispensado antes, imotivadamente, direito a reintegração, mas apenas, ao pagamento dos salários pelo tempo restante” (fl. 333). Há incidência, portanto, do Enunciado n° 296/TST. Conheço da revista, entretanto, por divergência com o primeiro aresto de fl.332 (íntegra às fls. 388/390) cuja tese, no sentido de que a garantia de emprego prevista em cláusula normativa é assegurada somente durante o seu período de vigência, se contrapõe à tese recorrida. MÉRITO VÍNCULO DE EMPREGO Consignou a respeitável decisão recorrida: O autor foi admitido em 3/2/87 e despedido em 10/10/90, sendo que sempre desempenhou o cargo de Assistente Técnico III. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 382 JURISPRUDÊNCIA Vislumbra-se no caso em foco, mais uma das inúmeras hipóteses de ocorrência de relação trilateral, onde existe a intermediação de mão-de-obra através de empresa prestadora de serviços, que na verdade burla normas tutelares do trabalho e mascara o contrato de trabalho. Esta espécie de relação trilateral estabelecida entre as partes é condenável pela doutrina e jurisprudência, de vez que não se trata de trabalho temporário com respeito à Lei n° 6.019/74, visto que o autor prestou serviço por período bem superior aquele previsto pela citada legislação, desnaturando a espécie de contrato por ela regulado. No caso, aplica-se o Enunciado 256 do TST, sendo a tomadora do serviço a real empregadora. Mantém-se, inclusive com relação a anotação da CTPS do autor do contrato de trabalho com sua real empregadora” (fl.313). Examinando os embargos de declaração opostos pelo Reclamante, a nova decisão proferida pelo egrégio TRT entendeu configurados os elementos caracterizadores da relação de emprego (fls.551/553) previstos no art. 3° da CLT, “conforme demonstra o conjunto probatório dos autos” (fl. 552). Frente aos fatos apurados pelo egrégio TRT (fls.551/553) não vejo como, sem reexame do conjunto fático-probatório, vedado a esta Corte pelo Enunciado n° 126, afastar o reconhecimento do vínculo de emprego nas circunstâncias específicas destes autos. Nego provimento ao recurso de revista. REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO Não seria razoável concluir no sentido de que a respeitável decisão recorrida pretendeu dar vigência perpétua à norma coletiva nela referida quando deferiu ao reclamante o pedido de reintegração, com o pagamento dos salários e demais vantagens até a efetiva reintegração. A situação revelaria claro enriquecimento ilícito do autor. Cabível, tão-somente, o pagamento dos salários e demais vantagens pessoais até 31/10/91, correspondentes ao período coberto pela garantia de emprego instituída pela norma coletiva (Obs.: a sentença registra que os “documentos de fls.153/157 e 161/162 demonstram que houve deferimento de garantia de emprego até 31/10/91” (fl. 174). Do exposto, dou provimento ao recurso de revista da Reclamada apenas para excluir da condenação a reintegração do Reclamante, mantendo a condenação no tocante ao pagamento dos salários do período coberto pela garantia de emprego instituída pela norma coletiva vigente até 31/10/91. Isto posto, Acordam os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, conhecer da revista, por divergência e, no mérito, quanto ao tema vínculo de emprego, unanimemente negar provimento e, quanto ao tema reintegração no emprego, por maioria dar-lhe provimento para excluir da condenação a reintegração Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 Jul/set 2000 383 JURISPRUDÊNCIA do reclamante, mantendo a condenação no tocante ao pagamento dos salários do período coberto pela garantia de emprego, instituída pela norma coletiva vigente até 31/10/91, vencidos os Srs. Ministros Francisco Fausto, que juntará voto divergente, e Mauro César. A Turma deferiu juntada do instrumento procuratório, requerida da Tribuna pelo douto Patrono do primeiro recorrente. Brasília, 10 de novembro de 1999. José Luiz Vasconcellos, presidente. Carlos Alberto Reis de Paula, relator. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. VÍNCULO EMPREGATÍCIO Recurso de revista. Supressão de instância. Vínculo empregatício. Reconhecimento pelo Tribunal Regional. Sentença de improcedência reformada. Julgamento de pedidos decorrentes do vínculo empregatício. Impossibilidade. Aplicação do caput do art. 515 do CPC. O limite do efeito devolutivo revela-se pela impugnação formulada pelo Recorrente, estando, assim, a devolução jungida ao que foi decidido na sentença. Recurso de revista provido. PROCESSO N°TST-RR-324.006/96-(Ac. 3a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR324.006/96, em que é recorrente Club Athlético Paulistano e recorrido Reginaldo Silva da Cruz. A sentença de fls. 116/118 julgou improcedente a reclamação trabalhista do reclamante. Inconformado, o reclamante interpõe recurso ordinário para o TRT (fls. 121/124). O egrégio Regional da Segunda Região deu provimento parcial ao recurso ordinário do reclamante para julgar a reclamação procedente em parte, devendo o recorrido, por conseqüência, pagar ao recorrente as verbas na inicial requeridas, com exclusão das horas extraordinárias; da expedição de oficio e dos honorários de advogado, serão passíveis de regular apuração, cabendo as anotações em oito dias (fls. 13 7/151). O reclamado interpõe recurso de revista com base na alínea c do art. 896 da CLT, alegando violação legal e constitucional (fls. 154/159). Despacho de admissibilidade da revista à fl. 164. Contra-razões às fls. 167/169. Sem parecer da douta Procuradoria-Geral. É o relatório. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 384 JURISPRUDÊNCIA VOTO CONHECIMENTO VÍNCULO EMPREGATÍCIO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. APLICAÇÃO DO ARTIGO 515 DO CPC O egrégio Regional reformou a respeitável sentença que havia julgado improcedente a reclamatória, reconhecendo a existência de vínculo de emprego entre as partes, em face do preenchimento dos pressupostos do art. 3° da CLT. Entendeu, também, que era possível passar-se ao exame das parcelas decorrentes do reconhecimento do vínculo de emprego, em virtude da aplicação do artigo 516 do CPC. Acrescentou que a MMa Junta de Conciliação e Julgamento ao decidir sobre a existência ou não de emprego, manifestou-se acerca do mérito da pretensão, sendo, portanto, lícito ao Tribunal proferir pronunciamento sobre as demais matérias. Sustentou que a profundidade do efeito devolutivo autoriza este posicionamento, uma vez que a contestação foi suficientemente esclarecedora sobre os direitos postulados. O reclamado argumenta que o Regional não poderia ter enfrentado o mérito da reclamatória, ou seja, as demais matérias acerca das quais não houve pronunciamento da primeira instância, pois, ao contrário, deveriam ser elas devolvidas ao juízo originário. Neste contexto, afirma que o art. 515 do CPC ao determina que “a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada”, restou violado, uma vez que olvidada a sua aplicação, bem como, o disposto no artigo 5°, LV, da Constituição Federal. Assiste-lhe razão. Decorre do princípio dispositivo, o efeito devolutivo do recurso, insculpido no artigo 515 do CPC, pelo qual o órgão ad quem, não pode julgar além do que foi postulado no recurso, sob pena de incorrer em julgamento extra, ultra ou citra petita. O CPC autoriza o conhecimento pelo Tribunal de questões não apreciadas pelo juízo originário, conquanto tivessem sido suscitadas e discutidas no processo, todavia, cabe ressaltar que decorre do princípio do tantum devolutum quantum appellatum a extensão do efeito devolutivo. O limite deste efeito revela-se pela impugnação formulada pelo recorrente, estando, assim, a devolução jungida ao que foi decidido na sentença. Se a decisão do juízo de primeiro grau foi terminativa, o Tribunal reformando-a deve devolver o feito àquela instância para o julgamento do mérito, ou seja dos pedidos decorrentes da declaração do vínculo. No caso dos autos o Tribunal não poderia manifestar-se sobre as verbas decorrentes do vínculo de emprego, porquanto reformou a r. sentença que não reconheceu a existência dessa prejudicial de exame dos demais pedidos. Foi aplicado pelo Regional o disposto no artigo 516 do CPC, mediante o qual ao Tribunal estão devolvidas as matérias impugnadas no recurso e aquelas relativas Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 385 JURISPRUDÊNCIA ao conhecimento de ofício, como por exemplo os pressupostos processuais e as condições da ação. Entretanto, os pedidos examinados pelo TRT não se configuram em questão de ordem pública, e sim de matérias afetas ao mérito da causa, que da forma como foram tratadas pelo Regional ficaram impedidas de serem reexaminadas quanto à análise e enquadramento da prova, mormente considerando a impossibilidade da devolução deste tema em sede de recurso de revista. Com estes fundamentos, uma vez afastada a aplicação do artigo 516 do CPC, entendo violado o disposto no art. 515, caput, do CPC. Conheço. MÉRITO VÍNCULO EMPREGATÍCIO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. APLICAÇÃO DO ARTIGO 515 DO CPC Como conseqüência do conhecimento por violação do caput do artigo 515 do CPC, dou provimento ao recurso para, reformando a decisão Regional, determinar o retorno dos autos à instância de origem, a fim de que sejam examinados os pedidos decorrentes do vínculo empregatício. Isto posto, Acordam os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso por violação ao art. 515, caput, do CPC e, no mérito, reformando a decisão Regional, determinar o retomo dos autos à instância de origem, a fim de que sejam examinados os pedidos decorrentes do vínculo empregatício. Brasília, 25 de agosto de 1999. José Luiz Vasconcellos, presidente. Carlos Alberto Reis de Paula, relator. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. DIRETOR. SOCIEDADE ANÔNIMA Sendo o reclamante diretor de sociedade anônima, eleito na forma da lei e “subordinado " tão-somente ao Conselho Administrativo, não é empregado. Recurso de revista conhecido e provido. PROCESSO N° TST-RR-412.290/97- (Ac. 3a Turma) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR412.290/97, em que é recorrente Paraná Companhia de Seguros e recorrido Huber da Guia Rosa. Inconformada com o venerando acórdão do egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 9a Região de fls. 416/453, complementado às fls. 463/466 (embargos declaratórios) interpõe a reclamada recurso de revista. Insurge-se quanto aos temas: - vínculo empregatício, sob o argumento de que o autor era incontroversamente vice-presidente Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 386 JURISPRUDÊNCIA e diretor de produção, eleito na forma da lei, não podendo ser confundido com mero empregado. Aponta, em relação ao tema, violação do art. 143 da Lei n° 6.404/76 e divergência jurisprudencial com os arestos de fls. 475/476; - correção monetária / época própria, em que indica o art. 5o, II, da CF como violado além de dissídio jurisprudencial. O recurso foi admitido pelo respeitável despacho de fl. 483/484, e oferecidas contra-razões às fls. 487/489. Sem remessa dos autos à douta Procuradoria Geral, nos termos do artigo 113, II, do RITST. É o relatório. VOTO O recurso é tempestivo (certidão de fl. 468, 01/08/97, sexta-feira e protocolo de fl. 470, 12/08/97, terça-feira), houve correto preparo (custas e depósito da condenação às fls. 365 e 481) e o subscritor da petição está regularmente legitimado (fl. 284). DIRETOR. SOCIEDADE ANÔNIMA. DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO O egrégio Regional manteve a decisão de 1o grau que reconheceu o vínculo empregatício entre o reclamante - diretor de produção e a reclamada em acórdão, de onde se extraem trechos assim expressos, verbis: “...A menção aos artigos inseridos no Estatuto da reclamada, denotam a subordinação a que estava sujeito o autor, tendo em vista que a autonomia laborai era limitada pela atuação do Conselho de Administração, esta responsável pela fixação da política administrativa e fiscalização. O autor não sendo acionista tem limitado seu campo de atuação, tanto que a responsabilidade pelos riscos, na verdade era acompanhada de perto pelo Banestado, tendo em vista que o Presidente do Conselho de Administração era o Presidente do Banestado.” (fl. 423) “... Denota-se do cargo de direção em questão a retirada de sua essência traços de autonomia e representatividade, aliado ao fato de não ser acionista, que reforçam a tese do diretor-empregado. A dependência econômica está caracterizada pelo pagamento dos denominados “honorários” e gratificação semestral, estes fixados pelo Conselho de Administração, conforme afirma o preposto, fls. 288. Constata-se que o cargo de direção exercido pelo autor mostra-se como as exercidas por empregados de elevada categoria por sua competência e confiança, porém com limitada autonomia de ação aliada à subordinação à cúpula administrativa. A autonomia (sic) Diante do supracitado, configura-se o vínculo empregatício eis que o autor na verdade desempenhava atividades que o qualificariam como diretor-empregado, subordinado às decisões do Conselho Administrativo, não sendo acionista não poderia responder por ela a ponto de comprometê-la eis que fiscalizado por tal órgão no qual desempenhava o cargo de Presidência aquele que o indicara Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 387 JURISPRUDÊNCIA e portanto, ciente dos acontecimentos que se sucediam na reclamada. Conseqüentemente lhe cabiam, limitada pela fiscalização e decisão do Conselho. No tocante à dependência econômica caracterizado estava que gratificações semestrais. E, finalmente a não eventualidade se caracterizava pelo cargo que desempenhava. Resta caracterizada a função de diretor-empregado e não diretor- órgão da sociedade, no dizer de Süssekind e outros.” Inconformada, interpõe a reclamada recurso de revista, sob o argumento de que sendo diretor, eleito, desempenhando funções determinadas pelo Estatuto, sem qualquer subordinação a não ser a que prevê o próprio Estatuto, não poderia o reclamante ser considerado empregado. Aponta divergência jurisprudencial com os acórdãos de fls. 475/476 e violação do art. 143 da Lei n° 6.404./76. No tocante ao art. 143 da Lei n° 6.404/76, não se vislumbra violação literal e inequívoca ao indicado dispositivo legal, tendo em vista que este nada dispõe sobre a relação existente entre o diretor e a sociedade anônima e vínculo de emprego, limitando-se a tratar da composição da diretoria. Pertinência do Enunciado 221 do TST. O último aresto colacionado (fl. 476) desserve ao confronto porquanto oriundo de turma desse colendo TST, em inobservância ao disposto no art. 896, a, da CLT. No entanto, a reclamada, ora recorrente, logrou demonstrar divergência específica em relação aos demais arestos colacionados, pois estes contêm tese diametralmente oposta àquela defendida no venerando acórdão recorrido, no sentido de que o diretor eleito pela assembléia de acionistas não é empregado e não há possibilidade de existência de vínculo com a empresa, enquanto que o egrégio Regional entendeu que o autor, embora fosse diretor eleito pela assembléia de acionistas, seria empregado ante sua autonomia relativa, posto que estaria limitada pela fiscalização e decisão do Conselho Administrativo. Conheço por divergência jurisprudencial. DO PROVIMENTO DIRETOR. SOCIEDADE ANÔNIMA. DO VÍNCULO EMPREGATÍCIO Esse colendo TST tem se posicionado no sentido de reconhecer a impossibilidade jurídica de se considerar empregado um diretor de sociedade anônima, eleito para tanto, ante o fato de que o diretor da sociedade anônima é órgão da sociedade, não existe dependência hierárquica, não é responsável perante qualquer chefe ou empregador imediato, a não ser a assembléia geral ou, como in casu, ao Conselho de Administração, como reconheceu o v. acórdão regional, e tal fato em nada altera a conclusão pela inexistência de vínculo empregatício, uma vez que o reclamante detinha a condição de diretor de produção, eleito na forma legal para exercer tal encargo. Ademais, em toda e qualquer sociedade anônima há uma vinculação “subordinativa” ao conselho de administração ou, se inexistente, à assembléia geral. Esta, principalmente nas sociedades em que existe um controle acionário de indivíduos ou grupo, na verdade é dona dos destinos da empresa e dos diretores. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 388 JURISPRUDÊNCIA Ocorre, todavia, que o diretor pratica os atos e a eventual reprovação, por parte da assembléia, pode comprometê-lo, mas não ao ato que praticou na administração da empresa. Quando se institui um conselho de administração, este órgão, na verdade, não subtrai a representação legal do empreendimento. Por certo, muitas questões serão levadas pelo diretor, antes da adoção de uma solução, à apreciação do conselho. Todavia, os atos que venha a praticar, serão projetados para terceiros como válidos e eficazes. Somente se tivesse ficado nítida a absoluta subordinação prévia do diretor ao conselho é que poderíamos alterar o nosso ponto de vista com relação à inexistência da relação de emprego, o que inocorreu in casu. Na realidade, a despeito de possível fiscalização de outro órgão, sendo o reclamante diretor de sociedade anônima, eleito na forma da lei, não sendo subordinado a qualquer chefe ou empregador imediato a não ser o Conselho de Administração, conforme se extrai do v. acórdão recorrido, não há como se reconhecer o vínculo de trabalho entre ele e a reclamada. Destarte, dou provimento ao recurso de revista para, afastando o reconhecimento do vínculo de emprego, julgar improcedente a reclamatória, invertendo-se o ônus de sucumbência. Isto posto, Acordam os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, para, afastando o reconhecimento do vínculo de emprego, julgar improcedente a reclamatória, invertendo-se o ônus de sucumbência. Brasília, 11 de abril de 2000. José Luiz Vasconcellos, presidente e relator. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 389 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INTERESSE DIFUSO Legitimidade do Ministério Público do Trabalho. Ação civil pública. Interesse difuso. O art. 83, III, da Lei Complementar n° 75/93 deve ser interpretado em conjunto com as demais disposições acerca da legitimidade do Ministério Público para promover a ação civil pública, não estando esta limitada à defesa dos interesses coletivos. O item I do mesmo diploma legal registra que compete ao Ministério Público do Trabalho promover as ações que lhe sejam atribuídas pela Carta Magna, bem como pelas leis trabalhistas, incluindo-se, portanto, a ação civil pública, para a proteção de interesses difusos e do patrimônio público e social, prevista no art. 129, III, da Constituição da República. O art. 6o, VII, a e d, da Lei Complementar n° 75/93, por sua vez, é claro ao assegurara legitimidade do Ministério Público para ajuizar a ação civil pública afim de proteger os direitos constitucionais e os interesses difusos. Recurso de revista conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação civil pública - legitimidade ativa - Ministério Público- interesses difusos - imposição de obrigação de não fazer - sociedade de economia mista. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. (TST-RR-583.480/99 - 5a Turma - Rel. Juíza Convocada Anelia Li Chum - DJU 12.05.2000) AÇÃO RESCISÓRIA. ANISTIA Ação rescisória. Anistia. Lei n° 8.878/94. O direito à anistia foi assegurado pela Lei n° 8.878/94 aos servidores públicos civis e empregados da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, bem como aos empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista, que houvessem sido demitidos no período de 16-3-90 a 30-9-92, com violação de dispositivo constitucional, legal, regulamentar, de cláusula de acordo, convenção ou sentença normativa, ou por motivação política. A verificação de preenchimento dos requisitos à obtenção da anistia coube à Comissão Especial de Anistia(CEA), criada pelo Decreto n° 1.153, de 08.06.94. Todavia, ante a verificação de irregularidades por ausência de motivação das decisões proferidas nos processos de concessão de anistia pela citada Comissão, foi criada a Comissão Especial de Revisão dos Processos de Anistia (CERPA), à luz do Decreto n° 1.499, de 24.05.95, que, até o momento, vem analisando todas as anistias concedidas. Recurso a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Anistia - readmissão por determinação de comissão criada para este fim - superveniência do Decreto n° 1499/1995 - reexame das readmissões. