Artigo de periódico
Direitos trabalhistas: sua preservação como direitos humanos e fundamentais em tempo de Covid-19
Artigo de periódico
Direitos trabalhistas: sua preservação como direitos humanos e fundamentais em tempo de Covid-19
Trabalho redigido em pleno curso da pandemia no Brasil e no mundo, sem ainda o necessário distanciamento cronológico para avaliação de sua repercussão histórica nas sociedades e no comportamento das pessoas. Fala-se muito em uma virada de página histórica que traria um novo paradigma de sociedade com repercussão nas relações interpessoais, com maior solidariedade entre as pessoas e a inversão de prioridades na escala de valores, resultado também da quarentena reflexiva a que as pessoas estão submetidas. Como dito no início, ainda é cedo para uma avaliação definitiva das consequências da crise sanitária, podendo também conduzir a um resultado pessimista sobre o futuro, com a ampliação do individualismo, egoísmo, espiral de violência e uma busca desenfreada de vantagens. No primeiro momento, deve ser registrado que a humanidade tomou consciência de sua fragilidade, a despeito dos avanços tecnológicos já obtidos, em razão do impacto de que a existência de um simples vírus é suficiente para aniquilar toda uma geração ou várias delas. Também prevalece, ainda que não exista esse sentimento de união, a ideia da humanidade como um único agrupamento humano que, independente das particularidades de uma ou outra nação, encontra-se na mesma situação, o que acarreta a necessidade de uma maior aproximação pelo denominador comum de se tratar da mesma espécie humana. Essa internacionalização ou universalização do vírus que atende pelo nome de pandemia deveria trazer a ideia, que se tem dúvida de que esteja prevalecendo, de um problema comum que deve ser combatido de forma única e universal por todos os povos. Ocorre que, na prática, não tem sido assim por mais que a Organização Mundial de Saúde procure uniformizar procedimentos e iniciativas, pois é certo que impera um certo nacionalismo nocivo e estrábico, além dos já conhecidos negacionismos e sabotagens às medidas para fazer frente à crise sanitária. Tem-se, no caso, o ser humano com todas as suas idiossincrasias, pois, se de um lado, prevalece o virtuosismo demonstrado pela preocupação de salvar vidas nos hospitais com o risco de vida por parte dos profissionais da saúde, por outro, verifica-se a manifestação de interesses egoísticos nas "preocupações" com o retorno da atividade econômica. Quanto a esta, não se tem a menor dúvida da necessidade do retorno à normalidade, sendo que em muitos casos se trata de verdadeira questão de sobrevivência em algumas atividades, porquanto é fundamental que as empresas voltem à sua atuação no mercado e os empregos estejam garantidos. O que se tem aqui então é um aparente conflito de valores, ou seja, de um lado, a luta pela vida e sua garantia com o cumprimento das recomendações médicas e científicas e, de outro lado, a necessidade de retorno ao trabalho e ao giro normal da economia para que as pessoas possam também sobreviver e garantir a sua manutenção. Nessa antinomia de valores (apenas aparente) a serem preservados e colocados na mesa, é evidente que a garantia imediata da sobrevivência se torna imprescindível em face das demais consequências da tragédia pandêmica. Nesse cipoal de conflitos e tragédias situam-se os direitos trabalhistas, que não podem ser sacrificados em nome da "normalidade" e salvação da economia. Se há algo que deve ser preservado, sob pena de agravamento da tragédia, juntamente com a atividade econômica são os direitos trabalhistas e sociais, que se elevam à condição de direitos humanos e fundamentais. Nesse caso, como também ocorre com a pandemia, faz-se necessário um enfoque internacional na defesa dos direitos trabalhistas, porquanto, como direitos humanos, com a característica da universalização, somente com medidas de longo alcance em nível supranacional, que os coloquem na esfera dos direitos humanos que realmente são, é que poderão ter sucesso a sua defesa e garantia. É a perspectiva de defesa dos direitos trabalhistas e sociais como direitos humanos que não pode, em termos de proteção, variar de acordo com a conjuntura política, social e econômica, sendo igualmente certa a necessidade de sua preservação diante de eventuais inconstitucionalidades e de desvios de tratamento que a eles possam ser dados. Nesse passo, torna-se fundamental a atuação firme e sensível da jurisdição, não se afastando da sua missão de último reduto na garantia de direitos e de respeito à Constituição da República, por mais crítico que seja o momento vivenciado pela sociedade. Neste estudo, além da referência necessária à pandemia, entende-se que a preservação dos direitos trabalhistas significa não se olvidar da sua condição de direitos humanos e fundamentais, apontando para o importante papel a ser desempenhado pela jurisdição em quadra histórica de dificuldades coletivas e transnacionais.
