Artigo de periódico
Manifesto pela democracia desportiva na reforma da Lei Pelé
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Manifesto pela democracia desportiva na reforma da Lei Pelé
A Lei n. 9.615/98, conhecida como "Lei Pelé", estabelece normas gerais sobre o esporte. No entanto, várias de suas disposições organizam uma peculiar espécie de esporte: o futebol. A gestão deste esporte, parte constitutiva da própria "alma brasileira", alcançou tamanho grau de especulação econômica, que se fez necessário disciplinar o "comércio" de jogadores. Representantes dos clubes de futebol, com o apoio dos Ministros do Esporte e do Trabalho, formularam um projeto de lei para alterar a Lei Pelé. Esse projeto de lei recebeu o n. 5.186/2005, e teve tramitação privilegiada, no início, por ter sido acompanhado de uma Mensagem de Urgência Constitucional do Presidente da República (art. 64, § 1º da CF) . Com o término da legislatura 2003/2006, a proposição aguardou a criação de nova comissão especial. A partir de 24 de junho de 2008, tiveram início intensos trabalhos para sua aprovação, agora sob regime de prioridade. O relator da Comissão Especial, Deputado José Rocha, apresentou substitutivo em dezembro de 2008, modificando substancialmente o projeto inicial em vários aspectos. O deputado José Rocha, que possui uma extensa e ininterrupta carreira política, também é há tempos vinculado aos cartolas do mundo futebolístico: foi presidente do Esporte Clube Vitória em 1983 e 1985. O substitutivo a ser votado inova a ordem jurídica em vários pontos. No que diz respeito aos objetivos deste artigo, ressaltamos os seguintes: a) natureza jurídica do direito de arena; b) disciplina da formação profissional dos atletas; c) financiamento da formação profissional de atletas e o mecanismo de solidariedade; d) redistribuição de recursos para o esporte; e) representação do Conselho Nacional do Esporte. O projeto também omitiu pontos importantes. É que a Lei Pelé possuía várias imperfeições, muitas delas decorrentes de alterações subsequentes, que lhe vieram piorar o conteúdo. Essas imperfeições não têm sido enfrentadas nos debates políticos sobre a matéria. Mas o que é mais grave é que se está reformulando um "sistema nacional do desporto" sem a real participação de todos os segmentos da sociedade. O lobby dos clubes de futebol é tão forte que vem conseguindo impor suas intenções sobre os interesses do governo, e com maior facilidade, sobre os interesses da sociedade brasileira. Uma dessas intenções é afastar as relações de trabalho das regras gerais da CLT, simplificando e precarizando o esporte. A propósito, não é de hoje que se sabe que, principalmente no futebol, é extremamente importante o desenvolvimento de mecanismos de proteção social, seja para amparar atletas em fim de carreira, seja para garantir as necessidades básicas de atletas em formação. Todas as Leis que estabeleceram normas gerais sobre o esporte mencionavam essa preocupação, mas nunca se atreveram a solucioná-la de fato. É por este motivo que faz tanta falta que outras perspectivas sejam consideradas nesse debate sobre "reforma da Lei Pelé", e não apenas a do interesse dos gestores do futebol (clubes e federações). A perspectiva que apresentaremos aqui está comprometida com a garantia dos direitos sociais e com a defesa da ordem jurídica trabalhista. Esse compromisso não se limita à preservação das normas sobre a contratualidade nas relações profissionais, mas também pretende a criação de um verdadeiro sistema que financie a formação profissional e a dê suporte ao processo de finalização da carreira do atleta maduro. Para tanto, é preciso resgatar, com absoluta prioridade, a prevalência do direito nacional em face de "regulamentos desportivos", uma vez que as regras desportivas não podem se sobrepor às normas constitucionais brasileiras, nem aos tratados internacionais que o país subscreveu, especialmente em matéria de direito social e direitos humanos.
Para citar este item
https://hdl.handle.net/20.500.12178/165936Itens relacionados
Notas de conteúdo
Prevalência do direito nacional e do direito do trabalho. O falso amadorismo. Inadmissibilidade do tratamento desigual entre atletas que disputam competições profissionais -- Civilização do direito de arena -- A formação profissional dos atletas. A formação profissional segundo o substitutivo que pretende alterar a Lei Pelé. Financiamento da atividade de formação profissional de atletas: mecanismo de solidariedade e outras fontes: o mecanismo de solidariedade: outras fontes -- Sobre os recursos para o esporte. Recursos do Ministério do Esporte. Recursos do COB e CPB. Recursos da Federação das Associações de Atletas Profissionais - FAAP. Recursos provenientes de leis de incentivo ao esporte. Redistribuição de recursos no âmbito da proposta capitaneada pelos Clubes de Futebol (o substitutivo ao PL n. 5.186/2005) -- Sobre a representação do Conselho Nacional do EsporteFonte
LOPES, Cristiane Maria Sbalqueiro. Manifesto pela democracia desportiva na reforma da Lei Pelé. Revista Ltr: legislação do trabalho, São Paulo, v. 74, n. 3, p. 346-359, mar. 2010.Assunto
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