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROAR- Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 393 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA 402.728/97 - SBDI 2 - Rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho - DJU 23.06.2000) AÇÃO RESCISÓRIA. CABIMENTO. ERRO DE FATO. NÃO- CONFIGURAÇÃO. AÇÃO RESCISÓRIA. REVOLVIMENTO. AÇÃO RESCISÓRIA. ENUNCIADO N° 298 DO TST Ação rescisória. Cabimento. Decisão que soluciona a titularidade do crédito trazido a cotejo em ação de consignação em pagamento. Sentença de mérito. Na ação de consignação em pagamento fundada em dúvida sobre quem deve legitimamente receber o crédito, liberado o devedor, inicia-se a disputa entre os pretendentes aos valores consignados, já sem a presença do autor da consignatória. Há, pois, dois julgamentos distintos, em momentos diversos e com objetos inconfundíveis. No primeiro, é reconhecida a eficácia do depósito, a exoneração do autor do vínculo obrigacional e, conseqüentemente, a desoneração do devedor da relação jurídica, resultando na coisa julgada material no particular. No segundo, com a extinção do feito consignatório propriamente dito, instaura-se nova relação processual, nos mesmos autos, atendido o rito ordinário, para solucionar a titularidade do crédito, cuja decisão faz coisa julgada material apenas para os pretendentes aos valores consignados. In casu, verificando-se que pretendem as autoras neste feito tão-somente desconstituir o acórdão que não as contemplou com o crédito depositado, o pleito é de conformidade com o artigo 485 do CPC, que pressupõe sentença de mérito. Erro de fato. Não configuração. Não se evidencia erro de fato quando o julgador rescindendo, examinando o conjunto fático-probatório dos autos, hipoteticamente adota errônea interpretação. Ação rescisória. Revolvimento do conjunto fático-probatório. O revolvimento do conjunto fático-probatório não se enquadra no escopo da ação rescisória, que tem apenas indicações nos estritos termos do ordenamento jurídico vigente. Ação rescisória. Enunciado n° 298 do TST. “A conclusão acerca da ocorrência de violação literal de lei pressupõe pronunciamento explícito, na sentença rescindenda, sobre a matéria veiculada”. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - cabimento - decisão rescindenda prolatada em ação de consignação em pagamento. - Conhecido. - Mérito negado provimento. II - Ação rescisória - erro de fato. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. III - Ação rescisória - Enunciado n° 298 do TST -prequestionamento. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROAR-352.394/97 - SBDI 2 - Rel. Min. Ronaldo José Lopes Leal - DJU 09.06.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3,jul/set 2000 394 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA AÇÃO RESCISÓRIA. DECADÊNCIA Ação rescisória. Decadência. Ampliação do prazo. Pessoa jurídica de direito público. Direito intertemporal. Hipótese em que o trânsito em julgado da decisão rescindenda ocorreu em 1994, exaurindo-se em 1996 o prazo decadencial para a propositura de ação rescisória. Regra ampliativa do prazo para ajuizamento de ação rescisória por pessoa jurídica de direito público, de dois para quatro anos, sobrevindo apenas em 1997, com a edição da Medida Provisória n° 1.577/97. Aplicação do princípio geral da irretroatividade das leis, segundo o qual as leis são de efeito imediato frente aos feitos pendentes, mas não são retroativas, de modo a ser respeitada a decadência já consumada sob a égide da lei anterior, por consubstanciar-se em direito adquirido. Recursos ordinário e de ofício a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - ampliação do prazo decadencial por medida provisória - entidade de direito público - aplicação imediata - decadência consumada - irretroatividade. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-RXOFROAG-468.140/98 - SBDI 2 - Rel. Min. João Oreste Dalazen - DJU 02.06.2000) AÇÃO RESCISÓRIA. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL Ação rescisória. Inépcia da petição inicial. Causa de pedir. Pedido. Nexo lógico. Caso em que o autor, mediante ação rescisória, visa à desconstituição de acórdão proferido pelo Regional. Todavia, a causa de pedir exposta na petição inicial cinge-se a apontar vícios da sentença proferida pela JCJ de origem. Na petição inicial, o Autor deve narrar os fatos jurídicos com clareza e precisão, postulando as conseqüências daí decorrentes. A inexistência de um nexo lógico entre os fundamentos expendidos na petição inicial, relativos aos defeitos apontados na sentença, e a conclusão a que chega o Autor, ao deduzir pedido de rescisão do acórdão regional, caracteriza a inépcia da petição inicial (arts. 267, inciso I, e 295, inciso I e parágrafo único, inciso II, do CPC). Recurso ordinário a que se nega provimento, por fundamento diverso. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - inépcia da petição inicial causa de pedir- pedido - nexo lógico. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-RXOFROAR-488.3 72/98 - SBDI 2 - Rel. Min. João Oreste Dalazen - DJU 19.05.2000) AÇÃO RESCISÓRIA. LEGITIMIDADE. TERCEIRO INTERESSADO Em princípio, os limites subjetivos da coisa julgada são as partes no processo. Tal delimitação diz respeito às pessoas diretamente vinculadas à coisa julgada material, que resultou da solução da lide entre as partes. Não atingem a esfera jurídica de tercei Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 395 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ro, isto é, não há benefício a terceiros, mas pode haver prejuízo jurídico a estes. Se o terceiro demonstra que é juridicamente interessado, porque a decisão objeto da ação rescisória reconhece algo incompatível com a sua relação jurídica, ele poderá se opor à eficácia da sentença. Não restando demonstrado o interesse jurídico, mas meramente económico na hipótese dos autos, impõe-se a manutenção do julgado regional que extinguiu o processo sem julgamento do mérito ante a ilegitimidade ad causam dos autores para propositura da ação rescisória. Recurso ordinário a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - ilegitimidade ativa ad causam - terceiro interessado - associado do sindicato - preservação da integridade patrimonial de sindicato - colusão - acordo judicialmente homologado. - Conhecido. Mérito - negado provimento. (TST-ROAR-460.153/98 - SBDI 2 - Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen - DJU 30.06.2000) AÇÃO RESCISÓRIA. PRESCRIÇÃO Ação rescisória. Prescrição. Violação a literal dispositivo de lei e ofensa a coisa julgada. Não configuração. Se a Empregada foi despedida em 1977 e ajuizou reclamação trabalhista pleiteando sua reintegração, a qual foi arquivada em setembro de 1977, por não comparecimento da Reclamante à audiência inaugural (art.844 da CLT), não se justifica a inércia da Reclamante de setembro de 1977(data do arquivamento da primeira reclamação trabalhista por ela ajuizada)a fevereiro de 1991 (data do ajuizamento da segunda reclamação trabalhista), de forma que não se configura a indigitada violação do art.178, § 10, VI, in fine, do Código Civil, b) Não ocorre ofensa à coisa julgada se a decisão que transitou em julgado não trata da matéria para a qual se postula a rescisão. Se a decisão apontada como parâmetro para a verificação de ofensa à coisa julgada não tratou da prescrição quanto à estabilidade decenal, mas tão-somente da existência do vínculo de emprego e verbas consectárias, tais como, repouso semanal, férias, 13° salário, salário família e reajustes normativos da categoria, não ocorreu a ofensa à coisa julgada prevista no art. 485, IV, do CPC. Recurso ordinário a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - violação a literal disposição de lei - prescrição - caracterização. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. II - Ação rescisória - violação da coisa julgada - prescrição - estabilidade decenal. Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROAR-426.668/98 - SBDI 2 - Rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho - DJU 30.06.2000) AÇÃO RESCISÓRIA. REMESSA OFICIAL. DECADÊNCIA. ENUNCIADO N° 100/TST Ação rescisória. Remessa oficial. Decreto-Lei n° 779/69. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 396 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA A egrégia SDI já firmou entendimento no sentido de ser cabível a remessa ex officio de decisões contrárias a entes públicos proferida sem sede de ação rescisória (art. 1°, inciso V, do Decreto-Lei n° 779/69, e inciso II do art. 475 do CPC) (Item n° 71 da Orientação Jurisprudencial da SDI). Decadência. Hipótese em que não tem incidência o teor do Enunciado n° 100 do TST. Teoria da substituição. Art. 512 do CPC. Trânsito em julgado parcial da decisão rescindenda. Dada a teoria da substituição da sentença, formalmente prevista pelo art. 512 do CPC, o julgamento pelo tribunal ad quem substitui o decisório de mérito apenas naquilo em que foi objeto de recurso. Verificando-se que quanto à matéria objeto do pedido de rescisão não houve interposição de recurso para o Tribunal Superior, sendo a impugnação apenas parcial, o acórdão regional transita em julgado em relação àqueles temas não recorridos. Neste caso, o início do prazo decadencial coincide com o término do prazo para a interposição do recurso de revista, momento em que ocorre o trânsito em julgado antecipado da decisão quanto aos tópicos não recorridos. Não há que se falar na incidência do teor do Enunciado n° 100 da Súmula do TST nesta hipótese, o qual somente se aplica nos casos em que a matéria versada na ação rescisória foi renovada nos sucessivos recursos interpostos, o que não ocorreu no caso em comento. 3. Remessa oficial em ação rescisória desprovida. Prejudicado o exame dos demais aspectos do recurso ordinário do Ministério Público. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - entidade de direito público - privilégios processuais - Decreto-Lei n° 779/1969. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. II - Ação rescisória - argüição de decadência - contagem do prazo- marco inicial - impugnação parcial - matéria não objeto de recurso na ação rescindenda trânsito em julgado. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROAR414.442/97 - SBDI 2 - Rel. Min. Francisco Fausto Paula de Medeiros - DJU 04.08.2000) AÇÃO RESCISÓRIA. VÍCIO DA CITAÇÃO EDITALÍCIA Diz o art. 232, inciso I, do CPC, ser imprescindível à citação editalícia afirmação do autor da ação ou do Oficial de Justiça sobre a ocorrência das circunstâncias previstas no I e II do art. 231 daquele Código. Constatado que o recorrido, ao requerer a citação por edital ao fundamento de que a unidade onde trabalhara fora desativada e transferida para lugar incerto e não sabido, alertara que a empresa deixara um representante na cidade, impunha-se procedesse à citação na sua pessoa para só depois, se comprovada a sua frustração, recorrer-se à citação editalícia. Essa, por sua vez, não se justificava em relação à Volkswagen do Brasil não só por conta do fato, que se pode classificar como público e notório, de ter sede em São Paulo, mas sobretudo diante da evidência de o recorrido ter trabalhado por 5 anos na unidade desativada, a dar o tom de inverossimilhança da versão de que ignorava o seu endereço, mormente levando-se em conta que o obtivera, sem desusado esforço, ao tempo da deflagração do processo de execução. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 397 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA Recurso provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - violação a literal disposição de lei - vício de citação na ação rescindenda - edital. - Conhecido. - Mérito - provido. (TST-ROAR-548.427/99 - SBDI 2 - Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen - DJU 23.06.2000) ACÚMULO DE FUNÇÕES. MOTORISTA E CARREGADOR DE CAMINHÃO Motorista. Carregador de caminhão. Desempenho de duas funções. Contraprestação equivalente. Devida. É elementar, no âmbito do Direito Laboral, que o empregado assume obrigação de fazer, ao passo que ao empregador compete a obrigação de dar, ou seja, de pagar salário. É de se registrar, entretanto, que a regra prevalente na contratação está adstrita ao princípio pacta sunt servanda. Obriga-se o empregado a prestar um trabalho previamente ajustado e o empregador à correspondente contraprestação. Nesse contexto, considerando o princípio inserto no artigo 468 da CLT, relativo à inalterabilidade unilateral das condições de trabalho, conclui-se que o empregado, uma vez contratado especificamente para exercer as funções de motorista, não pode ser obrigado a exercer as atividades de carregador/descarregador de caminhão, porquanto alheias ao seu contrato de trabalho. Por outro lado, diante do caráter comutativo inerente ao pacto laboral, dúvidas não há quanto ao fato de que o salário percebido deve ser proporcional ao pactuado. Dessa forma, se no curso da relação de emprego, somente o exercício da função de motorista é remunerado, faz jus o obreiro à contraprestação pelo exercício das atividades de carregador/descarregador de caminhão, que, sob pena de enriquecimento ilícito da reclamada, não pode ficar sem a correspondente remuneração. Inexistindo, entretanto, no ordenamento jurídico pátrio, dispositivo legal que contemple solução específica para a hipótese, é de ser analogicamente aplicado o artigo 7°, inciso XVI, da CF, que fixa, como direito dos trabalhadores urbanos e rurais, “a remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal”. Realmente, a incidência do referido dispositivo constitucional, por força de “analogia legis”, afigura-se pertinente, porquanto ao empregado, em verdade, é imposta a execução de uma atividade extraordinária, não prevista em seu contrato de trabalho. Faz jus, pois, o obreiro, ao pagamento de um adicional de 50% (cinqüenta por cento), calculado sobre a sua remuneração, como decorrência do exercício da atividade extra contratual de carregador/descarregador de caminhão. Recurso de revista provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Acumulação de funções - motorista de caminhão e carregador/descarregador - salário cumulativo - pagamento de adicional de50% sobre a remuneração - serviço extraordinário - aplicação analógica do artigo 7°, inciso XVI da CF/l 988. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito provido. (TST-RR-590.894/99 — 4a Turma—Rel. Min. Milton de Moura França —DJU 19.05.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 398 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. EXPOSIÇÃO A RAIOS SOLARES Adicional de insalubridade. Exposição a raios solares. NR 15/MTB, anexo 7. Tanto o Anexo 7 da NR 15 do Ministério do Trabalho, como a própria NR 15, submetem a insalubridade jurídica a inspeção e laudo, o que não se compatibiliza com as peculiares condições da sujeição a raios solares. Disso se conclui impertinente a concessão de adicional de insalubridade para o trabalhador em atividade a céu aberto, dada a falta de previsão legal. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Rurícola - adicional de insalubridade - exposição aos raios solares. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito-provido. (TST-RR-351.932/97 - 3a Turma - Rel. Min. José Luiz Vasconcellos — DJU 12.05.2000) ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. EQUIPARAÇÃO SALARIAL Constatado que o art. 2o do Decreto n° 93.412/86, apesar de ter condicionado o direito ao adicional de periculosidade ao exercício das atividades discriminadas no seu anexo, fez profissão de fé quanto a irrelevância do cargo e da categoria do empregado, além do ramo da empresa, não se pode recorrer à definição dada pela ABTN ao sistema elétrico de potência como sendo o “conjunto de circuitos elétricos interrelacionados, que compreende a instalação para geração, transmissão e distribuição de energia elétrica até a medição inclusive”. É que dela se infere que o direito ao adminículo teria ficado circunscrito ao trabalho prestado às empresas do setor de energia elétrica, pois são as únicas que se dedicam às atividades ali detalhadas. Para conciliar o disposto no anexo do Decreto com o declarado objetivo do legislador de universalizar o direito ao adicional de periculosidade, é forçoso interpretar vulgarmente o sistema de potência como sendo o conjunto de instalações elétricas em que a tensão é igual ou superior a 380 volts, por ser a tensão utilizável no setor industrial, em contraposição ao sistema de consumo em que a tensão é igual ou inferior a 220 volts. Comprovado que o reclamante trabalhava em área em que a tensão era de 220 volts, não tem direito ao adicional, em que pese à conclusão da perícia, por conta da condição do juiz, consagrada no art. 436 do CPC, de perito peritorum. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Adicional de periculosidade - empregado de empresa consumidora de energia elétrica - atividade de manutenção de elevadores. Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. II - Equiparação salarial - identidade de funções - inexistência. - Recurso não conhecido - violação legal e contrariedade a enunciado indicadas não caracterizadas. (TST-RR347.753/97 - 4a Turma - Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen - DJU 24.05.2000) ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. LAUDO PERICIAL EMPRESTADO É plenamente possível o uso de laudo pericial emprestado na lide trabalhista, para fins de apuração da existência da periculosidade, sempre que observadas as mesmas Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 399 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA condições de trabalho entre os laboristas, com o laudo se referindo a um único local de trabalho e na mesma empresa, enfim retratando uma realidade laborativa, em idênticas condições ambientais. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Adicional de periculosidade - laudo pericial emprestado - identidade de local de trabalho. - Recurso não conhecido. (TST-RR488.514/98 - 2a Turma - Rel. Juiz Convocado Márcio Ribeiro do Valle - DJU 04.08.2000) ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. PILOTO DE AERONAVE O simples fato de o empregado encontrar-se presente quando do abastecimento da aeronave não lhe garante, por si só, o direito ao percebimento do adicional de periculosidade, porquanto ausente a exposição ao risco em caráter permanente. Inteligência extraída do artigo 193 da CLT. Recurso de revista conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Adicional de periculosidade - contato intermitente - piloto de aeronave. - Conhecido por violação do artigo 193 da CLT. - Mérito - provido. (TST-RR-294.897/96 -1a Turma - Rel. Min, João Oreste Dalazen - DJU 04.08.2000) ADICIONAL DE TRANSFERÊNCIA. REEMBOLSO. DESPESAS DE MUDANÇA Adicional de transferência. Inexistência de comprovação da alegação de que a transferência ocorreu de modo provisório. Não é devido, em conseqüência, o pagamento do adicional de transferência. Reembolso. Despesas de mudança. Art. 470 da CLT. Devido o pagamento das despesas de retorno do Reclamante ao local de origem, mesmo após a rescisão do contrato de trabalho. Recurso de revista a que se dá provimento parcial. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Adicional de transferência - exercente de cargo de confiança- previsão em cláusula contratual - transferência temporária. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. II - Reembolso de despesas - retorno do empregado ao local de origem - mudança posterior à rescisão do contrato de trabalho. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. (TST-RR-524.458/98 - 5a Turma - Rel. Min. Gelson de Azevedo - DJU 19.05.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 400 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ADMISSIBILIDADE. RECURSO JUDICIAL Eficácia da norma processual no tempo. Regência do ato recursal pela norma vigente na época da prolação da decisão recorrida. Inaplicabilidade das normas inscritas na Lei n° 9.756/98. Válida instrumentação realizada nos moldes da antiga redação do art. 897 da CLT e da Instrução Normativa n° 6/96 do TST. Tendo-se originado a decisão guerreada num momento processual pretérito, com base na vigência de normas processuais pretéritas e a ela contemporâneas, caberá às partes a utilização de recurso próprio erigido sob o manto daquele ordenamento legal vigente, sob pena de malferir-se os mais comezinhos princípios do direito processual civil e constitucional (artigo 6°, da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, e o princípio da igualdade jurisdicional, artigo 5°, incisos LIV e LV, da Constituição da República). É de se revelar, também, que as partes detêm, pelo princípio processual da disponibilidade, a possibilidade de apresentar-se em juízo da melhor maneira que lhes aprouver, podendo, portanto, a qualquer momento e dentro do prazo que é conferido utilizar-se do meio processual que lhes é legalmente oferecido. Conclui-se, conseqüentemente, que as disposições inscritas na Lei n° 9.756/98, somente se aplicam aos agravos interpostos contra despachos denegatórios exarados em data posterior à edição daquela. Portanto, na presente hipótese há de ser consagrado o entendimento de que preenchia o agravo todos os requisitos exigidos pelo artigo 897 da CLT, antes da edição da Lei n° 9.756/98, e pela Instrução Normativa n° 6/96 do Colendo Tribunal Superior do Trabalho. Embargos conhecidos e providos. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Agravo de instrumento - formação - traslado deficiente - ausência de peça essencial - certidão de publicação do acórdão recorrido - Lei n° 9.756/1998 - interposição anterior à vigência da norma. - Conhecido por violação do artigo 897 da CLT. - Mérito - embargos acolhidos. (TST-EAIRR545.564/99 - SBDI 1 -Rel. Min. José Luiz Vasconcellos - DJU 04.08.2000) ADVOGADO. CARGO DE CONFIANÇA Advogado de instituição financeira. Inexistência de cargo de confiança. 