Para citar este item
https://hdl.handle.net/20.500.12178/180588Notas de conteúdo
Covid-19: números - análises -- Direitos trabalhistas: direitos humanos e fundamentaisFonte
KOURY, Luiz Ronan Neves. Direitos trabalhistas: sua preservação como direitos humanos e fundamentais em tempo de Covid-19. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, Belo Horizonte, Edição especial, t. 1, p. 133-146, jul. 2020.Veja também
-
O trabalho decente como direito humano e fundamental
Alvarenga, Rúbia Zanotelli de | dez. 2014Os direitos humanos fundamentais constituem o conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano, que tem como finalidades precípuas o respeito à sua dignidade – por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal – e o estabelecimento de condições mínimas de vida e de desenvolvimento da personalidade ... -
Evolución del sistema procesal laboral en Guatemala
Valenzuela Herrera, Augusto | set. 2012[por] Em termos comuns a oralidade é entendida como uma forma de comunicação através do uso de palavras dirigidas a outras pessoas, do ponto de vista legal, o procedimento vai além do conceito de uma forma de comunicação, uma vez que o princípio da oralidade na direito processual estabelece a necessidade para a realização ... -
A interpretação da MP n. 927/20 no que pertine à adoção flexibilizada do teletrabalho em tempos de pandemia: a preservação da vida e saúde do trabalhador
Lopes, Adriano Marcos Soriano; Santos, Solainy Beltrão dos | 2020A MP n. 927/20 deve ser interpretada à luz da conformidade constitucional de modo a permitir a preservação da saúde do trabalhador. O trabalho visa elucidar se o teletrabalho regulamentado pela norma emergencial pode ser utilizado por empresas que não foram açambarcadas pela crise ocasionada pela pandemia. Para tanto, a ... -
O salário-família e a sua destinação social como direito fundamental do segurado de baixa renda
Alvarenga, Rúbia Zanotelli de; Broetto, Matheus Giacomin | jan. 2021Tem como tema central o instituto salário-família, consagrado como benefício previdenciário pela Lei n. 8.213/1991 – Lei dos Benefícios Previdenciários – como um direito social que é conferido ao segurado de baixa renda, inclusive o doméstico e ao trabalhador avulso, de acordo com o número de filhos menores de 14 (quatorze) ... -
O teletrabalho no contexto da pandemia: interpretação da Medida provisória n. 927/2020 à luz do artigo 7º, XIII, da Constituição Federal
Boff, Amanda Brazaca | 2020As medidas preventivas destinadas ao controle do contágio pelo novo coronavírus (Covid-19) reverberaram significativamente em todas as esferas que envolvem o trabalho humano. A imperiosa adoção de instrumentos para o enfrentamento da crise econômica e social instaurada ensejou a edição de sucessivos atos normativos, ... -
O trabalho infantil sob a ótica constitucional e aplicabilidade da Convenção n. 138 da OIT na Justiça do Trabalho
Dias, Sandra Mara de Oliveira | jun. 2014Ao analisar a evolução histórica do trabalho infantil no mundo, constata-se que este sempre fez parte da história da humanidade em todas as civilizações, desde os tempos bíblicos. Há relatos, no Antigo Testamento, de que Davi tocava harpa para acalmar o Rei Saul e pastoreava as ovelhas de seu pai para ajudar sua família. ... -
A Lei 14151/2021 e o afastamento compulsório da empregada gestante: uma análise à luz do direito brasileiro de fontes interna e internacional
Vieira, Luciane Klein; Webers, Aline Graziela Bald | out. 2022[por] Analisa a Lei 14151/2021, que introduziu em seu texto o afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial durante o período de emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus. A pesquisa é qualitativa, realizada por meio do método normativo-descritivo, valendo-se de procedimento ... -
Informativo TST: n. 267 (1º a 17 fev. 2023)
Brasil. Tribunal Superior do Trabalho (TST) | 17 fev. 2023 -
Liberdade econômica em tempo de crise sanitária e econômica: um desafio à igualdade e à liberdade substanciais
Carvalho, Augusto César Leite de | 2021Trata da liberdade e da igualdade, investigando, em perspectiva histórica, o sentido e o alcance desses valores fundamentais em tempo de crise sanitária contingente e crise econômica que persiste e recrudesce a vulnerabilidade dos trabalhadores, em sua relação com o capital e com as instituições que oscilam entre legitimar ... -
O trabalho infantojuvenil proibido: prevenção e erradicação
Ribeiro, Gaysita Schaan | jun. 2009O trabalho infantojuvenil é, hoje, uma preocupação mundial, e o problema não atinge apenas os países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. Trata-se de um fenômeno que não é próprio apenas da modernidade, mas que atualmente tem sido foco de atenção por parte de toda a comunidade internacional, no sentido de identificar ...