7a e 8a horas de trabalho como extras. O empregado de instituição financeira que exerce a função de advogado não está enquadrado na exceção prevista no artigo 224, § 2°, da CLT, fazendo jus, portanto, ao pagamento das 7a e 8a horas de trabalho como extras. O simples fato de o advogado representar o banco em juízo não caracteriza cargo de confiança, eis que o poder de representação é inerente à própria função advocatícia. Recurso de revista conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Advogado - enquadramento - bancário cargo de confiança-horas extras. - Conhecido por divergência jurisprudencial. -Mérito - provido. (TST-RR-318.188/96 - 3 a Turma - Rel. Min. José Luiz Vasconcellos DJU 19.05.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 401 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ADVOGADO. JORNADA DE TRABALHO. HORAS EXTRAS Advogado. Jornada de trabalho. Horas extras. Lei n° 8.906/94. Ficando caracterizada a dedicação exclusiva, porque a jornada de trabalho do advogado empregado não ultrapassava a quarenta horas semanais, conforme previsto em contrato de trabalho firmado entre as partes, mesmo com a edição da Lei n° 8.906/94 e na ausência de acordo individual ou convenção coletiva que altere o contrato, não faz jus ao pagamento de horas extras advogado empregado. Recurso de revista a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Advogado empregado - jornada de trabalho de 8 horas diárias contratada anteriormente à vigência do novo Estatuto da OAB - regime de dedicação exclusiva - aplicabilidade do artigo 20 da Lei n° 8.906/1994 - horas extras. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-358.603/97 - 3a Turma - Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula - DJU 23.06.2000) AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRASLADO DE PEÇAS Agravo de instrumento. Ausência do traslado da certidão de publicação do acórdão regional. Art. 897, § 5o, da CLT. Lei n° 9.756/98. O caput do § 5o do artigo 897 da CLT permite, no caso de provimento do instrumento, o imediato julgamento do recurso denegado, competindo ao Juiz, ao analisar o apelo, verificar o preenchimento dos pressupostos extrínsecos de conhecimento para o seu regular processamento. Em assim sendo, para que a egrégia Turma caso proveja o agravo, tenha condições de analisar a tempestividade da revista, é de lógica conseqüência a imperatividade do traslado da cópia da certidão de publicação da v. decisão regional, máxime em se considerando que o exame da admissibilidade do recurso de revista pelo juízo a quo não possui eficácia vinculante para o juízo ad quem. Revela-se, então, obrigatório o traslado de peças que viabilizem a aferição da tempestividade da revista, sendo certo que, dentre elas, a certidão de publicação do acórdão concernente ao julgamento da decisão regional, nos termos do § 5o do art.897 da CLT, com a redação conferida pela Lei n° 9.756/98, é a única hábil a comprovação do exigido, revelando-se peça essencial. Recurso não conhecido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Admissibilidade do agravo de instrumento formação - traslado deficiente - ausência de peça essencial - certidão de publicação do acórdão recorrido. - Embargos não conhecidos - violações legais indicadas não caracterizadas. (TST-EAIRR-545.098/99 - SBDI 1 - Rel. Min. José Luiz Vasconcellos DJU 09.06.2000) Rev. TST, Brasília, vol, 66, nº 3, jul/set 2000 402 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA AJUDA-ALIMENTAÇÃO. NATUREZA SALARIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÉPOCA PRÓPRIA Ajuda-alimentação. PAT. Natureza salarial. Ausência. A ajuda-alimentação fornecida pelas empresas em decorrência do Programa de Alimentação do Trabalhador não possui natureza salarial. Isto porque o Decreto n° 5, de 14 de janeiro de 1991. ao dispor sobre a matéria, estabeleceu, em seu artigo 6°, que a parcela paga in natura pela empresa não tem natureza salarial, não se incorporando à remuneração para quaisquer efeitos. Trata-se, aliás, de disposição que em tudo se coaduna com o espírito da Lei n° 6.321/76 que, em seu artigo 3°, já descaracterizava a natureza salarial das parcelas in natura pagas em decorrência do PAT, ao estabelecer que estas não se incluíam como salário de contribuição que, por sua vez, segundo a Lei n° 8.212/91 (art. 28), nada mais é do que “a remuneração efetivamente recebida ou creditada a qualquer título, durante o mês, em uma ou mais empresas, inclusive os ganhos habituais sob a forma de utilidades”. Correção monetária. Época própria. O pagamento dos salários até o 5° dia útil do mês subseqüente ao vencido não estará sujeito à correção monetária. Se essa data-limite for ultrapassada, incidirá o índice de correção monetária do mês subseqüente ao da prestação dos serviços, isto porque razão não haveria para computara correção monetária relativa ao mês do cumprimento da obrigação se a própria lei estabelece tolerância até o 5° dia útil do mês subseqüente. Recurso de revista provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Salário in natura - PAT. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. II - Correção monetária - salário - época própria. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. III Competência da Justiça do Trabalho - descontos previdenciários e fiscais. - Recurso não conhecido por aplicação do Enunciado n° 337 do TST. (TST-RR-457.492/98 - 4a Turma —Rel. Min. Milton de Moura França - DJU 02.06.2000) APOSENTADORIA ESPONTÂNEA. EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO Extinção do contrato de trabalho. Aposentadoria espontânea. Nova contratação sem concurso público. Segundo o entendimento da egrégia Seção de Dissídios Individuais desta Corte, com a concessão da jubilação, extingue-se o contrato de trabalho, iniciando-se, a partir da readmissão do empregado na empresa, um novo pacto laboral, com efeitos jurídicos próprios, nos termos do art. 453 da CLT. Impossível, no entanto, estabelecer novo contrato de trabalho coma recorrente, sociedade de economia mista, sem a aprovação em concurso público, nos termos do art. 37, II, da Constituição Federal. Recurso não conhecido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Aposentadoria voluntária - extinção do contrato de trabalho - recontratação - nulidade - ausência de concurso público - data posterior à Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 403 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA CF/1988. - Recurso não conhecido por aplicação do Enunciado n° 333 do TST. (TSTRR-497.712/98 - 2a Turma - Rel. Min. Vantuil Abdala - DJU 04.08.2000) AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO. INCORPORAÇÃO AO SALÁRIO Auxílio-alimentação. Pagamento no decorrer do contrato e durante a aposentadoria. Incorporação ao salário. Supressão. Ilegalidade. Tendo os reclamantes percebido valores pecuniários a título de auxílio-alimentação na atividade e na inatividade, por mais de 23 (vinte e três) anos, afigura-se ilegal a supressão desses valores, durante a aposentadoria, ao argumento de cumprir determinação do Ministério da Fazenda que entendera ser ilegal a extensão da vantagem aos aposentados. Hipótese fática em que o pagamento do auxílio-alimentação, desde o início, se configurou em verba de natureza salarial (CLT, art. 458), não havendo campo, portanto, para aplicação das disposições contidas na legislação que disciplina o PAT Programa de Alimentação do Trabalhador (Lei n° 6.321/76). Recurso de revista parcialmente conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de deserção argüida em contra-razões - custas processuais. - Preliminar rejeitada. II - Auxílio-alimentação - natureza jurídica - habitualidade - incorporação - complementação de aposentadoria. - Conhecido por divergência jurisprudencial - violações legais e contrariedade a enunciado indicadas não caracterizadas. - Mérito - provido. (TST-RR-583.260/99 - 3a Turma - Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula - DJU 30.06.2000) AVISO PRÉVIO SUPERIOR A 30 DIAS Aviso prévio superior a 30 dias. Contagem para todos os fins. As verbas rescisórias devem ser calculadas levando-se em conta o tempo de aviso prévio, não importando ter sido este prazo estipulado por negociação das partes ou por concessão da empresa, eis que a integração do aviso prévio no tempo de serviço e a repercussão das verbas rescisórias sobre o mesmo decorrem de lei (§ 1°, art. 487, CLT), além disso, a jurisprudência desta Corte, consubstanciada na Orientação Jurisprudencial n° 82, é no sentido de que a data da saída do empregado a ser anotada na CTPS é a do término do aviso prévio, ainda que indenizado. Revista não conhecida. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão regional por negativa de prestação jurisdicional. - Preliminar não conhecida. II - Aviso prévio de 60 dias previsto em cláusula normativa - projeção para efeito de contagem de tempo de serviço - reflexos nas verbas rescisórias. - Recurso não conhecido. III - Adicional de transferência - previsão em cláusula contratual - transferência temporária - ferroviário. - Recurso não conhecido. IV - Preenchimento do SB-40 e da multa diária - ausência de prequestionamento. - Recurso não conhecido. V - Multa - embargos declaratórios protelatórios. - Recurso não conhecido. (TST-RR-536.283/99-2a Turma -Rel. Min. Vantuil Abdala-DJU 04.08.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 404 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA CIPEIRO. INQUÉRITO O art. 165 da CLT expressamente ressalva em seu parágrafo único que o motivo para a despedida de membro da CIPA pode ser comprovada na reclamação ajuizada na Justiça do Trabalho. Logo, é desnecessária a instauração de inquérito judicial para apuração de justa causa de empregado detentor de estabilidade provisória, oriunda de sua condição de integrante da CIPA. Recurso de revista conhecido e desprovido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Estabilidade provisória - membro titular da CIPA - falta grave - dispensa por justa causa - inquérito judicial - necessidade. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR358.967/97 - 5a Turma - Rel. Min. Rider Nogueira de Brito - DJU 02.06.2000) COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. DANO MORALE MATERIAL Ação rescisória. Competência material da Justiça do Trabalho. Indenização por dano moral e material decorrente do contrato de trabalho. Apesar da matéria, objeto da decisão rescindenda, ser controvertida, trata-se de matéria constitucional (Competência da Justiçado Trabalho, art. 114 da Constituição Federal). Assim, a jurisprudência desta Corte tem firmado orientação no sentido de que a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar dissídios em que se discute o direito à indenização por dano moral e material, se tal discussão teve origem no contrato de trabalho. Recurso ordinário a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - competência da Justiça do Trabalho - indenização por danos morais e materiais - contrato de trabalho. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROAR-458.283/98 - SBDI 2 - Rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho - DJU 30.06.2000) COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. PREVIDÊNCIA PRIVADA Pedido de restituição de valores relativos à reserva de poupança da entidade de previdência privada. Preliminar de incompetência da Justiça do Trabalho. Inexistência de relação de emprego em litígio. Violação do art. 114 da Constituição Federal. O art. 114 da Constituição Federal delimita a competência da Justiça do Trabalho ao dispor que “compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas”. Nesse contexto, para fixar a competência desta Justiça especializada, impende perquirir qual o elemento determinante para a satisfação do pedido postulado Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 405 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA em juízo: a existência de contrato de trabalho com a empresa reclamada ou a associação à entidade providenciaria. Ora, em se tratando de pedido de restituição de reserva de poupança em razão da remessa contratual, em razão da rescisão contratual, a lide não decorre do vínculo empregatício, na forma em que estabelece o referido dispositivo constitucional, e sim da livre opção que levou os reclamantes a associarem-se à entidade previdenciária e contribuir para o seu Departamento de Aposentadoria e Benefícios. Trata-se, portanto, de entidade de direito privado que goza de personalidade jurídica própria, instituída com a finalidade de proporcionar aos empregados que livremente aderiram ao referido plano a complementação de aposentadoria concedida pela Previdência Social. Dessa forma, a concorrência da reclamada com recursos financeiros não atrai a competência para esta Justiça especializada, já que a própria Lei n° 6.435/77 - que regulamenta as entidades de previdência privada -, em seu artigo 1°, ao prever que” entidades de previdência privada, para efeitos da presente lei, são as que têm por objeto instituir planos privados de concessão de pecúlios ou de rendas, de benefícios complementares ou assemelhados aos da Previdência Social, mediante contribuição de seus participantes, dos respectivos empregadores ou de ambos”, abre a possibilidade para que o empregador atue como agente arrecadador e patrocinador da entidade previdenciária, sem que disso resulte vinculação com o contrato de trabalho. Recurso de embargos provido para julgar incompetente esta Justiça especializada para apreciar e julgar a lide. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Incompetência da Justiça do Trabalho - restituição de valores- reserva de poupança de entidade de previdência privada. - Conhecido por violação do artigo 114 da CF/1988. - Mérito - embargos acolhidos. (TSTERR-194.807/95 - SBDI 1 -Rel. Min. Milton de Moura França - DJU 16.06.2000) CONFISSÃO FICTA. USO DE BIP A confissão ficta gera presunção de veracidade dos fatos articulados pela parte adversa, cabendo ao julgador o respectivo enquadramento. In casu, o fato, fictamente confessado, de que o reclamante podia ser acionado mediante a utilização de BIP não é constitutivo do direito ao pagamento de horas extras ou de horas de sobreaviso. Decisão em consonância com a Orientação Jurisprudencial n° 49 da SDI. Recurso de que não se conhece. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Sobreaviso - uso do BIP - confissão ficta. Recurso não conhecido - violação legal, divergência jurisprudencial e contrariedade de enunciado indicadas não caracterizadas. II - Horas extras - uso do bip - sobreaviso. - Recurso não conhecido por aplicação do Enunciado n° 333 do TST. (TST-RR582.480/99 -5a Turma - Rel. Min. Gelson de Azevedo - DJU 12.05.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 406 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. RESCISÃO. MULTA RESCISÓRIA. QUITAÇÃO INCOMPLETA DAS VERBAS RESCISÓRIAS Contrato de experiência. Cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão antes do termo final. Pagamento relativo à estabilidade acidentária (Lei n° 8.213/91). Indevida. Existindo cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão do contrato de experiência antes do seu término (CLT, art. 481), e exercitada a faculdade pelo Empregador, não há como deferir o pagamento relativo à estabilidade acidentária prevista no artigo 118 da Lei n° 8.213/91. Na hipótese, o contrato por prazo determinado, quando rescindido antecipadamente, não se transmuda, naturalmente, em contrato por prazo indeterminado, mas, tão-somente, observa os princípios que regem a rescisão dos contratos por prazo indeterminado. Multa rescisória (CLT, art. 477, § 8o). Quitação incompleta das verbas rescisórias. A quitação incompleta dos valores pecuniários devidos ao trabalhador por ocasião da rescisão contratual importa em mora salarial, sendo devido, portanto, o pagamento da multa prevista no § 8o do art. 477 da CLT. Entendimento de 2o grau que se mantém (Enunciado n° 221 do TST). Recurso de revista parcialmente conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de inconstitucionalidade do artigo 118 da Lei n° 8.213/1991. - Preliminar não conhecida por aplicação do Enunciado n° 333 do TST. II - Acidente do trabalho - estabilidade provisória - cláusula assecuratória do direito recíproco de rescisão antecipada - contrato de experiência. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito -provido. III - Multa - artigo 477 da CLT - pagamento incompleto das verbas rescisórias - caracterização - atraso no pagamento. - Recurso não conhecido por aplicação dos Enunciados n°s 221 e 297 do TST. (TST-RR-590.008/99 — 3a Turma - Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula — DJU 23.06.2000) DESCONTOS SALARIAIS. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E FISCAL Contribuição previdenciária e fiscal. Sujeito passivo da obrigação. A eventual inobservância de prazo no pagamento de tributos gera uma penalidade pecuniária, mas não tem o condão de alterar o sujeito passivo direto da obrigação tributária (art. 113, § 3o, do CTN). Somente por disposição expressa da lei se pode excluir a responsabilidade do contribuinte, transferindo o respectivo encargo financeiro com o tributo para terceiros, (art. 128 do CTN). Revista conhecida e provida. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Descontos previdenciários e fiscais - ônus do pagamento - empregado. - Conhecido por violação do artigo 46 da Lei n° Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 407 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA 8.541/1992 e artigo 12 da Lei n° 7.787/1989. - Mérito - provido. (TST-RR-358.513/97 - 5a Turma - Rel. Min. Rider Nogueira de Brito - DJU 04.08.2000) DESERÇÃO. DEPÓSITO RECURSAL Recurso de revista. Deserção. Depósito recursal. Interesses conflitantes. Inexistência de litisconsórcio unitário. Inteligência dos arts. 48 e 509 do CPC. Segundo inteligência do artigo 48 do CPC, “os litisconsortes serão considerados, em suas relações com a parte adversa, como litigantes distintos; os atos e omissões de um não prejudicarão nem beneficiarão os outros”. Igualmente é peremptório o artigo 509 do CPC, de aplicação subsidiária no Processo do Trabalho, ao dispor que “o recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo se distintos ou opostos seus interesses”. Logo, não se revela juridicamente acertado que a recorrente, MRS Logística S.A., possa se beneficiar do depósito feito pela Rede Ferroviária Federal S/A, considerando que ambas as reclamadas têm interesses conflitantes na presente ação, já que pretendem ver-se excluídas da lide. Registre-se, ademais, que o mandamento contido no artigo 509 do CPC somente é aplicável na hipótese em que há litisconsórcio unitário. Realmente, somente nesse caso é que se justifica o aproveitamento do efeito do recurso aos litisconsortes omissos, tendo em vista a necessária uniformidade com que deve ser solucionada a lide. Recurso de revista não conhecido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Deserção - condenação solidária - depósito recursal efetuado por um único reclamado - interesses conflitantes. - Recurso não conhecido. (TST-RR-540.236/99 - 4a Turma - Rel. Min. Milton de Moura França - DJU 04.08.2000) DESERÇÃO. DEPÓSITO RECURSAL. VALIDADE Deserção. Depósito recursal realizado em agência do próprio reclamado. Validade. A Lei n° 8.036/90 conferiu à Caixa Econômica Federal a atribuição de agente operador dos depósitos do FGTS, assumindo o controle de todas as contas, passando os demais estabelecimentos bancários à condição de agentes recebedores e pagadores do FGTS. O Banco Reclamado, ao realizar o depósito recursal em sua própria agência, indicou o nome do reclamante e o número de seu PIS/PASEP, a finalidade do depósito interposição de recurso ordinário -, o número do processo e a JCJ de origem. O depósito recursal realizado pelo Reclamado nesses moldes atende ao sistema legal implantado com a Lei n° 8.030/90, quanto à realização do depósito na conta vinculada do FGTS. Configurada a violação do art. 899,§§ 1° e 4°, da CLT. Recurso de Revista provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Deserção - depósito recursal realizado no próprio banco reclamado. - Conhecido por violação do artigo 899, parágrafos 1° e 4° Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 408 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA da CLT. - Mérito - provido. (TST-RR-357.540/97 - 5a Turma - Rel. Min. Rider Nogueira de Brito - DJU 26.05.2000) DIRIGENTES SINDICAIS. NÚMERO. ABUSO DE DIREITO O entendimento de que a entidade sindical incorreu em abuso de direito ao permitir que 54 empregados da empresa integrassem a diretoria da Federação não afronta de forma direta o art. 8°, I, da Constituição da República, pois a autonomia prevista constitucionalmente não pode ser usada para garantir estabilidade a membros integrantes da diretoria que supera em muito a razoabilidade. Recurso de revista não conhecido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: Recurso do empregado. I - Estabilidade sindical - dirigente sindical - número de empregados beneficiados - limitação - incompetência da Justiça do Trabalho. - Recurso não conhecido - violação legal indicada não caracterizada - aplicação dos Enunciados n°s 337 e 297 do TST. Recurso adesivo da empresa. - Prejudicado. (TST-RR-355.540/97 - 5a Turma — Rel. Min. Rider Nogueira de Brito — DJU 02.06.2000) DISPENSA IMOTIVADA. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA O art. 173, § 1°, da Constituição Federal é explícito ao asseverar que a empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica sujeitam-se ao regime próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias. Interpretando-se o referido dispositivo constitucional, conclui-se que a reclamada, sociedade de economia mista, deve observar, para a contratação e demissão de seus empregados, o que determina a CLT e a legislação complementar, razão pela qual pode, usando da prerrogativa do exercício de direito potestativo, que o já mencionado dispositivo constitucional lhe confere, dispensá-los imotivadamente. A possível antinomia entre a necessidade de realização de concurso público para contratar (CF, art. 37, II) e a possibilidade de dispensa sem justa causa se resolve pela não imposição, às empresas estatais, de mais ônus do que os já previstos na Constituição, sob pena de invializá-las, quando operarem em regime concorrencial. Recurso de revista conhecido a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Empregado público - motivação para a sua despedida - reintegração. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-589.109/99 - 4a Turma - Rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho — 04.08.2000) EMPREGADO DOMÉSTICO. RESCISÃO Empregado doméstico. Homologação do termo de rescisão do contrato de trabalho. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 409 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA Quanto aos trabalhadores domésticos, não havendo previsão na legislação específica ou no parágrafo único do artigo 7 da Constituição Federal, inexiste obrigatoriedade de homologação perante o Sindicato do termo de sua rescisão contratual, mesmo quando conta o citado trabalhador com mais de um ano de serviço. Revista provida. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão regional por negativa de prestação jurisdicional. - Preliminar não analisada - artigo 249, parágrafo 2°, do CPC. II - Empregada doméstica - rescisão contratual - homologação pelo sindicato. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. (TST-RR582.904/99 - 2a Turma - Rel. Juiz Convocado Márcio Ribeiro do Valle — DJU 16.06.2000) ESTABILIDADE. CONCURSO PÚBLICO. CELETISTA Admissão mediante concurso público. Contratação sob regime celetista. Estabilidade do art. 41 da Constituição Federal de 1988. Inaplicabilidade. A conclusão de que o empregado público, ainda que admitido mediante concurso público de ingresso (artigo 37, II, da CF/88), sob o regime da legislação trabalhista, não se beneficia da estabilidade constitucionalmente assegurada, porque destinada apenas aos servidores públicos civis, submetidos ao regime estatutário e ocupantes de cargos públicos criados por lei, não viola frontal e literalmente o art. 41 da Constituição Federal. A expressa referência a “cargo” e à “nomeação”, contida no caput deste dispositivo e em seu § 1o, “exclui a aplicação do dispositivo para os servidores admitidos ou contratados para o desempenho de emprego ou função pública”. Recurso de revista não provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I-Estabilidade-artigo 41 da CF/l 988 -servidor público estadual regido pela CLT - ingresso por concurso público. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-353.492/97 - 4a Turma - Rel. Min. Milton de Moura França - DJU 04.08.2000) ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DE TRABALHO Estabilidade provisória. Acidente de trabalho. Reintegração. Inconstitucionalidade do art. 118 da Lei n° 8.213/91. O caput do art. 118 da Lei n° 8.213, de 24-7-91, estabelece que o segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de 12 (doze) meses, a manutenção de seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente. E a atual Constituição Federal, ao consagrar os princípios da proteção contra a despedida arbitrária, ou sem justa causa, o fez de forma ampla e genérica, amparando também os trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho. Assim, verifica-se que o art. 118 da Lei n° 8.213/91 se harmoniza perfeitamente com o disposto no art. 7o, inciso I, do Texto Maior, não havendo necessidade, no caso vertente, de lei complementar. O texto legal é claro ao prever a Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 410 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA garantia, mantendo o contrato de trabalho do empregado por, no mínimo, 12 (doze) meses. Revista conhecida e desprovida. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Doença profissional - estabilidade provisória - efeitos após o término do período de 12 meses previsto na Lei n° 8.213/1991. Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR553.830/99 - 2a Turma - Rel. Min. José Luciano de Castilho Pereira - DJU 02.06.2000) ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ASSOCIAÇÃO PROFISSIONAL. DIRIGENTES Não existe mais a possibilidade de uma associação profissional ter a representatividade dos empregados nas mesmas condições que os sindicatos, tendo em vista a inexistência de autorização do Ministério do Trabalho para a criação de Sindicato. Em assim sendo, não há sentido para que os dirigentes de uma associação profissional gozem de estabilidade. Logo, não há se falar em violação dos artigos 543, § 3°, da CLT e 8°, inciso III, da Constituição da República, muito menos em contrariedade ao Enunciado n° 222 do TST, este já cancelado pelo órgão especial deste Tribunal, permanecendo intacto o artigo 896 da Consolidação das Leis do Trabalho. Recurso de embargos não conhecidos. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Admissibilidade - recurso de embargos admissibilidade - recurso de revista - estabilidade provisória - dirigente de associação profissional - Enunciado n° 222 do TST - cancelamento - incompatibilidade com a CF/l 988. - Embargos não conhecidos - violações legais e contrariedade a enunciado indicadas não caracterizadas. (TST-ERR-164.772/95 - SBDI 1 - Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula - DJU 30.06.2000) ESTABILIDADE PROVISÓRIA. CIPEIRO. FALTA GRAVE Estabilidade provisória do cipeiro. Prática de falta grave. Desnecessidade de inquérito judicial. O art. 494 da CLT, que prevê a necessidade de inquérito judicial para apuração de falta grave imputada a empregado estável, pertine à estabilidade decenal, que era aquela adquirida pelo empregado após mais de dez anos de serviço na mesma empresa. Em caso de estabilidade provisória do cipeiro, assegurada pelo art. 10, II, b, do ADCT da Constituição Federal, o dispositivo constitucional é de meridiana clareza ao vedar a dispensa do empregado, nessas condições, se inexistente justa causa. Na mesma linha, o art. 165 da CLT assevera que, ocorrendo a despedida do titular da representação dos empregados na CIPA, caberá ao empregador, se acionado na Justiça do Trabalho, comprovar a existência da justa causa. Não prevêem, como se infere, a necessidade de instauração de inquérito judicial para apuração da falta. Ademais, o Regional, que é soberano na apreciação do material fático-probatório dos autos, entendeu caracterizada Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 411 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ajusta causa, por incontinência de conduta, mau procedimento e embriaguez em serviço do reclamante. Nesse compasso, não tem aplicação ao caso o art. 494 da CLT, ante o que dispõem os arts. 165 da CLT e 10, II, b, do ADCT da Carta Magna. Recurso de revista a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Estabilidade provisória - membro de CIPA - falta grave - dispensa por justa causa - inquérito judicial - necessidade. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-556.215/99 -4a Turma - Rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho - DJU 12.05.2000) ESTABILIDADE PROVISÓRIA. CIPEIRO. REINTEGRAÇÃO Membro da Cipa. Estabilidade provisória. Reintegração. Trata o caso dos autos de interpretação do art. 10, II, a, do ADCT, indicado como violado na ação rescisória, o que afasta a alegação de controvérsia em torno da matéria, uma vez que dispositivo constitucional não comporta exegese razoável, admitindo apenas uma única interpretação. Ora, este dispositivo limita o período estabilitário a até 1 (um) ano após o término do mandato como membro da CIPA, não assegurando o direito à reintegração, mas, logicamente, apenas aos salários do período, por se tratar de estabilidade provisória. Recurso ordinário não provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - estabilidade provisória membro titular da CIPA - reintegração - indenização - período estabilitário exaurido. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROAR-530.280/99 - SBDI 2 - Rel. Min. José Luciano de Castilho Pereira-DJU 04.08.2000) ESTABILIDADE PROVISÓRIA. DIRETOR DE COOPERATIVA Estabilidade provisória. Diretor de cooperativa de empregados que admite terceiros em seu quadro social. Não se entende, considerando a natureza jurídica de tal tipo de cooperativa, que o empregador que fica alheio ao quadro dos cooperados com relação a muitos dos quais não mantém nenhuma relação jurídica, se vincule à mantença da estabilidade daquele que, sendo seu empregado, seja eleito diretor. Quando a cooperativa é só de empregados, a estabilidade visa assegurar a independência do diretor na gestão da cooperativa. Quando, todavia, o quadro é formado de forma complexa, não vemos porque atribuir àquele que é empregador de um dos diretores eleitos, entre os muitos que poderiam sê- lo, de garantir-lhe a estabilidade. Embargos parcialmente conhecidos mas não providos. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão regional por negativa de prestação jurisdicional. - Preliminar não conhecida - violações legais indicadas não caracterizadas. II - Estabilidade provisória - diretor de cooperativa. - Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 412 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - embargos rejeitados. (TST-RR260.651/96 - SBDI 1 - Rel. Min. José Luiz Vasconcellos - DJU 09.06.2000) ESTABILIDADE PROVISÓRIA. PERÍODO PRÉ-ELEITORAL Ação rescisória. Estabilidade. Período pré-eleitoral. Lei n° 7.773/89. Empresa pública. Já está pacificado nesta Corte a aplicabilidade da legislação eleitoral às empresas públicas e sociedades de economia mista. No entanto, tendo a decisão rescindenda, proferida 5 anos após o término do período estabilitário, decidido pela reintegração da Reclamante e o pagamento de todo o período do afastamento, restou vulnerado o disposto no art. 15 da Lei n° 7.773/89, uma vez que tal dispositivo limita o período estabilitário até o término do mandato presidencial. Assim, uma vez ultrapassado o período ali previsto, são devidas somente as verbas legais, desde a dispensa até o final do período estabilitário. Recurso ordinário provido. Ação cautelar apensada. Em virtude do provimento do presente recurso ordinário em ação rescisória, e pelos motivos aqui expendidos, julgo procedente o pedido da ação cautelar n° TST - AC. 556.369/99 apensada, mantendo, portanto, os efeitos da liminar concedida até o trânsito em julgado definitivo da presente ação rescisória. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - garantia de emprego - período eleitoral - empresa pública - indenização - limitação ao período da estabilidade. - Conhecido. - Mérito - provido. II - Ação cautelar - efeito suspensivo - ação rescisória. - Conhecida. - Mérito - procedente. (TST-ROAR-517.478/98 - SBDI2-Rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho - DJU 04.08.2000) EXECUÇÃO. IMPENHORABILIDADE. CRÉDITO RURAL Recurso de revista. Execução. Impenhorabilidade do bem oferecido em garantia à cédula de crédito rural. Enunciado n° 266/TST. Na hipótese do artigo 896, § 4o, da CLT, o recurso de revista somente se viabiliza ante a demonstração de ofensa direta à Constituição, que é aquela cujo aperfeiçoamento se dá sem a necessidade de se aferir, em primeiro lugar, a existência de lesão à norma legal de hierarquia inferior. No caso dos autos, toda a controvérsia gira em torno da melhor interpretação a ser conferida ao art. 69 do Decreto-Lei n° 167/67, em face do art. 184 do Código Tributário Nacional, diante da decisão proferida pelo e. Regional no sentido de não persistir a impenhorabilidade de bem oferecido em garantia de financiamento concedido pelo Banco do Brasil à empresa executada por meio de cédula rural pignoratícia, ante o caráter privilegiado do crédito trabalhista. Inviável, portanto, a admissibilidade do recurso nos termos do Enunciado n° 266 do TST. Recurso de revista não conhecido. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 413 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Admissibilidade - recurso de revista - execução de sentença - penhora - bem gravado por cédula de crédito rural - violação direta à Constituição Federal - não caracterização. - Recurso não conhecido - violação legal indicada não caracterizada. (TST-RR-527.382/99 - 4a Turma - Rel. Min. Milton de Moura França - DJU 16.06.2000) EXECUÇÃO. MASSA FALIDA Massa falida. Execução. Competência da Justiça do Trabalho. Se a Justiça do Trabalho é competente para julgar as demandas decorrentes de suas próprias sentenças, mais ainda o será para executar os créditos trabalhistas emanados de suas decisões. Na execução, portanto, que envolver os créditos trabalhistas, denominados superprivilegiados, deve prevalecer a competência da Justiça do Trabalho para processá-la, por desaparecerem as razões que recomendam a universalização do juízo falimentar para um estabelecimento uniforme do quadro de credores concorrentes ao rateio do ativo líquido da massa. Ademais, a execução trabalhista não representa, em rigor, processo autônomo, mas simples fase seqüente ao processo de conhecimento, de que se originou o título exeqüendo. Recurso conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Competência da Justiça do Trabalho - execução de créditos trabalhistas - empresa em processo falimentar. - Conhecido por violação do artigo 114 da CF/l 988. - Mérito - provido. (TST-RR-588.122/99 - 1a TurmaRel. Min. Ronaldo José Lopes Leal - DJU 02.06.2000) FÉRIAS EM DOBRO Férias em dobro. Possibilidade do pedido quando em curso o contrato. De uma simples leitura do art. 137, caput e § 1o, da CLT, extrai-se não ser necessária a ocorrência da rescisão contratual para que o empregado venha a juízo postular o pagamento em dobro das férias não concedidas dentro do chamado período concessivo. O referido art. 137 da CLT prevê uma sanção com o claro intuito de desencorajar a violação do instituto, e a aplicação de tal sanção independe de estar ou não em curso o contrato de trabalho. Falar-se em necessidade de rescisão do contrato de trabalho para se possibilitar o pedido do pagamento de férias em dobro, nos termos em que disposto no art. 137 da CLT, não coaduna com os princípios informadores do Direito do Trabalho. Recurso de revista conhecido em parte e desprovido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Férias - concessão após o período concessivo - pagamento em dobro - trabalhador rural. - Conhecido por divergência jurisprudencial - violação legal indicada não caracterizada. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-354.973/97 - 2a Turma- Rel. Min. José Luciano de Castilho Pereira - DJU 26.05.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 414 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA Recurso ordinário. Ação rescisória. Violação do art. 10, II, b, do ADCT/CF/88. Estabilidade provisória. Gestante. Desconhecimento da gravidez pelo empregador. O artigo 10, inciso II, do ADCT não impôs qualquer condição à proteção da empregada gestante. Assim, o desconhecimento da gravidez, pelo empregador, no momento da despedida imotivada não constitui obstáculo para o reconhecimento da estabilidade constitucional. Dessa forma, viola o texto constitucional a decisão que não reconhece a estabilidade da empregada gestante em virtude do desconhecimento da gravidez pelo empregador no ato da sua demissão. Recurso ordinário em ação rescisória provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - violação a literal disposição de lei - estabilidade provisória - gestante - conhecimento da gravidez pelo empregador. - Conhecido. - Mérito - provido. (TST-ROAR-400.356/97- SBDI 2-Rel. Min. Francisco Fausto Pauta de Medeiros — DJU 12.05.2000) GESTANTE. INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ. DOLO Ação rescisória. Interrupção da gravidez (dolo processual evidenciado). In casu, impõe-se o acolhimento da demanda rescisória, no que tange à premissa de dolo por parte da empregada, consistente em omitir o fato da interrupção da gravidez, nos autos originários, visando auferir vantagem indevida. O aborto ocorreu antes do julgamento do recurso ordinário, portanto quando o pleito relativo ao reconhecimento da estabilidade provisória, decorrente do seu estado gravídico, ainda se encontrava sub judice. Assim, a conduta obreira de não comunicar o fato caracterizou omissão dolosa, perfeitamente enquadrável na hipótese tipificada no inciso III do artigo 485 do CPC, porquanto reduziu a capacidade de defesa da empregadora, na medida em que impediu que ela produzisse prova tendo em vista aquele fato; além disso, influenciou o convencimento do órgão julgador, induzindo-o a emitir pronunciamento não condizente com a verdade, já que confirmou a condenação da empresa ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade na forma em que foi deferida pela sentença, isto é, considerando todo o período após o parto, quando, na verdade, esse evento não se concretizou. Recurso ordinário a que se dá parcial provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão regional por cerceamento de defesa - não intimação da ré para apresentação de documentos referentes à gravidez e sua interrupção. - Preliminar rejeitada. II - Ação rescisória - estabilidade provisória - gestante - interrupção da gravidez por aborto involuntário no curso da reclamação trabalhista - não comunicação ao juízo - dolo processual - limitação do direito a 2 semanas de repouso remunerado e à indenização do período anterior ao aborto - retomo à função como requisito do exercício do direito - inexistência em função da comprovação de assédio sexual. - Conhecido. - Mérito - parcialmente Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 415 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA provido. (TST-ROAR-357.754/97 - SBDI 2 - Rel Min. Ronaldo José Lopes Leal DJU 04.08.2000) GRATIFICAÇÃO NATALINA. CONVERSÃO PELA URV DO DIA DO PAGAMENTO Pagamento da 2a parcela do 13° salário do ano de 1994 de acordo com o disposto no art. 24 da Lei n° 8.880/94. Recurso de revista a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Conversão da moeda - URV - 13° salário antecipação - cálculo - URV do dia do pagamento. - Conhecido por divergência jurisprudencial - violações legais indicadas não caracterizadas. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-348.178/97 — 5a Turma - Rel. Min. Gelson de Azevedo — DJU 19.05.2000) GREVE. ABUSIVIDADE. DESCONTOS NAS FÉRIAS E NO PRÊMIO- ASSIDUIDADE O exercício do direito de greve, muito embora esteja assegurado constitucionalmente, somente faculta ao empregador reconhecer os dias de paralisação como faltas injustificadas, quando não for declarado abusivo tal exercício. Uma vez reconhecida a abusividade da greve, é facultado ao empregador deixar de efetuar o pagamento relativo aos salários dos dias de paralisação e deduzir esse lapso do período aquisitivo ao direito de férias. Recurso de revista conhecido, mas desprovido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Greve - declaração de abusividade - descontos nas férias e prêmio assiduidade. - Conhecido por divergência jurisprudencial. Mérito - negado provimento. (TST-RR-496.982/98 - 3a turma - Rel. Min. Francisco Fausto Paula de Medeiros-DJU 16.06.2000) GRUPO ECONÔMICO. CONTRATO COM EMPRESAS DIVERSAS Grupo econômico. Contrato com empresas diversas. Unicidade do tempo de serviço. Impossibilidade. Para efeito de indenização de antigüidade, não são computados os períodos em que o empregado tenha laborado em empresas do mesmo grupo econômico, mediante contratos de trabalho diversos. A solidariedade prevista no art. 2o, parágrafo 2o, da CLT é simplesmente passiva e para efeito de responsabilidade quanto a débitos trabalhistas das outras. Recurso parcialmente conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Indenização de antiguidade - contagem de tempo de serviço - empresas do mesmo grupo econômico. - Conhecido por divergência Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 416 jurisprudencial. - Mérito - provido. II - Domingos e feriados trabalhados e não compensados - pagamento em dobro. - Recurso não conhecido por aplicação do Enunciado n° 333 do TST. (TST-RR-385.933/97-2a Turma-Rel. Min. Vantuil Abdala - DJU 04.08.2000) HABEAS CORPUS. DEPOSITÁRIO. RECUSA DO ENCARGO Habeas corpus. Depositário. Recusa do encargo. Nomeação compulsória. Impossibilidade. Não se aperfeiçoa o depósito se a executada recusou-se a assumir o encargo de depositária do bem. A decretação de prisão civil, em decorrência da qualificação da paciente como depositária infiel, configura constrangimento ilegal, tendo em vista que, não há lei que obrigue a aceitação do encargo de depositário de um bem em processo de execução e o art. 5°, II, da Constituição Federal dispõe que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Recurso ordinário provido para conceder a ordem de habeas corpus. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Habeas corpus - execução - depositário de bens - recusa pelo executado - nomeação compulsória - não caracterização como depositário infiel. - Conhecido. - Mérito - provido. (TST-ROHC-642.336/00 - SBDI 2 Rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho - DJU 02.06.2000) HORAS EXTRAS. ACORDO DE COMPENSAÇÃO E PRORROGAÇÃO. HORAS EXTRAS. CONTAGEM MINUTO A MINUTO. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. BASE DE CÁLCULO. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÉPOCA PRÓPRIA Recurso da reclamada. Horas extras. Acordo de compensação e prorrogação de jornada simultâneos. Não existe em nosso ordenamento jurídico norma que impeça a realização de horas extras simultaneamente ao regime compensatório, desde que sejam observados, é claro, os limites legais impostos à duração da jornada de trabalho. O que há, na verdade, é a autorização expressa da norma consolidada, ex vi do art. 61, para a extrapolação do limite legal ou convencionado para a duração do trabalho na hipótese de necessidade imperiosa. Recurso provido. Horas extras. Minutos que antecedem e sucedem à jornada contratual. A jurisprudência desta corte entende que é devido o pagamento das horas extras relativas aos dias em que o excesso de jornada ultrapassa cinco minutos antes e/ou após a duração normal do trabalho. Recurso parcialmente provido. Adicional de insalubridade. Base de cálculo após a Constituição Federal de 1988. O art. 7°, XXIII, da Carta Política, ao empregar a expressão “remuneração”, apenas reconheceu o caráter remuneratório do adicional de insalubridade. Assim, tendo o Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 417 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA dispositivo constitucional remetido a regulamentação da matéria a lei ordinária, continua a regular o assunto o art. 192 da CLT, que não confronta com a Lei Maior e, por isso, está por ela recepcionado. A orientação jurisprudencial da SDI tem-se posicionado no mesmo sentido e entendido que, mesmo na vigência da Constituição, a base de cálculo do adicional de insalubridade é o salário mínimo. Recurso provido. Recurso do reclamante. Correção monetária. Época própria. A jurisprudência dominante nesta corte lixou o entendimento de que a correção monetária relativa a créditos trabalhistas tem início a partir do sexto dia útil do mês subseqüente ao do vencimento da obrigação de pagar o salário. Não conheço. Tema(s) abordado(s) no acórdão: Recurso da reclamada. I-Regime compensatório - acordo coletivo de trabalho - validade - existência simultânea de trabalho extraordinário - pagamento de horas extras. - Conhecido por divergência jurisprudencial. Mérito - provido. II - Cartão de ponto - hora extra - contagem dos minutos que antecedem ou sucedem a jornada. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito parcialmente provido. III - Adicional de insalubridade - base de cálculo - salário mínimo. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito -provido. Recurso do reclamante. I - Correção monetária - salário - época própria. - Recurso não conhecido por aplicação do Enunciado n° 333 do TST. (TST-RR-350.028/97 - 1a Turma - Rel. Min. Ronaldo José Lopes Leal - DJU 04.08.2000) HORAS EXTRAS. CONTROLE DE JORNADA. TACÓGRAFO Não se destinando o tacógrafo a comprovar que os horários trabalhados pelo empregado eram controlados pela empresa, mas apenas a aferir o controle da velocidade do veículo, não há que se falar em pagamento de horas extras. Recurso de revista parcialmente conhecido e desprovido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Motorista - trabalho externo - utilização de tacógrafo pelo empregador-jornada de trabalho - controle de horário - horas extras. Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. II - Adicional de periculosidade - ônus da prova. - Recurso não conhecido - violações legais indicadas não caracterizadas. (TST-351.969/97 - 2a Turma-Rel. Min. Vantuil Abdala- DJU 02.06.2000) HORAS EXTRAS. FOLHAS INDIVIDUAIS DE PRESENÇA. CORREÇÃO MONETÁRIA. CRÉDITOS TRABALHISTAS Horas extras. Folhas individuais de presença. O fato de a cláusula normativa estipular que as FIPs atendem às exigências do art. 74, § 2°, da CLT não tem o condão de impedir que elas possam ser desconstituídas por meio de prova oral, quando esta atestar que os registros não correspondem à real jornada cumprida pelo empregado. Entendimento contrário implica flagrante desrespeito ao Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 418 princípio da primazia da realidade, onde o aspecto formal deve ceder lugar à realidade fática. Correção monetária. O marco inicial da correção monetária dos créditos trabalhistas ocorre a partir do 5o dia útil do mês subseqüente ao do vencimento da obrigação de pagar salários. Recurso em parte conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão regional por negativa de prestação jurisdicional. - Preliminar não conhecida - violações legais e divergência jurisprudencial indicadas não caracterizadas. II - Horas extras - prova testemunhal - prevalência sobre folhas individuais de presença previstas em norma coletiva. - Conhecido por divergência jurisprudencial - violações legais indicadas não caracterizadas. - Mérito - negado provimento. III - Correção monetária - salário época própria. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. IV Desconto - CASSI e PREVI. - Recurso não conhecido - violações legais e divergência jurisprudencial indicadas não caracterizadas - aplicação do Enunciado n°296 do TST. V - Honorários advocatícios. - Recurso não conhecido - violações legais indicadas não caracterizadas - aplicação dos Enunciados n°s 126 e 296 do TST. (TST-RR453.029/98 - 2a Turma - Rel. Min. José Luciano de Castilho Pereira - DJU 30.06.2000) HORAS EXTRAS. INTEGRAÇÃO AOS SALÁRIOS VINCENDOS Integração das horas extras aos salários vincendos. Sentença condicional. O art. 290 do Código de Processo Civil é claro ao dispor que, quando a obrigação consistir em prestações periódicas, considerar-se-ão elas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor, se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las, a sentença as incluirá na condenação, enquanto durar a obrigação. Extrai-se, do referido texto legal, que as prestações vincendas devem ser concedidas pela sentença de cognição, independentemente de o autor as ter pedido e enquanto durar a obrigação. Recurso de revista conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Horas extras - integração ao salário - pagamento das parcelas vincendas - sentença condicional - não caracterização. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. (TST-RR-467.756/98 - 2ª Turma - Rel. Min. José Luciano de Castilho Pereira - DJU 30.06.2000) INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA Incompetência da Justiça do Trabalho. Ação civil pública. Segurança em estabelecimentos bancários. A Justiça do Trabalho não é competente para dirimir ação civil pública versando sobre segurança bancária, pois, além de essa matéria não estar elencada no art. 114 da Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 419 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA Constituição Federal, a atribuição de autorizar e fiscalizar o funcionamento dos estabelecimentos bancários, após verificado o preenchimento dos requisitos mínimos de segurança, é atualmente do Ministério da Justiça, por força dos ditames da Lei n°9017/95, que deu nova redação à Lei n° 7.102/83. Recurso conhecido e provido para, declarando a Justiça do Trabalho incompetente para dirimir a presente controvérsia, extinguir o processo sem julgamento do mérito, a teor do art. 267, inciso IV, do CPC. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação civil pública - incompetência da Justiça do Trabalho em razão da matéria - instalação de portas de segurança giratórias. Conhecido por violação do artigo 114 da CF/l 988. - Mérito - provido. (TST-RR308.274/96 - 2a Turma - Rel. Min. Vantuil Abdala - DJU 19.05.2000) ISONOMIA SALARIAL. BNH. INCORPORAÇÃO PELA CEF BNH. Incorporação pela CEF. Quadro complementar. Enquadramento. Diferenças salariais. Isonomia. Ofensa. Não-configuração. A época da extinção do Banco Nacional de Habitação - BNH, seus empregados passaram a compor o quadro suplementar de pessoal da Caixa Econômica Federal. Constatou-se, na oportunidade, que o nível salarial dos empregados do extinto BNH era irrefutavelmente superior ao dos empregados da CEF. Com o precípuo objetivo de corrigir a referida distorção, a CEF procedeu a um ajuste, que consistiu em elevar os salários menores, que eram pagos a seus empregados, de forma a colocá-los em patamares idênticos aos empregados oriundos do BNH, medida viabilizadora da implantação do quadro único de empregados. Ressalta, nesse contexto, que o princípio da isonomia salarial não foi afrontado e, muito menos, se pode eficazmente falar em prejuízo e ofensa a direitos adquiridos. A medida adotada pela CEF - de criar um quadro único para corrigir as distorções salariais, implantando a devida e almejada justiça salarial entre empregados e um mesmo empregador - portanto, foi absolutamente legal. Precedentes desta Corte. Recurso de revista não conhecido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Sucessão trabalhista - CEF - BNH - quadro suplementar - diferenças - princípio da isonomia. - Recurso não conhecido. (TST-RR312.838/96 - 4a Turma - Rel. Min. Milton de Moura França - DJU 04.08.2000) JORNADA DE TRABALHO. REVEZAMENTO. AVISO PRÉVIO. REDUÇÃO DA JORNADA Regime de revezamento. Art. 7°, inciso XIV, da Constituição Federal. Intervalos intraturnos e repouso semanal não descaracterizam o sistema de turnos ininterruptos de revezamento. A intenção do legislador foi de amparar o trabalhador que, dada a permanente variação de horários de trabalho, tem uma sobrecarga maior de desgaste, e não de favorecer o desenvolvimento contínuo da atividade produtiva. Enunciado n° 360 do TST. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 420 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA Aviso prévio. Redução da jornada. A inobservância da jornada reduzida no período do aviso prévio implica sua nulidade, obrigando ao empregador a efetivação de referido pagamento, e não das horas extras correspondentes. Recurso de revista conhecido em parte e não provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Turnos ininterruptos de revezamento - caracterização - existência de intervalos intraturnos e repouso semanal. - Recurso não conhecido - violação legal e divergência jurisprudencial indicadas não caracterizadas. II - Aviso prévio - ausência de redução da jornada - efeitos - nulidade. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-360.061/97 -2a Turma - Rel. Min. José Luciano de Castilho Pereira - DJU 19.05.2000) JUIZ CLASSISTA. ENQUADRAMENTO SINDICAL Juiz classista. Comprovação de exercício profissional por dois anos. Enquadramento sindical.. Dá-se o enquadramento sindical, de acordo com a regra do art. 511, § 2°, da CLT, pela atividade preponderante da empresa. E a Lei n° 5.889/73 (arts. 2°e 3°), ao definira figura de empregado rural, deixa claro a necessidade da prestação de serviços a empregador rural, que, segundo a disposição legal, é “a pessoa física ou jurídica, proprietário ou não, que explore atividade agroeconômica, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou através de prepostos e com auxílio de empregados.” E, adiante (art. 4°), diz que “equipara-se ao empregador rural, a pessoa física ou jurídica que, habitualmente, em caráter profissional, e por conta de terceiros, execute serviços de natureza agrária, mediante utilização do trabalho de outrem.” Assim estabelecida a definição de empregador rural, inequívoco considerar que não se enquadra na conceituação empresa voltada à atividade de eletrificação rural. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão regional por ausência de notificação da autoridade que realizou a nomeação. - Preliminar rejeitada. II - Investidura de juiz classista - impugnação - repetição de petição inicial já ajuizada por outro interessado - descabimento. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. III - Investidura de juiz classista - impugnação - procedimento de habilitação - comprovação do exercício de atividade profissional - enquadramento sindical - rurícola - empresa de eletrificação rural, - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROIJC-558.664/99 - Pleno - Rel. Min. José Luiz Vasconcellos - DJU 02.06.2000) JUIZ CLASSISTA. IMPUGNAÇÃO DE INVESTIDURA Legitimidade ativa ad causam da Associação dos Magistrados e do Ministério Público do Trabalho para a propositura de impugnação à investidura de juiz classista. A AMATRA não tem legitimidade para propor a impugnação prevista no § 3° do art. 662 da CLT, uma vez que não tem interesse, no sentido processual, haja vista que Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 421 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA qualquer interessado para contestar investidura de juiz classista a que se refere o § 3o do art. 662 da CLT, é aquele que tem o interesse de agir, é qualquer pessoa que tenha se apresentado na disputa e que se sinta preterido na nomeação e não qualquer pessoa do povo. Recurso não provido. O Ministério Público do Trabalho tem legitimidade para recorrer assim no processo em que é parte, como naqueles que oficiou como fiscal da lei, a teor da Lei Complementar n° 75/93 e dos arts. 81 e 499, § 2o do CPC e 129 da CF. Recurso provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: Recurso da Associação dos Magistrados. I Juiz Classista - impugnação à investidura - legitimidade ativa ad causam - interesse de agir. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. Recurso do Ministério Público. I - Juiz Classista - impugnação à investidura - legitimidade ativa ad causam do Ministério Público do Trabalho. - Conhecido. - Mérito - provido. (TST-ROIJC-619.278/99 - Pleno - Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula - DJU 02.06.2000) JUSTA CAUSA. DESÍDIA. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÉPOCA PRÓPRIA Justa causa. Desídia (CLT, art. 482, alínea e). Não configuração. Interpretação teleológica. Não transgride o artigo 482, alínea e, da CLT decisão regional que mantém sentença que afasta a demissão por justa causa imputada ao reclamante pelo fato de o mesmo, em alguns dias, ter faltado ao serviço por motivo de estar se separando — problemas psicológicos — da esposa. Hipótese em que foi considerado o tempo de serviço do Reclamante na Reclamada — quase 10 anos — para atenuar o rigor da punição. Interpretação teleológica consentânea com a realidade, uma vez que na aplicação da lei o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum (art. 5o da Lei de Introdução ao Código Civil). Pertinência do Enunciado n° 221 do TST. Correção monetária. Época própria. Sendo a correção monetária a atualização do poder aquisitivo da moeda com a finalidade de restaurar o seu efetivo poder de aquisição, deve incidir apenas a partir do momento em que a verba torna-se legalmente exigível que, no caso de salários, é o quinto dia útil do mês subseqüente ao da prestação dos serviços. Logo, a incidência da correção monetária ocorre a partir do mês subseqüente ao da prestação do trabalho. Recurso de revista parcialmente conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Justa causa - desídia - caracterização - faltas reiteradas em decorrência de separação judicial. - Recurso não conhecido por aplicação dos Enunciados n°s 221 e296 do TST. II - Horas extras - diferenças - ônus da prova. - Recurso não conhecido por aplicação dos Enunciados n°s 126, 296e 297 do TST. III - FGTS - recolhimento - comprovação - ônus da prova. - Recurso não conhecido por aplicação dos Enunciados n°s 296 e297 do TST. IV - Correção monetária Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 422 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA - salário - época própria. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. (TST-RR-437.891/98-3a Turma-Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula-DJU 16.06.2000) . JUSTA CAUSA. EMPREGADO ESTÁVEL Recurso do município de Santa Bárbara D’Oeste. Remessa ex officio em ação rescisória. Empregado estável (art. 19 do ADCT/88). Dispensabilidade do inquérito judicial para apuração de falta grave. Violação de lei não configurada. In casu, não há como reconhecer violada a literalidade dos arts. 492 e 853 da CLT, porque nenhum desses dispositivos legais estabelece que a dispensa por justa causa do empregado estável, nos termos do art. 19 do ADCT/88, seja precedida do inquérito judicial para apuração da falta grave. E, mesmo que assim não fosse, não pode ser ignorado que a decisão que se pretende rescindir encontra-se calcada na prova produzida nos autos da reclamação trabalhista originária, a qual ofereceu elementos de convicção suficientes para que o juízo rescindendo considerasse comprovada a existência de falta grave, suficiente e apta para gerar a dispensa do obreiro sem ônus. Assim, o procedimento do inquérito judicial tornou-se dispensável. Recurso voluntário e remessa ex officio a que se dá provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - necessidade de indicação expressa do dispositivo violado - estabilidade do artigo 19 do ADCT da CF/1988 servidor público celetista - necessidade de inquérito judicial para apuração de falta grave. - Conhecido. - Mérito - provido. II - Ação rescisória - honorários advocatícios. - Conhecido. - Mérito - provido. (TST-RXOFROAR-352.400/97 - SBDI 2 - Rel. Min. Ronaldo José Lopes Leal - DJU 23.06.2000) LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. MULTA Embargos à SDI. Litigância de má-fé. Verdade dos fatos. Recurso protelatório. Multa. Tem total pertinência a condenação ao pagamento de multa e da indenização previstas no artigo 18 do Código de Processo Civil, se a parte se insurge contra o provimento do agravo de instrumento mediante argumentação dissociada da verdade dos autos. E isso porque, nessa hipótese, resta caracterizada inequívoca litigância de má- fé, tendo em vista não só a alteração da verdade dos fatos em torno dos quais gira a controvérsia (CPC, art. 17, inciso II), como também a utilização da via recursal com intuito manifestamente protelatório (CPC, artigo 17, inciso VII). Recurso de embargos não conhecido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Litigância de má-fé - recurso com intuito protelatório - multa - argumentação dissociada da verdade dos autos. - Embargos não conhecidos. (TST-EAIRR-528.170/99 - SBDI 1 - Rel. Min. Milton de Moura França DJU 16.06.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 423 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. PARCELA JÁ RECEBIDA Litigância de má-fé. Empregado. Parcela já recebida. Empregado que postula parcela já quitada no instrumento de rescisão contratual (adicional de férias), trazido com a petição inicial, sem ressalvas, incorre em sanção por litigância de má-fé. Imperiosa a necessidade de acentuar-se a repressão à má-fé processual do litigante no processo trabalhista, seja quem for, sob pena de negar-se toda a base de ética e de dignidade em que repousa a administração da Justiça pelo Estado. A intolerável complacência, senão leniência, com que a Justiça do Trabalho, não raro, tem tratado o exercício abusivo do direito de demandar e de defender-se tem concorrido apenas para encorajar tal prática. Inadmissível, todavia, que, por contada impunidade e do estímulo propiciado pelas comodidades da Informática, transforme-se o processo trabalhista em terreno propício ao aventureirismo irresponsável e contribua-se para congestionar ainda mais a sobrecarrega da Justiça do Trabalho. Inexistência de violação ao artigo 18, § 2o, do CPC, mormente porque quem demanda por dívida já resgatada, sem ressalvar, deduz pretensão contra texto expresso de lei (CLT, art. 477, § 2°) e altera a verdade dos fatos (nega ou oculta fato existente: o pagamento!). Recurso de revista não conhecido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Litigância de má-fé - multa - lide temerária - demanda por parcela quitada no instrumento de rescisão contratual. - Recurso não conhecido - violações legais indicadas não caracterizadas. II - Abono de férias - terço constitucional - compensação - adicional de férias - norma municipal. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-358.669/97 - 1a Turma - Rel. Min. João Oreste Dalazen - DJU 19.05.2000) MANDADO DE SEGURANÇA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. CUMULAÇÃO DE VANTAGENS NOS PROVENTOS DE APOSENTADORIA Incompetência da Justiça do Trabalho. Ainda que a União Federal participe no pólo passivo ou como autora na ação mandamental, a competência é desta justiça obreira, pois tanto o inciso I como o inciso VIII do art. 109 da Constituição Federal, ao definirem a competência ratione personae da Justiça Federal, excepcionam expressamente a competência da Justiça do Trabalho, além de se dever considerar que a competência para apreciar o writ, no nosso ordenamento jurídico, é definida pela autoridade coatora. Ademais, o art. 21, inciso VI, da LOMAN outorga privativamente aos Tribunais o julgamento originário dos mandados de segurança impetrados contra seus atos, os dos seus respectivos presidentes e os de suas Câmaras, Turmas ou Seções. Cumulação de vantagens nos proventos de aposentadoria. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 424 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA Disposição contida no artigo 5° da Lei n° 6.732/79 prevê que funcionário que se aposentar optando pelas vantagens previstas nos artigosl80 e 184 da Lei n° 1.711/52 não poderá usufruir do benefício previsto no artigo 2° do primeiro texto legal, pois esse dispositivo se refere a vantagem pessoal relativa a quintos, que, nos proventos de aposentadoria, não pode ser cumulada com o vencimento do cargo em comissão e da função gratificada que o funcionário estiver exercendo. Assim, ainda que o servidor tenha-se aposentado percebendo todas as vantagens, quando for constatada a irregularidade, não lhe ofende o direito adquirido o ato que determina a exclusão da vantagem paga a mais, sob pena de perpetuar o ilícito. Caracterizada a ilegalidade da cumulação das referidas vantagens, inexiste direito líquido e certo a ser garantido ao impetrante, razão pela qual mantenho o decisum regional. Recurso em mandado de segurança não provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de incompetência da Justiça do Trabalho argüida em contra-razões - ato de Juiz Presidente de Tribunal Regional do Trabalho. - Preliminar rejeitada. II - Preliminar de não cabimento do mandado de segurança por incidência da Súmula n° 266 do STF argüida em contra-razões. - Preliminar rejeitada. III - Mandado de segurança - servidor público - aposentadoria supressão de parcelas recebidas na ativa - gratificação de gabinete - GADF- direito adquirido. - Conhecido. (TST-ROMS-404.942/97- Órgão Especial-Rel. Min. Ronaldo José Lopes Leal - DJU 02.06.2000) MANDADO DE SEGURANÇA. DEPÓSITO RECURSAL. FALTA GRAVE. DIRIGENTE SINDICAL Depósito recursal e recurso ordinário em mandado de segurança. Não há obrigação de recolhimento de depósito recursal em sede de recurso ordinário interposto à decisão proferida em julgamento de mandado de segurança, porque, não havendo condenação, é necessária a garantia do juízo. Dirigente sindical. Suspensão do contrato de trabalho. Inquérito judicial para apuração de falta grave. Pedido de sustação da suspensão. Deferimento liminar. A questão referente à suspensão de dirigente sindical para a apuração da falta grave, geradora da demissão de empregado portador da garantia de emprego, é de alta indagação nos tribunais trabalhistas. Isto porque, no âmbito da legislação existente, a suspensão ou não do empregado para a instauração do inquérito judicial não ultrapassa o âmbito da faculdade patronal. Não há, então, qualquer possibilidade de enquadrar o ato que determina a perda da eficácia da suspensão entre aqueles que transgridem direito líquido e certo. Recurso ordinário em mandado de segurança desprovido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de deserção argüida em contra- razões - depósito recursal. - Preliminar rejeitada. II - Mandado de segurança - cassação de liminar de reintegração em reclamação trabalhista - dirigente sindical - suspensão para apuração de falta grave - inquérito judicial. - Conhecido. - Mérito - negado Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 425 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA provimento. (TST-ROMS-412.323/97- SBDI 2-Rel. Min. Francisco Fausto Paula de Medeiros - DJU 30.06.2000) MANDADO DE SEGURANÇA. ESTABILIDADE. DIRIGENTE SINDICAL Mandado de segurança. Estabilidade. Dirigente sindical. Reintegração. Abuso de direito. Tutela antecipada. Mandado de segurança contra liminar em processo trabalhista que determinou a reintegração de empregada eleita secretária do Departamento Feminino de Sindicato, cujos estatutos prevêem, entre titulares e suplentes, 328 dirigentes. A liberdade de auto-organização sindical (CF/88, artigo 8°, incisos I e III) permite ao estatuto do sindicato criar tantos cargos de direção quantos reputados necessários, mas a garantia de emprego somente beneficia dirigentes em número não superior aos cargos previstos no art. 522 da CLT. Não há arrimo legal para se consentir em que o sindicato amplie, além do previsto no art. 522, da CLT, o número de componentes de seus órgãos de administração contemplados com estabilidade sindical, sob pena de afronta ao art. 5°, inciso II, da Constituição da República. Ilegal e ofensivo ao direito líquido e certo da Impetrante o ato impugnado, concede-se a segurança para coibir-se abuso de direito. Recurso ordinário da empregada litisconsorte passiva a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Mandado de segurança - suspensão de liminar em reclamação trabalhista - tutela antecipada - reintegração - estabilidade - dirigente sindical - número de empregados beneficiados - limitação. - Conhecido. Mérito - negado provimento. (TST-ROMS-459.395/98 - SBDI 2 - Rel. Min. João Oreste Dalazen-DJU 19.05.2000) MANDADO DE SEGURANÇA. FGTS. INTERVENÇÃO. CEF Mandado de segurança. Pedido formulado pelo empregado referente à opção pelo FGTS, com efeito retroativo. Anuência do empregador. Não há como criar uma instância de prova em mandado de segurança. Assim, como está na inicial, o pedido de opção retroativa do FGTS foi exercitado pelo Litisconsorte em 06.07.92. Sobre a matéria, é tranqüila a jurisprudência do TST no sentido de ser imprescindível a anuência do empregador em se tratando de pedido formulado por empregado referente à opção pelo FGTS, com efeito retroativo. Intervenção da Caixa Econômica Federal no processo de opção. Não tem a Justiça do Trabalho porque homologar, como já fez no passado, opção retroativa quanto ao FGTS. Logo, não haveria porque chamara CEF para participar de jurisdição que o Juiz não tem. Entendo, entretanto, que o Mandado de Segurança se dirige apenas contra o ato do Juiz, que, equivocadamente, cuidou, em jurisdição voluntária, da mencionada opção. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3 jul/set 2000 426 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA Recurso ordinário conhecido e desprovido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de perda do objeto argüida pelo Ministério Público. - Preliminar rejeitada. II - Nulidade - litisconsórcio passivo necessário - ausência de notificação. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. III FGTS - opção retroativa - necessidade da anuência do empregador - homologação em jurisdição voluntária por Juiz do Trabalho. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROMS-333.712/96 - SBDI 2 - Rel. Min. José Luciano de Castilho Pereira — DJU 02.06.2000) MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA Mandado de segurança preventivo. Penhora. Bem particular. Sócio cotista minoritário. Teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Mandado de segurança visando a evitar a consumação da penhora sobre bens particulares de sócio minoritário em execução de sentença proferida em desfavor de sociedade por quotas de responsabilidade limitada, cuja dissolução se deu sem o encaminhamento do distrato à Junta Comercial. Em casos de abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito e violação aos estatutos sociais ou contrato social, o art. 28 da Lei n° 8.078/90 faculta ao Juiz responsabilizar ilimitadamente qualquer dos sócios pelo cumprimento da dívida, ante a insuficiência do patrimônio societário. Aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Recurso ordinário não provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Mandado de segurança preventivo - cabimento - execução - penhora - bem de sócio minoritário de empresa de responsabilidade limitada- teoria da desconsideração da pessoa jurídica - dissolução irregular da sociedade. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROMS-478.099/98 SBDI 2 - Rel. Min. João Oreste Dalazen - DJU 23.06.2000) MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA EM DINHEIRO Mandado de segurança. Execução provisória. Penhora em dinheiro. Mandado de segurança contra determinação, em execução provisória, de penhora sobre dinheiro, em detrimento do Certificado de Depósito Bancário (CDB), indicado para tal fim. Em se tratando de execução provisória e tendo o executado oferecido Certificado de Depósito Bancário (CDB) para a garantia do débito, enquanto não consolidada a dívida, constitui ofensa a direito líquido e certo a determinação de penhora sobre dinheiro, mormente quando não impugnado o bem oferecido pelo Exeqüente. Recurso ordinário a que se dá provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Mandado de segurança - execução provisória - penhora em dinheiro - ordem preferencial - substituição de bens indicados pelo Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 427 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA executado - certificados de depósito bancário - CDB. - Conhecido. - Mérito - provido. (TST-ROMS-431.362/98 - SBDI 2 - Rel. Min. João Oreste Dalazen - DJU 16.06.2000) MANDADO DE SEGURANÇA. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL Mandado de segurança. Supermercado. Funcionamento aos domingos. Acordo individual de compensação. Sindicato. Substituição processual. Mandado de segurança impetrado por supermercado, visando à abertura incondicionada do comércio aos domingos, ou observando meramente a celebração de acordos individuais de compensação, louvando-se do Decreto n° 27.048/49. Infundada a pretensão, pois desde o advento do Decreto Federal n° 99.467, de 2008-90, franqueou-se a abertura do comércio varejista em geral aos domingos e feriados, contanto que firmado “em Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho” e respeitada a competência dos Municípios para legislar sobre o horário de funcionamento do comércio local. A locução legal e constitucional “Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho” pressupõe obrigatória e inafastável intervenção do sindicato da categoria profissional para legitimar a compensação decorrente da abertura do comércio varejista em domingos e feriados. Recurso ordinário conhecido e desprovido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Mandado de segurança - regime compensatório - acordo individual - validade - sindicato - substituição processual - supermercado - funcionamento aos domingos. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROMS-468.052/98 — SBDI 2 — Rel. Min. João Oreste Dalazen — DJU 12.05.2000) MANDADO DE SEGURANÇA. SUSPENSÃO DE INTERMEDIAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA Mandado de segurança. Decisão concessiva de liminar requerida em sede de ação civil pública ajuizada contra a empresa ora impetrante consistente na proibição de se contratarem os serviços da cooperativa de trabalhadores; na suspensão da prática de intermediação de mão-de-obra em favor da empresa e na determinação de imediata contratação dos empregados com registro em carteira. Em que pese a legitimidade de parte do Ministério Público do Trabalho para patrocinar a ação civil, bem como a competência desta Justiça para processá-la e julgá-la, pois o pedido de suspensão das atividades da Cooperativa, de conteúdo constitutivo- negativo, reporta-se diretamente à relação de emprego, atraindo a aplicação do art. 114 da Constituição, que se notabiliza por sua incontrastável prodigalidade, assoma-se a inadmissibilidade da sua cumulação com o pedido de índole cominatória, indutora da ilegalidade da decisão que o acolheu liminarmente. Resta, de outra parte, evidenciada a abusividade da decisão impugnada na ação mandamental por ter subtraído o direito de Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 428 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA a empresa ora recorrida servir-se da mão-de-obra advinda da Cooperativa. Sobretudo porque só o poderia na esteira do acolhimento do pedido de que seja dissolvida compulsoriamente a cavaleiro da assinalada ilicitude de suas atividades, pois teria sido criada e controlada pela impetrante com o intuito de se pôr a salvo dos encargos oriundos da relação de emprego, cuja verificação demanda ampla dilação probatória incondizente com a cognição sumária inerente à liminar concedida na ação civil pública. Recurso ordinário a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Mandado de segurança - cabimento - cassação de liminar em ação civil pública - terceirização de mão-de-obra - cooperativa de trabalhadores. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROMS-589.373/99 - SBDI 2 - Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen - DJU 12.05.2000) MANDADO DE SEGURANÇA. TUTELA ANTECIPADA. REINTEGRAÇÃO AO SERVIÇO É notória a orientação jurisprudencial dominante nesta Corte sobre a inadmissibilidade do mandado de segurança para cassar ato concessivo de tutela antecipada se esse o foi no corpo da sentença ou, tendo-o sido o curso do processo, acabou ratificado na decisão definitiva, hipótese em que se tem preconizado o cabimento da cautelar inominada para imprimir efeito suspensivo ao recurso ordinário acaso interposto. Ocorre que compulsando os autos se constata que a tutela foi concedida em decisão à parte e não obstante o fosse na mesma data da prolação da sentença demérito, dessa não constou qualquer registro sobre a sua convalidação. Daí a certeza do cabimento do mandado de segurança, não só porque os efeitos da tutela antecipada não se confundem com os da sentença definitiva, mas sobretudo por causa do conteúdo interlocutório da decisão, em condições de atrair a regra da irrecorribilidade imediata das interlocutórias do art.893, § 1°, da CLT. De outro lado, além do equívoco de se ter postulado a tutela antecipada do artigo 273 do CPC, equívoco que fora endossado pela decisão que a concedera, pois em se tratando de obrigação de fazer a norma pertinente é a do art. 461 daquele Código, as próprias razões da decisão que a deferira dilucidam a não-ocorrência dos requisitos previstos indiferentemente num e noutro dos dispositivos em tela. Com efeito, depois de a douta autoridade dita coatora ter descartado a nulidade da resilição contratual pelo prisma da Convenção 158 da CLT, das normas regulamentares do impetrante recorrido ou mesmo de preceitos da Constituição do Estado, entendeu de acolhê-la por se tratar de empregado concursado de Sociedade de Economia Mista, a inviabilizar o exercício do poder potestativo, deixando subentendido a existência de estabilidade no emprego. Sucede que a tese ali abraçada não se mostra assim tão pacífica, como aliás o confessou o próprio magistrado de origem ao salientar “ser cediço que a questão da contratação/dispensa no âmbito da Administração Pública não é questão de fácil deslinde”, tendo em vista a larga dissensão doutrinária e jurisprudencial se a exigência do concurso público altera o sentido da norma do art. 173 da Constituição ou é capaz de sugerir a idéia de a resilição imotivada trazer implícita a do direito à estabilidade no cotejo com o art. 7°, inciso I, daquele Texto. Isso porque, além de o art. 173 ser Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 429 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA enfático ao equiparar as Sociedades de Economia Mista às Pessoas Jurídicas de Direito Privado, no que concerne, por exemplo, à aplicação do Direito do Trabalho, o art. 7o, inciso I, optou por priorizar a indenização compensatória em detrimento da estabilidade como forma de proteção da relação de emprego, a desautorizar, ao menos em sede de liminar, a ordem de imediata reintegração ao serviço por conta da inexistência de estabilidade ou garantia de emprego que a sustentasse. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Mandado de segurança - cabimento - tutela antecipada - concessão fora do corpo da sentença em ato à parte - não convalidação do ato pela sentença. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROMS- 570.743/99 - SBDI 2 - Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen - DJU 27.06.2000) MÉDICO. HORAS EXTRAS Horas extras. Lei n° 3.999/61. Médicos. Fixação de salário mínimo para a jornada de 4 horas de trabalho. Contratação para jornada de 8 horas de trabalho. Inexistência de direito ao pagamento, como extraordinárias, das horas excedentes da quarta diária. Recurso de revista a que se dá provimento, Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Médico - jornada de trabalho - salário mínimo profissional - Lei n° 3.999/1961 - horas extras. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. II- Servidor público - reajuste salarial - instrumento normativo- validade. - Recurso não conhecido por aplicação dos Enunciados n°s 296 e 297 do TST. (TST-RR-334.053/96 - 5a Turma - Rel. Min. Gelson de Azevedo - DJU 02.06.2000) MOTORISTA. EMPRESA RURAL. ENQUADRAMENTO. PRESCRIÇÃO O enquadramento do empregado como trabalhador rural ou urbano faz-se pelo princípio da atividade preponderante da empresa a quem este presta serviços. Assim sendo, na hipótese ora em exame, por ser o reclamante motorista de empresa rural, a ele são aplicáveis as regras previstas para os trabalhadores rurais, pouco importando o fato de pertencer a categoria profissional diferenciada. Revista parcialmente conhecida, mas desprovida. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Motorista - enquadramento - rurícola - atividade preponderante da empresa - prescrição. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. II - Horas in itinere - incidência - adicional de 25%. - Recurso não conhecido - violação legal e divergência jurisprudencial indicadas não caracterizadas - aplicação dos Enunciados n°s 296, e 337, inciso I, do TST. (TST-582.999/99 - 3a Turma - Rel. Min. Francisco Fausto Paula de Medeiros - DJU 16.06.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 430 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA MULTA. ATRASO NO PAGAMENTO DE VERBAS RESCISÓRIAS Massa falida. Multa por atraso no pagamento das verbas rescisórias. Inaplicabilidade do art. 477 da CLT. A multa prevista no art. 477 da CLT é incompatível com as normas da Lei de Falência, que exige a inscrição do crédito trabalhista no juízo falimentar, impossibilitando a rápida quitação das verbas rescisórias. Recurso de revista a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de deserção do recurso ordinário - custas processuais - depósito recursal - empresa em processo falimentar. - Preliminar não conhecida. II - Multa - artigo 477 da CLT - atraso no pagamento das verbas rescisórias - empresa em processo falimentar. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-630.988/00 -3a Turma - Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula — DJU 02.06.2000) NULIDADE. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. DECADÊNCIA PRESCRIÇÃO Preliminar de nulidade do acórdão regional por ausência de fundamentação. Não há que se falar em ausência de fundamentação do julgado, visto que foram expressamente adotadas pelo colegiado regional, como razão de decidir, os fundamentos expendidos no parecer exarado nos autos pela douta Procuradoria Regional do Trabalho no tópico em questão. Preliminar rejeitada. Decadência. Matéria não impugnada expressamente no recurso. Questão prejudicial suscitada no apelo. Trânsito em julgado após a decisão quanto à questão prejudicial. Prescrição. Somente ocorre o trânsito em julgado das matérias enfrentadas na decisão rescindenda, mesmo quando não impugnadas via recursal, dada a interposição de recurso apenas parcial pela parte vencida, veiculando questão prejudicial de mérito, quando resolvida tal questão, em caráter definitivo. Isso acontece ante a precariedade do decidido em relação à solução da questão prejudicial que, se acolhida, retira do mundo jurídico a condenação anteriormente imposta. Recurso ordinário provido para afastar a decadência e determinar o retomo dos autos. Sobrestado o julgamento do recurso ordinário quanto aos demais temas. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar nulidade do acórdão regional por ausência de fundamentação - adoção do parecer do Ministério Público pelo acórdão recorrido. - Preliminar rejeitada. II - Ação rescisória - decadência - impugnação parcial - matéria não objeto de recurso na decisão rescindenda e vinculada a questão prejudicial - trânsito em julgado - marco inicial - solução definitiva da prejudicial. Conhecido.-Mérito-provido. (TST-ROAR-456.94//98—SBDI 2 - Rel. Min. Francisco Fausto Paula de Medeiros - DJU 04.08.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 431 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA NULIDADE. CONTRATAÇÃO EM PERÍODO PRÉ-ELEITORAL A declaração de nulidade da contratação efetivada em período vedado pela legislação eleitoral produz efeitos ex tunc. Ressalva-se, neste caso, em face da impossibilidade de devolver ao trabalhador a força despendida, apenas os salários correspondentes ao trabalho efetivamente realizado, pois o direito não admite que alguém possa enriquecer sem causa, em detrimento de outrem. Recurso de Revista provido, julgando-se totalmente improcedentes os pedidos, em face do indeferimento já em Primeiro Grau do pleito relativo a saldo de salários. Tema(s) abordado(s) no acórdão: Recurso do reclamado. I- Servidor público contratação - nulidade - período eleitoral. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. Recurso do reclamante. - Prejudicado. (TST-RR-351.276/97 2a Turma -Rel. Min. Vantuil Abdala-DJU 19.05.2000) NULIDADE. CONTRATO DE TRABALHO. CUSTAS PROCESSUAIS. MUNICÍPIO Relação jurídico-empregatícia com ente municipal. Nulidade. Efeitos. Violência literal ao art. 37, § 2°, da Constituição Federal. A situação cotejada envolve força de trabalho do contratado, que não lhe pode ser restituída se for proclamada a nulidade da relação empregatícia. Há de se considerar que o vício do ato fulminado não pode propiciar o locupletamento da administração às custas do trabalho do contratado. Assim, diante das premissas lançadas, o Tribunal Superior do Trabalho, conjugando os princípios norteadores do direito, a hermenêutica constitucional e as regras de interpretação do ordenamento jurídico vigente, tem decidido que o empregado faz jus somente aos salários stricto sensu decorrentes da força de trabalho despendida. De resto, decisão rescindenda que imprime à nulidade do contrato de trabalho pactuado efeito ex nunc vulnera o artigo 37, § 2°, da Lei Fundamental e, em conseqüência, o artigo 485, inciso V, da Lei Adjetiva Civil. Custas processuais. Município. No âmbito da Justiça do Trabalho, são aplicáveis as disposições contidas no Decreto-Lei n° 779/69, de natureza especial, que não foi revogada pela Lei n° 9.289/96, de caráter geral. Tema(s) abordado(s) no acórdão: Recurso do Município. I - Ação rescisória servidor público - contratação - nulidade - ausência de concurso público. - Conhecido. - Mérito - provido. II - Entidade de direito público - privilégios processuais - revogação do Decreto-Lei n° 779/1979 pela Lei n° 9.289/1996 - custas processuais. Conhecido. - Mérito - negado provimento. Remessa necessária. - Recurso prejudicado. (TST-RXOFROAR-528.616/99 - SBDI 2 - Rel. Min. Ronaldo José Lopes Leal DJU 09.06.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 432 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA NULIDADE. VIOLAÇÃO DE PRECEITOS LEGAIS Nulidade do venerando acórdão recorrido. Omissão acerca dos preceitos legais invocados no recurso de revista. Exigência no sentido de que seja invocada a violação dos preceitos legais suscitados. Desnecessidade. Segundo a iterativa, notória e atual jurisprudência desta Corte, a obrigatoriedade quanto à invocação expressa, quer na revista, quer nos embargos, dos preceitos de lei tidos como violados, não significa exigir da parte a utilização de expressões verbais como “contrariou”, “feriu”, “violou”, etc., porquanto o que se pretende é que seja articulada a matéria e invocado o dispositivo legal pertinente, de modo a que se possa advir da argumentação expendida a violação suscitada. Embargos providos. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão proferido nos embargos declaratórios por negativa de prestação jurisdicional - admissibilidade recurso de revista - necessidade de indicação expressa do dispositivo violado. - Conhecido por violação dos artigos 93, inciso IX, da CF/1988 e 832 da CLT. - Mérito embargos acolhidos. (TST-ERR-200.126/95 -SBDI 1 -Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula - DJU 09.06.2000) PRECATÓRIO. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA Precatório. Atualização monetária. Data do efetivo pagamento. Já são diversos os julgados desta Colenda Corte que consignam a possibilidade de sucessivas atualizações monetárias, em face do pagamento pelo instrumento do precatório, cuja defasagem monetária chega a ser anual. O art. 100, § 1o, da Constituição Federal prevê para a Administração Pública apenas um mecanismo de prognóstico orçamentário, mas não a isenta de pagar ao credor o valor devidamente atualizado na data da satisfação do crédito. Recurso de revista não conhecido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Precatório - atualização monetária - juros de mora - data do efetivo pagamento. - Recurso não conhecido - violação legal indicada não caracterizada e aplicação do Enunciado n° 266 do TST. (TST-RR-360.032/97 3a Turma - Rel. Min. José Luiz Vasconcellos - DJU 12.05.2000) PROFESSOR. JORNADA DE TRABALHO EXTRAORDINÁRIA O excesso de jornada de trabalho do professor, cujo limite encontra-se estabelecido no art. 318 da Consolidação das Leis do Trabalho, deve ser remunerado com o adicional previsto no art. 7o, XVI, da Constituição da República. Recurso de revista a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão regional por cerceamento de defesa e por negativa de prestação jurisdicional. - Preliminar não conhecida-violações legais indicadas não caracterizadas - aplicação do Enunciado n° Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 433 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA 297 do TST. II - Professor - horas-aulas excedentes - incidência - adicional de horas extras. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-348.113/97 - 5a Turma-Rel. Min. Gelson de Azevedo-DJU 26.05.2000) QUINTOS. INCORPORAÇÃO Quintos. Incorporação. Exegese do art. 5° da Lei n° 9.624/98. Havendo a incorporação de quintos sido extinta pelo art. 15 da Lei n° 9.527/97, e levando-se em consideração que a Lei n° 9.624/98, a qual resguardou o cômputo do tempo de serviço residual para a concessão da próxima parcela, transformou, em seu art. 2°, os quintos em décimos, conclui-se que a incorporação deve ser feita na base de décimos e não de quintos, que já foram extintos. Recurso provido para julgar procedente, em parte, o pedido, deferindo ao requerente a incorporação de mais 1/10 (um décimo) da FC-3. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Matéria administrativa - servidor público gratificação por tempo de serviço - incorporação - conversão de quintos em décimos. - Conhecido. - Mérito - provido. (TST-RMA-529.184/99 - Pleno - Rel. Min. Rider Nogueira de Brito - DJU 02.06.2000) REAJUSTAMENTO SALARIAL. ACORDO COLETIVO Reajuste salarial. Previsão em acordo coletivo. índice contrário ao fixado pela legislação vigente. Hipótese em que o termo é posterior à lei. Prevalência da lei. Os reajustes salariais previstos em cláusulas coletivas de trabalho não prevalecem em frente das disposições de legislação sobre política salarial do governo federal, vigentes na data da formalização do ato negocial. Exegese do art. 623 da CLT. 2. Recurso ordinário em ação rescisória desprovido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Ação rescisória - violação a literal disposição de lei - incompetência da Junta de Conciliação e Julgamento para declarar nulidade de termo aditivo a acordo coletivo. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. II Ação rescisória - violação a literal disposição de lei - Plano Collor - IPC de março prevalência sobre cláusula de norma coletiva. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. III - Ação rescisória - erro de fato. - Conhecido. - Mérito - negado provimento. (TST-ROAR-434.062/98-SBDI 2 - Rel. Min. Francisco Fausto Paula de Medeiros -DJU 04.08.2000) RECURSO JUDICIAL INTERPOSTO POR FAC-SÍMILE Recurso ordinário interposto por fac-símile. Princípio da aplicabilidade da lei processual no tempo. Inexistência de norma processual pretérita reguladora de apresentação de ato processual mediante fac-símile. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 434 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA Em razão do princípio da aplicação das leis, a norma processual é de efeito imediato diante dos feitos pendentes, desde que se respeite a efetivação dos atos já praticados sob a vigência da lei anterior. Ocorre que, relativamente à interposição de recurso mediante fac simile, a aceitação condicionada à apresentação do original no prazo recursal residia em construção jurisprudencial e, no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, na Resolução Administrativa n° 48/92, ambas sem feitio legislativo stricto sensu. Destarte, considerando os fatos jurígenos dos autos e a norma inscrita no artigo 5°, inciso LV, da Constituição Federal, dá-se provimento ao agravo de instrumento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Recurso judicial - interposição via fac simile - data anterior à vigência da Lei n° 9.800/1999 - aplicação da lei no tempo - tempestividade. - Conhecido. (TST-AIRO-475.856/98 - SBDI 2 - Rel. Min. Ronaldo José Lopes Leal-DJU 23.06.2000) REINTEGRAÇÃO. CONVERSÃO EM INDENIZAÇÃO Reintegração. Conversão em indenização. Extensão. Aposentadoria. Não viola os artigos 128 e 460 do CPC decisão que converte reintegração, em face da impossibilidade de sua eficácia, em indenização até o advento da aposentadoria, face interpretação de normas coletivas existentes à época. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Estabilidade provisória - norma coletiva período de vigência exaurido - reintegração - empregado aposentado - conversão do direito em indenização até a data da aposentadoria. - Recurso não conhecido - violações legais e divergência jurisprudencial indicadas não caracterizadas - aplicação do Enunciado n° 296 do TST. (TST-RR-630.888/00 - 3a Turma-Rel. Min. José Luiz Vasconcellos — DJU 02.06.2000) REINTEGRAÇÃO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PORTADOR DE AIDS Tratando-se de dispensa motivada pelo fato de ser o empregado portador da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida - SIDA e sendo incontestável a atitude discriminatória perpetrada pela empresa, vedada pelo ordenamento jurídico pátrio, a despedida deve ser considerada nula, sendo devida a reintegração. Embargos não conhecidos. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão da turma por negativa de prestação jurisdicional. - Preliminar não conhecida - violações legais indicadas não caracterizadas. II - Reintegração - empregado portador do vírus da AIDS - HIV - ato discriminatório do empregador. - Recurso não conhecido - violações legais indicadas não caracterizadas - aplicação do Enunciado n° 296 do TST. III Admissibilidade - recurso de embargos - admissibilidade do recurso de revista - violação do artigo 896 da CLT - contrariedade aos Enunciados n°s 23, 126, 296 e 337, II, do TST - especificidade dos acórdãos- divergência. - Recurso não conhecido - viola Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 435 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ção legal e contrariedade a enunciados indicadas não caracterizadas. (TST-ERR217.791/95 - SBDI 1- Rel. Min. Vantuil Abdala- DJU 02.06.2000) REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. VALIDADE Pessoa jurídica. Validade do mandato. Necessidade de apresentação do estatuto social. Carece de previsão legal a exigência quanto à apresentação dos estatutos ou contrato social para o reconhecimento da validade de instrumento procuratório firmado por pessoa jurídica. Dispensável, portanto, ajuntada dos atos constitutivos, a não ser que haja dúvida razoável do juiz ou impugnação da parte contrária. E, mesmo nesta hipótese, deve o juiz conceder à parte a oportunidade de provar a legitimidade da representação, concedendo-lhe prazo razoável para que providencie a necessária juntada do documento, nos termos do artigo 13 do CPC. Recurso de revista conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão regional por negativa de prestação jurisdicional. - Preliminar não examinada - artigo 249, parágrafo 2o, do CPC. II - Irregularidade da representação processual - ausência do contrato social - artigo 13 do CPC - prazo para saneamento do vício. - Conhecido por violação do artigo 5o, inciso II, da CF/l988.-Mérito-provido. (TST-RR-342.578/972a Turma — Rel. Min. Vantuil Abdala - DJU 30.06.2000) RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DONO DA OBRA Dono da obra. Responsabilidade subsidiária. Inexistência. Há que ser bem separada a relação havida entre o empreiteiro e o dono da obra, de índole eminentemente civil, daquela existente entre o empreiteiro e seus empregados, integralmente regida pela legislação trabalhista. O dono da obra não é empregador dos trabalhadores que laboram para o empreiteiro e em relação a eles não é titular de qualquer direito ou obrigação de cunho trabalhista. O artigo 455 da CLT não guarda qualquer relação com o vínculo havido entre o empreiteiro e o dono da obra. O citado dispositivo consolidado rege o liame jurídico havido entre o empreiteiro, o subempreiteiro e seus empregados, atribuindo ao primeiro responsabilidade solidária pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas levado a efeito pelo segundo. Recurso de revista provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I-Responsabilidade subsidiária - dono da obra - empreiteiro. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. (TSTRR-547.314/99 - 4a Turma - Rel. Min. Milton de Moura França - DJU 19.05.2000) SALÁRIO IN NATURA. IMÓVEL FUNCIONAL Imóvel funcional. Natureza jurídica da cessão. Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 436 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA No caso dos imóveis funcionais, sua concessão pela Administração Pública fez, desde o início de Brasília, como condição para poder trazer do Rio de Janeiro os servidores federais que laboravam na antiga capital. Se, com o passar do tempo, o número de imóveis funcionais passou a ser insuficiente para atender a todos os servidores, garantindo-se a “benesse” apenas aos mais gabaritados, nem por isso deixou de ser condição de trabalho, mormente em face de que muitos dos beneficiários recebiam-no pelo fato de virem trabalhar em Brasília, oriundos dos mais variados Estados da Federação. Nesse sentido, verifica-se que os imóveis funcionais foram sempre fornecidos para o desempenho do cargo ou função na Administração Pública, devendo ser repassado a outro servidor, quando cessado o vínculo com a administração ou o exercício do cargo. Revista conhecida e não provida. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Salário in natura - servidor público - moradia - imóvel funcional. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-316.253/96 - 4a Turma - Rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho — DJU 16.06.2000) SERVIDOR DE AUTARQUIA ESTADUAL. SALÁRIO-BASE MENOR QUE O SALÁRIO MÍNIMO Salário é o conjunto de pagamentos feitos pelo empregador ao empregado, em decorrência do contrato de trabalho, seja como contraprestação do serviço, seja em razão da disponibilidade do trabalhador, das interrupções contratuais ou por força de lei. Esse entendimento não atenta contra a definição de salário mínimo, encontrada no art. 76 da CLT, nem é incompatível com o disposto no art. 7°, inciso IV, da Constituição Federal. Se o salário é pago em valor superior ao mínimo assegurado, considerada a soma de todas as parcelas que o compõem e que possuem natureza salarial, a garantia constitucional está sendo respeitada e a conceituação de salário mínimo observada. Revista a que se nega provimento. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Servidor público estadual - salário base valor inferior ao salário mínimo - validade. - Conhecido por divergência jurisprudencial.-Mérito-negado provimento. (TST-RR-356.132/97- 5ªTurma-Rel. Min. Rider Nogueira de Brito - DJU 02.06.2000) SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. CATEGORIA INORGANIZADA Embargos à SDI. Federação. Legitimidade ad causam. Substituição processual. Categoria inorganizada. Impossibilidade. Enunciado n° 359 do TST. A controvérsia existente em torno da possibilidade de as entidades sindicais de grau superior ingressarem em juízo, na qualidade de substituto processual da categoria não organizada, constituiu foco de reiterados debates no âmbito desta Corte até ser sedimentado o entendimento no sentido de que “A federação não tem legitimidade para ajuizar a ação de cumprimento previsto no art. 872, parágrafo único, da CLT na qualidade de substi Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 437 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA tuto processual da categoria inorganizada” (Enunciado n° 359 do TST). Realmente, se a federação não tem legitimidade para ajuizar ação de cumprimento, ao teor do art. 872, parágrafo único, da CLT, que se refere exclusivamente ao sindicato, muito menos possui legitimidade para ajuizar ação individual plúrima, ante a inexistência de disposição legal nesse sentido (art. 6°, § 2°, do CPC). Nesse contexto, a egrégia Turma, ao não conhecer do recurso de revista pela aplicação do óbice constante da alínea a, in fine, do art. 896 da CLT, contrariamente ao alegado, manteve a incolumidade do referido dispositivo legal. Recurso de embargos não conhecido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I-Admissibilidade-recurso de revista-substituição processual - federação - legitimidade - ação de cumprimento - categoria profissional inorganizada. - Embargos não conhecidos - violação legal indicada não caracterizada. (TST-ERR-147.215/94 - SBDI 1 - Rel. Min. Milton de Moura França DJU 16.06.2000) SUCESSÃO. RESPONSABILIDADE PELOS DÉBITOS TRABALHISTAS Ferrovia Centro Atlântico. Sucessão. Responsabilidade pelos débitos trabalhistas. A concessão de serviço público, com arrendamento da malha ferroviária e suas instalações à nova ferrovia pela Rede Ferroviária Federal, por implicar mudança de titularidade na exploração do negócio e continuidade na prestação dos serviços, configura a ocorrência de sucessão trabalhista. O fato de a transferência de bens ter se dado por arrendamento também não afasta a sucessão e a conseqüente responsabilidade da arrendatária pelo contrato de trabalho do reclamante no período anterior à concessão, eis que as alterações na estrutura jurídica da empresa ou a mudança na sua propriedade, uma e/ou outra não têm o condão de prejudicar direitos adquiridos do trabalhador. Recurso de revista improvido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Concessão de serviços públicos - responsabilidade solidária - débitos trabalhistas - empresa cessionária - contrato de arrendamento - sucessão trabalhista - caracterização. - Conhecido por divergência jurisprudencial - violações legais indicadas não caracterizadas - aplicação dos Enunciados n°s 221 e 297 do TST. - Mérito - negado provimento. II - Horas extras - integração - pagamento das diferenças postuladas. - Recurso não conhecido - violações legais indicadas não caracterizadas - aplicação dos Enunciados n°s 126, 296 e 297 do TST. (TST-RR-650.994/00 - 2a Turma - Rel. Juiz Convocado Márcio Ribeiro do Valle - DJU 30.06.2000) SUCESSÃO DE EMPRESAS. RESPONSABILIDADE DA SUCESSORA. VALIDADE. QUITAÇÃO. ENUNCIADO N° 330 O reconhecimento da sucessão de empresas depende do preenchimento de dois requisitos: é necessário que o estabelecimento, visto como unidade econômico-jurídi- Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 438 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ca, tenha a sua propriedade transferida para outro titular, e os serviços prestados pelos trabalhadores não sofram solução de continuidade. No caso dos autos, caracterizada está a sucessão, porquanto o exercício da atividade produtiva passou a ser desenvolvido pelo Banco Bandeirantes S/A, sem qualquer interrupção, usufruindo das agências, postos de serviços e pontos eletrônicos do sucedido. Recurso de revista desprovido no particular. Enunciado n° 330. Quitação. Validade. A orientação consubstanciada no Enunciado n° 330 da Súmula de jurisprudência desta Corte é clara no sentido de que a quitação passada pelo empregado, com a assistência do sindicato da categoria, ao empregador tem eficácia liberatória quanto às parcelas expressamente consignadas no termo de rescisão contratual, só podendo ser oportunamente discutidas se houver ressalva expressa e especificada quanto ao valor dado à parcela ou mesmo em relação à própria parcela impugnada. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Sucessão trabalhista - caracterização - responsabilidade do sucessor. - Conhecido por divergência jurisprudencial - aplicação do Enunciado n° 221 do TST. - Mérito - negado provimento. II - Rescisão contratual verbas rescisórias - recibo de quitação - homologação pelo sindicato - eficácia liberatória. - Conhecido por contrariedade ao Enunciado n° 330 do TST. - Mérito - provido. (TST-RR-473.056/98 -3a Turma - Rel. Min. Francisco Fausto Paula de Medeiros DJU 16.06.2000) SUCESSÃO TRABALHISTA. ARRENDAMENTO Na hipótese de sucessão de empresas, a responsabilidade quanto a débitos e obrigações trabalhistas recai sobre o sucessor, nos termos dos artigos 10 e 448 da CLT, em face do princípio da despersonalização do empregador. Apresenta-se irrelevante o vínculo estabelecido entre sucedido e sucessor, bem como a natureza do título que possibilitou ao titular do estabelecimento a utilização dos meios de produção nele organizados. Dá-se a sucessão de empresas nos contratos de arrendamento, mediante o qual o arrendatário ocupa-se da exploração do negócio, operando-se a transferência da unidade econômico-jurídica, bem como a continuidade na prestação de serviços. Recurso de revista parcialmente conhecido e não provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Preliminar de nulidade do acórdão regional por negativa de prestação jurisdicional. - Preliminar não conhecida - violações legais indicadas não caracterizadas. II - Preliminar de ilegitimidade passiva ad causam - responsabilidade solidária - sucessão trabalhista - concessão de serviços públicos - empresa cessionária. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - negado provimento. III - Sucessão trabalhista - contrato de arrendamento - responsabilidade solidária da empresa sucedida - débitos trabalhistas. - Conhecido por divergência ju- Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 439 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA risprudencial. - Mérito - negado provimento. (TST-RR-486.767/98 -1a Turma - Rel. Min. Milton de Moura França - DJU 12.05.2000) TELEFONISTA. JORNADA DE TRABALHO. EQUIPARAÇÃO Atendente de telemarketing. Equiparação a telefonista. A jornada reduzida prevista no artigo 227 da CLT tem por objetivo proteger o empregado, sendo mais lógico o entendimento no sentido de que o benefício não visa resguardar apenas os laboristas de empresas que explorem estritamente o serviço de telefonia. Se o Reclamante exercia a função de atendente de telemarketing, operando terminais telefônicos e de vídeo, prestando assistência pelo telefone a clientes e corretoras durante 06 (seis) horas por dia e trabalhando mais 02 (duas) em atividades outras, conforme reconhecido pelo próprio Regional, não há como afastar a sua pretensa equiparação aos telefonistas, já que, no presente caso, não se trata de vendedor que utilizava o telefone para efetuar vendas. Recurso provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Operador de “telemarketing” - equiparação - telefonista - jornada de trabalho reduzida - horas extras. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. (TST-RR-349.601/97 - 2a Turma - Rel. Juiz Convocado Márcio Ribeiro do Valle - DJU 09.06.2000) TURNO ININTERRUPTO DE REVEZAMENTO. FOLGAS SEMANAIS A concessão de folgas durante a semana não descaracteriza o turno ininterrupto de revezamento. A ininterruptividade a que alude o art. 7°, inciso XIV, da Carta Magna se refere à operacionalização da empresa. Ou seja, basta que a atividade empresarial seja contínua, ininterrupta, com os empregados cumprindo jornada de trabalho em sistema de escalas, para que esteja configurado o regime de turnos ininterruptos de revezamento, com jornada de 6 horas diárias. Na realidade, o benefício da jornada reduzida veio para compensar o prejuízo biológico, familiar e social, decorrente da alternância periódica de horários. Não sendo a simples concessão de folgas que irá neutralizar ou amenizar os efeitos danosos impostos ao empregado submetido a esse regime de trabalho. Revista conhecida e provida. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Turnos ininterruptos de revezamento - caracterização - concessão de folgas semanais - horas extras. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. (TST-RR-497.057798 - 5° Turma - Rel. Min. Rider Nogueira de Brito - DJU 04.08.2000) VALIDADE. TRANSAÇÃO PREVENTIVA DE LITÍGIO A transação é ato jurídico cuja validade subordina-se aos requisitos do art. 82 do CCB, o que restou caracterizado nos autos, pois o reclamante é agente capaz, o objeto Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 440 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA da transação é lícito, e a forma, conforme se extrai dos termos do acórdão do Regional, foi a prescrita em lei. O vulto dos direitos perseguidos na demanda não justifica o entendimento de que o obreiro sofreu prejuízo e de que, portanto, o acordo entre as partes é inválido. Isso porque a transação pressupõe a existência de concessões recíprocas, o que certamente foi avaliado pelo autor - advogado capacitado a ser vice-presidente de uma empresa -, sendo inadmissível que desconhecesse os efeitos de uma transação preventiva de litígio. Recurso de Revista conhecido e provido. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Nulidade do acórdão regional por não aplicação do Enunciado n° 278 do TST - efeito modificativo - embargos de declaração. Recurso não conhecido. II - Transação extrajudicial - efeitos - coisa julgada. - Conhecido por violação dos artigos 1025, 1029 e 1030 do CCB. - Mérito - provido. (TSTRR-574.471/99 - 5a Turma-Rel. Min. Rider Nogueira de Brito - DJU 04.08.2000) VÍNCULO EMPREGATÍCIO. OFICIAL DE JUSTIÇA AD HOC Recurso de revista. Oficial de justiça ad hoc. Continuidade do exercício da função. Irrelevância. Inexistência de vínculo empregatício. Afastadas as questiúnculas ligadas à onerosidade do serviço e à sujeição ao Juiz Diretor do Foro, em razão de não se admitir, de regra, o trabalho gratuito e a sujeição à autoridade se dever à condição do oficial ad hoc de auxiliar da justiça, a teor do art. 139 c/c 143, II, do CPC - inconfundível por isso mesmo com a subordinação jurídica inerente ao contrato de emprego, ganha invulgar relevo a questão da continuidade do serviço. Essa, porém, não pode ser encarada no sentido material da permanência na função, mas no sentido técnico-legal da persistência da nomeação original que o fora em caráter precário, sendo irrelevante não fossem baixados sucessivos atos que legitimassem a atuação como oficial de justiça ad hoc. Isso não só pela presunção de renovação tácita da nomeação precedente, mas sobretudo pela constatação de o ato praticado pelo magistrado o ter sido em caráter administrativo, norteado pelos princípios da impessoalidade e legalidade, em que a insinuada versão de Sua Excelência não os ter observado não transmuda o vinculo jurídico com a Administração Pública, que o será necessária e forçosamente administrativo. Tema(s) abordado(s) no acórdão: I - Oficial de justiça ad hoc - relação de emprego - exercício reiterado da função. - Conhecido por divergência jurisprudencial. - Mérito - provido. (TST-RR-248.416/96 - 4a Turma - Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen - DJU 26.05.2000) Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 441 ÍNDICE TEMÁTICO JURISPRUDÊNCIA Ação rescisória. Cabimento...........................................................................................................259 Ação rescisória. Litispendência...................................................................................................264 Ação rescisória. URPs de abril e maio/1988......................................................................... 260 Adicional de periculosidade. Eventualidade. Ferroviário.............................................266 Adicional de periculosidade. Ultratividade da norma coletiva.....................................268 Adicional de produtividade. Projeção ad futurum.............................................................270 Agravo regimental. Pedido de liminar em ação cautelar inominada incidente . 276 Aposentadoria espontânea. Verbas rescisórias...................................................................279 Coisa Julgada. Equiparação salarial. Configuração...........................................................282 Compensação de jornada. Acordo tácito. Devolução de descontos..........................290 Complementação de aposentadoria. Proporcionalidade................................................295 Conflito trabalhista no espaço. Trabalho no exterior........................................................301 Dissídio coletivo ajuizado por empresa. Legitimidade.....................................................307 Equiparação salarial. Configuração................................................................................................. Fundação estadual. Decreto-Lei n° 779/69............................................................................ 314 Honorários periciais. Valor superior ao sugerido pelo perito........................................317 Intempestividade. Embargos declaratórios...........................................................................319 Juiz classista. Recondução..............................................................................................................323 Justiça gratuita. Honorários periciais........................................................................................326 Limitação do litisconsórcio facultativo...................................................................................328 Mandado de segurança. Competência da Justiça do Trabalho. Alteração de regime jurídico......................................................................................................................................333 Mandado de segurança. Reintegração. Dirigente sindical.............................................341 Mandado de segurança. Tutela antecipada. Reintegração ao serviço........................338 Massa falida. Multa do art. 477 da CLT...................................................................................345 Medida cautelar incidental em mandado de segurança. Liberação de FGTS ... 348 Penhora. Empresa pública estadual...........................................................................................352 Penhorabilidade de bem vinculado a cédula de crédito rural........................................353 Plano de demissão incentivada. Adesão...................................................................................358 Preclusão. Coisa julgada................................................................................................................360 Preliminar de ilegitimidade ad causam. Liquidação extrajudicial.............................366 Professor. Jornada de trabalho extraordinária.....................................................................369 Reintegração. Dispensa imotivada..............................................................................................373 Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 445 ÍNDICE TEMÁTICO Reintegração no emprego..............................................................................................................376 Supressão de instância. Vínculo empregatício.....................................................................384 Vínculo empregatício. Diretor. Sociedade anônima..........................................................386 EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA Ação civil pública, interesse difuso...........................................................................................393 Ação rescisória. Anistia...................................................................................................................393 Ação rescisória - cabimento. Erro de fato - não configuração. Ação rescisória - revolvimento. Ação rescisória - Enunciado n° 298 do TST 394 Ação rescisória. Decadência........................................................................................................395 Ação rescisória. Inépcia da petição inicial.............................................................................395 Ação rescisória. Legitimidade. Terceiro interessado........................................................395 Ação rescisória. Prescrição...........................................................................................................396 Ação rescisória-remessa oficial. Decadência-Enunciado n° 100 do TST.. . . ........396 Ação rescisória. Vício da citação editalícia..........................................................................397 Acúmulo de funções. Motorista e carregador de caminhão..........................................398 Adicional de insalubridade. Exposição a raios solares ..................................................399 Adicional de periculosidade. Equiparação salarial.............................................................399 Adicional de periculosidade. Laudo pericial emprestado................................................399 Adicional de periculosidade. Piloto de aeronave.......................................... 400 Adicional de transferência. Reembolso - despesas de mudança..................................400 Admissibilidade. Recurso judicial.............................................................................................401 Advogado. Cargo de confiança...................................................................................................401 Advogado. Jornada de trabalho. Horas extras.....................................................................402 Agravo de instrumento. Traslado de peças.............................................................................402 Ajuda-alimentação -natureza salarial. Correção monetária-época própria. .. ........403 Aposentadoria espontânea. Extinção do contrato de trabalho.....................................403 Auxílio-alimentação. Incorporação ao salário.....................................................................404 Aviso prévio superior a 30 dias...................................................................................................404 Cipeiro. Inquérito................................................................................................................................405 Competência da Justiça do Trabalho. Dano moral e material.......................................405 Competência da Justiça do Trabalho. Previdência privada.............................................405 Confissão ficta. Uso de bip................................... 406 Contrato de experiência - rescisão. Multa rescisória - quitação incompleta das verbas rescisórias........................................................................................................................407 Descontos salariais. Contribuição previdenciária e fiscal.............................................407 Deserção. Depósito recursal...........................................................................................................408 Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 446 ÍNDICE TEMÁTICO Deserção. Depósito recursal. Validade...................................................................................408 Dirigentes sindicais. Número. Abuso de direito...................................................................409 Dispensa imotivada. Sociedade de economia mista...........................................................409 Empregado doméstico. Rescisão................................................................................................409 Estabilidade. Concurso público. Celetista.............................................................................410 Estabilidade provisória. Acidente de trabalho.....................................................................410 Estabilidade provisória. Associação profissional. Dirigentes.....................................411 Estabilidade provisória. Cipeiro. Falta grave........................................................................411 Estabilidade provisória. Cipeiro. Reintegração...................................................................412 Estabilidade provisória. Diretor de cooperativa...................................................................412 Estabilidade provisória. Período pré-eleitoral.....................................................................413 Execução. Impenhorabilidade. Crédito rural........................................................................413 Execução. Massa falida...................................................................................................................414 Férias em dobro...................................................................................................................................414 Gestante. Estabilidade provisória..............................................................................................415 Gestante. Interrupção da gravidez. Dolo................................................................................415 Gratificação natalina. Conversão pela URV do dia do pagamento.............................416 Greve. Abusividade. Descontos nas férias e no prêmio-assiduidade........................416 Grupo econômico. Contrato com empresas diversas........................................................416 Habeas corpus. Depositário. Recusa do encargo................................................................417 Horas extras - acordo de compensação e prorrogação. Horas extras contagem minuto a minuto. Adicional de insalubridade - base de cálculo. Correção monetária - época própria...........................................................................................417 Horas extras. Controle de jornada. Tacógrafo.....................................................................418 Horas extras - folhas individuais de presença. Correção monetária - créditos trabalhistas...........................................................................................................................418 Horas extras. Integração aos salários vincendos...................................................................419 Incompetência da Justiça do Trabalho. Ação civil pública.............................................419 Isonomia salarial. BNH. Incorporação pela CEF.................................................................420 Jornada de trabalho - revezamento. Aviso prévio - redução da jornada................. 420 Juiz classista. Enquadramento sindical...................................................................................421 Juiz classista. Impugnação de investidura.............................................................................421 Justa causa-desídia. Correção monetária-época própria.............................................422 Justa causa. Empregado estável...................................................................................................423 Litigância de má-fé. Multa................................................................... 423 Litigância de má-fé. Parcela já recebida.......................................... 424 Mandado de segurança - competência da Justiça do Trabalho. Cumulação de vantagens nos proventos de aposentadoria.....................................................................424 Rev. TST, Brasília, vol. 66, nº 3, jul/set 2000 447 ÍNDICE TEMÁTICO Mandado de segurança-depósito recursal. Falta grave-dirigente sindical .. 425 Mandado de segurança. Estabilidade. Dirigente sindical..............................................426 Mandado de segurança-FGTS. Intervenção-CEF................................................ 426 Mandado de segurança. Penhora...............................................................................................427 Mandado de segurança. Penhora em dinheiro...................................................................427 Mandado de segurança. Substituição processual..............................................................428 Mandado de segurança. Suspensão do intermediação de mão-de-obra 428 Mandado de segurança. Tutela antecipada. Reintegração ao serviço......................429 Médico. Horas extras.......................................................................................................................430 Motorista. Empresa rural. Enquadramento. Prescrição.................................................430 Multa. Atraso no pagamento de verbas rescisórias...........................................................431 Nulidade-ausência de fundamentação. Decadência-prescrição...........................431 Nulidade. Contratação em período pré-eleitoral..............................................................432 Nulidade - contrato de trabalho. Custas processuais - município...........................432 Nulidade. Violação de preceitos legais.................................................................................433 Precatório. Atualização monetária............................................................................................433 Professor. Jornada de trabalho extraordinária...................................................................433 Quintos. Incorporação....................................................................................................................434 Reajustamento salarial. Acordo coletivo..............................................................................434 Recurso judicial interposto por fac-símile............................................................................434 Reintegração. Conversão em indenização...........................................................................435 Reintegração. Dispensa discriminatória. Portador de AIDS.........................................435 Responsabilidade processual. Validade.................................................................................436 Responsabilidade solidária. Dono da obra............................................................................436 Salário in natura. Imóvel funcional.........................................................................................436 Servidor de autarquia estadual. Salário-base menor que o salário mínimo............ 437 Substituição processual. Categoria inorganizada..............................................................437 Sucessão. Responsabilidade pelos débitos trabalhistas.................................................438 Sucessão de empresas - responsabilidade da sucessora. Validade- quitação - Enunciado n° 330 .......................................................................................................438 Sucessão trabalhista. Arrendamento......................................................................................439 Telefonista. Jornada de trabalho. Equiparação ..............................................440 Turno ininterrupto de revezamento. Folgas semanais...................................................440 Validade. Transação preventiva de litígio............................................................................440 Vínculo empregatício. Oficial de justiça ad hoc.................................................................441 Rev. TST, Brasília, vol 66, nº 3, jul/set 2000 448